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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

Mostrando postagens com marcador Trump. Mostrar todas as postagens
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sábado, 5 de abril de 2025

Trump, protecionismo e a história como farsa - Leonardo Weller (Folha de S. Paulo)

Trump, protecionismo e a história como farsa

Leonardo Weller*

Folha de S. Paulo, 5/04/2025

É bem capaz que o presidente americano pague um preço amargo pela barafunda saudosista em que está se metendo

 

Donald Trump chocou o mundo com o surpreendente pacote protecionista anunciado no dia 2 de abril, data por ele batizada de "Dia da Libertação". Segundo a revista britânica The Economist, a tarifa média dos EUA deve se elevar dos atuais 2% para nada menos do que 24%, patamar inconcebível há décadas. O presidente apresenta seu violento tarifaço como um retorno ao passado. Reiteradamente Trump afirma que altas tarifas servirão para reindustrializar seu país, fazendo a América "great again".

Há um fundo de verdade no saudosismo protecionista de Trump. No entanto, como é de praxe com idealizações da história que tentam trazer o passado para o presente, também há muito de engodo e cilada nesta tentativa de guinada autárquica.

A história da política comercial estadunidense é marcada pelo protecionismo. O governo de Washington permaneceu à margem do liberalismo do século 19, quando o Reino Unido liderou um inédito processo europeu de abertura comercial. Na contramão do que se passava no outro lado do Atlântico, os EUA elevaram suas tarifas para quase 50% após a Guerra Civil, nos anos 1860. Política comercial foi, junto com escravidão, um dos temas contenciosos do conflito.

Enquanto o Sul defendia a redução de barreiras às importações, o Norte, em pleno processo de industrialização, almejava reservar o mercado interno para os bens produzidos em suas fábricas. A União nortista ganhou e levou: a escravidão acabou e o protecionismo se recrudesceu.

Segundo o historiador econômico Robert Allen, em seu artigo "Excepcionalismo americano como um problema na história global" ("American exceptionalism as a problem in Global History"), as altas tarifas ajudaram os EUA a se industrializarem. Com vastos recursos naturais, aquela economia tinha vantagens comparativas em commodities, assim como o resto do continente americano. Para Allen, foi graças ao protecionismo que as fábricas estadunidenses resistiram à competição britânica, condição necessária para que, no século 20, assumissem a liderança industrial do mundo.

Uma segunda rodada protecionista ocorreu em 1930, no início da Grande Depressão, quando o presidente Hoover sancionou uma lei que elevava tarifas no intuito desesperado de conter a crise econômica. O resultado foi uma onda de retaliações ao redor do mundo. Estudos históricos recentes mostram que a medida influiu na abrupta queda do comércio global, embora não tenha sido a causa da depressão. De todo modo, o aumento das tarifas foi uma iniciativa errada em uma conjuntura difícil, tornando-a ainda pior.

Os EUA finalmente reduziram suas tarifas no pós-guerra ao comandarem o Acordo Geral de Tarifas e Comércio. A liberalização comercial contribuiu para o crescimento mundial verificado no período, durante o qual economias da ÁsiaEuropa e América Latina cresceram mais do que a estadunidense. A pujança global era vista com bons olhos em Washington: entendia-se que o sucesso do comércio mundial ajudaria a conter o comunismo. A Guerra Fria não era o único motivo da liberalização do pós-guerra, mas certamente foi um de seus condicionantes mais importantes.

Em retrospecto, até que demorou para que o liberalismo do pós-guerra ruísse, haja vista que o Muro de Berlim caiu há mais de três décadas. Desde então, a China se tornou o motor da indústria mundial e o Ocidente —inclusive os EUA— se desindustrializou.

O protecionismo trumpista tem, portanto, algum cabimento histórico. Mas o retorno ao passado é impossível. Os estadunidenses simplesmente não estão aptos a trabalharem como os chineses —o documentário "American Factory" é uma divertida ilustração deste fato. O tarifaço de Trump penalizará tanto os consumidores quanto o que sobrou da indústria. Após décadas se beneficiando de importados baratos, os EUA não estão preparados para a escassez de bens que virá a reboque, com quebras de cadeias produtivas e alta da inflação.

É de se esperar uma forte reação política interna. No final, é bem capaz que o próprio Trump pague um preço amargo pela barafunda saudosista em que está se metendo –e levando consigo seus compatriotas e o resto do mundo.

 

*Doutor em história econômica pela London School of Economics, professor da FGV/EESP e autor de "Democracia negociada: política partidária no Brasil da Nova República"

 



terça-feira, 1 de abril de 2025

Meu Primeiro de Abril de verdade - Paulo Roberto de Almeida

 Esta minha postagem, feita há vários dias, parece ter recolhido algum apoio entre os meus 18 seguidores no Linkedin; mas também saiu por aqui, por isso estou postando novamente:

Impasse

Os Democratas têm vergonha e não querem proclamar ao mundo que sua grande nação está sendo “dirigida” por um completo imbecil. 

Os Republicanos que foram seduzidos e submetidos tampouco querem admitir que deu tudo errado e agora são caudatários de um idiota total.

Poucas vezes na história, um país inteiro hesita em reconhecer que todos, absolutamente todos, estão entregues a um cretino fundamental, o Grande Mentecapto.

Agora é tarde?”

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Completo, complemento, utilizando-me, mais uma vez, de um “figura de estilo” de Nelson Rodrigues:

Todos os dias, invariavelmente todos os dias, o noticiário do mundo inteiro nos fornece provas contundentes de que a nação mais poderosa da Terra está sendo (des)conduzida, levada e rebaixada por um cretino fundamental, o que deve ser um motivo de humilhação para um grande número de seus nacionais.

Assino e dato:

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 1ro de abril de 2025

(Mas NÃO É um Primeiro de Abril; é uma triste realidade)

terça-feira, 18 de março de 2025

O que nenhum ditador comunista conseguiu fazer, foi feito por Trump: silenciar a Voice of America - Dana Milbank The Washington Post

From the Washington Post, March 18, 2025 

domingo, 16 de março de 2025

O impasse - Paulo Roberto de Almeida

 Os Democratas têm vergonha e não querem proclamar ao mundo que sua grande nação está sendo “dirigida” por um completo imbecil. 

Os Republicanos, que foram seduzidos e submetidos, tampouco querem admitir que deu tudo errado e que agora são caudatários de um idiota total.

Poucas vezes na história um país inteiro hesita em reconhecer que todos, absolutamente todos estão entregues a um cretino fundamental, o Grande Mentecapto.

segunda-feira, 10 de março de 2025

Interpretando uma foto altamente simbólica

Putin deve estar dizendo para si próprio:

"Nunca pensei que fosse tão fácil enganar esse idiota, e com isso consigo desativar a política externa do meu outrora inimigo."

De fato não parece muito difíl, quando se é um tirano com grandes projetos em face de um aprendiz de ditador...


quarta-feira, 5 de março de 2025

Vamos olhar para dentro, again (Economic Consequences of Mister Trump) - Paulo Roberto de Almeida

Vamos olhar para dentro, again

Paulo Roberto de Almeida

Nota sobre o retorno dos EUA sobre si mesmo, na introversão trumpista. 


        Trump está anunciando o maior programa de introversão umbilical da história dos EUA, ever. Não sei se vai conseguir nos próximos 3,5 anos, mas é possível que consiga entravar os EUA por anos à frente.

        Xi Jinping e toda a China agradecem a facilitação desse trabalho no sentido de “make China great again”. 

        Três séculos atrás, um Imperador idiota, aconselhado por mandarins talvez  “republicanos”, resolveu fechar os portos da China aos contatos estrangeiros, expulsar os “imigrantes” e passar a viver na excelência de suas realizações anteriores, excelentes até ali.

        Em consequência, a China passou em branco pela primeira revolução industrial, pela segunda, e na terceira, estava imersa no Grande Salto para a Frente e na Revolução Cultural do maoísmo demencial, e conseguiu recuar o gigante asiático da primeira economia do mundo (1/3 do PIB global) até o século XVIII, para menos de 5% do PIB total sob Mao.

        Deng, com certo esforço, logrou colar a China à 4a. revolução industrial, e ela já está a caminho da 5a. e possivelmente já está na 6a., com distinção.

        Trump quer recuar os EUA abaixo da 3a. revolução industrial, para o fordismo da 2a., a do motor à explosão e do petróleo.

        Os chineses só observam, satisfeitos, mas silenciosos. 

        Como diria Napoleão, nunca interrompa seu inimigo quando ele estiver fazendo alguma bobagem. Keep quiet China!

        Trump está ajudando a fazer a China great again, e ela agradece, mas só silenciosamente, para não interromper esse magnífico processo de retrocesso programado, deliberado e voluntário.

        Arnold Toynbee e Carlo Maria Cipolla, estudiosos da sucessão e da decadência dos impérios, já faleceram, pois teriam excelente material empírico para continuar A Study of History e The Economic Decline of Empires em novas bases, nunca antes vistas na História.

        Trump merece todo o crédito pela obra grandiosa, aplaudido freneticamente pelos republicanos amestrados.

        Confesso que eu nunca esperei ter uma exposição completa de um painel inteiro do desenvolvimento histórico num único discurso alucinante no Congresso americano. Thanks Donald: como diria Keynes, teremos consequências econômicas de Mister Trump.

        Encerro, deplorando o espetáculo.

Paulo Roberto Almeida

Brasília, 5 de março de 2025


domingo, 2 de março de 2025

O “Ocidente” dos últimos 80 anos está temporariamente aposentado, Trump oblige - Amilton Aquino (via FB)

 Copiando postagem de Amilton Aquino, graças à boa atenção de Walmyr Buzatto:

“Não queria escrever mais um post sobre Trump, mas o que aconteceu nesta sexta é de uma importância tão grande que será lembrado nos livros de história como o dia em que a ordem internacional do pós-guerra foi definitivamente sepultada. Na verdade, isso já vinha acontecendo desde a campanha presidencial dos EUA, quando Trump começou a normalizar Putin. A constrangedora situação a que Zelensky foi submetido apenas ratificou da forma mais vil possível aquilo que muitos defensores de Trump se recusavam a enxergar: os EUA abriram mão de seu papel de liderança das democracias. A OTAN já não garante a segurança do bloco ocidental. Agora, a lei é cada um por si, a lei do mais forte, um novo mundo onde EUA, China e Rússia ditam as regras conforme seus interesses geopolíticos e comerciais, passando por cima de valores e consensos que o mundo levou décadas para amadurecer depois de muito sofrimento.

A partir de hoje, países até então problemáticos para a paz mundial, como Alemanha e Japão, que se tornaram dois dos países mais pacíficos do mundo em troca do escudo norte-americano, podem iniciar corridas para desenvolver seus próprios arsenais nucleares. O mesmo pode acontecer com a Ucrânia, que hoje lamenta ter aceitado o acordo de 1994, no qual entregou seu arsenal à Rússia em troca de proteção da OTAN de uma eventual agressão russa.

Portanto, ao contrário do discurso hipócrita de Trump, que se diz muito preocupado em “promover a paz” a qualquer custo, igualando agressor e agredido (o mesmo discurso de Lula e Bolsonaro, vale lembrar), o mundo ficará muito mais perigoso nos próximos anos. Inclusive para os EUA, que hoje estão protegidos por um oceano, como argumentou Zelensky. Ou seja, ele não falou nada demais, mas Trump transformou algo óbvio em uma agressão aos EUA, afirmando com o dedo em riste que Zelensky não tinha o direito de dizer “como os norte-americanos se sentirão”. E encerrou a conversa, negando-lhe o pedido de falar, e ainda o cutucou dizendo que ele “já tinha falado demais”, sugerindo que tudo aquilo que aconteceu seria uma festa para a imprensa. De longe, o maior desastre para a história da diplomacia mundial.

Embora muita gente tenha achado que Zelensky não foi hábil o suficiente para se desvencilhar da má vontade de seus dois detratores, me parece muito claro que, se o evento não foi uma arapuca previamente armada para humilhá-lo, na prática foi o que Trump e Vance fizeram.

Conseguiram? Pela reação mundo afora, acho que o tiro saiu pela culatra, pois os representantes das principais democracias se manifestaram em peso em solidariedade a Zelensky. Na minha timeline pipocam a apoios a Zelensky, contrastando com algumas postagens que tentam “justificar” o xadrez 4D de Trump. Curiosamente, essas justificativas vêm da direita iliberal, trumpista/bolsonarista, ou da esquerda jurássica, saudosa da antiga URSS, que vê em Putin um desafiador da hegemonia norte-americana.

Narrativas à parte, o fato é que, horas antes do evento, Trump foi questionado sobre por que achava Zelensky um ditador e respondeu, com a maior cara de pau do mundo, que não lembrava de ter dito isso. Ou seja, acredito que ele de fato queria assinar um acordo com Zelensky, e que a reunião descambou de forma natural, não planejada. O problema é: qual acordo ele queria assinar? A julgar pelo que foi vazado para a imprensa, a Ucrânia seria praticamente extorquida pelos EUA sem qualquer garantia de proteção, incluindo a concessão à Rússia das terras invadidas e a negação de entrada da Ucrânia na OTAN. Praticamente uma rendição. Ora, se é para se render e ser extorquido, melhor Zelensky ir direto a Moscou. Não precisaria passar pelo constrangimento de ouvir de Trump que “seu ódio a Putin é um obstáculo à paz”.

No mais, a Europa tem agora a obrigação moral de arregaçar as mangas e continuar apoiando a Ucrânia em seu esforço de guerra. Esta não é uma guerra qualquer, mas sim a linha que separa um mundo regido pelo direito internacional de um mundo dominado pelos mais fortes, ao qual Trump resolveu aderir.”

Trump: um agente do KGB há quase quatro décadas? - Zahra Khalig (The Mirror)

 A matéria é verdadeira, mas a alegação pode ser falsa, daí o ponto de interrogação do meu título. Mas eu a considero inteiramente plausível, conhecendo-se o tipo de trabalho produzido pelo KGB e as inacreditáveis posturas pró-Putin (um ex-agente do KGB, naquele mesmo ano, 1987, estacionado em Dresden) e pró-Rússia assumidas agora, num momento crucial da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia. Diplomatas brasileiros também foram recrutados pelo KGB, como registrado eM revelações feitas no momento da implosão da antiga União Soviética (vou transcrever novamente o que postei aqui, anos atrás). PRA

Ex-UK spy chief's verdict on bombshell claims Trump recruited by Russia's KGB in 1987

The shocking claim first surfaced in a Facebook post by ex-KGB officer Alnur Mussayev, who said Donald Trump was groomed 37 years ago as a 'potential Soviet asset' - operating under the pseudonym 'Krasnov'.

Zahra Khalig
The Mirror, Feb 25, 2025

https://www.mirror.co.uk/news/world-news/ex-uk-spy-chiefs-verdict-34748254

A former UK spy chief has weighed in on the bizarre claims made by an ex-KGB spy that Donald Trump was recruited as a Russian asset over 40 years ago, operating under the codename "Krasnov".

The shocking claim first surfaced in a Facebook post by ex-KGB officer Alnur Mussayev, who said the US president was groomed 37 years ago as a "potential Soviet asset". Mussayev, 71, was working in the 6th Directorate of the KGB at the time, which focused on counter-intelligence support within the economy, and claims recruiting capitalists was a key objective.

His Facebook post read: "In 1987, I worked in the 6th Department of the KGB of the USSR in Moscow. The most important area of work of the 6th Department was the acquisition of spies and sources of information from among businessmen of capitalist countries. It was in that year that our Department recruited the 40-year-old businessman from the USA, Donald Trump, nicknamed Krasnov."

It followed a viral twitter thread of "evidence" by Twitter user @anthony7andrews to back the allegation. He wrote: "Now that it’s been revealed that Trump has been a Russian asset for 40 years named Krasnov by the FSB, I will write a simple thread of various pieces of information that solidifies the truth of everything I’ve written. Please read and share."

But former spy chief Sir David Omand says he does not give the allegations any credence. Responding to Andrew Marr on LBC, who asked if there is any weight to the claims, he said: "No no. I say that largely because if there had been a real smoking gun then I think it would have surfaced in the years since that story first came out - and there are enough pro-Ukrainian people around in Russia, that it would have surfaced.

"So I don't give it credence, it's a bit conspiratorial and actually you don't need to be a conspiracy theorist - it is all in plain sight these days."

Intelligence reports dating back to the 1980s suggest the KGB was actively working to recruit high-profile Western figures as informants or spies. It has been claimed that Trump's KGB file remains open and is under the management of a close confidant of Vladimir Putin - but there is yet to be any concrete evidence to back these allegations.


domingo, 2 de fevereiro de 2025

Um novo Estudo da História? - Paulo Roberto Almeida

Um novo Estudo da História?

Paulo Roberto Almeida


A partir dos anos 1930, indo até o início dos anos 1960, o historiador britânico Arnold Toynbee produziu os muitos volumes do seu monumental Um Estudo da História, sintetizados num único volume em duas oportunidades do pós-guerra. 

Ele traçou a emergência, ascensão e declínio de mais de duas dezenas de grandes civilizações históricas, buscando detectar as similaridades ou constâncias nesses processos, sempre por fatores estruturais, próprios às suas evoluções, mas alguns de natureza contingente, como guerras, invasões externas e dominação por forças mais poderosas, ou grandes desastres naturais. 

Ele não tinha sido apresentado ainda a um fator relativamente incongruente que é a possibilidade de um idiota completo ser democraticamente eleito por uma larga tropa de similares e começar a destruir sistematicamente um país, que ocorre ser uma das mais prometedoras civilizações da História.

Não contava com a astúcia muito pouco hegeliana da História.

Sorry pela brincadeira…

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 2/02/2025


sábado, 1 de fevereiro de 2025

Make the world great again, and America smaller - Paulo Roberto de Almeida

 Lei das Consequências Involuntárias: a guerra tarifária de Trump contra a China está acelerando a internacionalização da manufatura chinesa, primordialmente no Sudeste Asiático, mas crescentemente também na África e na América Latina. Ou seja, os EUA que admitiram a China no Gatt-OMC um quarto de século atrás, estão fazendo a China ficar Great Again, crescendo para fora, e diversificando para dentro, com deslocamento de mão de obra para novas atividades ligadas ao consumo doméstico, exatamente o que a China precisava fazer. 

Thanks Mister Trump, you are great!

terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Os EUA chegaram finalmente ao que Tocqueville mais temia? - Paulo Roberto de Almeida

Os EUA chegaram finalmente ao que Tocqueville mais temia?

Paulo Roberto de Almeida


Todos somos prisioneiros da “ditadura do momento”, ou tendemos a ser.

Os Founding Fathers se referiam a, e queriam, um tipo de sociedade que não existe mais, convergente no trabalho honesto, ao estilo da “ética protestante” de Max Weber.

Já são muitos os exercícios teóricos sobre os EUA totalmente disfuncionais e em declínio inevitável. Arnold Toynbee, por exemplo, nos volumes posteriores à IIGM do seu monumental Estudo da História, já acreditava nessa decadência no momento de maior poder mundial dos EUA, em 1947. 

Seu sistema eleitoral, por exemplo, foi feito para evitar a “tirania da maioria”, como dizia Tocqueville, mas essa maioria pode ainda assim produzir a tirania da mediocridade, com uma democracia de massas que se opõem ao conhecimento de uma elite educada. 

Os EUA chegaram à mediocridade da maioria?

Olhando a turba que apoia Trump de maneira irracional parece que sim.

Contemporaneamente aos Founding Fathers, o romancista James Fenimore Cooper - o do Último dos Moicanos - já dizia que a democratização leva inevitavelmente à mediocrização. 

Talvez seja o caso. Sociedades homogêneas e pequenas talvez consigam conservar a qualidade do regime democrático; grandes sociedades muito diversificadas podem correr o risco da “tirania da mediocridade”, sujeitas à “ditadura” de algum oportunista capaz de encantar e manipular a maioria de cidadãos pouco educados.

Acho que a maioria dos pouco educados nos EUA encontrou o seu oportunista idiota que os conduzirá ao aprofundamento de um declínio toynbeeano.

Enquanto isso, a China milenar aposta numa sociedade do conhecimento e isso não tem muito a ver com a “ditadura de um partido leninista” e sim com a tradição persistente de um regime tecnocrático baseado na seleção mandarinesca dos mais competentes para gerir uma boa administração das coisas e das pessoas.

O PCC é mais chinês do que marxista-leninista, uma doutrina que ficou na superfície da estrutura política; a infraestrutura humana continuou mandarinesca, isto é, meritocrática.

Nos EUA, a meritocracia parece ter se deixado aprisionar por um oportunista obcecado pela ideia de sua própria grandeza, que ele confunde com a grandeza americana, quando o país já deixou de ser uma sociedade do conhecimento para valorizar apenas a riqueza fugaz do ganho financeiro.

O “enriqueça rapaz” já não segue mais os preceitos austeros de um Benjamin Franklin, e sim o oportunismo manipulador de um especialista em enganar os incautos como o idiota ignorante de um Trump.

Pior para os americanos, sorte dos chineses, que continuam a valorizar o conhecimento de longo prazo sobre o enriquecimento rápido.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 21/01/2025

domingo, 12 de janeiro de 2025

Trump, o Brasil e o mundo pós-2025 Pedro Malan O Estado de S. Paulo

Trump, o Brasil e o mundo pós-2025

Pedro Malan

O Estado de S. Paulo, domingo, 12 de janeiro de 2025

 

O futuro, que tem por ofício ser incerto, está a se tornar ainda mais incerto, imprevisível e perigoso. São momentosas as razões para que seja assim. A relação cada vez mais conflituosa entre os EUA e a China nas áreas econômica, tecnológica e militar; o agravamento dos conflitos no Oriente Médio; a belicosidade da Rússia em relação à Europa; o desenvolvimento vertiginoso da inteligência artificial e seu potencial de uso no desenvolvimento de armas mais letais como também em campanhas de propaganda política e desinformação. Tudo sob o dramático pano de fundo da mudança climática, do risco de aumento de endemias e de grandes fluxos migratórios que com grande frequência causam virulentas reações.

A avassaladora vitória eleitoral de Donald Trump deve a seus olhos constituir um claro mandato para intensificar seu peculiar modus operandi e sua visão sobre o que significa fazer a América “great again”. Anos atrás, a revista The Economist sugeriu que as ações de Trump seguiam um roteiro padrão, composto de três atos: fazer ameaças, alcançar acordos (propiciados pelas ameaças) e declarar vitória sempre (“make threats, strike deals, always declare victory”).

A julgar por suas declarações e postagens neste momento que antecede sua posse no próximo dia 20, esse script vem sendo seguido à risca por Trump, em várias frentes. Ameaçou impor tarifas (“a palavra mais bonita do dicionário”) de até 60% sobre produtos chineses, e de 25% sobre seus dois parceiros do acordo Nafta, Canadá e México. E também a produtos importados da Dinamarca, caso esta não concorde com seu “projeto” para a Groenlândia, “questão vital para a segurança nacional norteamericana”. Noticiou o propósito de assumir o controle do Canal do Panamá e de mudar o nome do Golfo do México para Golfo da América. Exibiu um mapa coberto com a bandeira norte-americana que alcança todo o território do Canadá, ao qual já se referiu como o 51.º Estado norte-americano. E voltou a pressionar os países europeus para que elevem, agora para 5% do Produto Interno Bruto (PIB), seus gastos em defesa.

E o Brasil, nesse complexo contexto? Nosso país terá neste ano de 2025 a dupla e grande responsabilidade, na área internacional, de presidir a COP-30 e a reunião anual do grupo Brics, agora ampliado para dez países integrantes. Ambas a serem realizadas no Brasil, ambas a exigir exaustivas negociações diplomáticas para que possam vir a ser consideradas exitosas. Não será tarefa fácil, dado o conturbado contexto doméstico, o quadro regional de grande instabilidade e uma situação global que inspira grande apreensão dos pontos de vista econômico e geopolítico.

O protagonismo do Brasil, sua voz, seu prestígio, sua influência na cena internacional são em larga medida afetados pela percepção que tenha o resto do mundo sobre nossa influência e gravitas em nossa própria região. E, ainda mais importante, sobre como estamos equacionando nossos inúmeros problemas domésticos nas áreas econômica, social e político-institucional.

A propósito, será proximamente lançado livro, organizado por Ana Carla Abrão Costa, Ana Paula Vescovi e por mim, em homenagem ao extraordinário Eduardo Guardia, que tão cedo nos deixou. O artigo que escrevemos Ana Carla e eu, intitulado Desafios fiscais crescentes para 2026 e muito além, abre com a seguinte epígrafe de Eduardo Guardia: “Estamos num momento muito delicado no Brasil. Somos um país que tem oportunidades enormes. Vejo isso hoje no mercado de capitais: novas tecnologias, novos setores. Mas vamos olhar o País como um todo e enxergar os problemas que ou simplesmente não estamos conseguindo resolver ou estamos empurrando para debaixo do tapete. Essa é a grande obrigação de todos nós. Temos que ter uma compreensão dos desafios, temos de exigir que o País caminhe na direção correta, porque estamos acumulando uma quantidade imensa de problemas que vão tornando as soluções mais custosas, mais difíceis”.

Essas palavras, proferidas em 2021, retêm relevância e urgência para o debate que deveria ter lugar no caminho que nos levará às eleições de outubro 2026 – e muito além. Democracias de grandes massas urbanas (o Brasil é a terceira maior do mundo) não são propensas a adotar ações que gerem no curto prazo custos para interesses específicos muito vocais, e benefícios difusos e de longo prazo para a maioria. Que por vezes o façam, é consequência de uma liderança incomumente corajosa ou de um eleitorado que compreende os custos de adiar escolhas difíceis. Liderança corajosa e competente é coisa rara, mas também é raro um eleitorado informado e comprometido.

O que exige educação para a liberdade. A qual, segundo Aldous Huxley, “deve começar com a apresentação de fatos e enunciação de valores e deve prosseguir, desenvolvendo técnicas adequadas para realizar esses valores e combater aqueles que, por qualquer razão, optam por ignorar os fatos ou negar os valores”. E no mesmo Admirável Novo Mundo Revisitado: “A sobrevivência da democracia depende da capacidade de um grande número de pessoas de fazer escolhas realistas à luz de informações adequadas”. É preciso que nos empenhemos para que seja esse o nosso caso.

Parabéns ao Estadão pelos 150 anos. Que venham os próximos! •


sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Constatação simplória 2 - Paulo Roberto de Almeida

Constatação simplória 2

Paulo Roberto de Almeida

Constato, não sem certa tristeza, que não somos o único grande país no qual as elites dirigentes e dominantes se congratulam entre si, falam apenas para si próprias, embevecidas em seu mundo-fantasia, no qual nada deve mudar no futuro previsível.

De certa forma, além do Brasil, a Rússia de Putin e os EUA de Trump, parecem partilhar da mesma tendência à introversão num cenário construído para a autossatisfação.

Sorry pela nota deceptiva.

Paulo Roberto de Almeida 

SP, 3/01/2025


sábado, 28 de dezembro de 2024

Trump team says Canada, Greenland, Panama comments are part of a broader plan - Jacqueline Alemany, Cat Zakrzewski (The Washington Post)

 Trump team says Canada, Greenland, Panama comments are part of a broader plan

Not everyone is convinced.

By Jacqueline Alemany and Cat Zakrzewski

The Washington Post, December 28, 2024 

 

President-elect Donald Trump's comments about Greenland, Panama and Canada are part of his “America First” foreign policy approach. 

In the past several weeks — and before he has been sworn in for his second term — President-elect Donald Trump has threatened trade wars with both of the United States’ closest neighbors, mused about taking over Greenland, blustered about bringing the Panama Canal back under American control and suggested making Canada the 51st state.

Less than a month before his inauguration, Trump — who vowed to end foreign wars and made “peace through strength” a rallying cry of his 2024 presidential campaign — is crafting an “America First” foreign policy defined by antagonism toward U.S. allies and adversaries alike, centered around dreams of territorial expansionism, and channeled through the president-elect’s braggadocio.

Trump’s pre-presidency tactics regarding Greenland, the Panama Canal and the United States’ closest neighbors aren’t likely to result in massive change. Canadians and their political leaders are unlikely to prove receptive to dissolving their country, and U.S. lawmakers have not broadly expressed willingness to absorb Canada as a new state. Greenland’s prime minister has said the island is not for sale, and Panamanian President José Raúl Mulino has said that “every square meter of the Panama Canal and its adjacent zone belongs to Panama and will remain so.”

For any other modern president — especially one who campaigned on ending wars, not starting them — threatening to encroach on allies’ sovereignty would be extremely unusual. But U.S. foreign policy during Trump’s first term was marked by near-constant departures from diplomatic conventions and prior international commitments and defined by unpredictable and at times hostile political and economic brinkmanship with traditional partners and enemies across the globe. For Trump, training his imperial instincts on some of the United States’ closest partners advances a version of that same scattershot foreign policy he pursued during his first term, when he sought to forcefully promote American interests on the global stage with little regard for borders or delicate international relationships.

 

Trump’s team insists that his recent comments are part of a broader strategy.

“World leaders are flocking to the table because President Trump is already delivering on his promise to Make America Strong Again,” Trump transition spokeswoman Anna Kelly said in a statement. “When he officially takes office, foreign nations will think twice before ripping off our country, America will be respected again, and the whole world will be safer.”

An overarching mission of countering Russia and China is the common thread tying together Trump’s comments about Canada, Mexico, Greenland and Panama, a Trump transition official argued. Trump himself has not explicitly made that argument.

“This isn’t just slapdash, there’s a coherent connective tissue to all of this,” said the official, who spoke on the condition of anonymity because they were not authorized to discuss the matter publicly. “Trump knows what levers to pull and what guardrails there are, and he’s in a position of power to utilize those levers.”

Earlier this month, Canadian officials announced a plan to increase spending on border security and use canine teams and artificial intelligence to intercept illegal drugs. The transition team has pointed to that announcement as an early indication of the success of Trump’s strategy.

Not everyone is convinced. Former Rep. Carlos Curbelo (R-Florida) told MSNBC this week that Trump’s messages could “deteriorate” relationships between the United States and other countries, which could make it more difficult to build international alliances in the future. “These kinds of insults could provoke them into a confrontation with the United States,” Curbelo said, noting it’s unlikely that it would be a military conflict. “There is a risk here even if it is a negotiating tactic.”

Trump’s focus on the Western Hemisphere, as opposed to Russia and China directly, indicates that he is “less convinced we can determine national security outcomes in other theaters of the world,” where the U.S. has less influence, according to Ryan Berg, the director of the Americas Program and head of the Future of Venezuela Initiative at the Center for Strategic and International Studies, a nonpartisan Washington-based nonprofit group that specializes in national security issues.

On Sunday, while announcing Ken Howery, a co-founder of PayPal and former U.S. ambassador to Sweden, as his pick for ambassador to Denmark, Trump emphasized his desire to take ownership of Greenland, the semiautonomous Danish territory where the United States maintains its northernmost air base.

“For purposes of National Security and Freedom throughout the World, the United States of America feels that the ownership and control of Greenland is an absolute necessity,” Trump wrote on his social media network, Truth Social.

Trump has actively pursued the idea of buying Greenland since at least 2019, when the then-president pushed his top aides to look into the process of acquiring the world’s largest island, whether buying it would be legal and where money to purchase the vast, icy landmass might come from. The idea came from an old friend of Trump, Ronald Lauder, an heir to the Estée Lauder cosmetics fortune, who pitched him on the plan at the outset of his first term.

Although it sounds “a bit hilarious,” the island’s strategic importance has been a long-standing issue in U.S. foreign policy, and Trump’s announcement was “not unexpected” based on his past positions, said a former Danish diplomat who dealt with the issue during the first Trump administration, speaking on the condition of anonymity to discuss a sensitive international issue. Mike Pompeo, Trump’s second secretary of state, visited the region in June 2020 shortly after the U.S. reopened its first consulate in Nuuk, Greenland, for the first time since 1953. Pompeo highlighted America’s presence in the Arctic, and took aim at Chinese and Russian efforts to gain a foothold in the resource-rich island.

“Something is probably going to happen with Greenland over the next 10 to 15 years,” the former diplomat added. “They might go independent which is why the U.S. is hedging for all futures. They are moving in the direction that the U.S. sees as a part of its zone of influence.”

In a separate series of social media posts last weekend, Trump escalated his threats to retake control of the Panama Canal, accusing Panama of “ripping off” the United States with high shipping rates and allowing Chinese soldiers to operate the waterway — claims that Mulino denied.

“There are no Chinese soldiers in the canal, for the love of God,” Mulino said during a briefing last week, addressing Trump’s post directly. “It’s nonsense. There is not a single Chinese soldier in the canal.”

But Berg said there is some validity to the idea that China’s global-port influence — including on both sides of the Panama Canal — is expanding.

“There is worry about Chinese influence of the canal and the reliability of U.S. operations,” Berg said. “It could be one of the main routes to deploy U.S. naval vessels from the Atlantic to the Pacific in a contingency situation where we have national security interests — such as Taiwan.”

Trump’s obsession with the Panama Canal is long-standing, according to John Feeley, who served as Trump’s ambassador to Panama. Trump felt that President Jimmy Carter made a “historic mistake” by signing two treaties that relinquished American control over the canal, Feeley said — an echo of Ronald Reagan’s position that the U.S. was the “rightful owner” of the canal. When Trump raised the matter during his first meeting with then-president Juan Carlos Varela in 2017, Varela responded with a non sequitur about Syria, managing to avoid an escalation of the topic, according to Feeley.

“The tiger doesn’t change its stripes. He’s got history with these ideas — these are not coming out of nowhere,” Feeley said. “And Donald Trump thrives on chaos. He loves to be the agent of chaos. He feels that this kind of disruptive approach to international affairs makes him and the United States strong.”

“It’s very much the Richard M. Nixon uncontrollable madman theory,” Feeley continued, referring to the Nixon administration’s strategy of cultivating an image of a volatile and unpredictable president to intimidate and destabilize adversaries.

Trump’s expansionist rhetoric harks back to a time when a state’s power was defined by the land it controlled, rather than the more diffuse forms of influence — military, economic, cultural and diplomatic — that U.S. presidents have pursued since the conclusion of World War II, said Daniel Immerwahr, a Northwestern University history professor and author of “How to Hide an Empire,” a history of American imperialism.

“None of this would have sounded weird in the 19th century,” Immerwahr said, adding that Trump has embraced a more forceful approach to U.S. diplomacy, appearing to lack the patience for the “sinuous blend of cooperation and consent” that has defined U.S. diplomacy for much of the last century.

Trump’s focus on the Panama Canal is ironic because the passageway historically was the focal point of a shift in U.S. policy away from territorial expansionism toward a more “informal empire,” said Jonathan Katz, a foreign correspondent and author of “Gangsters of Capitalism,” a biography of Smedley Butler, a decorated Marine and veteran of America’s foreign wars in the late 19th and early 20th centuries.

“It’s really in Panama where America makes this turn to ‘we’re not going to formally colonize this place, but we’re going to create a de facto colony and control the strip in the middle,’ ” Katz said.

Trump’s expansionist visions may appear to contradict the anti-interventionist promises he made on the campaign trail, as he argued the United States should limit spending to defend Ukraine and bashed the North Atlantic Treaty Organization. But his positions echo the early foreign policy of Woodrow Wilson, one of the first politicians to run on the catchphrase “America First.”

Wilson is largely remembered for his efforts to advance international order through the creation of the League of Nations. But he ran for office on the slogan, “He kept us out of war,” as he vowed to keep the United States out of World War I. Katz noted that the people of Haiti, the Dominican Republic and Mexico would have disagreed with that motto, given U.S. intervention in those countries during Wilson’s first term.

“When we’re talking about what is retrospectively looked at as isolationism, we’re really talking about staying out of European wars while then doing war and effectively annexation everywhere else,” Katz said. “In a lot of ways it’s not that different.”

Although many of Trump’s allies brush off Trump’s threats as part of his normal negotiating playbook, some in his orbit have real concerns about whether he will cross the line from harsh rhetoric and economic warfare to military intervention. Trump has threatened a 25 percent tariff on Mexican imports to stop the flow of illegal drugs, and privately discussed the idea of firing missiles into Mexico to try to take out cartels. Instead of ruling out the idea, which Mexican officials have warned would destroy all security cooperation between the two countries, several Republican presidential candidates during the 2024 GOP primary indicated support for using military force to stop fentanyl trafficking.

A conservative foreign policy adviser with insight into the president-elect’s transition process said that while he believed that Trump’s position was “mostly posturing,” that the unanimous agreement during the Republican primary to make war on the cartels was troubling and a “hazardous approach.”

“Given the fact that this has already been through the ideas machine and spit out the other end, articulated by everybody from [Vivek] Ramaswamy and [Ron] DeSantis, as something they are all willing to do Day 1, it makes me a little more concerned,” said the foreign policy adviser, who spoke on the condition of anonymity to be more candid.

Trump’s early appointments of Latin American experts to high-ranking positions could signal his intent to focus on the Western Hemisphere. Trump tapped Sen. Marco Rubio (R-Florida), a foreign policy hawk, for secretary of state; Christopher Landau, his first-term ambassador to Mexico, for deputy secretary of state; and Mauricio Claver-Carone, who served as deputy assistant to the president and senior director for Western Hemisphere affairs at the National Security Council under Trump and is known for his hard-line policy preferences, as special envoy to Latin America.

Some of Trump’s picks, such as Rubio and Rep. Michael Waltz (R-Florida), who has been tapped to serve as Trump’s national security adviser, would not be out of place in any Republican presidential administration. But other Trump choices, such as Claver-Carone and Richard Grenell, whom Trump named as presidential envoy for special missions, are more controversial figures, even within conservative circles, the conservative foreign policy adviser said.

“You have a cast of characters that runs the gamut on what sort of advice they’ll be proffering,” the conservative foreign policy adviser added. “Trump goes beyond ‘Team of Rivals,’ to welcoming the thunder dome in some ways. … A lot of this seems paradoxical by design.”

 

terça-feira, 24 de dezembro de 2024

As duas novas pragas da modernidade - Paulo Roberto de Almeida

As duas novas pragas da modernidade 

Paulo Roberto de Almeida

Putin, o Hitler do século XXI, é um destruidor da paz e da segurança na Europa, e tenta também mudar o mundo, mas não tem poder para isso. A China observa, tentando ver qual benefício consegue tirar para si das tresloucadas aventuras do tirano de Moscou.

Trump, o idiota que chegou ao poder, é uma ameaça ao mundo inteiro, pois é um desmantelador potencial das instituições multilaterais, ou seja, está destruindo, a marteladas, a ordem que Woodrow Wilson tentou criar em 1919 (e que o Congresso americano vetou), assim como a ordem que Franklin Roosevelt e Churchill criaram (a despeito de Stalin) em 1945, e que funcionou de forma precária por 80 anos.

Putin e Trump são as duas maiores ameaças à estabilidade mundial no momento presente. Cada um deles tem o seu cortejo de beócios, que os seguem bovinamente em suas respectivas obras de destruição material e institucional.

Existe certa convergência de intenções entre os dois patéticos personagens, ainda que contextos e circunstâncias de cada um deles sejam bastante diferentes, umas das outras.

O que os une, essencialmente, é uma falta total de empatia para com o mundo tal qual ele existe, uma raiva pessoal que se expressa em suas atitudes respectivas, fruto de um egocentrismo doentio e malévolo, no limite de uma psicopatia perversa. 

O caso deles é psiquiátrico, e se a ONU tivesse condições, guiada por estadistas democráticos, o destino de cada um deles seria o de serem levados numa ambulância, com camisa de força, diretamente a um asilo psiquiátrico, para sempre.

Neste Natal de 2024, não quero ser uma ave de mau agouro, mas prevejo os piores desastres humanitários, caso esses dois loucos continuem tendo poder.

Não creio que os europeus ocidentais, os membros da UE ou da Otan, tenham poder, capacidade ou vontade de deter esses dois personagens saídos diretamente de algum revival de Cassandra. 

O resto do mundo não conta muito no roteiro da tragédia, muito menos o tal de Sul Global, que de fato não existe. Não temos sequer alguma pitonisa délfica para desvendar o que poderiam nos antecipar os vapores do futuro. 

Recorrendo à filosofia popular, estamos no mato sem cachorro. 

Desculpem-me ser cético negativo quanto ao cenário imediato neste Dia de Natal, mas  creio que, mesmo neste 25/12/2024, teremos péssimas notícias vindas de uma ou outra das duas pragas, ou de ambas.

Fiquem bem, mas cruzem os dedos para 2025. Bom Ano a todos!

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 24 de dezembro de 2024


sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Venezuela: a maneira dura de Trump tratar com a ditadura não vai funcionar, como não funcionou com Cuba ou Nicarágua - Francisco Rodriguez (Foreign Affairs)

 The Case for Engagement With Venezuela

Maximum Pressure Will Only Strengthen Maduro

By Francisco Rodríguez

Foreign Affairs, November 28, 2024

https://www.foreignaffairs.com/venezuela/case-engagement-venezuela?utm_medium=newsletters&utm_source=fatoday&utm_campaign=The%20Case%20for%20Engagement%20With%20Venezuela&utm_content=20241128&utm_term=EDZZZ003ZX#author-info

 

Among the most complex foreign policy challenges facing the new U.S. administration is the situation in Venezuela. Over the past 12 years, Venezuela has transitioned from a fragile democracy to an entrenched authoritarian regime, experiencing one of the most severe economic collapses and migration crises in modern history outside wartime. And in recent years, these problems have increasingly affected the United States. During the past five years, U.S. authorities have apprehended more than 900,000 Venezuelans attempting to cross the southern border.

[Lea la versión de este artículo en español aquí.]

Many expect that Donald Trump’s presidency will mean the return of the maximum-pressure approach to Venezuela that defined his first term, when Washington imposed sweeping oil and financial sanctions, backed efforts at an armed uprising, and even floated the possibility of direct military action. At a rally in Florida just three days before the election, Senator Marco Rubio, Trump’s nominee for secretary of state, asserted that under the new administration, “we will have a very different position, much tougher and much clearer, not only in Venezuela, but also in Cuba and Nicaragua.” Rubio has cosponsored legislation to codify sanctions on Venezuela, conditioning any sanctions relief and diplomatic recognition on Venezuelan President Nicolás Maduro relinquishing power and an opposition-led transition.

But a return to the failed strategy of maximum pressure by the new administration would be a grave mistake. Sanctions are rarely effective in achieving regime change, and Venezuela is no exception. Far from destabilizing Maduro, U.S. sanctions have helped him consolidate control, increasing the asymmetry of power between the state’s apparatus and an impoverished and weakened civil society. More than seven million Venezuelans have fled the country since 2014, and doubling down on pressure could further worsen the living conditions of those remaining. Maximum pressure will, therefore, cut against Washington’s effort to reduce irregular migration and ensure a stable energy supply.

The United States should continue to condemn Maduro’s authoritarian government for its human rights violations and dismantling of democratic institutions. But Trump and his administration should adopt a strategy of targeted engagement with Venezuela’s authorities. Such a strategy would prioritize maintaining or strengthening economic and diplomatic linkages between the United States and Venezuela—the types of connections that can empower stakeholders committed to fostering a democratic transition. The first priority of U.S. policy should be to alleviate the suffering of Venezuelans, recognizing that broad economic sanctions have exacerbated that suffering. Where possible, Washington should leverage engagement—including the gradual easing of sanctions—to encourage improvements in human rights and political freedoms. This strategy of targeted engagement offers a path to immediately improve conditions in Venezuela while enhancing the prospects for a democratic transition in the medium to long term.

SANCTIONING CATASTROPHE

From 2017 to 2022, the United States imposed some of the harshest sanctions on Venezuela that it has levied on any country. The Trump administration halted all trade with Venezuela’s state-owned oil, gold, and banking sectors (transactions with private banks were still allowed) and blocked the national government and the oil industry from borrowing, restructuring debt, or receiving dividends from its offshore subsidiaries (like Citgo). In 2019, Washington handed control over Venezuela’s overseas assets to the U.S.-recognized opposition, led by Juan Guaidó, and blocked the country’s access to international reserve holdings, including special drawing rights in the International Monetary Fund.

The first Trump administration also imposed secondary sanctions, barring Venezuela from selling oil abroad by targeting foreign companies and vessels involved in its oil trade. Between 2019 and 2021, 47 vessels and 12 companies were sanctioned for assisting in Venezuelan oil exports. (In contrast, despite similar U.S. sanctions on Russian oil today, non-U.S. tankers can still sell Russian oil at $60 per barrel without being sanctioned themselves.)

This pressure has compounded Venezuela’s economic crisis. The country’s contraction in per capita incomes began in 2013 because of severe macroeconomic imbalances created by years of populist policies. Yet starting in 2017, sanctions significantly worsened the economy by severing Venezuela’s access to vital oil and financial markets, which led to a sharp decline in oil production. Sanctions contributed substantially to falling oil output, imports, and productivity; without them, Venezuela’s economy would have started to recover when oil prices rose in 2017. Sanctions accounted for around 52 percent of Venezuela’s economic contraction between 2012 and 2020. Without sanctions, Venezuela would have still faced a severe crisis, with per capita incomes dropping by 34 percent. With sanctions, however, GDP per capita declined by an extraordinary 71 percent—equivalent to almost three successive Great Depressions.

Venezuela’s migration crisis stems from this collapse in economic opportunities. Although the country’s human rights violations are horrific, they are not on the scale of the ethnic cleansing, genocide, or armed conflict that typically drives mass displacement. Instead, millions of Venezuelans have left to escape an economic catastrophe. If the U.S. government resumes policies that target Venezuelans’ livelihoods, it should not be surprised when many of those affected end up at its doorstep.

GAINING FROM ENGAGEMENT

In 2022, the Biden administration reestablished contact with the Maduro government, pursuing a dual track that gradually eased sanctions and encouraged renewed negotiations with the opposition. In November of that year, the U.S. Treasury issued a license for Chevron—the only U.S. oil company with production capacity in Venezuela—to export Venezuelan oil to the United States, coinciding with the resumption of talks between the Maduro government and its opposition.

Critics claimed that the Biden administration was giving Maduro sanctions relief without gaining anything in return. Yet this critique overlooks a key achievement. In October 2023, Maduro publicly committed to holding free and fair presidential elections. Though the election ended up being minimally transparent, this concession ultimately allowed the opposition coalition to register Edmundo González as a candidate after María Corina Machado, who had won the opposition’s primary in October 2023, was barred from running. Washington also successfully encouraged the opposition to abandon its failed electoral boycotts and to engage in the election process despite facing an unlevel playing field.

These decisions helped pave the way for González to defeat Maduro in the July 28 presidential election by more than a two-to-one margin. The opposition documented its victory with tally sheets from the country’s electronic voting system, reenergizing the coalition and demonstrating its broad support among Venezuelans. Although this victory did not produce immediate change, with Maduro’s electoral council blatantly altering the election’s results to declare Maduro the winner, it marked the opposition’s strongest challenge yet to Maduro’s authoritarian rule.

Critics might argue that the opposition’s electoral victory was meaningless because Maduro ultimately retained power and intensified repression. But such a critique misses the broader significance of the outcome. The elections played a crucial role in revitalizing and legitimizing Venezuela’s opposition, demonstrating its broad popular support, and strengthening its internal cohesion. These developments are essential preconditions for any successful challenge to an entrenched regime. Whether these gains can translate into meaningful change will depend on how realistic the opposition’s objectives are and how well it leverages its newfound strength in future negotiations.

BEYOND ISOLATION

A realistic foreign policy toward Venezuela must begin with the recognition that Washington has limited influence over political dynamics in authoritarian countries. In a world where 71 percent of people live under autocratic regimes, it is not only futile but also dangerous to target select countries—such as Cuba, Iran, and Venezuela—for regime change. Singling out specific regimes risks alienating allies, undermining U.S. moral authority, and reinforcing authoritarians’ claims that Washington meddles in other countries’ domestic affairs. In Venezuela, a principled, pragmatic approach—focused on humanitarian relief and diplomatic engagement—would better serve the interests of both the United States and the Venezuelan people.

Trump’s administration should thus continue easing economic sanctions. It should do so, in part, simply because the restrictions have needlessly immiserated millions. But improving the country’s living conditions also serves a political purpose. The more tolerable life becomes for Venezuelans, the less likely they are to flee to the United States. Managing migration flows from Venezuela will also require sustained communication and coordination with Caracas. Reopening the U.S. embassy in Venezuela is therefore a critical step to safeguarding American interests in the country, as well.

A return to the failed strategy of maximum pressure would be a grave mistake.

Easing sanctions could afford the Trump administration an opportunity to secure concessions on human rights. Licenses for new oil projects, for example, could be conditioned on revenues being allocated to international organizations that can address Venezuela’s humanitarian crisis. Likewise, the Trump administration could use sanctions relief to induce political reforms. It should work to secure the release of political prisoners. It should negotiate for institutional changes that reduce the stakes of power and create space for coexistence between Venezuela’s political factions. It should push Venezuela to appoint new electoral authorities and commit to inviting in international observers for upcoming elections. All three of these steps would provide vital space for electoral competition. They remain the best path to fostering a democratic transition. (The United States should also work with regional partners, including Brazil, Colombia, and Mexico, to forge a realistic political settlement.)

Should the Trump administration embrace a policy of limited engagement, it would be bowing to reality. Punitive policies may appeal to policymakers, but they often corner regimes, making behavioral change unlikely. A government whose leaders fear U.S. prosecution will do everything to remain in power, including stealing elections. Strategic engagement, on the other hand, can incentivize positive shifts and strengthen local actors who support a negotiated resolution. The political scientists Steven Levitsky and Lucan Way have shown that countries with economic, social, and institutional ties to the West are more likely to democratize than those subjected solely to punitive measures.

Likewise, Trump would be accepting that when people become poorer in an authoritarian country, the state becomes stronger, not weaker. At the height of the Venezuelan economy’s contraction, a large segment of the population depended on politically conditioned government handouts. In contrast, Venezuela’s economic recovery of the past four years, due in part to the easing of oil sanctions, has helped reduce low-income voters’ dependency on government programs, making them less susceptible to electoral blackmail.

No U.S. administration can overhaul Venezuela’s political system. But by setting achievable goals that address immediate needs, promote economic recovery, and support fundamental freedoms, the United States can help the Venezuelan people. A pragmatic approach that prioritizes economic recovery and gradual political progress will be far more effective in bringing Venezuela closer to change than a strategy of suffocation.

 

  • FRANCISCO RODRÍGUEZ is Rice Family Professor of the Practice of International and Public Affairs at the University of Denver’s Josef Korbel School of International Studies.

sábado, 16 de novembro de 2024

Trump 2.0 promete um choque econômico global - Otaviano Canuto

Trump 2.0 promete um choque econômico global

Otaviano Canuto

Center for Macroeconomic Development, November 7, 2024

Se republicano sobrepujar limites legais do mercado internacional e implementar algo próximo do que prometeu, economia global sofrerá fortes impactos


A vitória eleitoral de Trump foi completa. Além do colégio eleitoral e dos votos absolutos, seu partido retomou o senado e deve manter a maioria de deputados na câmara. A execução de sua agenda, portanto, não precisará ficar limitada ao que pode fazer com medidas executivas, ganhando força para também incorporar o legislativo quando este for necessário.

Ao longo de sua campanha, Trump aludiu a vários caminhos nos quais poderia colocar sua agenda de política econômica. Espera-se que tire o pé no pedal na agenda de descarbonização presente na política econômica americana, algo que, pelo peso e tamanho da economia do país, terá impacto global. Também se espera o retorno da inclinação desfavorável à imigração na gestão pública que marcou seu primeiro mandato.

Dúvidas e apreensões estão também dirigidas a suas promessas de uso novamente de políticas comerciais sob a forma de tarifas sobre importações, em escala e abrangência geográfica e setorial maiores do que foi em seu mandato anterior. Caso isto se cumpra em intensidade próxima ao que aludiu durante a campanha, pode-se contar com algum grau e intensidade de choque sobre o país e a economia global.

Dentre outras medidas de política comercial, Trump já mencionou duas possíveis: uma tarifa de 60% sobre as importações chinesas e uma tarifa universal de 10-20% sobre todas as importações. Ao longo da campanha mencionou outras de tamanhos variados sobre produtos de outros países. Até ameaçou estabelecer tarifas de 100% sobre países que ameacem abandonar o dólar americano como moeda global de escolha.

Enquanto a administração democrata perseguiu uma “redução de risco” na exposição à economia chinesa – alegando razões de segurança nacional, mediante políticas de proteção, bloqueio de acesso à tecnologia e subsídios à produção local em semicondutores e energia limpa – pode-se dizer que os anúncios de Trump apontam na direção da busca de um “descolamento ou dissociação” total entre as duas economias.

Como em todas as políticas mercantilistas, baseadas na crença de que o adversário perde e a produção local ganha, há sempre uma subestimação dos impactos negativos sobre todos os lados, inclusive terceiros países. Como abordamos aqui em 2020, as tarifas de Trump contra a China em seu governo anterior acabaram impactando negativamente o próprio emprego manufatureiro dos EUA, para não falar da agricultura perdida para o Brasil no mercado chinês.

Para aqueles que acham que terceiros países podem se beneficiar como “conectores” entre EUA e China –como México, Vietnã, Malásia e outros têm feito desde a guerra no primeiro mandato de Trump– cumpre observar que um “descolamento” perseguido pela administração dos EUA não vai deixar tais conexões intocadas.

Trump já comparou guerras comerciais a lutas de boxe. Cabe observar que a elevação do custo de vida para os cidadãos norte-americanos como resultado das tarifas será parte do impacto sofrido pelo lado que golpeia no caso. Não por acaso, Kamala Harris chamou a proposta tarifária de Trump de imposto sobre os consumidores dos EUA”.

Tarifas são um imposto sobre importações. Trump disse que o imposto será pago por estrangeiros, ou seja, que estes absorveriam o impacto sem repasse a preços. Mas isso significaria a ausência do efeito de substituição de importações por produção local.

O resultado mais provável será a elevação de preços domésticos. Alguns alegam que os efeitos inflacionários das tarifas de Trump em seu primeiro governo foram mínimos. Contudo, as novas propostas de Trump se aplicariam a uma parcela muito maior das compras externas. O impacto nos preços será muito maior do que o relativamente modesto “protecionismo inicial” do primeiro mandato de Trump.

Cabe observar que um imposto sobre importações é, também, um imposto sobre exportações, pelo fato de que em parte as tarifas viram um custo para os exportadores que dependem de insumos importáveis. Isso necessariamente tornará tais exportações menos competitivas. Assim, as tarifas elevadas pré-anunciadas por Trump tenderão a expandir indústrias de substituição de importações menos competitivas, mas contrair as exportadoras altamente competitivas. A retaliação estrangeira contra as exportações dos EUA agravaria esse dano. Assistiu-se a tais efeitos durante a elevação de barreiras comerciais por Trump em seu primeiro mandato.

Onde resta pouca dúvida é quanto ao efeito recessivo para a economia global, particularmente com as prováveis respostas retaliatórias dos demais países. Passando por uma desaceleração chinesa, mas também em outros países. Na reunião anual do FMI em Washington, D.C., em outubro, Christine Lagarde, chefe do Banco Central Europeu, disse que novas barreiras comerciais poderiam renovar as pressões inflacionárias mundiais e reduzir o PIB global em até 9%, em seu cenário mais grave.

Uma segunda área onde Trump já deu sinais é a tributária e fiscal. No campo fiscal, o déficit público nos EUA tende a se elevar substancialmente. Isto também tende a trazer impactos macroeconômicos em escala global.

Trump mostrou inclinação para tornar permanentes todos os cortes aprovados pelo Congresso em 2017, o que será facilitado pela vitória republicana no senado e na câmara de deputados. Naquele ano os cortes nas taxas de imposto de renda corporativo foram permanentes, ao passo que os cortes nos impostos de renda individual e de herança deveriam expirar no final de 2025. Trump quer torná-los todos permanentes, além de acrescentar outros itens – como gorjetas. Trump falou em recomposição de arrecadação tributária via tarifas, mas ninguém estima ser isso possível.

No lado das despesas, mesmo cortando a despesa prevista nas leis dos semicondutores e da energia limpa (“Chips Act” e “Inflation Reduction Act – IRA ”), cortes substanciais não serão possíveis sem encolher gastos sociais, como o “Medicare”. Analistas projetam que as propostas de Trump aumentarão a dívida federal. O Comitê para um Orçamento Responsável, apartidário, estima que os planos de Trump podem adicionar US$ 7,5 trilhões.

Muitos economistas e investidores destacam um risco de um longo período de taxas de juros mais altas nos EUA. Temem que não apenas novas tarifas, mas também déficits americanos maiores, possam aumentar a pressão inflacionária dos EUA, levando o Federal Reserve a estender seu período de política monetária mais rígida.

E o Brasil? Mais imediatamente, a eleição de Trump já está trazendo impacto sobre o Brasil mediante os canais de transmissão monetária e cambial. A valorização do dólar em relação às demais moedas que já acompanhou as pesquisas eleitorais favoráveis a ele também atingiu o real. Ontem, no primeiro dia após as eleições, a desvalorização do real foi acentuada, mesmo tendo revertido até o final do dia.

O que se pode depreender para o futuro é a uma perspectiva de juros mais altos nos EUA, empinando sua curva temporal, acompanhando não só a perspectiva de inflação mais alta nos EUA, mas também de déficits públicos maiores. Mais do que nunca, aumentará a demanda de que o governo brasileiro dê sinais mais firmes de redução de seu desequilíbrio fiscal no futuro próximo, de modo a evitar que o prêmio de risco-país intensifique o efeito da valorização do dólar e das taxas de juros longas mais altas nos EUA sobre a taxa de câmbio e a inflação no Brasil.

Na área comercial, é possível até que o deslocamento de demanda agrícola chinesa dos EUA para o Brasil que ocorreu durante a guerra comercial EUA-China no primeiro governo Trump – deslocamento não revertido posteriormente – possa receber impulso adicional em novas rodadas de retaliação chinesa na guerra comercial.

O comercio bilateral Brasil-EUA evoluiu, no passado recente, de déficits do primeiro para saldos próximos de zero. A subida nas exportações agrícolas brasileiras – carne, açúcar, óleos e gorduras – e a redução nas compras brasileiras de combustíveis fósseis ajudaram naquela direção, enquanto o déficit brasileiro bilateral nas manufaturas cresceu nos últimos anos.

Há sensibilidade, por outro lado, quanto às exportações brasileiras de produtos metalúrgicos. Deve-se ter em vista as demandas por fabricantes de aço dos EUA de que tarifas sejam impostas sobre as exportações brasileiras de aço.

O Brasil não aparenta estar no foco da política comercial de Trump, como China e os “países conectores”. Mas vale notar que em uma entrevista em abril para a revista Time, Trump se referiu ao Brasil como “um país dê tarifas muito altas”. O não-alinhamento geopolítico brasileiro e as seguidas referências à substituição do dólar, porém, podem vir a aproximá-lo daquele foco.

Em resumo, as políticas comercial e fiscal no governo Trump 2.0 podem trazer choques macroeconômicos para a economia global e o Brasil. A possibilidade de desaceleração no crescimento econômico chinês, como consequência da política comercial Trump 2.0, pode vir a ser também um canal de transmissão sobre a economia brasileira através de suas exportações de commodities para aquele país.

No lado fiscal, há menor impedimento para o governo Trump 2.0. Já quanto as tarifas, há quem – como John H. Welch, CEO da Research for Emerging Markets Inc– destaque limites legais que dificultariam o cumprimento das promessas significativas feitas por Trump durante a campanha. Caso este venha a de fato a sobrepujar tais limites e implementar algo próximo do que prometeu, a economia global e o Brasil enfrentarão um verdadeiro choque macroeconômico.

 

Otaviano Canuto, 68 anos, é integrante-sênior do Policy Center for the New South, integrante-sênior não-residente do Brookings Institute e diretor do Center for Macroeconomics and Development em Washington. Foi vice-presidente e diretor-executivo no Banco Mundial, diretor-executivo no FMI e vice-presidente no BID.