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quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Ler Tocqueville para entender a America - Contardo Calligaris

Eduardo em Washington

Enquanto espera a sabatina, poderia ler Da Democracia na América, de Tocqueville

Paul Hollander, que morreu poucos meses atrás, escreveu repetidamente, desde 1995, sobre o antiamericanismo. Sociólogo, fugiu da Hungria para os Estados Unidos em 1956, quando seu país foi ocupado pelos soviéticos. Não estranha que tenha sido um crítico atento a qualquer esquerdismo fácil.
​Hollander fazia a seguinte distinção: 
1) Existem críticas legítimas e merecidas à política estrangeira dos Estados Unidos e ao modo de vida de seus cidadãos; 
2) E também existe o antiamericanismo propriamente dito, graças ao qual cada um culpa os EUA por todas as injustiças que acometem seu próprio país, mesmo que os EUA tenham pouco ou nada a ver com isso.
No Brasil é fácil ouvir que a ditadura militar foi uma trama da CIA, sustentada por uma frota dos EUA presente ao longo da costa brasileira para dissuadir qualquer reação contra o golpe de 1964. 
Agora, é certo que os EUA, menos de dois anos depois da crise dos mísseis soviéticos em Cuba, não gostariam que o Brasil entrasse no bloco comunista. Mas também é certo que eles se prontificaram a intervir (caso precisasse) mais do que intervieram. Culpar os EUA pelo golpe é um jeito de negar o peso e o tamanho das paixões totalitárias e fascistas que se expressavam nas marchas da Família com Deus pela Liberdade e que continuam vivas no Brasil de hoje.
Moral da história, em geral, o antiamericanismo serve para fazer de conta que nossos países não são responsáveis por suas mazelas: foi a culpa do tio Sam. 
Inversamente, o que é o filoamericanismo e para o que serve?
Na fim da Segunda Guerra, para um europeu, era uma forma de gratidão. Durante a Guerra Fria, era uma maneira de se declarar anticomunista. 
Mas hoje o filoamericanismo parece ser apenas uma adulação servil, que mal esconde um sentimento de inferioridade e uma decepção histórica por não ter dado certo. Ao filoamericanismo, em geral, os americanos destinam um desprezo condescendente, tipo: lá vem de novo o papagaio de pirata na hora do selfie… 
Enfim, para ser embaixador do Brasil em Washington, certamente não é bom ser estupidamente antiamericano e tampouco é bom ser estupidamente filoamericano.
O presidente Bolsonaro afirmou que o filho Eduardo, que ele gostaria de ver embaixador em Washington, fala inglês e fritou hamburguesas nos EUA. 
O inglês fluente é irrelevante de tão básico. Mas fico feliz com as hamburguesas. Admiro, no modo de vida dos EUA, o fato de que os jovens de classe média façam trabalhos manuais sem por isso se sentirem aviltados socialmente. 
Além disso, a experiência ajudará Eduardo a simpatizar com o grande número de brasileiros que vivem nos EUA sem visto de trabalho: para alguns, fazer faxinas ou fritar hamburguesas nos EUA é socialmente mais digno do que ser professor no Brasil. Enfim, graças às hamburguesas, Eduardo embaixador vai saber protegê-los e representá-los com carinho.
Mas vamos ao que mais importa. Um embaixador representa o governo do momento, mas, além ou aquém disso, representa o país —o que é bem mais complexo.
Tudo bem, qualquer aluno do Instituto Rio Branco lê, e ainda dá para encontrar num sebo, os três volumes de “Intérpretes do Brasil” da Nova Aguilar (ed. Silviano Santiago). Os colegas de Eduardo o ajudarão com  o resto da bibliografia.
Agora, os EUA não são menos complexos do que o Brasil. Mas não é nada irremediável: Eduardo adorará, suponho, aproveitar sua estada para se inscrever em um mestrado ou em uma pós-graduação em estudos americanos. 
O curso certamente o ajudará a ser o melhor embaixador possível. Se ele precisar de um tema de pesquisa, lembro justamente que quase nada foi escrito sobre filoamericanismo. Um orientador? Sem hesitar: Louis Menand, autor da melhor obra sobre as origens do pragmatismo americano, “The Mataphysical Club” (2001). 
Enfim, enquanto espera a sabatina do Senado, Eduardo poderia ler (ou reler) “Da Democracia na América” (1835), de Tocqueville, só para se lembrar que a simpatia pelos Estados Unidos não exclui a capacidade de crítica. 
Quem sabe, Eduardo, embaixador em Washington, possa escrever de lá despachos que, falando dos EUA, jogarão uma luz singular sobre o próprio Brasil.
Por exemplo: “Pai, imagina que aqui eles pensam que as leis (e a própria Constituição) não existem para proteger as maiorias, como você bem lembrou, mas para proteger (pasme!) as minorias! Esses americanos são bizarros!”.

Embaixada em Washington: Rubens Ricupero e Roberto Abdenur (Época)

Não é para qualquer um

    DOIS EX-EMBAIXADORES BRASILEIROS NOS ESTADOS UNIDOS EXPLICAM POR QUE ACHAM QUE EDUARDO BOLSONARO NÃO DEVE SE MUDAR PARA WASHINGTON
    por Ruan de Sousa Gabriel
    Revista Época, 15/08/2019

    Na quinta-feira 8 de agosto, o Itamaraty foi informado de que o governo americano aprovou a indicação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), terceiro filho do presidente Jair Bolsonaro, para ser o embaixador brasileiro em Washington. Antes disso, o presidente americano, Donald Trump, já havia elogiado a nomeação de Eduardo para a embaixada. "Eu acho o filho dele (de Jair Bolsonaro) excelente. Ele é um jovem brilhante, maravilhoso. Estou muito feliz com a indicação", disse Trump. Em defesa da indicação do filho, o presidente Bolsonaro tem reforçado que a interlocução de Eduardo com os americanos è um ponto a seu favor - além do fato de ter morado nos Estados Unidos e de ser o presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara.
    O sinal verde dos Estados Unidos, no entanto, não quer dizer que Eduardo já pode Começar a arrumar as malas e preparar a mudança para a elegante residência que aparece nesta foto. Ele ainda precisa passar por algumas etapas de aprovação no Senado. Primeiro uma sabatina e depois duas votações: uma na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CRE) c outra no plenária Se aprovado, Eduardo poderá assumir a embaixada - caso não seja impedido pela Justiça. Na segunda feira 12, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com um pedido de liminar - decisão provisória - para barrar a nomeação O MPF considera o filho do presidente desqualificado para o cargo e defende que os indicadas a embaixadas precisam de, no mínimo, três anos de experiência diplomática no currículo Na sexta-feira 9, o partido Cidadania entrou com um mandado de segurança coletivo preventivo no Supremo Tribunal Federal (STF) solicitando uma limitar que impeça a indicação, por considerá-la nepotismo.
    ÉPOCA conversou com dois ex-embaixadores brasileiros em Washington sobre a nomeação de Eduardo: Rubens Ricupero, que serviu entre 1991 e 1993, e Roberto Abdenur. que chefiou a embaixada entre 2004 e 2007. Ricupero chegou a Washington depois de uma longa carreira diplomática. De volta ao Brasil, ele foi ministro do Meio Ambiente e da Amazônia Legal no governo Itamar Franco e ministro da Fazenda durante a implantação do Plano Real. Abdenur foi embaixador no Equador, na China, na Alemanha e na Áustria antes de seguir para os Estados Unidos. Tanto Ricupero quanto Abdenur consideram equivocada a nomeação de Eduardo. Confira a seguir as principais razões apresentadas.
    Falta de qualificação
    RUBENS RICUPERO Falta a Eduardo qualificação, experiência, maturidade, peso intelectual e cultural. O posto de embaixador em Washington é, para quase todos os países, o mais importante de tipo bilateral. Todas as nações de peso diplomático, praticamente sem exceção, têm diplomatas de carreira em Washington. É verdade que, em circunstâncias excepcionais, uma pessoa que não é da carreira pode ser um excelente embaixador. O Brasil teve Oswaldo Aranha, que era uma grande figura no Brasil, um homem de grande estatura e que havia sido ministro da Fazenda. Era uma figura impar, respeitada pela sociedade. O outro exemplo foi Walther Moreira Salles, que esteve à frente da embaixada numa época em que o Brasil passava por grandes problemas cm termos de dívida, de balanço de pagamentos. Ele era, na época, o banqueiro brasileiro que gozava de melhores conexões com os bancos internacionais. Eduardo, por sua vez, é uma pessoa de um nível muito modesta
    ROBERTO ABDENUR Eduardo não tem quase nenhuma experiência internacional. Não tem nenhuma experiência em negociação bilateral ou multilateral. Jamais participou de uma conferência internacional. A tradição, a regra não escrita, é que sejam nomeados embaixadores em estado adiantado da carreira, com larga experiência, que já tenham chefiado dois, três, quatro postos antes. Washington foi meu quinto posto. Fui antes embaixador no Equador, na China, na Alemanha e na Áustria, além de ter sido secretário-geral do Itamaraty. A embaixada em Washington é a única que tem um alcance universal do ponto de vista do itamaraty e do governo brasileiro, porque os Estados Unidos estão presentes e atuantes em praticamente todas as questões internacionais. Então, é preciso ser capaz de acompanhar a evolução, no plano internacional, de múltiplos acontecimentos políticos, econômicos, de segurança e ambientais. A embaixada em Washington .abastece as demais embaixadas brasileiras com análises das políticas externa interna americanas. O embaixador em Washington tem multiplicidade de tarefas.
    Incapacidade de diálogo
    RR Eduardo é o representante na América Latina do movimento fundado pelo americano Steve Bannon, que é da extremíssima-direita. Portanto, Eduardo está no ponto mais extremo do espectro das opiniões de direita. Ele tem opiniões muito extremadas na política internacional, mais favoráveis a soluções bélicas. Normalmente, um embaixador precisa ter uma posição muito equilibrada, porque é representante do pais, não de um partido ou um governo. Ele é a própria encarnação do pais que representa. Para isso, é preciso alguém que não seja um extremista de esquerda ou de direita. É preciso que seja alguém que esteja dentro dc um mínimo denominador comum das opiniões.
    RA Esse rapaz se fez fotografar com um boné escrito "Trump 2020". Isso deve ter pegado muito mal junto aos democratas, que hoje têm poder político efetivo porque controlam a Câmara dos Deputados e estão investindo contra Trump. Se esse rapaz for embaixador, poderá ser um vínculo útil com a administração Trump, mas não terá interlocução com o conjunto do sistema político americano. O Congresso americano tem uma imensa importância na definição das questões de comércio exterior, por exemplo. Já existe entre os democratas uma visão negativa do Brasil de Jair Bolsonaro por causa das políticas regressivas que o presidente está aplicando neste momento, negacionistas em relação às mudanças climáticas, às questões indígenas, aos direitos humanos e por aí vai. Isso só fará piorar se esse rapaz for embaixador.
    Adesão aos EUA
    RR Uma vez, dando uma entrevista à televisão americana, Eduardo qualificou os imigrantes brasileiros irregulares como vagabundos, indivíduos que não mereciam ser acolhidos. Ele disse que muitos deles eram até criminosos. Um dos deveres do embaixador do Brasil é proteger seus cidadãos. Eu, quando fui embaixador lá, lidei com inúmeros casos de brasileiros maltratados pela policia da Imigração. Tomei uma iniciativa pioneira: organizei a primeira reunião dc todas os cônsules do Brasil no país com a polícia da Imigração, o Departamento de Justiça e o Departamento de Estado para ver se poderíamos ter um protocolo de atitudes para que nossos nacionais não fossem maltratados. Isso é uma coisa sagrada. A atitude de Eduardo revela uma coisa muito grave. Ele, talvez por ser jovem, por ler morado lá, por ter esse entusiasmo pelos Estados Unidos, identifica-se muito com os americanos. Eduardo quer ser simpático aos americanos e. ao dar uma entrevista, acha que uma das maneiras de obter o aplauso americano é condenar seus compatriotas que estão lá procurando uma vida melhor. Isso na diplomacia é gravíssimo. O maior defeito que um diplomata pode ter é se identificar mais com o país no qual ele está do que com o seu.
    RA O embaixador precisa conhecer extensamente as grandes questões internacionais, preparar relatórios - os chamados telegramas - com análises sofisticadas dos principais fatos e tendências que ocorrem no mundo. não apenas nos listados Unidos. O Brasil está e vai continuar sofrendo duras pressões americanas para esfriar suas relações com a China. E será extremamente danoso ao Brasil se cedermos 1 milímetro nisso
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    Para ser oficializado como embaixador nos Estados Unidos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro ainda precisa ser aprovado pelos senadores.

    quarta-feira, 14 de agosto de 2019

    Embaixada em Washington: cobertura da grande mídia - Manchetômetro

    A indicação de Eduardo Bolsonaro para embaixador na grande imprensa brasileira   

     
    Manchetômetro13/08/2019 11:10
     

    No último dia 11 de julho, o presidente Jair Bolsonaro confirmou boato de que planejava indicar seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), para o cargo de embaixador do Brasil em Washington. A indicação veio a público no dia seguinte ao aniversário do deputado, quando ele completou a idade mínima para assumir esse tipo de cargo.
    Na Câmara dos Deputados, Eduardo preside a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Em visita aos EUA, o deputado acompanhou o seu pai em encontros com autoridades nos quais nem mesmo o Ministro de Relações Exteriores esteve presente.
    O caso abriu uma nova polêmica, um dia após o presidente ter afirmado, em promessa à Frente Parlamentar evangélica, que nomearia para o STF um ministro “terrivelmente evangélico”. De modo geral, a indicação tem sido criticada por seu explícito nepotismo. Neste texto, examinamos como a grande imprensa abordou o evento, assim como as diferenças na cobertura apresentada por cada jornal. Para tanto, consideraremos a semana subsequente à publicização da intenção do presidente, ou seja, o período de 12 a 19 de julho.

    O GLOBO

    No dia 12 de julho O Globo apresentou uma chamada[1] de capa sobre a declaração de Bolsonaro de que indicaria seu filho Eduardo como embaixador em Washington, que contou com foto e com reprodução de trecho da fala do presidente.

    Na coluna de Bernardo Mello Franco, a indicação foi criticada. Para o autor, o “03” – alcunha pela qual ele e outros colunistas e mesmo o editorial do jornal se referem ao terceiro filho do presidente – não cumpre os requisitos para a função. Mello Franco compara o Brasil à Arábia Saudita, afirmando que “nenhuma democracia séria trata o seu principal posto no exterior como capitania hereditária”.

     No interior do jornal, o evento foi notícia na editoria Mundo. Uma matéria[2] reproduziu falas do presidente e de Eduardo justificando a decisão e apontou a relativa proximidade do deputado brasileiro com Trump. Em um segundo momento, a matéria afirmou que o Itamaraty recebeu a notícia com perplexidade, uma vez que é de praxe que sejam indicados diplomatas de carreira e que, ainda que exista brecha para indicação de quem não passou pelo Instituto Rio Branco, não há precedentes de nomeação de parentes diretos do presidente desde os anos 1930. Contudo, a matéria apresentou apenas uma fala crítica (de Maurício Santoro, professor de Relações Internacionais da UERJ), que especulava sobre as intenções do presidente com a nomeação sem incidir especificamente sobre a medida. Ao mencionar a surpresa gerada entre os diplomatas, o jornal o fez de forma genérica, e destacou, inclusive, que alguns avaliavam possíveis “vantagens” na já mencionada proximidade relativa entre Eduardo e a família de Trump.

    Uma segunda matéria[3] na mesma página aborda o fato de que o STF e juristas divergem sobre a legalidade da indicação. O texto discorre sobre entendimentos díspares do STF em casos anteriores de indicação de parentes para cargos. Ao final, são consultados dois especialistas em Direito Constitucional – um professor da UERJ e um professor da PUC-SP – que dão opiniões diferentes sobre a legalidade da indicação.

    O assunto também aparece na página 22, em que outra coluna – de Guga Chacra – rebateu a indicação e, assim como Bernardo Mello Franco, comparou a decisão do presidente à prática na Arábia Saudita, sublinhando que as principais democracias do mundo costumam indicar diplomatas de carreira e com experiência para o posto.

    Em 13 de julho, diferentemente do dia anterior, a cobertura apresentou crítica clara e incisiva. Houve uma pequena chamada de capa, destacando que a palavra final sobre a indicação de Eduardo caberá ao STF e ao Senado. O jornal destacou que essas instituições têm sido atacadas por bolsonaristas, que “parlamentares da Comissão de Relações Exteriores veem dificuldades para aprovar nomeação” e que “advogados já entraram na Justiça para impedi-la”. Abaixo da chamada, o jornal destacou ainda a seguinte declaração de Eduardo, informando ter sido sua resposta ao argumento do nepotismo: “Tenho uma vivência pelo mundo. Já fiz intercâmbio, já fritei hambúrguer lá nos Estados Unidos”. A matéria[4]principal citou vários parlamentares contrários à indicação e sublinhou a discussão sobre nepotismo. Na mesma página, houve, ainda, um box de opinião do jornal, que criticava o presidente pela decisão e pelo “risco” que seria nivelar o Brasil a ditaduras africanas e árabes. Por outro lado, a opinião editorial do jornal levantava dúvidas sobre a decisão configurar ou não nepotismo.[5]

    Uma segunda matéria[6] expôs a justificativa de Eduardo ao negar ser nepotismo a indicação de seu nome. Muito embora a própria frase dita pelo deputado e empregada no título do texto ridicularize a afirmação, o texto em si é desprovido de tom crítico, reproduzindo o que disse o parlamentar e ressaltando o fato de a decisão ter sido tomada pelo presidente após Trump ter elogiado Eduardo no contexto da visita oficial da qual participou em março passado.

    No dia seguinte, 14 de julho, enfim, o assunto foi tema de editorial.[7]Embora de o texto de dez parágrafos o evento tenha tratado do assunto apenas em um, e os nomes do presidente e de seu filho sequer tenham sido mencionados, o título do texto – “Risco de nepotismo e obscurantismo no Itamaraty”– chama a nomeação do filho do presidente de nepotismo. O caso também foi tratado na charge de Chico Caruso (p. 3) insinuando que o filho do rei quer beneficiá-lo. Na mesma página, a coluna[8] de Dorrit Harazim fez mais uma crítica ao movimento do presidente. O evento apareceu novamente na coluna[9] de Bernardo Mello Franco, embora não seja esse o seu foco – a coluna trata de José Murilo de Carvalho e o autor menciona a crítica feita pelo historiador: “o familismo é típico de governos autoritários”. Na coluna de Miriam Leitão, o tema também foi mencionado com críticas incisivas, mesmo sem ser o foco da matéria. Ainda no dia 14, em outra matéria,[10] o jornal sublinhou as críticas que a medida vem recebendo, desde políticos do PSOL até Janaína Paschoal (PSL-SP) e Olavo de Carvalho, e apontou para o tímido apoio a Eduardo. Uma segunda matéria[11] especulava sobre a possibilidade de Jair Bolsonaro estar testando a repercussão da indicação antes de formalizar a medida.

    No dia 15, com menor cobertura, o assunto ainda ressoava na capa, na charge de Chico que, novamente, mostrava Jair como Rei e Eduardo como um bebê em seu colo sendo oferecido ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. No dia 16, Bolsonaro confirmou que, de sua parte, a indicação estava definida em pronunciamento na Câmara dos Deputados, no qual disse que “se está sendo tão criticado, é sinal de que é a pessoa adequada”. Assim, o tema permaneceu no jornal. Novamente uma chamada de capa com foto apontou para a matéria[12]da página 19, que, repetindo informações anteriores, além dos motivos elencados por Bolsonaro para indicar seu filho, discutiu a medida a partir da acusação de nepotismo e da resistência que poderia enfrentar, inclusive no Senado. Na página 3, a coluna de José Casado criticava o nepotismo da medida.

    No dia 17, o tema apareceu ridicularizado na coluna[13]de Zuenir Ventura e, mais uma vez, criticado na coluna[14] de Miriam Leitão, que fala de um retrocesso aos tempos da fidalguia. Na seção Mundo, novamente o assunto recebe destaque. A primeira matéria[15] da editoria ressaltou que o assunto “se tornou uma queda de braço entre oposição e governo no Senado” e especulou amplamente sobre o risco de a medida não ser aprovada na casa. No meio da matéria, um pequeno box de opinião[16] editorial do jornal acusou como um erro de Eduardo afirmar, entre os motivos a seu favor, o de ter acesso facilitado ao presidente Trump. Para o jornal, o embaixador é um representante do Brasil junto ao país como um todo, e não ao presidente especialmente.

    No dia 18, o tema continuou na capa, mas com menos destaque. A chamada destacou a afirmação de Bolsonaro de que “embaixadores não fizeram nada de bom” desde 2003, e contou com uma foto em que o presidente aparecia ao lado de seu filho mais novo em viagem à Argentina. Na página 3, Ascânio Seleme usou seu espaço para criticar a decisão do presidente e afirmar que Eduardo não era qualificado para a função e, na mesma página, Veríssimo usou de humor para ridicularizar a situação. Na editoria Mundo, novamente o tema é abordado a partir de pronunciamento feito por Bolsonaro na Cúpula do Mercosul, quando tocou no assunto e atacou o período PT dizendo que, desde 2003, os embaixadores do Brasil em Washington não fizeram nada de bom.

    No dia 19, as críticas continuaram na capa, com nova charge de Chico Caruso que retratou Bolsonaro empurrando um carrinho de bebê e, dentro dele, o bebê Eduardo, com um picolé no qual se lia “USA”. Nesse dia, o assunto ocupou mais um editorial do jornal,[17] que levantou preocupações quanto à possibilidade da medida se tornar realidade.

    FOLHA DE S. PAULO

    Na Folha, o primeiro dia (12 de julho) apresentou chamada[18] de capa que informou a decisão de Bolsonaro, lembrou que ela precisaria ser aprovada por maioria simples na Comissão de Relações Exteriores e no plenário do Senado e destacou que quem se opunha à medida a caracterizava como nepotismo. Mas, ainda na chamada, informou que advogados ouvidos pelo jornal opinaram que, por o cargo ser de natureza política, estaria livre da regra de veto da nomeação de parentes.

    A coluna[19] de Bruno Boghossian critica a indicação. Segundo ele: “Se Eduardo ganhar a vaga, o Brasil trocará um embaixador por um marqueteiro da direita radical. Ele até entende a língua de Trump, mas ficará falando sozinho se o Partido Democrata vencer a próxima eleição.”

    Na editoria Mundo, a matéria[20] vinculada à já mencionada chamada de capa destacou a oposição dos diplomatas em atuação à possibilidade de a indicação ser aceita, especialmente pelo encaminhamento ideológico agudo que Eduardo poderia significar. Uma segunda matéria,[21] por outro lado, explicava a legislação vigente sobre nepotismo e o posicionamento do STF, e citava dois advogados consultados pela redação, segundo os quais por ser um cargo de natureza política, não se caberia a proibição. A terceira matéria[22] trouxe a ótica de senadores que compõem a Comissão de Relações Exteriores (CRE) e se opõem à indicação. No fim desse texto, é reproduzida também a opinião favorável à indicação do presidente da CRE, Nelsinho Trad (PSD-MS). Um quarto texto contém análise[23] assinada por Igor Gielow, na qual discutiu a vinculação de Eduardo com um discurso radical e traçou comparação, ao final, com a Arábia Saudita. De modo geral os textos fazem referência a um grupo “olavista” colocado como problema.

    No dia 13 de julho, uma pequena chamada de capa ironizou o filho do presidente: “Eduardo fala de hambúrguer, e Bolsonaro nega nepotismo”.[24] A matéria[25] principal à qual a chamada remetia comentava a afirmação de Eduardo para justificar sua adequação ao posto e outros argumentos esgrimidos por ele e pelo pai para rebaterem a acusação de nepotismo. Uma segunda matéria[26] na mesma página abordou a nomeação de parentes para embaixadas no mundo como uma prática de países autoritários. Ainda na editoria Mundo, um texto de análise[27] argumentou que a indicação era pertinente e condizente com os planos do governo e que poderia, inclusive, ser acertada caso Eduardo mantivesse “o sangue frio” no posto e deixasse “conselheiros voluntaristas em segundo (ou décimo) plano”. Outra matéria,[28] de Igor Gielow, apresentou olhar benevolente, destacando vantagens e desvantagens na nomeação de Eduardo.

    O editorial[29] do jornal também abordou a temática, argumentando que Eduardo não teria a moderação e sobriedade necessárias para o posto. Para o jornal, era simplória a argumentação do presidente para indicar o filho e mesmo que a escolha não fira a legislação, não seria uma boa prática republicana a mistura de relações familiares e institucionais. Ao fim, o editorial critica o Senado pelo “costume de reiterar designações do presidente”, mas deixa espaço para a dúvida acerca da confirmação de Eduardo, já que prevê resistência à decisão. A indicação também aparece na coluna Painel.[30] Entre especulações sobre os passos seguintes à indicação, Daniela Lima destacou que dirigentes de partidos criticaram o timing do anúncio, pois ele acabou competindo com a pauta da Reforma da Previdência.

    No dia 14 de julho, outra matéria[31] da editoria Mundo da Folha abordou a opinião de Janaina Paschoal e de Olavo de Carvalho que, em redes sociais, criticaram a indicação de Eduardo.

    No dia seguinte, o assunto apareceu em uma coluna de opinião,[32]na qual Leandro Colon criticou passionalmente a medida, a que chamou de “ideia lunática”, afirmando que “se Bolsonaro tiver um pouco de bom senso (algo um tanto improvável tratando-se do personagem), deveria recuar e afirmar que teve um delírio causado pela euforia familiar com os 35 anos completados pelo seu 03”.

    Em 16 de julho, o tema esteve de novo na capa da Folha, com chamada[33] que especulava sobre o temor do presidente de sua indicação ser rejeitada pelo Senado. A matéria principal,[34] dentro do jornal, discutiu mais uma vez a possível oposição e dificuldade de votos que o presidente irá encarar no Senado pela escolha de seu filho, revisitando informações já anteriormente apresentadas. No mesmo dia, em outra coluna[35] a decisão de Bolsonaro é amplamente criticada e o autor, Joel Fonseca, discutiu o discurso antissistema e outras características do governo Bolsonaro, afirmando que o grande perigo de uma guinada populista estaria, ainda assim, controlado por ora.

    No dia 17, a Folha reportou[36] que o documento para indicação de Eduardo estava pronto. Entre outros pontos, o texto sublinhou que é de praxe que o pedido ocorra em sigilo e anteceda a divulgação do nome indicado para que seja possível certificar-se antes que o país que receberá o embaixador não tem objeção ao nome escolhido, diferentemente do que aconteceu com Eduardo, uma vez que a intenção de nomeação foi amplamente anunciada antes do ato. Mais uma vez, o jornal descreveu o processo no Senado que se seguiria à indicação e mencionou tópicos já visitados nos dias anteriores.

    No dia 18 de julho, uma pequena nota[37] na capa referiu-se a um artigo de opinião do deputado federal Marco Feliciano (Pode-SP). No texto,[38] Feliciano defende a legalidade da indicação de Eduardo retomando argumentos já mencionados no jornal – que o presidente é quem nomeia embaixadores; e que o cargo é de natureza política, portanto livre da legislação de nepotismo. Feliciano traça um histórico de casos em que deputados foram indicados embaixadores e sublinha o bom trânsito de Eduardo junto ao governo dos EUA. Após ressaltar mais de uma vez que são necessárias “racionalidade” e “supremacia do interesse público” – a que opõe a “supremacia da ideologia” – para analisar a situação, Feliciano termina seu artigo dizendo: “Que Deus continue a abençoar o Brasil”.

    Ainda nesta edição, houve outra matéria,[39] na editoria Mundo, sobre a declaração do presidente Bolsonaro enquanto participava da reunião do Mercosul, na Argentina, criticando a atuação dos embaixadores brasileiros nos Estados Unidos durante os governos do PT. A matéria discorre inicialmente sobre a indicação do filho, retomando eventos já abordados anteriormente. A segunda metade do texto falou sobre a presença do presidente na cúpula.

    No dia 19, mais uma matéria[40] abordou o caso, referindo-se à liveque o presidente fez na noite anterior em suas redes sociais, quando afirmou que “beneficiaria seu filho, sim” e mais uma vez justificou sua decisão. A matéria também reproduziu trechos da fala do ministro Onyx Lorenzoni em apoio a Bolsonaro.

    O ESTADO DE S. PAULO

    No dia 12 de julho, a notícia de indicação de Eduardo também ocupou a capa[41] do Estadão. Reunindo muitas informações, a chamada mencionava o ministro do STF Marco Aurélio Mello e sua consideração recente sobre nepotismo, o fato de que outros ministros da Corte têm entendido que a regra não serve para cargos políticos, e o apoio de Steve Bannon, estrategista da campanha de Trump, à ideia. Na editoria de política – ao contrário dos outros jornais que cobriram o evento em sua editoria Internacional, o Estadão cobriu o evento na de Política –, a matéria[42]principal discorreu sobre os pontos polêmicos da indicação: o fato de Bolsonaro ter deixado o cargo vago meses até sugerir que indicaria seu filho dois dias após ele completar a idade mínima para o posto, o possível enquadramento como nepotismo – dando voz ao ministro Marco Aurélio Mello –, a lembrança de que o presidente já teria cogitado nomear outro filho para um cargo no início do governo – Carlos, para a Secretaria de Comunicação –, o fato de Eduardo não ter experiência e não ser embaixador de carreira; e, ainda, o fato de que outro deputado de seu partido, Capitão Augusto (PSL-SP), iria apresentar uma emenda para que congressistas que assumam chefias em missões diplomáticas não tenham que deixar o mandato. Na mesma página, uma segunda matéria[43]falou sobre o apoio efusivo de Bannon à indicação.

    No dia 13, o assunto também apareceu em pequena chamada[44] de capa que focou, assim como a matéria principal,[45] na especulação sobre a resistência que Eduardo enfrentaria pela aceitação de seu nome na Comissão de Relações Exteriores do Senado. Foram listados os votos possivelmente contrários e os argumentos dos que se opõem à indicação, bem como as ressalvas daqueles que supostamente a admitem. O jornal, como os outros, também elencou os passos a seguir para concretizar a indicação de um embaixador e mencionou que apenas uma indicação (feita por Dilma Rousseff) foi, na história, barrada pelo Senado. Na mesma página, aparece um texto de análise[46] do professor de relações internacionais da FGV, Guilherme Casarões, que criticava a transformação da diplomacia em um “empreendimento familiar”. O tema também apareceu na Coluna do Estadão,[47] que uniu diversas notas de especulação política sobre a indicação, e na coluna[48] de João Domingos, que, embora considerasse nepotismo a “polêmica e inoportuna” forma como a indicação está sendo feita, afirmou que a carreira do deputado é promissora se decidir entrar para o mundo da diplomacia.

    Outra matéria[49] abordou a declaração de Bolsonaro rebatendo a acusação de nepotismo. O jornal reproduziu trechos da argumentação do presidente e, em seguida, lembrou casos de nomeações de familiares de políticos. No final do texto, foi abordada a geração de uma nova polêmica em meio à votação da reforma da Previdência. Mais uma pequena matéria[50] teve foco nos argumentos de Eduardo (entre outros, “fritar hambúrguer”) e de Bolsonaro (entre outros, ser “amigo dos filhos do Trump”) a seu favor. A última matéria[51] da página foi centrada em entrevista com o ex-embaixador Rubens Ricupero — segundo o jornal, um dos diplomatas brasileiros mais respeitados –, na qual vem sublinhada sua afirmação de que nomear parentes para a diplomacia é ação típica de “monarquias absolutas”.

    No dia seguinte, 14 de julho, o tema apareceu em uma pequena chamada de capa para a coluna[52] de Eliane Catanhêde, que criticou a medida, afirmando que Bolsonaro age como se fosse dono do Brasil. Para a colunista, além de Eduardo não ter formação que justifique sua escolha, a indicação assemelha o Brasil a ditaduras, como a da Arábia Saudita. Termina com críticas à “dinastia Bolsonaro”.

    Outra matéria[53] do jornal partiu de ironia sobre a declaração de Eduardo com relação a fritar hambúrguer nos EUA, mas para abordar como vive o embaixador em Washington. O texto também relata o número de funcionários, cardápio e características do imóvel da embaixada. Na mesma página, outras duas matérias cobriram o tema. Uma[54] versou sobre a primeira reação negativa de Olavo de Carvalho e bolsonaristas à indicação, e outra[55] considerou o entendimento político que o STF vem tendo de que cargos de natureza política não recaem em nepotismo.

    Como ocorreu nos outros jornais, o dia 15 de julho focou na polêmica envolvendo outro filho de Bolsonaro, Flavio, em razão da decisão do ministro Dias Toffoli que o beneficiou.

    Mas no dia 16, o assunto voltou à capa,[56] com a afirmação de Bolsonaro rebatendo críticas à indicação de Eduardo e em pequena chamada para o editorial. Só neste dia a polêmica chegou ao editorial[57] do Estadão. O texto foi incisivamente crítico, focando na indicação feita pelo presidente como um “disparate” e em desqualificando Eduardo, além de conclamar o Senado a impor o “devido veto”. Em outro texto[58] da mesma edição, o jornal destacou como subtítulo: “Bolsonaro ignora ataques até de aliados ao projeto de pôr filho em embaixada nos EUA”. Como no caso dos outros jornais para esta data, a matéria abordou o discurso do presidente em sessão solene na Câmara, quando ironizou as críticas à ideia de indicar o filho embaixador. O jornal destacou que mesmo da “ala ideológica do governo” partem críticas, e reproduziu manifestação de um general ligado ao PSL contrária à indicação. O texto ainda falou da dificuldade que a proposta pode enfrentar no Senado, reproduzindo trecho da fala da senadora Simone Tebet (MDB-MS), presidente da Comissão de Constituição e Justiça. Ao fim, o jornal reproduziu falas de Bolsonaro e do vice-presidente Hamilton Mourão defendendo a indicação. Ao lado da matéria principal, foi publicada, ainda, uma entrevista[59] concedida por Marcílio Marques Moreira, em que o ex-embaixador em Washington (1986-1991) criticou e pediu a revisão da escolha do presidente.

    No dia 17, a cobertura continuou com uma matéria[60]sobre a confirmação da indicação por Bolsonaro e sobre o governo já ter uma minuta pronta para enviar aos EUA. O jornal destacou o descumprimento da praxe (o indicado só costuma ser anunciado após o pedido de agrément), reproduziu informações concedidas pelo porta-voz da presidência, Otávio do Rêgo Barros, e lembrou da etapa de análise do Senado. A matéria reproduziu ainda trechos de declarações do presidente no evento de posse do novo presidente do BNDES, nas quais Bolsonaro mencionou o assunto novamente. Outras duas matérias completaram a página sobre o caso da nomeação de Eduardo. Uma[61] abordou o fato de o deputado, em cinco meses como presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara, não ter conseguido avançar “com o principal acordo assinado com os americanos em discussão” (que permitiria o uso de foguetes americanos na base de Alcântara). Para o jornal, “o filho do presidente acumulou desentendimentos com parlamentares, derrotas em votações e viu acumular outros 16 acordos internacionais assinados pelo Brasil”. O texto discorreu sobre como Eduardo teria tentado passar por cima dos demais membros do colegiado e levar a proposta da base de Alcântara direto à votação, tendo sido barrado pela oposição e partidos do centro, citando uma crítica feita por uma deputada do PCdoB-AC e mencionando outras reações da comissão à conduta do filho do presidente. A outra matéria[62]explorou o fato de Eduardo ter afirmado – em vídeo que gravou para defender a indicação de seu nome – ter pós-graduação em economia [no Instituto Mises], embora não tenha se formado. Conforme a matéria, o curso foi iniciado em 2016 e seus colegas de turma se formaram em 2017, mas Eduardo não, por não ter entregado o trabalho final.

    No dia seguinte, o caso continuou na capa, embora em chamada[63]bem pequena. A matéria principal[64]falou sobre suposto movimento de aliados do governo no sentido de trocar integrantes da comissão que vai sabatinar Eduardo de modo a torná-la menos “hostil” ao deputado. O assunto também foi abordado na coluna[65] de William Waack, que criticou a decisão de Bolsonaro pela “química pessoal”. Segundo Waack, “os países não têm amigos, têm interesses” e a impessoalidade deve ser a tônica das relações internacionais.

    No último dia examinado por nós, o jornal publicou mais uma matéria[66] em que destacou a declaração de Bolsonaro do dia anterior – “Pretendo beneficiar filho meu, sim.” –, em uma de suas lives divulgadas nas redes sociais, quando mais uma vez ratificou sua decisão. O jornal reproduziu trechos da argumentação do presidente.

    CONCLUSÕES

    Como podemos perceber, os três grandes jornais apresentam posições editoriais contrárias à indicação. Na cobertura, sobressai um caráter oficialista, com a repetição de argumentos e declarações do presidente e de Eduardo. O Estadão é o mais incisivo na crítica, que se torna clara também em suas matérias, destacando inconsistências na afirmações de Eduardo, lacunas em sua atuação como presidente da Comissão de Relações Exteriores e movimentação política suspeita a seu favor por apoiadores na Câmara – tópicos não cobertos pelos outros jornais, que focaram no possível resultado do imbróglio, sem aprofundamentos.

    O argumento do nepotismo aparece de modo geral, mas perde força. A escolha do próprio filho para um posto chave da diplomacia brasileira é criticada como personalismo. Os impressos destacam mais a forma da medida do que seus possíveis conteúdos, consequências, significados. Embora a discussão sobre o viés ideológico de Eduardo apareça como crítica aos olavistas, pouco se investiu na análise do que essa direção ideológica de direita representaria para o Brasil em sua política externa – tópico de discussão que foi amplamente explorado pela imprensa durante os governos petistas, por exemplo. A indicação de pai para filho nos aproximaria de países ditatoriais, mas o exame das possíveis consequências diplomáticas de sua futura atuação ficou de fora da discussão.

    Os grandes jornais interpretam preferencialmente a indicação de Eduardo Bolsonaro como mais um produto do estilo equivocado de governo do seu pai, sem ao mesmo tempo abrirem espaço para a crítica ao projeto político e ideológico que anima pai e filho, e que no cenário internacional encontra rebatimento em figuras funestas como Steve Bannon e Donald Trump.

    [1] Bolsonaro pretende indicar seu filho para embaixador nos Estados Unidos. O Globo, 12/7/2019, capa.

    [2] Oliveira, Eliane; Soares, Jussara; Grillo, Marco. Filho Embaixador – Bolsonaro pretende nomear Eduardo para posto diplomatico em Washington. O Globo, 12/7/2019, p. 21.

    [3] Brígido, Carolina; Barini, Filipe. STF e juristas divergem sobre legalidade de indicação. O Globo, 12/7/2019, p. 21.

    [4] Grillo, Marco; Oliveira, Eliane; Maia, Gustavo. Risco duplo – Nomeação de Eduardo Bolsonaro para embaixada fica nas mãos de Senado e Judiciário. O Globo, 13/7/2019, p. 24.

    [5] Opinião do Globo – Nivelar por baixo. O Globo, 13/7/2019, p. 24.

    [6] Oliveira, Eliane. “Já fiz intercâmbio, já fritei hambúrguer lá nos EUA”. O Globo, 13/7/2019, p. 24.

    [7] Risco de nepotismo e obscurantismo no Itamaraty. O Globo, 14/7/2019, p. 2.

    [8] Harazim, Dorrit. A serventia de um embaixador. O Globo, 14/7/2019, p. 3.

    [9] Franco, Bernardo de Melo. O capitão e os generais. O Globo, 14/7/2019, p. 3.

    [10] Almeida, Amanda. Eduardo Bolsonaro defende candidatura em video. O Globo, 14/7/2019, p. 29.

    [11] Soares, Jussara. Indicação é ‘balão de ensaio’, dizem fontes do Planalto. O Globo, 14/7/2019, p. 29.

    [12] Soares, Jussara; Gós, Bruno; Maia, Gustavo. Ofensiva pró-Eduardo. O Globo, 15/7/2019, p. 19.

    [13] Ventura, Zuenir. Fala sério, predidente! O Globo, 17/7/2019, p. 3.

    [14] Leitão, Miriam. O Brasil volta ao tempo dos fidalgos. O Globo, 17/7/2019, p. 16.

    [15] Mendes, Adriana; Almeida, Amanda; Shinohara, Gabriel; Maia, Gustavo; Farias, Victor. Batalha no Senado. O Globo, 17/7/2019, p. 19.

    [16] Erro. O Globo, 17/7/2019, p. 19.

    [17] Não é republicano pai nomear filho para emabixada. O Globo, 19/7/2019, p. 2.

    [18] Bolsonaro vai indicar filho para embaixada nos EUA. Folha de S. Paulo, 12/7/2019, p. 1.

    [19] Boghossian, Bruno. Patetice diplomática. Folha de S. Paulo, 12/7/2019, p. A2.

    [20] Jair Bolsonaro decide indicar o filho Eduardo para vaga de embaixador nos EUA. Folha de S. Paulo, 12/7/2019, p. A12.

    [21] Lott, Diana; Turollo Jr., Reynaldo. Para advogados, indicação de filho de presidente não seria nepotismo. Folha de S. Paulo, 12/7/2019, p. A13.

    [22] Carvalho, Daneil. Oposição no Senado vê desrespeito a carreira diplomatica. Folha de S. Paulo, 12/7/2019, p. A13.

    [23] Gielow, Igor. Ligação com radicais pode atrapalhar deputado. Folha de S. Paulo, 12/7/2019, p. A13.

    [24] Folha de S. Paulo, 13/7/2019, p. A1.

    [25] Della Colleta, Ricardo; Uribe, Gustaco; Turollo Jr., Reynaldo; Carvalho, Daniel. ‘Já fritei hambúrguer nos EUA’, diz Eduardo sobre embaixada. Folha de S. Paulo, 13/7/2019, p. A13.

    [26] Lott, Daiana. Indicar familiars na diplomacia é comum em ditaduras. Folha de S. Paulo, 13/7/2019, p. A13.

    [27] Coelho, Luciana. Escolha de Eduardo condiz com objetivos do governo nos EUA. Folha de S. Paulo, 13/7/2019, p. A14.

    [28] Gielow, Igor. Chanceler se coloca como um anteparo a resistências nos EUA.

    [29] À sombra do pai. Folha de S. Paulo, 13/7/2019, p. A2.

    [30] Lima, Daniela. Cotação em dólar. Folha de S. Paulo, 13/7/2019, p. A4.

    [31] Olavo e Janaina pedem que Eduardo fique no Brasil. Folha de S. Paulo, 14/7/2019, p. A18.

    [32] Colon, Leandro. Desista, presidente. Folha de S. Paulo, 15/7/2019, p. A2.

    [33] Reação de senadores faz Bolsonaro avaliar risco de indicar filho. Folha de S. Paulo, 16/7/2019, capa.

    [34] Uribe, Gustavo; Della Colleta, Ricardo; Bramt, Danielle; Carvalho, Daniel. Bolsonaro avalia riscos de indicar filho a embaixada após reação de senadores. Folha de S. Paulo, 16/7/2019, p. A9.

    [35] Fonseca, Joel Pinheiro da. Risco controlado. Folha de S. Paulo, 16/7/2019, p. A6.

    [36] Della Colleta, Ricardo; Uribe, Gustavo; Carvalho, Daniel; Colombo, Sylvia. Documento para indicação de Eduardo está pronto, diz porta-voz. Folha de S. Paulo, 17/7/2019, p. A10.

    [37] Marco Feliciano – Bolsonaro acerta ao indicar filho para a embaixada. Folha de S. Paulo, 18/7/2019, capa.

    [38] Feliciano, Marco. Histeria coletiva e interesse público. Folha de S. Paulo, 18/7/2019, p. A3.

    [39] Colombo, Sylvia. Para Bolsonaro, embaixadores nos EUA não fizeram ‘nada de bom’ desde 2003. Folha de S. Paulo, 18/7/2019, p. A14.

    [40] ‘Vou beneficiar meu filho, sim’, diz Bolsonaro. Folha de S. Paulo, 19/7/2019, p. A10.

    [41] Bolsonaro diz que vai indicar filho para embaixada nos EUA. O Estado de S. Paulo, 12/7/2019, capa.

    [42] Catanhêde, Eliane; Lindner, Julia; Onofre, Renato. Bolsonaro quer ver filho embaixador nos EUA. O Estado de S. Paulo, 12/7/2019, p. A4.

    [43] Bulla, Beatriz. Ex-estrategista de Trump celebra indicação de Eduardo para cargo. O Estado de S. Paulo, 12/7/2019, p. A4.

    [44] Comissão se divide sobre embaixada para Eduardo. O Estado de S. Paulo, 13/7/2019, p. capa.

    [45] Moura, Bruno; Ramos, Rebeca. Indicação de Eduardo tem resistência em Comissão. O Estado de S. Paulo, 13/7/2019, p. A4.

    [46] Casarões, Guilherme. Diplomacia como empreendimento familiar. O Estado de S. Paulo, 13/7/2019, p. A4.

    [47] Bombig, Alberto. Itamaraty tenta decifrar enredo dos Bolsonaros. O Estado de S. Paulo, 13/7/2019, p. A4.

    [48] Domingos, João. O senhor embaixador. O Estado de S. Paulo, 13/7/2019, p. A8.

    [49] Wainer, Gabriel; Moura, Rafael Moraes; Lindner, Julia. Bolsonaro diz não ver nepotismo na escolha. O Estado de S. Paulo, 13/7/2019, p. A8.

    [50] Cury, Teo. Hambúrguer nos EUA – “Tenho vivencia no mundo”. O Estado de S. Paulo, 13/7/2019, p. A8.

    [51] Beraldo, Paulo. “Sem precedents em países deocráticos”, diz Ricupero

    [52] Catanhêde, Eliane. Eduardo bin Bolsonaro. O Estado de S. Paulo, 14/7/2019, p. A8.

    [53] O cardápio refinado da Embaixada nos EUA. O Estado de S. Paulo, 14/7/2019, p. A12.

    [54] Lago, Cecília do. Olavo e bolsonaristas reagem mal à possível indicação de Eduardo. O Estado de S. Paulo, 14/7/2019, p. A12.

    [55] Moura, Rafael Moraes. STF não vê nepotismo em parente em cargo político. O Estado de S. Paulo, 14/7/2019, p. A12.

    [56] Bolsonaro ironiza críticos do filho. O Estado de S. Paulo, 16/7/2019, capa.

    [57] O poder como capricho. O Estado de S. Paulo, 16/7/2019, A3.

    [58] Turtelli, Camila; Onofre, Renato; Pupo, Amanda; Lindner, Julia; Luna, Denise; Dolzan, Marcio. Governo reforça indicação de Eduardo. O Estado de S. Paulo, 16/7/2019, A7.

    [59] Beraldo, Paulo. ‘Eu espero que essa nomeação seja repensada’, afirma ex-embaixador. O Estado de S. Paulo, 16/7/2019, A7.

    [60] Lindner, Julia; Castro, Fabrício de. Governo já tem pronta consulta aos EUA sobre Eduardo. O Estado de S. Paulo, 17/7/2019, A 6.

    [61] Onofre, Renato; Frazão, Felipe. Em comissão, acordo de Alcântara não avança com deputado. O Estado de S. Paulo, 17/7/2019, A 6.

    [62] Pires, Breno. Pós graduação não concluída é citada como ‘credencial’. O Estado de S. Paulo, 17/7/2019, A6.

    [63] Aliados querem ‘blindar’ Eduardo. O Estado de S. Paulo, 18/7/2019, capa.

    [64] Onofre, Renato; Pupo, Amanda. Aliados avaliam mudra comissão que vai sabatinar Eduaro. O Estado de S. Paulo, 18/7/2019, A8.

    [65] Waack, William. Países não pertencem a presidentes. O Estado de S. Paulo, 18/7/2019, A6.

    [66] ‘Pretendo beneficiar filho meu, sim’, afirma Bolsonaro. O Estado de S. Paulo, 19/7/2019, A6.

    *Publicado originalmente pelo Manchetômetro