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sábado, 22 de novembro de 2014

O mito da revolucao cubana, por um desinformado - Paulo Roberto de Almeida

Recebo, hoje, 2 hs atrás, um comentário sintético, que reproduzo abaixo, a propósito de um texto meu de alguns anos atrás:

Luiscesarx

2 horas atrás  -  Compartilhada publicamente
Ou vc é desinformado, ou é mal intencionado.

O mito da Revolução Cubana Ordem Livre, em 01 de Junho, 2009. Autor   Paulo Roberto de Almeida

Como eu corro o risco de ser realmente um desinformado, vou transcrever novamente o artigo aqui, para solicitar o concurso de novos leitores, quanto ao meu grau de desinformação.
Cada um pode se pronunciar, concordando com meu crítico, acima, ou fazendo novos reparos ao texto em questão, que segue aqui, novamente.
Paulo Roberto de Almeida



Paulo Roberto de Almeida

Sumário:
1. O mito fundador: a revolução que se transformou em reação
2. A especificidade cubana: uma ilha que é quase uma fazenda pessoal
3. Os mitos entretidos pelo regime e por seus admiradores
4. O mito do socialismo
5. O mito das conquistas sociais
6. O mito do imperialismo como ameaça
7. À guisa de conclusão: um manifesto a favor do povo cubano


1. O mito fundador: a revolução que se transformou em reação
Poucos mitos, na América Latina, especialmente entre os acadêmicos, são tão poderosos quanto o da Revolução Cubana, usualmente identificada com as figuras de Fidel Castro e de Ché Guevara – ele próprio um mito à parte, icônico em suas manifestações mais apelativas, sem esquecer o merchandising – tanto quanto pelo tremendo valor simbólico da “resistência ao imperialismo”, especialmente relevante para todos aqueles que acreditam em outro mito da mesma família: a de que esse mesmo imperialismo é responsável pela miséria e subdesenvolvimento da América Latina, cujas veias abertas estariam sendo constantemente drenadas por esse monstro capitalista (trataremos, em outro artigo da série, dessa outra falácia acadêmica).
O próprio conceito de Revolução Cubana constitui um mito inaugural:  não existe mais revolução cubana, e isto há muito tempo. Tudo o que restou das transformações políticas na ilha, feitas entre 1959 e 1965 aproximadamente, foi um regime autocrático, de inspiração supostamente socialista (mais exatamente ao estilo soviético), incapaz de garantir um abastecimento adequado ao seu próprio povo (como, aliás, ocorria com todos os socialismos realmente existentes, sem exceção). Sublinho deliberadamente transformações políticas, posto que em matéria de transformações econômicas, o que ocorreu, mais exatamente, foi uma tremenda involução, um retrocesso absoluto, que resultou em que o ex-principal exportador de açúcar da região é obrigado, atualmente, a importar o produto para o consumo do seu próprio povo; sem falar da inexistência quase completa de indústrias de consumo dignas desse nome. Mas voltemos, em primeiro lugar, ao mito da revolução.
 Como sabem todos aqueles que estudam sociologicamente o fenômeno revolucionário, nenhum processo desse quilate, absolutamente nenhum, dura cinqüenta anos, ainda mais com a promessa – constantemente refeita pelos dirigentes ‘revolucionários’, na verdade, reduzidos hoje a uma nomenklatura geriátrica – de que a revolução é um movimento vivo, que deve se renovar e continuar para sempre. Um processo insurrecional e de ativa preparação para a tomada do poder político pode até durar muitos anos, como foi o caso, por exemplo, da revolução chinesa, que depois conheceu várias etapas no processo de construção do totalitarismo maoísta: a aliança de classes e as cem flores nos anos 1950; o grande salto para frente e sua desastrosa falência entre 1959 e 1962; a revolução cultural de 1965 a 1969; a grande luta entre as cliques dirigentes depois disso; e, finalmente, o que não tinha nada mais de revolucionário, a reforma gradual do socialismo chinês em direção de formas de mercado que não excluem (e até promovem) o capitalismo mais selvagem que se conhece desde Marx e Engels.
As revoluções constituem processos extremamente concentrados no tempo, ainda mais concentrados na utilização da violência política, que costumam substituir uma classe dirigente por outra, alterando completamente o sistema político e, até mesmo, as bases econômicas de funcionamento de uma determinada sociedade. Revoluções duram somente o tempo de substituição dos dirigentes no comando do Estado. A partir daí o que se tem são processos mais ou menos lentos de alteração das relações sociais, o que pode ser feito com doses extras de violência – como no caso chinês ou soviético, sob Mao e Stalin – ou, mais freqüentemente, por meio das burocracias que emergem com o novo poder. Enfim, uma revolução que dura 50 anos, na mais perfeita normalidade do comando ‘revolucionário’, é uma contradição nos termos. Todas as revoluções, a partir de um certo tempo se ‘estabilizam’ e a nova classe dirigente passa a cuidar de sua própria conservação, ou seja, a revolução se transforma em reação, quando não em algo profundamente reacionário.
No caso da Revolução Cubana, pode-se traçar, perfeitamente, uma cronologia para o processo revolucionário: a fase insurrecional durou poucos anos, a rigor desde Moncada (1953) até a tomada do poder, em janeiro de 1959, com a etapa guerrilheira se estendendo durante pouco mais de dois anos, tão somente. Ou seja, o processo de luta contra a ditadura de Batista foi algo extremamente rápido, em termos estritamente temporais, e absolutamente exitoso nos planos político-social e estratégico-militar, inclusive com a colaboração involuntária do próprio regime, que consentiu em anistiar o jovem advogado condenado por sedição após poucos meses de prisão (aqui entra um outro mito, o da “História me absolverá”, mas que pode ser deixado ao cuidado dos historiadores, por falta de espaço neste ensaio). 
A partir daí se abre o processo revolucionário propriamente dito: uma fase nacionalista em 1959, logo alterada por escolhas mais radicais nos planos político e econômico – inclusive as decisões de não realizar eleições livres e de expropriar grandes latifúndios para fins de reforma agrária – seguida, finalmente, da opção propriamente socialista, entre 1961 e 1962. A partir daí, a ‘revolução’ socialista se aprofunda, com a completa estatização dos meios de produção e a ‘sovietização’ do estilo de poder e das formas de dominação, processo que culmina, basicamente, em 1965, quando começam os primeiros expurgos e o regime perde sua aura romântica que ele tinha mantido até então. Muitos intelectuais e o próprio Ché Guevara abandonam a ilha, cada qual com suas opções intelectuais e políticas intactas: os primeiros por não concordarem com essa orientação do regime cubano; o segundo para tentar fazer a revolução em outros países.
Esta é a Revolução Cubana, nada mais do que isso: a tomada do poder em nome da luta contra a ditadura, pela democracia e pela justiça social, com promessas de reforma agrária (que aliás estavam sendo impulsionadas em quase toda a América Latina pelo próprio imperialismo, insatisfeito com o estilo oligárquico atrasado de quase todos os seus aliados na região). O que veio depois de 1965 foi a administração de um socialismo que não escapou às mesmas fatalidades de seus congêneres em outras partes: ineficiência econômica, irracionalidades produtivas, falta de inovação pela ausência de estímulos apropriados e, sobretudo, repressão política, falta de liberdade completa no plano partidário, de imprensa e intelectual, e as pequenas e grandes misérias morais de todo e qualquer regime socialista.
Pior do que isso, talvez, pois outros regimes atrasados na própria América Latina também exibiam ineficiência econômica, baixíssimos índices de produtividade econômica e, tanto à direita quanto à esquerda, repressão política e falta de liberdades elementares: no caso de Cuba, tudo isso se viu agregado do velho estilo soviético (stalinista, quero dizer) de dominação e de monopólio político absoluto pelo partido monocrático e todo poderoso (algo que nem as ditaduras direitistas mais extremas na região jamais produziram). Quem achar que estou errado, deveria, supostamente, poder provar-me que a ilha caribenha dispõe de: eficiência econômica, vibrante sistema produtivo, tecnologia avançada no plano internacional, liberdade política, imprensa livre e ausência de dissidentes encarcerados por divergência de opinião. O teste é muito simples e pode começar pela existência de balseros (boat-people), algo que só as ditaduras mais extremas conseguem produzir: a existência de pessoas desesperadas, dispostas a enfrentar os riscos terríveis de uma aventura no mar, para escapar ao desespero das misérias cotidianas (que geralmente são mais econômicas do que propriamente políticas). Apenas a existência contínua desses candidatos a náufragos do regime já provaria o tremendo fracasso da ‘revolução’ cubana.

2. A especificidade cubana: uma ilha que é quase uma fazenda pessoal
O que teve, e talvez ainda tenha, a Revolução Cubana de diferente, em relação aos modelos do gênero, é o tremendo carisma de dois de seus dirigentes (um deles efêmero, é verdade, mas aparentemente eterno): Fidel Castro e Ché Guevara. Desaparecido precocemente este último, restou o velho líder revolucionário, que empolgou muita gente, na ilha e fora dela, e permanece como o símbolo do processo revolucionário. Quanto ao Ché, é um fenômeno planetário: trata-se, possivelmente, depois da Coca-Cola, da imagem mais conhecida e valorizada do mundo, presente em dez de cada nove manifestações organizadas por movimentos de esquerda, sobretudo conquistando os jovens, que compram avidamente pôsteres e camisetas para indicar sua preferência romântica, alimentando com isto um dos mais pujantes mercados capitalistas de que se tem notícia na história do merchandising mundial.
Do Ché ficou a imagem do guerrilheiro heróico, seja em Cuba, seja na Bolívia, onde fracassou na tentativa de criar um outro Vietnã no coração da América Latina. Pouco se fala de seu período à frente de La Cabaña, uma caserna do ancien régime cubano convertida rapidamente num dos mais ativos centros de fuzilamentos logo depois da vitória da revolução, muitos dos quais após sumaríssimos julgamentos, outros sem sequer essa formalidade ‘burguesa’. Se fala ainda menos de suas rápidas e catastróficas passagens pela presidência do Banco Central cubano e pelo Ministério da Indústria, cujas conseqüências mais notáveis, aliás, foram as de apressar a subordinação da ilha aos interesses da União Soviética e o início de um longo período de dependência dos subsídios russos durante praticamente toda a existência residual da URSS. Seus planos de industrialização – sem falar na tentativa de criação de um ‘homem novo’, cuja realização perfeita seria um trabalhador sem qualquer tipo de exigência material, funcionando apenas à base de ‘emulação socialista’ – foram tão desastrosos que, já em 1965, Cuba escolhia voltar para a monocultura açucareira (atenção, quem diz isso não sou eu, e sim Celso Furtado, no último capítulo de seu livro, aliás deficiente, sobre a Formação Econômica da América Latina, de 1967).
Com a morte precoce de Camilo Cienfuegos, com o afastamento de Ché Guevara e o desaparecimento ou eliminação de outros possíveis concorrentes da fase insurrecional, a revolução cubana acabou sendo dominada pela figura ímpar, sem dúvida excepcional historicamente, de Fidel Castro, que passou a administrar a ilha como se fosse uma fazenda pessoal. Foram muitas as suas tentativas improvisadas de mudar a economia da sua fazenda – como o estímulo à plantação de café, na base do empirismo puro, sem qualquer viabilidade agronômica – com resultados catastróficos a cada vez. Mas a figura de Fidel Castro há muito tempo já passou por esse fenômeno que Max Weber identificou como a ‘rotinização do carisma’, sendo improvável que esse carisma sobreviva ao desaparecimento físico do titular. O mais provável é que a ‘revolução’ – que de fato já não existe mais – se estiole numa dominação puramente autocrática-oligárquica, até sua completa erosão numa futura redemocratização e normalização da ilha, segundo modalidades ainda não detectáveis neste momento.
Enfim, este é o primeiro mito ligado a Cuba, que cabe, portanto, descartar no plano histórico e mais exatamente sociológico. Vejamos, agora, quais seriam as outras falácias que podem ser associadas ao mesmo mito, entretido com tamanho desvelo em certos círculos acadêmicos, que eu chego a receber de um desses representantes da espécie mensagens eletrônicas que são finalizadas por um desses orgulhos ingênuos de certos companheiros de viagem do socialismo cubano: “Esta noite, 200 milhões de crianças dormirão nas ruas do mundo. Nenhuma é cubana.” Incrível como acadêmicos aparentemente bem informados conseguem se deixar mistificar pela propaganda de um regime incapaz de assegurar a essas mesmas crianças um futuro decente, em termos de conforto material, emprego e, sobretudo, liberdade política para se expressar normalmente pela internet, como mesmo crianças de favelas brasileiras conseguem fazer em centros comunitários que existem, justamente, para conectá-las ao mundo. Atribuo esse tipo de equívoco à ‘inconsciência revolucionária’.
O Brasil é certamente um país com muitos indigentes, alguns até com problemas de desnutrição ou de moradias precárias, falta de cuidados médicos e, sobretudo, de educação e de capacitação técnica ou profissional para o mercado de trabalho; daí a baixa produtividade, os precaríssimos rendimentos e a insuficiência geral no consumo e, portanto, a baixa qualidade de vida, segundo os índices do PNUD. Não são esses indigentes, contudo, os principais candidatos à emigração econômica, característica associada à paisagem social brasileira nas últimas duas ou três décadas, aliás coincidentes com as crises econômicas, o baixo crescimento, a falta de oportunidades de emprego decente e o desalento geral com a violência, a extorsão estatal e outros traços menos agradáveis de nossa situação presente. Geralmente são pessoas próximas dos estratos intermediários inferiores, ou até da classe média, que escolhem sair do Brasil, por acaso os mesmos tipos de candidatos a partir de Cuba, com uma diferença fundamental, porém: nenhum deles é boat-people, pela simples razão de que ninguém é impedido de sair do país. No caso de Cuba, é desnecessário precisar, os mesmos candidatos frustrados se sentem como que obrigados a deixar a ilha, pelo simples fato de que não vislumbram nenhuma possibilidade de mudança em sua situação econômica no futuro previsível. Poucos, ou praticamente nenhum, dos boat-people são verdadeiramente dissidentes ou opositores do regime: na quase totalidade dos casos, se trata apenas de pessoas desejosas de escapar das misérias cotidianas da ilha, aspirando viver normalmente num país normal, não numa ilha que vive, ou sobrevive, à base de cartões de racionamento.

3. Os mitos entretidos pelo regime e por seus admiradores
Todo e qualquer Estado normalmente constituído na história humana, ou seja, uma organização política capaz de garantir o funcionamento regular de instituições de comando e um sistema econômico capaz de se auto-sustentar – independentemente de suas características mais estatais ou mais privadas, de mercado, portanto – deveria, minimamente, poder assegurar algumas condições básicas para sua manutenção, preservação e continuidade. Aqueles que não conseguem, costumam desaparecer nas dobras da história, como demonstrou em relação a alguns casos exemplares o cientista americano Jared Diamond em seu livro Colapso. Esse Estado deveria, em princípio:
1) funcionar em bases políticas razoavelmente legítimas, suscitando o consenso em torno dos mecanismos de dominação, ou despertando muito pouca oposição ou dissidência em relação ao comando do Estado; quando houver dissensão, ela deveria poder ser canalizada por meios políticos não violentos, justamente;
2) garantir requisitos mínimos de satisfação material à população, sem o que aquela legitimidade logo se esvai, sobretudo se os cidadãos (ou súditos) se sentem espoliados em seus direitos elementares à segurança alimentar, patrimonial ou até pessoal; essa satisfação requer, portanto, um funcionamento razoável dos sistemas de produção e de distribuição, com alguma possibilidade de acumulação privada ou familiar, geralmente no que se refere à habitação, mas também a outros bens físicos;
3) assegurar um mínimo de direitos quanto à segurança pessoal dos cidadãos (ou súditos), na sua disposição de residência, livre escolha de uma ocupação, de culto ou de expressão pública de suas preferências políticas e culturais, sem o que o país em questão poderia viver em estado de tensão social permanente;
4) alguma legitimidade ou reconhecimento no plano externo, de maneira a se ter um relacionamento normal no plano internacional, sem ameaças externas ou conflitos destrutivos; ainda que o ambiente externo possa ser uma variável independente – e o fenômeno do imperialismo e do colonialismo independem da configuração política e econômica que possa adotar um Estado independente qualquer – um Estado normal deve ser capaz de assegurar um mínimo de tranqüilidade para os seus cidadãos (ou súditos), sem aquela sensação de serem constantemente ameaçados por algum poder externo.

Pois bem, com base nesses critérios aparentemente anódinos e perfeitamente burocráticos no plano da análise sociológica, podemos analisar os mitos da Revolução Cubana, por meio de elementos o mais possível objetivos, para verificar, justamente, as falácias que têm sido apregoadas em torno desse fenômeno. São muitas as falácias que vem sendo apregoadas em torno da “Revolução” Cubana, mas algumas têm mais consistência do que outras.
Vejamos, por exemplo, o que se lê em recente matéria em homenagem aos 50 anos dessa “revolução” no site do único movimento político brasileiro que, aparentemente, ainda defende resolutamente o que é chamado de conquistas da “Revolução” Cubana, o Partido Socialismo e Liberdade:
Os companheiros desse partido “não podem duvidar em afirmar que a revolução cubana foi o acontecimento mais importante acontecido em nossa ‘Pátria Grande’ latino-americana. Talvez possamos divergir sobre apreciações de seu regime político, da política internacional seguida pelo Fidel em certos períodos. Mas o concreto é que foi um movimento tão poderoso e tão genuíno para que hoje Cuba seja o único país do chamado “socialismo real” que existe e do qual não só podemos reivindicar sua história como também seu presente; Cuba mantém suas conquistas sociais e seu orgulho de ser independente do imperialismo a menos de cem milhas de suas costas.” (4.01.2009; http://www.socialismo.org.br/portal/socialismo/197-artigo/709-cuba-festeja-meio-seculo-de-revolucao)
O que se reivindica, portanto, são três coisas: (a) ser o único país do “socialismo real”; (b) conquistas sociais; (c) independência do imperialismo. A bem da verdade, esses três elementos resumem, efetivamente, o que se apregoa como positivo em torno da “Revolução” Cubana e são eles que devem motivar uma reflexão sobre se esses mitos são justificados. Não devo esconder desde já meu argumento de que esses três mitos constituem, justamente, as três grande falácias em torno da “Revolução” Cubana. Vejamos cada um deles sistematicamente.

4. O mito do socialismo
Não é verdade que Cuba seja o único representante do chamado “socialismo real”: o comentarista do PSol esquece a República Popular Democrática da Coréia e... vejamos, talvez o Vietnã, ou, quem sabe ainda, a China? Não é seguro que estes dois últimos sejam ainda socialistas, estilo “real”, mesmo que suas equipes dirigentes possam fazer apelo ao conceito para definir seus regimes políticos e seus sistemas sociais. Em todo caso, sobra a RPDC, ou Coréia do Norte, na companhia de Cuba, a defender, contra ventos e marés, o sistema que perdura em ambos os países desde mais de meio século. O que isto significa no plano das falácias acadêmicas?
O conceito original de ‘socialismo científico, segundo os demiurgos originais, seria o de um regime baseado na apropriação coletiva – não necessariamente estatal – dos meios de produção e na organização social da produção e da distribuição segundo a fórmula clássica enunciada na Critica ao Programa de Gotha: “de cada um segundo suas capacidades, a cada um segundo suas necessidades”. Independentemente do fato de que essa frase de efeito não quer dizer rigorosamente nada, a verdade é que, tanto para Marx, como para Engels, o Estado deveria simplesmente desaparecer assim que os trabalhadores conseguissem colocar em marcha o programa da revolução socialista – basicamente os dez pontos do Manifesto de 1848 – com a sociedade de produtores organizados funcionando em ‘piloto automático’ e o Estado se encaminhando gentilmente para o museu das antiguidades, ao lado do machado de bronze e da roca de fiar (segundo Engels, em A Origem da Família, da Propriedade..., etc.).
Não é preciso dizer que, já a partir de Lênin, não foi exatamente isso que aconteceu, mas o seu contrário, com o Estado mais fortalecido do que nunca, e os trabalhadores organizados em batalhões de produtores compulsórios, mais próximos do regime fordista – ou taylorista – do que daquela imagem romântica dos Cadernos Econômico-Filosóficos, segundo a qual o homem socialista seria um trabalhador pela manhã, um pescador de tarde e um filósofo pela noite. O fato é que o Estado leninista serviu de padrão para a dominação mussoliniana na Itália, logo em seguida, e mais adiante para o regime de partido único e de Estado totalitário da experiência hitlerista.
Qualquer que seja a opinião de acadêmicos anticapitalistas sobre as excelências dos regimes socialistas – a igualdade social, a segurança do trabalho e da moradia, o ‘futuro brilhante’ de realizações materiais do ‘socialismo real’ – a realidade legada por esse tipo de regime e de sistema de engenharia social é uma só, quase uniforme em sua materialização concreta nos diversos continentes em que ele existiu (ou onde ele ainda sobrevive, como nos casos cubano e norte-coreano): ditadura política, polícias secretas, delação de vizinhos, crimes políticos no caso da simples expressão de um pensamento dissidente, controle estrito das populações, misérias econômicas, catástrofes ecológicas, quando não Gulag ou extermínio dos ‘inimigos do povo’. Sequer preciso mencionar aqui a fome organizada por Stálin no caso da coletivização forçada da agricultura no início dos anos 1930  - que não apenas resultou na eliminação física de milhares de kulaks, mas sobretudo na privação absoluta de populações inteiras, sobretudo na Ucrânia – ou no ‘grande salto para trás’, organizado pelo presidente Mao, entre 1959 e 1962, que pode ter resultado na morte de algumas dezenas de milhões de camponeses, com cenas de canibalismo jamais vistas desde tempos míticos...
Gostaria de frisar, em direção dos acadêmicos true believers nas ‘reais’ possibilidades do socialismo, e que poderiam desconsiderar algumas das asserções acima, como sendo apenas ‘acidentes circunstanciais’ numa trajetória feita de boas intenções potenciais desse sistema, que, mesmo retirando os ‘acidentes’ (com alguns milhões de mortos, é bom lembrar), as demais características não dependem da opinião ou posição política do observador: são fatos materiais indiscutíveis e associados genericamente à história do socialismo no século 20 e, ainda hoje, ao socialismo cubano em particular: ditadura política, monopólio do partido, regime policial, repressão aos dissidentes, encerramento de toda uma população numa ilha-prisão. O acadêmico que for capaz, ainda assim, de defender esse regime, certamente não merece esse título, podendo apenas ser classificado como sustentáculo voluntário de uma ditadura, o que é propriamente indigno de quem se pretenda acadêmico. 
Em uma palavra, o socialismo do século 20 representou apenas e simplesmente isto: totalitarismo, uma herança certamente pesada para que seus supostos herdeiros ainda possam reivindicar, hoje, qualquer tipo de filiação intelectual. Que acadêmicos ou militantes brasileiros ainda defendam o socialismo como idéia, e a ‘revolução’ cubana em especial, apenas constitui um testemunho eloqüente sobre mais uma ‘inconsciência revolucionária’, que também poderia ser traduzida por duas singelas expressões: suprema ingenuidade política ou brutal ignorância informativa, em ambos os casos exemplos de estupidez acadêmica. Que alguns desses personagens tenham ódio à democracia parlamentar – que eles equiparam a uma ‘ditadura da burguesia’ – e à economia de mercado – para eles indistintamente capitalista, sem sequer saber que estão transformando deste sistema produtivo, ainda bastante limitado na história econômica mundial, em um superlativo conceitual – apenas confirma como preconceitos políticos podem obstar uma apreensão historicamente adequada das realidades políticas do século 20. Ou seja, além de estupidez acadêmica, cegueira intelectual.
Se o socialismo, enquanto conceito e enquanto realidade social, não é uma falácia completa, seus defensores deveriam ser capazes de provar que ele pode funcionar, de fato, segundo os quatro requisitos formais de um Estado normal, tal como enunciados acima, quais sejam: legitimidade política interna, funcionalidade produtiva ou material, liberdades elementares e relacionamento externo com base numa garantia de reconhecimento da representatividade do Estado em face de sua população (o que implica na admissibilidade, por exemplo, de livre acesso de órgãos multilaterais em setores específicos: livre organização de trabalhadores, segundo as convenções da OIT; respeito aos direitos humanos, segundo tratados internacionais monitorados pelo Conselho de Direitos Humanos; transparência dos procedimentos legais e judiciais, como estabelecido na Carta da ONU; liberdades fundamentais, como acordado na Declaração Universal de 1948, etc.). Trata-se, obviamente, de um teste muito simples, que qualquer acadêmico minimamente bem informado seria capaz de atender, sem alimentar qualquer falácia conceitual ou prática.

5. O mito das conquistas sociais
Mesmo reconhecendo alguns ‘problemas políticos’ – geralmente justificados pelo ‘assédio imperialista’ – os acadêmicos simpáticos a Cuba costumam argumentar com a excelência dos serviços cubanos de saúde e com a alta qualidade de sua educação, constituindo esses dois elementos as grandes justificativas em face das demais ‘deficiências’ do regime, uma espécie de compensação social pela falta de liberdades políticas e por todas as misérias da vida econômica. Estas ‘bondades da Revolução’ estão sempre na primeira linha da defesa das conquistas do socialismo cubano, constituindo, no entanto, mais um dos grandes mitos que cercam a ilha. Elas estão identificadas com as supostas conquistas sociais da ‘revolução’, como se a ilha, antes de Fidel Castro, fosse um inferno de misérias humanas e um deserto de avanços sociais. Um pouco de objetividade factual pode ajudar a avaliar essa questão.
Em 1958, Cuba ostentava bons indicadores sociais em diversos quesitos, situando-se, geralmente, nos três primeiros lugares do ranking latino-americano, junto com a Argentina e o Uruguai. Obviamente, muitos indicadores, baseados em médias nacionais, não refletiam exatamente a distribuição de serviços públicos pelo conjunto da população cubana. Mas se os dados nacionais refletem uma metodologia uniforme para todos os países da amostra, eles devem poder significar realidades objetivas quanto aos serviços disponíveis. De modo geral, Cuba se situava entre as sociedades mais avançadas da América Latina, com um perfil social bem mais próximo da Europa mediterrânea do que dos demais países latino-americanos.
De um conjunto de 122 países analisados, Cuba ocupava, em 1958, o 22º. lugar em matéria sanitária, com 128,6 médicos e dentistas por 100.000 habitantes, à frente de países como França, Reino Unido e Bélgica. Sua taxa de mortalidade já era uma das mais reduzidas do mundo (5,8 anuais por 1.000 habitantes; Estados Unidos 9,5) e o nível de alfabetização da ilha era de 80%, semelhante ao do Chile e da Costa Rica e superior ao de Portugal na mesma época. Ou seja, resulta equivocado pensar que Cuba fosse uma ilha habitada por miseráveis antes da revolução. O regime socialista cubano invoca a baixa mortalidade infantil para destacar a excelência dos cuidados de saúde disponíveis para a população, mas o fato é que esse indicador já apresentava uma taxa muito baixa desde os anos 1950: em 1958, o índice cubano registrava 40 mortes infantis para cada mil nascidos vivos, uma taxa melhor do que os índices da França (41,9), do Japão (48,9) e da Itália (52,8). Não obstante essa boa situação de partida, Cuba foi ficando para trás, pois que, em 2007, o indicador cubano registrava 5,3 óbitos, contra 4,2 para a França, 3,2 para o Japão e 5,0 para a Itália.
Mesmo a situação relativamente favorável de Cuba, no confronto com outros países latino-americanos, deve ser considerada em termos de dotação de recursos para gastos de saúde: durante muito tempo, o regime cubano foi de fato subvencionado pela União Soviética, de uma forma como nenhum outro pais latino-americano foi ajudado pelo império americano. Essas subvenções, embutidas nos pagamentos pelo açúcar acima dos preços dos mercados mundiais e no financiamento direto das aventuras militares cubanas em outros continentes, sustentaram os investimentos cubanos na área social durante muito tempo. Uma vez interrompidas as transferências diretas e indiretas, a situação cubana começou a se deteriorar seriamente. 
O sistema educacional cubano é, de fato, abrangente no mais alto grau, ainda que a suposta excelência não se traduza em uma pujante produção científica ou na transferência desse saber para o sistema produtivo, no qual patentes são quase desconhecidas. Pena também que, com o analfabetismo virtualmente inexistente, os cubanos não disponham para sua leitura diária que de jornais controlados pelo Partido Comunista e que seu acesso à internet só é comparável com a situação na Síria e na Birmânia. Apenas alguns poucos países exóticos mantêm, hoje, uma repressão à liberdade de informação tão ampla – com perdão pelo paradoxo involuntário – quanto a existente em Cuba. Uma população tão educada mereceria mais, certamente.
Outra das alegações freqüentes do regime se refere à suposta igualdade dos cubanos quanto à distribuição de renda. Não existem dados oficiais a esse respeito, mas estimativas de especialistas indicam que essa distribuição se deteriorou muito desde a crise do socialismo, sendo que o coeficiente de Gini passou de um índice 0,22 em 1986 para 0,407 em 1999. Em especial, no tocante à distribuição entre as classes de renda, a situação cubana conheceu uma evolução bem mais negativa do que o resto da América Latina: a razão entre o quintil mais rico e o quintil mais pobre de renda cresceu de 3,8 a 13,5 na ilha, entre 1989 e 1999, ao passo que, nesse mesmo período, a razão entre o quintil mais rico e o quintil mais pobre cresceu de 11,90 a 19,91 para a região como um todo: ou seja, em Cuba o aumento foi 3,85 vezes, enquanto o aumento na América Latina foi de apenas 1,67 vezes.
Se formos examinar a disponibilidade de habitações, a deterioração também foi sensível, com uma diminuição do número de moradias em função da baixa taxa de natalidade e da emigração. No plano mais geral do crescimento econômico a longo prazo, a trajetória cubana é também reveladora da incapacidade do sistema em produzir bem-estar. Como revelado na tabela abaixo, a posição relativa de renda por habitante de sete países selecionados, colocava Cuba em terceiro lugar em 1957, à frente da Espanha e de Portugal, tendo a ilha caído para o último lugar em 2007.

Classificação de países segundo o PIB per capita
Posição
1957
2007
1
Venezuela
Espanha
2
Argentina
Portugal
3
Cuba
Chile
4
Espanha
Venezuela
5
Portugal
México
6
México
Argentina
7
Chile
Cuba
Fonte: United Nations Statistics Division

Na verdade, o sistema socialista cubano é incapaz de alimentar o seu próprio povo atualmente, tendo a ilha de importar volumes significativos de alimentos, inclusive dos EUA, um dos principais parceiros comerciais. Incapaz de produzir bens exportáveis, Cuba tem uma balança comercial altamente deficitária, o que se reflete na dívida externa cubana e nas insolvências bilaterais com vários países europeus, com o México, com o Chile, com o Brasil e com o Japão. No total, a dívida externa cubana deve superar 38 bilhões de dólares, o que equivale a 3.410 dólares por habitante, três vezes a média latino-americana, de 1.173 dólares por habitante.
Um estudo recente sobre a situação do abastecimento alimentar em Cuba revelou dados assustadores: “Ao menos 13% da população é clinicamente subnutrida, na medida em que o estado do racionamento alimentar provê, agora, apenas entre uma semana e dez dias das necessidades alimentares básicas” (Antonio E. Morales-Pita, “Possible Scenarios in the Cuban Transition to a Market Economy”, Proceedings da Association for the Study of the Cuban Economy: Cuba in Transition 2007, p. 330). Um outro estudo confirma que “A economia cubana tem sobrevivido em larga medida graças aos investimentos, comércio, créditos e ajuda da Venezuela e, em menor medida, da China, assim como de investimento estrangeiro em setores estratégicos, como petróleo e gás, níquel e turismo, o que permitiu a Fidel lançar um processo de recentralização da tomada de decisão em 2003-2006, que reverteu a maior parte dos progressos feitos pelas modestas reformas orientadas para o mercado implementadas em 1993-1996, operando uma rígida transição de poder para Raúl” (Carmela Mesa-Lago, “The Cuban Economy in 2006-2007”, ASCE: Cuba in Transition 2007, p. 15).
Esse mesmo estudo citado imediatamente acima traz estatísticas arrasadoras sobre o declínio da produção cubana entre 1989 e 2006, em quase todos os setores da economia, sobretudo alimentares, como revelado na tabela abaixo.

Cuba: indicadores da produção física, 1989 e 2006 e variação 2006-1989 (%)
(milhares de toneladas métricas, ou unidades especificadas)
Setores, produtos
1989
2006
2006-1989 %
Petróleo
718
2.900
303
Gás Natural (milhões metros cúbicos)
34
1.085
3.091
Níquel
47
73
55
Açúcar
8.121
1.474
-82
Aço
314
257
-18
Cimento
3.759
1.705
-55
Eletricidade (bilhões kW/h)
16
16
0
Têxteis (milhões de m2)
220
27
-88
Fertilizantes
898
41
-95
Charutos (unidades)
308
418
35
Sapatos (milhões de pares)
12
3
-75
Sabão (lavanderia)
37
14
-62
Cítricos
1.016
373
-63
Arroz
532
434
-18
Ovos (milhões de unidades)
2.673
2.341
-12
Leite (vaca)
1.131
415
-63
Fumo
42
29
-31
Gado (milhares de cabeças)
4.920
3.737
-24
Peixes e frutos do mar
192
55
-71
Fonte: Carmela Mesa-Lago, “The Cuban Economy in 2006-2007”, op. cit., p. 4.

De fato, a situação econômica é deveras preocupante, daí as tentativas do novo governo pós-Fidel de introduzir algumas reformas pró-mercado para paliar essas dificuldades, como já tinha ocorrido com diversos outros países socialistas no período anterior à implosão final. Não é preciso alinhar muitos dados sobre essa deterioração constante, bastando mencionar o aumento da prostituição, do mercado negro e das transações ilegais, bastante visíveis para qualquer turista que tenha visitado a ilha nos últimos anos. Por uma dessas ironias da história, uma das principais alegações para o exacerbado nacionalismo e anti-americanismo cubano do período imediatamente posterior à revolução foi, justamente, a eliminação da designação infame da ilha como sendo o ‘bordel do imperialismo’. Aparentemente, os velhos tempos estão de volta...

6. O mito do imperialismo como ameaça
Finalmente, a escusa principal do regime para tentar explicar as dificuldades da vida econômica em Cuba sempre foi, historicamente, o ‘embargo americano’, aparentemente responsável por todos os problemas da ilha. Trata-se, provavelmente, do maior mito entretido pelo regime durante o último meio século, posto que esse embargo é amplamente contornado pelo comércio de Cuba com todos os demais países do mundo, sendo as únicas exceções as empresas americanas instaladas nesses países. Na verdade, como explicitado acima, os EUA converteram-se atualmente no principal fornecedor de alimentos para Cuba, sendo que muitos outros produtos americanos ingressam na ilha por terceiros países. A alegação é falsa, portanto.
Pode-se mencionar, também, as remessas dos cubanos emigrados a seus familiares na ilha, um aporte tão ou mais substancial do que aquele representado pelas transferências de trabalhadores mexicanos nos EUA para seu país natal. Cabe registrar que são essas divisas, ademais das gorjetas que médicos ou engenheiros ganham como taxistas clandestinos ou guias turísticos, que permitem paliar, um pouco, a situação de penúria absoluta da maior parte das famílias, aliás incontornável para todos aqueles que não dispõem de uma fonte de renda em moedas fortes.
De fato, o imperialismo tentou derrubar o regime cubano em 1961, numa desastrada operação da CIA que tinha sido montada ainda antes da administração Kennedy, assim como a CIA tentou assassinar Fidel Castro várias vezes, sem sucesso nenhum, em vista da excepcional qualidade da inteligência cubana, muito bem treinada por soviéticos e alemães orientais. Mas, as tentativas para minar o regime terminaram logo depois da crise dos mísseis de 1962, assim como o Congresso americano impôs um veto, desde os anos 1970, aos atentados contra a vida do líder cubano. O que restou de tudo isso foi o estúpido embargo americano, mais determinado pelo Congresso do que pelo Executivo, em função das expropriações de propriedades americanas não indenizadas no período de radicalização da revolução. Se o embargo tivesse sido suspenso – o que é difícil em vista do lobby cubano da Flórida – o regime não teria praticamente nenhuma desculpa para os níveis baixíssimos de padrão de vida para a maioria da população cubana.
Para ser mais preciso, é verdade que o governo socialista cubano abandonou o FMI e o Banco Mundial, consideradas entidades subordinadas a Washington; mas Cuba nunca deixou de fazer parte do GATT – atualmente da OMC – e pode, assim, transacionar com todos os demais membros do sistema multilateral de comércio. Portanto, ainda que exista animosidade do governo americano em relação ao regime socialista, na prática a ilha está absolutamente livre para intercambiar produtos com a quase totalidade do planeta, não o fazendo apenas por falta de competitividade de sua economia e da ausência de oferta exportável, inclusive de produtos tradicionais. O imperialismo, como diriam os maoístas, é um tigre de papel, hoje sobretudo interessado na normalização de relações, com o afastamento dos falcões do ex-governo Bush. Cuba já é membro da Aladi e foi admitida no Grupo do Rio, inclusive com o ativo apoio do Brasil, relacionando-se normalmente com todos os países do hemisfério, à exceção, ridiculamente, do império.

7. À guisa de conclusão: um manifesto a favor do povo cubano
Para não dizer que todos os acadêmicos ou intelectuais alimentam falácias sobre Cuba e sua situação econômica e política, permito-me transcrever aqui um manifesto de apoio ao povo cubano escrito por intelectuais argentinos. Assim diz o texto, no original, com cortes mínimos por conter informações desnecessárias:
“Ante la situación política de Cuba, un grupo de intelectuales argentinos dio a conocer una declaración, en la que expresa su apoyo moral al pueblo de ese país en su lucha para restablecer el imperio de la libertad y la justicia en la tierra de Martí. La declaración dice así:
“Los escritores y artistas argentinos que subscriben (...) expresan su solidaridad con quienes, en otros pueblos de América, luchan por la liberación de sus respectivos países, sometidos a regímenes de fuerza. Desean manifestar especialmente su apoyo moral al pueblo cubano, que, tremendamente agraviado y despojado de las garantías elementales de la civilización política, sufre persecución, vejamen y tortura, y lucha con admirable decisión y valentía para abatir la dictadura y restablecer, en la tierra de Martí, el imperio de la libertad y la justicia, cimentados en la soberanía del pueblo y la vigencia del derecho.”
Firmaram esse documento dezenas de nomes de intelectuais conhecidos na história artística e literária argentina, entre eles Adolfo Bioy Casares e Jorge Luis Borges. Pois bem, como ambos escritores, como se sabe, já não estão mais entre nós desde algum tempo, cabe fazer um esclarecimento a respeito e agregar um comentário pessoal sobre esse tipo de exercício, se eventualmente conduzido atualmente.
O texto, na verdade, não é atual, tendo sido publicado no diário El Mundo, de Buenos Aires, em 2 de março de 1958, e se referia, portanto, à luta dos democratas e revolucionários cubanos contra a ditadura de Fulgencio Batista, justamente. Os argentinos, então, saiam de uma outra ditadura, ainda que alguns a classificassem simplesmente de regime populista: o governo peronista, que tinha durando dez anos, desde o imediato pós-segunda guerra. Os intelectuais argentinos se orgulhavam, assim, de ter deixado para trás um triste período de sua história e se dispunham a ajudar outros povos da América Latina que também lutavam contra a ditadura em seus respectivos países, antecipando um pouco o que seria a chamada “doutrina Betancourt”, formulada depois de superada uma outra ditadura na Venezuela nesse mesmo ano de 1958 (e que levou inclusive o governo venezuelano a suspender relações diplomáticas com o Brasil, quando instalada aqui a ditadura militar de 1964).
Se me permito, agora, fazer um comentário atual, na verdade uma triste constatação, seria esta. Não creio que, atualmente, intelectuais brasileiros ou argentinos, ou de qualquer outro país latino-americano, se dispusessem a assinar um manifesto do mesmo teor – que poderia ter, inclusive, exatamente o mesmo texto – em favor do povo cubano, em luta pelo restabelecimento da democracia e do império da liberdade, da justiça e do direito naquela ilha, desde cinqüenta anos dominada por um regime que prometeu acabar com uma ditadura opressiva.
Pode ser patético fazer tal tipo de constatação “regressiva”, mas ela nos revela o quanto recuaram os intelectuais latino-americanos na defesa da democracia e da liberdade em nossos países. Em nome de não se sabe qual ‘soberania popular’ e de não se sabe qual ameaça de ‘dominação imperialista’, intelectuais dos países latino-americanos se mostram muito mais dispostos, na verdade, a assinar, de forma totalmente servil e incompreensível, manifestos em favor da continuidade da ditadura na ilha caribenha. Se pretendesse citar nomes, eu poderia alinhar alguns acadêmicos brasileiros que cometeram a indignidade de apoiar o regime cubano quando este condenou à morte alguns balseros (boat-people) que tentavam fugir da ilha, em 2003. Triste constatação, sem dúvida, que talvez merecesse adjetivos mais fortes.
Esta última constatação não constitui, obviamente, uma falácia acadêmica, no sentido aqui analisado. Trata-se, mais propriamente, de uma renúncia à inteligência e à dignidade intelectual, e de um abandono de valores normalmente exibidos por membros da academia, como os dos direitos humanos, do princípio democrático, da liberdade de opinião e de expressão e, sobretudo, da liberdade de ir e vir, valores pelos quais muitos desses acadêmicos se bateram durante a ditadura militar brasileira. O fato de não termos, em direção do povo cubano, a mesma defesa enfática de princípios e objetivos que animaram, no passado, a comunidade acadêmica brasileira, só pode revelar uma deterioração tremenda de seu senso moral ou mesmo da simples coerência com valores filosóficos que deveriam ser universais. Mas, parece que não...

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 1o. de março de 2009

Nota 1: Retirei o texto transcrito em espanhol, acima, do seguinte capítulo neste livro: “Expresan su adhesión al pueblo de Cuba intelectuales argentinos”. In: Jorge Luis Borges, Textos Recobrados (1956-1986). Buenos Aires, Emecé Editores, 2007, p. 323-324.
Nota 2: Os dados econômicos referidos neste ensaio foram retirados dos ‘proceedings’ de 2007, da Association for the Study of the Cuban Economy, com o apoio da Universidade do Texas, em Austin, neste link: http://lanic.utexas.edu/project/asce/publications/proceedings/index.html; adicionalmente, recorreu-se à publicação “Carta de Cuba, la escritura de la libertad”, sob a responsabilidade de um conjunto de autores e disponível no link: http://www.elcato.org/node/3948; acesso em fevereiro de 2009.

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Pausa para... poesia - Sá de Miranda, quinhentista

Por acaso participando de um debate, em outro espaço, retruquei uma frase pouco apropriada de um interlocutor. Ele tornou a desviar o foco do debate, atirando no mensageiro -- eu mesmo --, em lugar de se ater aos termos do debate (que estava em torno das famosas reformas de base do Jango).
Qual não foi minha supresa, logo em seguida, ao constatar que o interlocutor apagou todos os seus rastros, suas pegadas, suas frases mal concebidas e mal dirigidas.
Parece que eu fiquei falando comigo mesmo...
Além de me lembrar das famosas fotos com personagens apagados da era Stalin, lembrei-me de um poema famoso, que devo ter lido aos 12 ou 13 anos e do qual nunca me esqueci, pelo menos as quatro estrofes iniciais.
Pois bem, hoje resolvi buscar novamente esse poema, de um poeta quinhentista português, e para isso me dirigi ao Sapo.pt, o buscador lusitano, que para isso foi impecável.
Aqui vai, portanto, o poema inteiro, do qual só me lembrava da parte inicial.
Paulo Roberto de Almeida 

http://www.citador.pt/poemas/comigo-me-desavim-sa-de-miranda

Comigo me DesavimComigo me desavim, 
Sou posto em todo perigo; 
Não posso viver comigo 
Nem posso fugir de mim. 

Com dor da gente fugia, 
Antes que esta assi crecesse: 
Agora já fugiria 
De mim, se de mim pudesse. 
Que meo espero ou que fim 
Do vão trabalho que sigo, 
Pois que trago a mim comigo 
Tamanho inimigo de mim? 

Sá de Miranda, in 'Antologia Poética'
Tema(s): Auto-conhecimento Sá MirandaLer outros poemas de Sá de Miranda
Sá de MirandaPortugal
[Wikipedia]
28 Ago 1481 // 15 Mar 1558Poeta
 

Corrupcao: um empresario contra os empresarios... corruptos - Ricardo Semler

Capitalistas não são santos, nem liberais. São o que são, ou seja, precisam ganhar dinheiro, pois seus ganhos dependem do sucesso, nas condições ambientais que existem. Se um país é perfeitamente isento de corrupção, em ambiente competitivo, ele tem de ganhar dinheiro nessas condições. Um país corrupto até a medula, como parece ser o caso do Brasil, obriga o capitalista a também recorrer a expedientes escusos para sobreviver.
Não creio que ele tenha razão, pois capitalistas não fazem as regras, não escrevem as leis, e dificilmente terão convergência suficiente para aprovar determinadas leis que permitam fazer corrupção. Quem faz isso são os políticos, pressionados ou não por capitalistas, mas a palavra final é a da maioria dos políticos. Se estes se inclinam para a corrupção, assim será.
No caso do Brasil, é o caso, e com o PT é o caso exacerbado. O PT é inerentemente corrupto. Ponto.
Paulo Roberto de Almeida

Nunca se roubou tão pouco
Ricardo Semler
Folha de São Paulo:21/11/14

Não sendo petista, e sim tucano, sinto-me à vontade para constatar que essa onda de prisões de executivos é um passo histórico para este país
Nossa empresa deixou de vender equipamentos para a Petrobras nos anos 70. Era impossível vender diretamente sem propina. Tentamos de novo nos anos 80, 90 e até recentemente. Em 40 anos de persistentes tentativas, nada feito.
Não há no mundo dos negócios quem não saiba disso. Nem qualquer um dos 86 mil honrados funcionários que nada ganham com a bandalheira da cúpula.
Os porcentuais caíram, foi só isso que mudou. Até em Paris sabia-se dos "cochons des dix pour cent", os porquinhos que cobravam 10% por fora sobre a totalidade de importação de barris de petróleo em décadas passadas.
Agora tem gente fazendo passeata pela volta dos militares ao poder e uma elite escandalizada com os desvios na Petrobras. Santa hipocrisia. Onde estavam os envergonhados do país nas décadas em que houve evasão de R$ 1 trilhão --cem vezes mais do que o caso Petrobras-- pelos empresários?
Virou moda fugir disso tudo para Miami, mas é justamente a turma de Miami que compra lá com dinheiro sonegado daqui. Que fingimento é esse?
Vejo as pessoas vociferarem contra os nordestinos que garantiram a vitória da presidente Dilma Rousseff. Garantir renda para quem sempre foi preterido no desenvolvimento deveria ser motivo de princípio e de orgulho para um bom brasileiro. Tanto faz o partido.
Não sendo petista, e sim tucano, com ficha orgulhosamente assinada por Franco Montoro, Mário Covas, José Serra e FHC, sinto-me à vontade para constatar que essa onda de prisões de executivos é um passo histórico para este país.
É ingênuo quem acha que poderia ter acontecido com qualquer presidente. Com bandalheiras vastamente maiores, nunca a Polícia Federal teria tido autonomia para prender corruptos cujos tentáculos levam ao próprio governo.
Votei pelo fim de um longo ciclo do PT, porque Dilma e o partido dela enfiaram os pés pelas mãos em termos de postura, aceite do sistema corrupto e políticas econômicas.
Mas Dilma agora lidera a todos nós, e preside o país num momento de muito orgulho e esperança. Deixemos de ser hipócritas e reconheçamos que estamos a andar à frente, e velozmente, neste quesito.
A coisa não para na Petrobras. Há dezenas de outras estatais com esqueletos parecidos no armário. É raro ganhar uma concessão ou construir uma estrada sem os tentáculos sórdidos das empresas bandidas.
O que muitos não sabem é que é igualmente difícil vender para muitas montadoras e incontáveis multinacionais sem antes dar propina para o diretor de compras.
É lógico que a defesa desses executivos presos vão entrar novamente com habeas corpus, vários deles serão soltos, mas o susto e o passo à frente está dado. Daqui não se volta atrás como país.
A turma global que monitora a corrupção estima que 0,8% do PIB brasileiro é roubado. Esse número já foi de 3,1%, e estimam ter sido na casa de 5% há poucas décadas. O roubo está caindo, mas como a represa da Cantareira, em São Paulo, está a desnudar o volume barrento.
Boa parte sempre foi gasta com os partidos que se alugam por dinheiro vivo, e votos que são comprados no Congresso há décadas. E são os grandes partidos que os brasileiros reconduzem desde sempre.
Cada um de nós tem um dedão na lama. Afinal, quem de nós não aceitou um pagamento sem recibo para médico, deu uma cervejinha para um guarda ou passou escritura de casa por um valor menor?
Deixemos de cinismo. O antídoto contra esse veneno sistêmico é homeopático. Deixemos instalar o processo de cura, que é do país, e não de um partido.
O lodo desse veneno pode ser diluído, sim, com muita determinação e serenidade, e sem arroubos de vergonha ou repugnância cínicas. Não sejamos o volume morto, não permitamos que o barro triunfe novamente. Ninguém precisa ser alertado, cada de nós sabe o que precisa fazer em vez de resmungar.

RICARDO SEMLER, 55, empresário, é sócio da Semco Partners. Foi professor visitante da Harvard Law School e professor de MBA no MIT - Instituto de Tecnologia de Massachusetts (EUA)

Selfie na internet: do Google ao eBay, passando pelo Baidu - Paulo Roberto de Almeida

Ao acionar distraidamente a janela de busca do Firefox -- no Chrome não tem, pois se busca direto na janela de navegação -- descobri que o mundo tem algo mais além do Google, se desdobrando em vários outros instrumentos de busca.
Claro, isso eu já sabia, desde os velhos tempos do Alta Vista e do Lycos, mas agora tem vários outras ferramentas, com o surgimento do Bing da Microsoft, e antes mesmo, do Google Scholar, que simplificou um bocado minhas buscas acadêmicas por artigos específicos.
Quando eu estava na China, ficava irritado pois cada vez que eu procurava algo no Google, era invariavelmente direcionado para o Baidu, em chinês, claro, mas com muita publicidade em inglues de coisas chinesas, algo frustrante, mas compreensível naquele universo orwelliano.
Agora resolvi verificar os mais ativos, e fui obviamente à Wikipedia. Descobri que o irritante Baidu é o segundo mais usado no mundo, mas isso não tem nenhuma importância para nós. A despeito disso, coloquei o meu nome em vários instrumentos de busca, inclusive no Baidu, com algumas variantes, como especificado abaixo: apenas o meu nome, o nome seguido de "diplomata", ou "diplomat", para buscas exclusivamente em inglês, e outras variantes que podem ser verificadas abaixo.
Obviamente deve ter muita repetição, e outros PRAs indevidos, juntos ou separados, a despeito que eu sempre usei aspas, para isolar o nome devidamente (mas esses instrumentos de busca nem sempre obedecem aos requerimentos de busca. E nem sempre estou associado a essa antiga profissão, podendo, ao contrário, estar associado a uma menos antiga, a de professor.
Acabei encontrando inclusive um famoso criminoso homônimno, que abre o Ask.com, mas depois as remissões pareceram corretas. Muitas delas não especificamente o número total de "achamentos", embora isso não seja muito representativo, em virtude, justamente, das repetições ou das falsas atribuições e homonimias.
Termino pelo eBay, onde estou sendo vendido por 33 dólares, ou mais exatamente um livro meu em Francês.
Oh, esqueci de buscar em Francês, ou em espanhol, ou em lusitano (tem o Sapo.pt), mas ficamos só com estas, que já são o bastante.
O melhor instrumento, para mim ao menos, é o Google Scholar, que leva a artigos meus e a artigos onde sou citado, mas não aprofundei as buscas...
Se eu tivesse um instrumento para verificar plágio de meus textos por alunos preguiçosos, certamente teria uma farta colheita, mas tampouco faz alguma diferença...
Selfie, donc...
Paulo Roberto de Almeida


Estatísticas de acesso ao nome "PRA" em instrumentos de busca na Internet
 efetuada em 20/11/2014

“Paulo Roberto de Almeida”, em vários tipos de busca:

Google.com, “PRA”: Aproximadamente 101.000 resultados


Google Scholar em Português, “PRA, diplomata”: About 6,340 results

Google Scholar, English results only, “PRA”: About 240 results

Yahoo, “PRA”: 191,000 results

Yahoo, “PRA, diplomata”: 30,500 results

Bing, “PRA”: 191,000 results

Bing, “PRA, diplomata”: 30,500 results

Baidu.com: 百度为您找到相关结果约212,000
            去掉""获得更多 Paulo Roberto de Almeida 的搜索结果(关于双引号)

Excite, “PRA”: sem resultados consolidados, mas com várias páginas

AOL, “PRA”: About 101,000 results, but: Enhanced by Google.

AOL, “PRA”, diplomat: About 17,900 results

Ask.com: sem resultados consolidados, mas com várias páginas.
            Curiosamente, omeça com: Paulo David (criminoso) – Wikipédia, a enciclopédia livre
Paulo Roberto de Almeida David, conhecido como o Padre, foi um criminoso brasileiro famoso na década de 1970 no Rio de Janeiro, que atualmente atua como advogado.
            Mas depois segue com referências a este que aqui escreve…

eBay: 1 item found from eBay international sellers

Petrobras: perdas patrimoniais, preco das acoes, consequencias economicas sistemicas

Um economista, Aluizio Gomes, formula, em seu blog, as seguintes considerações sobre o escândalo Petrobrás, que está longe de ser esclarecido, e provavelmente o governo não tem interesse em esclarecer o assunto.
Transcrevo suas observações, seguidas de alguns comentários recebidos nessa postagem.
Paulo Roberto de Almeida  

Petrobras: observações econômicas
Aluizio Gomes, 19/11/2014

O banco americano Morgan Stanley foi um dos primeiros a divulgar a investidores uma estimativa das eventuais perdas com os desvios citados na Operação Lava Jato, da Polícia Federal. Para o Morgan, as perdas podem chegar a R$ 21 bilhões, o que comprometeria todo o lucro de 2014 da estatal.

O Morgan Stanley fez suas estimativas com base na informação dada pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto da Costa de que as propinas representaram 3% do que foi investido pela empresa nos últimos anos. Levando em conta uma margem de erro, o banco considerou perdas de 1% a 5%, o que significariam baixas contábeis entre R$ 5 bilhões e R$ 21 bilhões.

Neste último caso, se o registro das perdas na contabilidade for feito todo neste ano, não haverá pagamento de dividendos para os detentores das chamadas ações ordinárias (com direito a voto nas principais decisões das empresas). Os bancos estão fazendo as contas depois que a própria Petrobras admitiu que terá de reduzir o valor de seus ativos caso sejam confirmadas as denúncias de corrupção. Além disso, vários analistas financeiros alertam os investidores para a redução no pagamento de dividendos este ano e retiram a recomendação para a compra das ações da Petrobrás.

Os analistas do banco Safra que até ontem acreditavam que as ações da Petrobras teriam desempenho melhor do que outras ações, sugerindo oportunidade de compra, rebaixaram a ação para "neutro", ou seja, nem comprar, nem vender. O Itaú BBA disse em relatório assinado por seus analistas que a cada R$ 1 bilhão de registro de baixa contábil que a Petrobras tenha de fazer, os detentores de ações com direito a voto, que deveriam receber R$ 0,37 por ação, vão receber R$ 0,02 menos. Na prática, se o rombo for de R$ 10 bilhões, o dividendo a ser pago cairá pela metade.

Contas públicas
Um dos maiores prejudicados seria o próprio governo federal que é dono de mais de 50% dessas ações e espera fechar as contas com esses dividendos. O BNDES tem outros 10%. Já os investidores estrangeiros, que possuem a ação negociada em Nova York, têm quase 20%. Os investidores que têm ações preferenciais serão menos afetados porque, pela lei, a Petrobras é obrigada a pagar dividendo mínimo, mesmo que tenha prejuízo.

Os relatórios dos analistas se mostram cautelosos, mas alertam para o potencial de a situação da Petrobras se agravar caso permaneça por um longo período sob investigação a ponto de impedir que os auditores avalizem seu balanço até meados do próximo ano. Se o balanço anual não for auditado e publicado até lá, a empresa não terá como refinanciar sua dívida que vence em 2015 e poderá ser forçada a pagar antecipadamente, de uma só vez US$ 57 bilhões em empréstimos, segundo dados do Morgan.

Quando a empresa faz um empréstimo, ela se compromete a manter margens financeiras do seu negócio, que servem como garantia de solvência, e também prestar informações atualizadas. Entre essas informações, estão os balanços auditados por empresas independentes. Na semana passada, a PricewaterhouseCoopers se negou a assinar o balanço trimestral antes do fim da investigação que está sendo feita para apurar as perdas com os desvios nas refinarias Abreu e Lima e Comperj.




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 Por Gil Vasco, 19/11/2014

Cosme, a quebra da Petrobras e do País é fruto do "jeito petista de governar". É provável que o STF seja "compreensivo" com as malfeitorias petistas. Os agentes econômicos, porém, não perdoam: a Dilma terá de adotar as medidas ditas "neoliberais" pelos petistas, para decepção/frustração destes ... O perfil do ministro da Fazenda terá que passar pelo crivo do mercado. A Dilma está agora consciente de que governar é mais do que distribuir bolsa família.

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Por cosme,19/11/2014

Caro Osíres Costa. A eleição acabou mas não sou nem cego e muito menos insano. Estou achando que você é do PT. Como falei e falo sempre o PT representa o câncer do Brasil. Sou consciente que corrupção sempre existiu e existirá, mas igual a corja do PT ainda está para nascer na face deste planeta. Obs: meu amigo Osíres eu sou Cosme e Tenho um irmão que é Damião. O pior cego é aquele que não quer enxergar. Se você acredita em : Papai Noel. Tudo bem. Respeito.

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Por heraldo,19/11/2014

Como foi dito em comentário anterior. : A eleição ja acabou. De fato, acabou, o Brasil perdeu e os bandidos, ladrões e corruPTos ganharam e vão continuar saqueando o Brasil.

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Por heraldo,19/11/2014

E a Sra Dilma Yousseff , no comando da Petrobrás como presidente do Conselho de Administração durante os anos da roubalheira não " sabia de nada". Só existem duas hipóteses, ou ela era conivente com tudo, ou era uma figura meramente decorativa a quem ninguem prestava satisfações. E o papel de bobos fazemos todos nós.

Petrobras: Mensalao foi um caso para juizado de pequenas causas perto do Petrolao - Ministro Gilmar Mendes

O Ministro Gilmar Mendes, sem querer ofendê-lo, é um ingênuo.
Ele parece pensar que a corrupção petista se resume a esse caso conhecido...
Claro, a Petrobras é uma SENHORA vaca petrolífera.
Mas quem disse que os companheiros só roubaram nessa vaca?
Tem muitas outras tetas espalhadas por toda a administração, dezenas de estatais e de agências, centenas de transferências efetuadas a prefeituras, governos ou outros entes oficiais dominados por petistas, milhares de ONGs e de compras governamentais que permitem superfaturamento tranquilo, quase indectável.
Quem disse que os companheiros só roubaram alguns bilhões?
Quem disse que eles se contentam com pouco?
Paulo Roberto de Almeida 

Mendes: Mensalão é 'pequenas causas' frente à Lava Jato
A Tarde, 20/11/2014

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), comparou nesta quinta-feira, 2 as investigações na Operação Lava Jato ao processo do mensalão. Citando os valores envolvidos nos dois casos, o ministro afirmou que "agora, a ação penal 470 (mensalão) teria de ser julgada em juizado de pequenas causas, pelo volume que está sendo revelado" na Operação Lava Jato, que está revelando um esquema de corrupção na Petrobras.

"Nós falávamos que estávamos a julgar o maior caso, pelo menos de corrupção investigado, identificado. Mas nós falávamos de R$ 170 milhões", disse Gilmar, sobre o mensalão. Ao falar da Lava Jato, o ministro alertou que é um caso de proporções bem maiores. "Estamos a ver que esse dinheiro está sendo patrimonializado. Quando vemos uma figura secundária que se propõe a devolver US$ 100 milhões, já estamos em um outro universo, em outra galáxia", disse, em referência às notícias de que o ex-gerente-executivo da diretoria de Serviços da Petrobras, Pedro Barusco, fechou acordo de delação premiada em que se compromete a devolver o valor e contar o que sabe sobre o esquema de corrupção e propina na estatal.

O ministro avaliou como "lamentável" que o esquema revelado pela Lava Jato já estivesse em operação durante o julgamento do mensalão. "Nem o julgamento do mensalão e nem as penas que foram aplicadas tiveram qualquer efeito inibitório. Mostra que é uma práxis que compõe a forma de atuar, de gerir, administrar."

Tempo
Questionado se o processo que derivar da Operação Lava Jato pode se estender por anos no Supremo, como foi o caso do mensalão, Gilmar Mendes disse que hoje há "uma tecnologia processual mais moderna, com o trabalho das turmas". Desde junho, as ações penais são remetidas às turmas do STF e não ao plenário, como forma de agilizar o julgamento. "Mas certamente pode ser um caso trabalhoso. E também já se faz previamente a divisão dos processos. Haverá distribuição, definição de competência", disse Gilmar Mendes.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Petrobras/PTbras: fazendo as contas da corrupcao (um bocado de dinheiro)

Quaisquer que sejam os números, é um bocado de dinheiro.
Prestem atenção: não acredito na miséria dos 3%.
Acho que é bem mais.
Paulo Roberto de Almeida

Ricardo Britto

O Estado de S.Paulo, 19/11/2014


Brasília – O secretário de Fiscalização de Obras para a Área de Energia do Tribunal de Contas da União (TCU), Rafael Jardim Cavalcante, afirmou nesta tarde que a estatal petrolífera realizou a maior parte das contratações diretas de bens entre os anos de 2011 e 2014 sem licitação. A CPI mista da Petrobrás realiza nesta quarta uma audiência pública em que discute o regime de contratações feitas pela estatal. “Não temos ainda números definitivos, mas nos últimos quatro anos eventualmente em bens a Petrobrás talvez tenha contratado entre R$ 60 e R$ 70 bilhões. Levantamentos preliminares, e peço a paciência e a compreensão sobre a higidez desse número, apontam que de 60% a mais de 70%, dessas contratações de bens são feitas sem licitação. Para avaliar, antes do certo e errado, qual é o risco em termos de boa governança corporativo dessa prática e dessa previsão legal?”, questionou.

Os dados apurados, segundo o representante da Corte, constam de auditoria do TCU que ainda está em apuração na Corte. Cavalcante afirmou que a Petrobrás se vale do decreto que regulamenta o procedimento simplificado da estatal para realizar suas contratações. Ele citou que tal instrumento legal é alvo de 19 mandados de segurança no Supremo Tribunal Federal contra decisões do TCU. Até o momento, não houve um julgamento de mérito sobre a legalidade ou não desse mecanismo. O decreto, de número 2.745/1998 foi editado no governo Fernando Henrique Cardoso.

O secretário do TCU afirmou ainda que, em razão do decreto, a Corte de Contas só tem acesso às informações sobre licitações na Petrobrás após a realização delas. Destacou ainda que esse instrumento permite a elevação dos preços contratados acima dos 25%, porcentual de reajuste previsto na Lei de Licitações convencional (8.666/93). Cavalcante disse ainda que a estatal também adota a prática de se utilizar orçamentos sigilosos, com restrição de acesso aos órgãos de controle como o TCU. Para ele, o uso da licitação faz parte de um conjunto do sistema de governança que visa a defender o interesse público.
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Why Nations Fail, a book by Daron Acemoglu & James Robinson - a review by Sergei Soares



No site da Amazon que anuncia e vende o livro já aqui referido. O resenhista era diretor do Ipea.

 

Why Nations Fail: The Origins of Power, Prosperity, and Poverty 

 

Daron Acemoglu , 
 James Robinson 

Format:Kindle Edition
To an economist like me, reading Why Nations Fail, by Daron Acemoglu and James Robinson, is akin to being set free from shackles worn since I began studying. However, first let me say that the book has many and serious shortcomings. Let me talk about these before I get into why this book set me free. Since I am going to strongly criticize aspects of the book, let me make clear that this is one of the best books on economics I have read in a long time.

Several criticisms have been leveled in other reviews against this book: it is simplistic and perhaps overly ambitious, the history is bad, it explains away competing explanations. They are all true.

The book is undoubtedly simplistic. Basically, the authors state that the institutions of a nation or society can be placed on a one dimensional continuum running from "extractive" to "inclusive" and this explains the history of humanity from the neolithic to the present day. A second leitmotif is that the economic and political institutions complement each other and that economically inclusive but politically extractive institutions cannot last for long (as well as the opposite). Finally, since political and economic institutions reinforce each other, they are quite difficult to change, leading to what the authors call "the iron law of oligarchy." Needless to say, this really oversimplifies the analysis of institutions and history. While Acemoglu and Robinson give many, many historical examples to illustrate their thesis, some are more convincing than others. They use a huge mallet to hammer all the facts into their mold, either ignoring or re-interpreting contrary evidence.

I am no historian, but I do know the history of the region in which I live, Latin America, reasonably well. When Latin American examples were used in the book, they were shallow and even wrong. For example, the authors talk quite a bit about the establishment of indigenous "serfdom", with terrible extractive institutions such as the encomienda and repartimiento, in much of Hispanic America. I agree the story they tell is quite important but they do not get it quite right. Acemoglu and Robinson tell the tale of these institutions as if they were simply set in place by colonizing Spaniards when the truth was much more complex, involving conflicts and constant negotiation between the Spanish colonizers, the Spanish Crown, and the conquered peoples themselves. The colonizers wanted to set up slavery instead of serfdom but were impeded from doing so by the Crown through the Leyes Nuevas. The story is told marvelously well in La Patria del Criollo by Severo Martinez Pelaez. The funny thing is that the correct narrative would fit well into the inclusive-extractive framework with a richness that comes from putting in two groups of elite actors with divergent interests, but Acemoglu and Robinson tell it so simplistically so as to miss out.

Likewise, the authors analyze, in different points of the book, Colombia and Brazil, with exceptional praise for Brazilian institutions while they heap abuse upon the Colombian ones. Brazil at the present time has, evidently, better institutions than a Colombia only (we hope) beginning to emerge from decades of civil war. But these two countries are much more alike than different. If you believe the tale told by Acemoglu and Robinson, they could have been comparing Japan and Burma, and not two nations with similar history, GDP, and institutions. While Colombia has seen many horrors and has a long road to travel, recent progress in reigning in lawlessness and chaos is undeniable. While Brazil has seen amazing institutional progress in the last fez decades, many of its cities suffer with murder rates higher than those of Colombian cities, de facto slave labor can be still found in some areas, and its income and especially property distributions are still among the most unequal in Latin America. Especially jarring is that, in other parts of the book, the authors place great emphasis on when institutions limit executive power, giving as an example the American system's unwillingness to allow FDR to pack the Supreme Court to get his way. The same happened in Colombia when Alvaro Uribe passed legislation allowing him to run for a third term and the Supreme Court shot it down with the broad support of Colombian society, including Uribe's allies.

The same can be said of their analysis of Mexico and Argentina: maybe not wrong, but terribly shallow. I know little of the Glorious Revolution, the Roman Empire, the Meiji Restoration, the history of Botswana, or much else of what the book is based upon. But if the standard is the same as the their Latin American examples, then much of the book based upon is poor history. In defense of the authors, it is difficult to draw the details with finesse when painting with a broad brush and the history of humanity from the neolithic to present day is about as broad as you can get in the social sciences.

A final criticism is that Acemoglu and Robinson do not give competing explanations for the backwardness of nations the credit they deserve. They explain away rather than seek dialogue. They classify competing explanations into the Geography Hypothesis, the Culture Hypothesis, and the Ignorance Hypothesis. One problem is that they ignore other competing explanations that go from scientific knowledge (see Margaret Jacob's Scientific Culture and the Making of the Industrial West) to various Marxist explanations based upon capital accumulation. While Acemoglu and Robinson obviously admire Jared Diamond's Guns, Germs, and Steel - which is very well-argued "geography is destiny" book - they ignore other important proponents of the Geography Hypothesis such as Kenneth Pommeranz. I feel their case would be made stronger if they argued that the two approaches were complementary and not adversarial. A relation between geography, technology, political institutions, and economic institutions would be a much stronger theory than institutions alone.

With regards to the Culture Hypothesis, they are (I believe) correct in criticizing it for being so fluid as to be virtually without content. But here my take is not entirely neutral as I particularly loathe the Culture Hypothesis.

But it is on the Ignorance Hypothesis that Acemoglu and Robinson fire their cannon with relish. Being intelligent economists in contact with the intellectual world of "development" I am sure they are very frustrated at the arrogance of policy advisors from the likes of the World Bank, United Nations, or IMF who believe they have the solution to all the developing world's problems "if only policymakers would listen to them." I am not unsympathetic to their disgust at these people but I think Acemoglu and Robinson throw the baby away with the dirty bath water. History is just too full of examples of disastrous policies (disastrous for those who implemented them, not only for the poor souls who inhabit their countries) for the Ignorance Hypothesis to be dismissed out of hand. The authors blame almost all, if not all, bad policies on the material interests of the elite whose position would be endangered by good policy.

A more subtle, and, in my opinion, much more serious, problem is that knowledge and interests are not independent. It is one thing for the elite to choose bad (bad for the many) policy if that policy can be dressed up in plausible and attractive intellectual robes and quite another if that policy is seen as nothing more than plundering of the many by the few (see Antonio Gramsci on role of the intellectual in allowing policy agendas to go forward or not). The "economic nationalism" that has destroyed so many African, Latin American, and Middle Eastern economies is not just pure extraction of wealth of the many by the few; it also dressed in a coherent economic theory espoused by a host of intelligent sociologists and economists (for a popular, if somewhat limited exposition, see The Open Veins of Latin America by Eduardo Galeano). This is why dismissal of the Ignorance Hypothesis is so dangerous: not only is knowledge power, but economic theories that are on your side are also power.

So the book has quite a few shortcomings. Why did I like it so much?

Because as economists we are taught from course one that you cannot have your cake and eat it too. The trade-off between efficiency and equity has been fed to us since before we were weaned. The result to an economist very interested in equality such as myself are intellectual shackles that hobble and cripple our thinking.

Acemoglu and Robinson show us that in the real world, not some paretian maximum efficiency world, but the real one full of monopolies and other horrendous extractive institutions, there is no such trade-off. Equity is efficiency. Only egalitarian institutions allow for the full creative potential of people to be unleashed and thus only egalitarian institutions allow for boundless, unlimited growth based upon technology and productivity. There may be an equity-efficiency trade-off in Sweden or Norway, but certainly not in Mexico, Brazil, Haiti, Zimbabwe, or Pakistan. Much of this has been around in different guises since Schumpeter (who the authors cite extensively) and, more recently, in the endogenous growth literature, but nowhere has it been as clearly stated as in Why Nations Fail.

Why Nations Fail not only states this as its official position but, in spite of all its shortcomings, argues the point so well so as to be entirely convincing (at least to me). The fact that the authors get much of the history not quite right and that they fight rather than incorporate "competing" explanations does not reduce importance of the book and its central message. The sheer optimism of its viewpoint is as liberating as the Emancipation Proclamation.
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