O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

1346) Sobre colegas, livros e leituras...

Uma crônica dos costumes correntes
Paulo Roberto de Almeida
Via Política (Porto Alegre, 9 dez. 2006).

Como sabem todos os que me conhecem pessoalmente, ou que pelo menos acompanham os meus escritos – e eles são muitos, exageradamente numerosos, confesso –, eu mantenho uma dupla atividade, duas carreiras, quase, que não necessariamente se confundem (mas que podem se completar ou, por vezes, se “atrapalhar” mutuamente): sou diplomata, no plano profissional, e, ao lado disso, exerço lides acadêmicas, em caráter complementar e acessório. Em ambas atividades, tenho por hábito sintetizar minhas leituras, fazer pesquisas, buscar informações, refletir sobre o que leio ou assisto em encontros e reuniões de que participo e, depois, na labuta solitária das noites de computador, tento colocar meus resumos, resenhas, notas e elaborações no papel (ou melhor, em arquivos eletrônicos, como costuma ser mais freqüente hoje em dia).
Dessa múltipla atividade de leitor, observador, sintetizador e escrevinhador resultam, como seria de se esperar, artigos, notas, resenhas de livros, ensaios mais ou menos alentados e, de vez em quando, algum livro destinado ao público universitário. Entendo que essa produção possa ser útil a todos aqueles que estudam ou trabalham os mesmos temas que eu, ainda que seja para que alguns possam oferecer contestação e interpretações divergentes sobre esses temas. Eles costumam ser os de economia internacional e brasileira, desenvolvimento econômico comparado, problemas de integração, relações internacionais, em especial na vertente econômica, história e atualidade diplomática, com maior ênfase na política externa brasileira, e outros campos afins.
Prezo muito o debate intelectual, o confronto de idéias, o exame sério e responsável de argumentos bem informados e embasados empiricamente em todos esses campos citados, com vistas ao enriquecimento de minhas próprias reflexões, ao esclarecimento daqueles mais jovens, à busca, enfim, das melhores soluções possíveis aos problemas de desenvolvimento do Brasil e de outros países em condições similares (que não são, obviamente, as do melhor desenvolvimento humano possível). Entendo que o debate de idéias contribui para a elevação dos argumentos e para a maior racionalidade dessas soluções, inclusive como forma de enfocar questões objetivas vinculadas às dificuldades de desenvolvimento da maior parte dos países de baixo IDH. Não é preciso dizer que lamento muito que no Brasil se pratique tão pouco, e por vezes de forma tão canhestra, o debate de idéias, se é que ele existe, de verdade.

Pois bem, a propósito do quê, exatamente, estou escrevendo estas notas, um pouco egocêntricas, é verdade, em torno destas minhas características de leitor e de escrevinhador?
Confesso que me senti motivado a fazer estas novas reflexões em vista dos comentários indiretos de um colega – que não revelarei agora se ele, ou ela, é da carreira diplomática ou da academia – que pretendeu fazer troça comigo nesta semana que se passou (4 a 8 de dezembro de 2006). Sem se referir ao meu nome, mas deixando claro sobre quem falava de modo irônico, este distinto colega mencionou que havia “um colega que escreveu muitos livros, que eu não li nenhum”. Não estava presente à cena – e creio que ele não teria feito esse tipo de comentário desairoso em minha presença, mas é possível que sim – e não sei descrever o que se passou em seguida, mas imagino que todos riram, alguns zombeteiramente, outros com sorriso amarelo, para satisfação e deleite do autor da frase, que pretendia, obviamente, ser ferino.
O que poderia ser dito de tal comentário? Em primeiro lugar, que de modo algum ele me diminui. Creio mesmo que o mesmo tipo de sentimento deva ser partilhado por todos aqueles que o ouviram, pois eu não entenderia pessoas normais cultivando o dom da ignorância, ou do desconhecimento voluntário e deliberado. Trata-se, sem dúvida alguma, de uma típica frase de um despeitado, dessas que pertencem à família do “não li e não gostei”. Ela tem a intenção de demonstrar que o seu autor não atribui nenhuma importância aos escritos de um colega, mas que ele não é néscio ao ponto de ignorar os seus, os meus, escritos (pois do contrário nem saberia que esse colega é autor de “muitos livros”).
Não sendo néscio, o autor da frase apenas quer declarar, de público, que é um oponente ideológico – no sentido de detentor de outras idéias – dos argumentos do autor desses “muitos livros”. Algo como: “não li nenhum porque não concordo com as idéias do autor”. É seu direito, claro, mas ele seria mais claro se dissesse em que, e por que, não concorda com essas idéias, sob risco de ficar realmente aparentado ao grupo daqueles que não lêem, mas que não gostam do que não leram. Contraditório, não é mesmo? Patético, aliás.
Em segundo lugar, pode-se dizer que o colega em questão pratica a singular e bizarra arte da ignorância, e não se peja de o declarar de maneira aberta e zombeteira. Surpreende-me, assim, que essa arte encontre adeptos entre membros desta nobre profissão, qualquer que seja ela. O que se deveria presumir é que pessoas engajadas nesse tipo de atividade – acadêmica ou diplomática, pouco importa – cultivem o hábito da leitura e da reflexão pausada, antes de emitir qualquer conceito que possa revelar, não conhecimento, mas de fato ignorância, e o que é pior, deliberada, declarada e voluntária. Patético, mais uma vez, não é mesmo?
Não creio que o colega em questão – da academia ou da diplomacia, não importa aqui – pratique normalmente esse culto à ignorância, tal como demonstrado de maneira pública. Ao contrário. Ele deve ser daqueles que lêem regularmente, jornais, revistas e até mesmo livros, mas que selecionam cuidadosamente aquilo que lêem. No seu rol de leituras só devem entrar aqueles materiais que presumivelmente estejam em pleno acordo com suas próprias idéias. Ou se não for assim, ele pode até, de forma condescendente, se dignar a ler os escritos de algum oponente ideológico para depois castigá-lo de forma apropriada, através de escritos outros ou declarações públicas que tenham algum embasamento melhor do que o argumento do “não li e não gostei”.
Não me consta, porém, que o colega em questão seja um autor muito prolífico. Da sua produção própria descobri pouca coisa. Seu nome não figura no Google Scholar, que parece ser o padrão da produção acadêmica “citável” (apenas a título de comparação, sob o meu nome, por exemplo, existiam mais de uma centena de entradas em 9.12.2006, mas eu não pretendo humilhar esse meu colega com esse tipo de comparação descabida). No Google normal, aparecem muitas entradas sob o seu nome, mas elas se referem, no mais da vezes, a notícias de imprensa ou a citações indiretas, a propósito de atividades profissionais. Da sua bibliografia própria, conheço uma tese publicada e dois ou três artigos em revistas da área. Pas mal, diriam alguns. Mas, parece que alguns desses artigos foram feitos em colaboração com outros colegas, alguns subordinados, e fica difícil separar agora o que realmente é de Cesar. Mais passons.
Entendo que o colega em questão seja uma pessoa bastante ocupada e que ele certamente teria publicado mais, se suas muitas atividades de caráter profissional não o tivessem impedido. Isso não constitui motivo, porém, para fazer comentários que se pretendem jocosos em relação a um colega, eu, que de resto nunca o confrontou, direta ou indiretamente, por escritos ou palavras, e talvez nem tivesse por que fazê-lo, em vista da pouca visibilidade – com minhas desculpas sinceras – de seus próprios escritos. Na verdade, entendo que provavelmente ele leu, sim, alguns dos meus escritos, e não gostou do que leu. Se não leu algum livro meu – no que acredito que ele é absolutamente sincero –, ele deve, pelo menos, ter lido alguma entrevista minha, sobre algum problema qualquer de relações internacionais, e não deve ter gostado nada do que leu.
Concedo-lhe o direito de se considerar meu opositor ideológico e, se ele aceitasse, eu até o convidaria para um entrevero de plumas, uma espécie de combate de idéias, sobre os temas que ele julga estarem em contradição com o que ele mesmo pensa. Aliás, isso é tudo o que peço dos que não concordam com as minhas idéias: que eles exponham claramente os seus argumentos e que possamos, na saudável exposição e confrontação de idéias, conceitos, fatos e opiniões, chegar a alguma posição comum que possa contribuir para a solução dos muitos problemas que devem preocupar a ambos, como brasileiros que somos e engajados na melhoria intelectual e material de nosso país e dos seus cidadãos desfavorecidos.
Não creio, contudo, que ele venha a fazer isto. Uma pessoa com tal postura moral – isto é, que se permite fazer troça contra um suposto “inimigo intelectual”, ausente do local, aliás – não costuma normalmente se expor ao debate de idéias. Um colega de tal estatura moral costuma fazer isso mesmo que ele fez: fazer troça dos que lhe parecem arrogantes, vaidosos ou exagerados (sim, pois o fato de escrever “muitos livros” deve constituir algum defeito de caráter, que não consigo perceber exatamente qual seja). Ao ostentar essa opinião de maneira aberta, o colega em questão pretende, de fato, diminuir o colega que sou eu, que mesmo tendo escrito “muitos livros” não merece que eles sejam lidos, sobretudo por ele mesmo. É seu direito, certamente.
Lamento, não por mim, mas pelo mau exemplo dado aos colegas mais jovens, que espero não sintam obrigados a seguir esse meu colega em seu culto à ignorância.
Não sei por que, mas me veio agora à mente aquela famosa frase de um general fascista, franquista mais bem dito, Millan Astray, que respondeu assim a um famoso intelectual espanhol, Miguel de Unamuno, que tentava defender a Universidade de Salamanca das agruras da guerra civil: “Viva la muerte. Abajo la inteligencia.” Não quero exagerar, mas creio que a frase ferina do meu colega pertence a um ramo distante da mesma família. Esperemos que ela não se dissemine em seu meio.


PS.: Como estou colocando esta nota em um dos meus blogs, convido este meu colega, se ele desejar, é claro, a se pronunciar a respeito – em caráter anônimo, obviamente – na seção de comentários que está democraticamente à disposição de amigos e inimigos de minha produção intelectual. Não precisa sequer fazer comentários muito elaborados ou argumentos específicos. Pode xingar à vontade. Eu entenderei...

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 9 de dezembro de 2006

1345) Uma reflexão pessoal sobre as relações entre Estado e governo...

...que também pode ser lida como uma declaração de princípios...
Paulo Roberto de Almeida
Publicado em Via Política (3.12.2006)

As relações entre funcionários de carreira do Estado e os governos em vigor são sempre delicadas, uma vez que governos costumam solicitar adesões imediatas, em geral incondicionais, ao passo que Estados são entidades impessoais, aparentemente desprovidas de vontade própria, ainda que pautando-se por normas constitucionais mais ou menos permanentes. Os governos passam, o Estado fica, mas ele pode ser transformado pelo governo em vigor, se este último imprime uma ação de transformação estrutural das condições existentes ao início de seu mandato.
Funcionários de Estado devem ater-se, antes de mais nada, às normas constitucionais, tendo como diretrizes adicionais as leis gerais e os estatutos particulares que regem sua categoria ou profissão. Geralmente, mas nem sempre, os governos respeitam os estatutos próprios e os princípios que devem enquadrar as diferentes categorias de servidores do Estado, estabelecendo determinações que incidem mais sobre a conjuntura do que sobre a estrutura. Em alguns casos, governos pretendem não apenas transformar estruturalmente o Estado e a sociedade, mas também os regulamentos e as formas de atuação do Estado.
Desde que respaldado nas normas constitucionais em vigor e na vontade legítima da sociedade, tal como expressa pela via democrática das eleições, essa vontade transformista pode concorrer para a melhoria das condições de bem-estar da sociedade, pois se supõe que o governo encarna aquilo que em linguagem rousseauniana se chamaria “vontade geral”. A “vontade geral” é, contudo, algo tão difícil de ser definido quanto o chamado “interesse nacional”, suscetível de receber diferentes interpretações, tantas são as correntes políticas, os grupos sociais, os partidos em disputa pelo poder e outras configurações sociais que gravitam em torno do poder. Sim, antes de qualquer outra coisa, “vontade geral” e “interesse nacional” são basicamente definidos por quem detém o poder, não necessariamente em conclaves abertos ao conjunto da sociedade.
O moderno Estado democrático deveria ostentar um sistema de freios e contrapesos que impeça – ou pelo menos dificulte – sua manipulação por minorias partidárias que pretendem agir com base em “interesses peculiares” ou com base na “vontade particular” do grupo que ocasionalmente ocupa o governo. Tais são os papéis respectivos do parlamento e dos tribunais constitucionais, segundo o velho sistema do “equilíbrio de poderes”, ou segundo o moderno sistema – de inspiração anglo-saxã – dos checks and balances, que transformam toda vontade de alteração institucional um delicado jogo de pressões e contra-pressões. Há que se atentar, também, para a necessária continuidade da ação do Estado, que poderia ficar comprometida caso a ação de um grupo detendo o poder temporariamente – isto é, exercendo o governo de forma legítima – busque alterar radicalmente políticas e orientações estabelecidas através de consensos anteriormente alcançados.
Pode-se dizer que as democracias modernas funcionam quase sempre segundo essa visão gradualista, qual seja, a de uma custosa negociação entre os grupos políticos representados no parlamento, seguida de uma lenta implementação das decisões alcançadas. A construção de consensos é tipica dos regimes parlamentaristas, baseados numa maioria mais ampla do corpo político e social, mas é menos típica nos regimes puramente presidencialistas, onde tendem a se desenvolver comportamentos cesaristas ou bonapartistas (isto é, com um apelo direto às massas). Neste caso, o carisma do líder político pode resultar num canal de comunicação direta deste com os eleitores, por cima e acima dos demais poderes, que encontram dificuldades para participar do processo decisório em bases rotineiras.
Tal tipo de situação também pode colocar desafios não convencionais aos funcionários de Estado, que podem ser chamados a implementar decisões que resultem, não de um processo gradual de consensus building, mas de uma decisão solitária do líder cesarista. Velhas normas e antigas tradições podem ser contestadas ou postas à prova nesse novo roteiro, o que coloca esses funcionários ante o dilema de aderir simplesmente à vontade do governo ou buscar respaldo nas formas mais convencionais de atuação do Estado.
Não há uma resposta simples a esse dilema, pois ele implica em que o funcionário possa aferir se o processo decisório que conduziu a uma determinada tomada de decisão política está seguindo os canais institucionais consagrados ou se os novos procedimentos estão atropelando as normas e procedimentos do Estado. Em geral, a resposta é dada pela linha de menor resistência, que passa pela afirmação dos conhecidos princípios da hierarquia e da disciplina. Do funcionário de Estado se pede obediência aos ditames do governo, não necessariamente uma reflexão pessoal sobre os fundamentos da ação do governo. Esta última atitude é própria dos agentes políticos, não dos funcionários de carreira, aos se requer obediência e aquiescências às ordens e determinações superiores. A rigor, do funcionário não se pede reflexão, mas acatamento de decisão já tomada.
Quando o próprio funcionário é convertido em agente político, pode surgir algum conflito de consciência entre a antiga forma de procedimento coletivo – as burocracias estatais são sempre construções coletivas – e as novas condições de trabalho, que impõem adesão incontida e total ao poder do qual emana o seu novo cargo. Dele se espera, então, equilíbrio e ponderação na forma de conduzir sua ação.
Em que condições, nessas circunstâncias, pode o funcionário de Estado continuar a exibir independência de pensamento – e uma certa faculdade na propositura de novos cursos de ação – quando a autoridade legítima requer adesão pura e simples a decisões emanadas de uma fonte cesarista de poder? Não há respostas teóricas a esta questão, que exige uma reflexão de ordem essencialmente prática, em função das relações sociais, modos de atuação e poder de barganha respectivos dos agentes de Estado e de governo envolvidos num determinado processo decisório.
Minha própria ordem de prioridades tenderia a colocar esse processo decisório numa escala de preferências que vem da Nação, passa pelo Estado e desemboca no governo, mas tendo também a reconhecer que os dois primeiros conceitos – assim como os de “vontade geral” e de “interesse nacional” – são suficientemente vagos e arbitrários para abrigar todo tipo de postura em face de determinações governamentais. Em última instância tende a prevalecer o bom senso e uma certa capacidade de avaliação racional dos custos de oportunidade envolvidos em cada uma das decisões governamentais com que o funcionário de Estado possa ser confrontado.
Quero crer que a construção de um Estado “racional-legal” e a consolidação de uma democracia efetiva no Brasil já avançaram o suficiente como para permitir que funcionários de Estado como o que aqui escreve possa contribuir, de forma mais ou menos institucionalizada, para a tomada de decisões em sua esfera de atuação, independentemente de posturas mais ou menos marcadas pela vontade momentânea de alguma autoridade governamental. Ou estarei enganado?

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 2 de dezembro de 2006

1344) Algumas verdades muito simples (mas que nunca é demais relembrar...)

Acredito...
Em algumas verdades simples, muito simples:


Que a palavra do homem é uma só,
que todos têm o dever social e individual da verdade, que ela é única e imutável.
que devemos, sim, assumir, nossas responsabilidades pelos cargos que ocupamos,
que não podemos descarregar sobre outros o peso dessas responsabilidades,
que devemos sempre procurar saber o que acontece, em nossa casa ou trabalho,
que não devemos jactar-nos indevidamente por grandes ou pequenas realizações,
que sempre nos beneficiamos do legado dos antepassados, sobretudo em conhecimento,
que nenhuma obra social possui paternidade única e exclusiva, sendo mais bem coletiva,
que a tentativa de excluir antecessores ou auxiliares é antipática e contraproducente,
que devemos zelar pelo dinheiro público,
que temos o dever de pensar nas próximas gerações, não na situação imediata,
que vaidade é uma coisa muito feia, além de ridícula,
que sensação de poder pode perturbar a capacidade de raciocínio,
que poder concentrado desequilibra o processo decisório,
que ouvir apenas elogios embota o senso da realidade,
que o convívio exclusivo com áulicos perturba a faculdade de julgamento,
que, enfim, não comandamos ao julgamento da história.

Eu também aprendi, que os resultados são sempre mais importantes do que as intenções, mas que os fins não justificam os meios...

Acredito, para terminar, que coisas simples assim podem ser partilhadas com outros...

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 25 de setembro de 2006

1343) Implementando a revolução marxista do Manifesto

Implementando a revolução marxista do Manifesto
(uma lista atualizada de medidas)
Paulo Roberto de Almeida

Os leitores (assim como os militantes de esquerda) medianamente familiarizados com o Manifesto do Partido Comunista, o profético panfleto escrito em colaboração por Karl Marx e Friedrich Engels em fevereiro de 1848 para glorificar o “modo burguês de produção” e antecipar sua futura substituição pelo modo socialista de produção, sabem que na sua seção sobre “proletários e comunistas” há um conjunto de medidas, exatamente dez, que deveriam ser implementadas para a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e cidadãos em geral.
Essa lista de medidas, à distância de mais de 160 anos, tem um certo sabor “gótico”, como seria inevitável, mas o problema é que a maior parte da esquerda, pelo menos a brasileira, continua aderindo ao seu espírito centralizador, estatizante, enfim, socialista. Pois bem, em “manifesto alternativo” que eu redigi por ocasião dos 150 anos daquele Manifesto, eu propunha uma atualização das medidas, para torná-las compatíveis não apenas com nossos tempos de globalização, como também com as necessidades de uma esquerda moderna, ágil, pronta a enfrentar os problemas reais do mundo contemporâneo, sem vê-la praticando os mesmos mecanismos litúrgicos de um velho culto que quase já não é mais praticado em lugar algum. Essa atualização do velho Manifesto de Marx e Engels foi feita em um ensaio por mim preparado para o número especial de uma revista brasileira de ciência política e republicado, com alguns ajustes em meu livro Velhos e Novos Manifestos: o socialismo na era da globalização (São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999; link: http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/29Manifestos1999.html).
Como eu escrevia em “meu” manifesto de 1998, a próxima revolução socialista deverá ser a mais radical ruptura com a velha cultura comunista conhecida até aqui. Não é de surpreender que esse desenvolvimento leve a uma ruptura com as concepções mesmas defendidas pela velha esquerda, com seu cortejo de slogans ultrapassados e preconceitos ideológicos. O novo socialismo não mais vai usar sua eventual supremacia política, conquistada democraticamente nas urnas, para centralizar todos os meios de produção nas mãos do Estado, como pretendiam algo ingenuamente Marx e Engels. Isto seria uma grande irracionalidade política, como já tinham descoberto alguns socialistas “revisionistas” desde o começo do século XX. Não é dessa maneira que se logrará incrementar o conjunto das forças produtivas tão rapidamente quanto possível.
A revolução completa nas relações de produção resultará da plena capacitação individual dos trabalhadores, de sua educação refinada e preparação adequada para enfrentar os desafios de um mercado mundial capitalista, hoje dominado pela burguesia, mas que não tem porque permanecer sob o seu jugo monopólico. Para retirar à burguesia esse poder incomensurável, os trabalhadores devem realizar, eles também, seu processo de “acumulação primitiva”, a começar pelo mais comezinho dos direitos humanos, a educação de base, pública, universal e gratuita.
As medidas a serem adotadas em prol do estabelecimento das novas relações de produção serão evidentemente diferentes em cada país. Entretanto, as seguintes medidas seriam geralmente aplicáveis num país da periferia ainda insuficientemente desenvolvido do ponto de vista capitalista como o Brasil:

Dois manifestos em busca de um mundo melhor
Manifesto do Partido Comunista, 1848:
1. Expropriação da propriedade fundiária e emprego das rendas fundiárias para despesas do Estado.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
1. Abolição do “monopólio” da terra, como desejado no Manifesto de 1848; essa abolição seria feita progressiva mas rapidamente, por meio de pesada imposição fiscal; esse imposto da terra já estava aliás previsto na “Lei de Terras” votada quase 150 anos atrás no Brasil, mas os latifundiários que então dominavam o parlamento não deixaram passar o princípio do imposto territorial rural. Essa medida, do mais comezinho significado econômico e tributário, teve de ser implementada, já no final do século XX, por um governo dito social-democrata, notoriamente inspirado nos sãos princípios liberais da atividade econômica. Um programa amplo de “reforma agrária”, num país fundamentalmente urbano como o Brasil de hoje, não tem obviamente o mesmo impacto econômico que teria tido se tivesse sido realizado décadas atrás, mas ele tem um profundo significado social em regiões onde a terra se encontra concentrada nas mãos de uns poucos latifundiários “feudais”. O que se deve buscar é a disseminação da propriedade rural produtiva, ao lado do minifúndio organizado em cooperativas e do agribusiness totalmente capitalista.

Manifesto do Partido Comunista, 1848:
2. Pesado imposto progressivo.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
2. Além de um imposto sobre a renda, de caráter altamente progressivo e graduado, como desejado por Marx há 150 anos, estabelecer uma reforma tributária de escopo racional e de aplicação insonegável. De modo geral, as atividades produtivas deveriam ser desoneradas, em favor de um imposto universal sobre o consumo final (com dedução correspondente das etapas anteriores e das exportações), introduzindo-se para corrigir a eventual injustiça da imposição indireta um sistema de alocações diretas e indiretas para as camadas de menor renda. Um imposto sobre transações financeiras poderia eventualmente se substituir à maior parte dos demais, eliminando-se aliás os problemas de uma imensa máquina arrecadadora, mas ele deveria estar na base de um federalismo fiscal rigoroso e dotado de mecanismos de correção de desigualdades inerentes à capacidade fiscal diferenciada dos estados e municípios. O direito de herança, assim como a fortuna, seriam moderadamente taxados, apenas para fins de “justiça social”, pois que o retorno fiscal desse tipo de imposição é inversamente proporcional ao esforço da máquina arrecadadora. Determinados bens — álcool, tabaco — também poderiam ser taxados pesadamente, para fins de contenção do consumo e financiamento de programas destinados a combater seus efeitos nefastos. As loterias e concursos seriam todos revertidos a finalidades sociais.

Manifesto do Partido Comunista, 1848:
3. Abolição do direito de herança.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
3. Revisão do conjunto de dispositivos regulatórios do trabalho, no sentido de adequar sua oferta e demanda à flexibilidade e adaptabilidade de mercados típica de uma economia globalizada e de liberá-lo da camisa de força de uma legislação característica do regime das guildas medievais. O trabalho não vai conseguir contrapor-se à preeminência do capital pela introdução de limites, condicionalidades ou restrições à sua utilização, mas sim pelo aumento contínuo de sua qualificação intrínseca. O desemprego, aliás, não resulta da falta de proteção contra a “prepotência” do capital ou do aumento da concorrência estrangeira que sustenta preços de “dumping” com base em trabalho aviltado e mal pago, mas de causas propriamente internas, geralmente vinculadas à rigidez das economias e de sua incapacidade de adaptação às mudanças tecnológicas em curso.

Manifesto do Partido Comunista, 1848:
4. Confiscação da propriedade de todos os emigrados e rebeldes.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
4. Política deliberada de acolhimento de imigrantes, sobretudo por meio de mecanismos de atração de “cérebros”, abrindo-se as universidades e os laboratórios públicos a todos os pesquisadores estrangeiros que quisessem estabelecer-se no Brasil. Desmantelamento das exigências abusivas que se fazem à vinda de imigrantes individuais — aprovação prévia de contrato de trabalho ou 200 mil dólares de investimento direto — pois a maior parte da riqueza potencial que possa ser trazida pela mão-de-obra de outros países está no cérebro — como no caso de especialistas de software — e não em sistemas industriais pesados.

Manifesto do Partido Comunista, 1848:
5. Centralização do crédito nas mãos do Estado, através de um banco nacional com capital de Estado e monopólio exclusivo.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
5. Decentralização do crédito e privatização dos poucos bancos que ainda restam em mãos do Estado, com a preservação de um banco nacional para fins de desenvolvimento regional, de crédito educativo, de pesquisa científica e tecnológica e de financiamento de atividades de ponta, sem retorno imediato.

Manifesto do Partido Comunista, 1848:
6. Centralização de todo o sistema de transportes nas mãos do Estado.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
6. Decentralização e desmonopolização radicais de todos os meios de comunicação e de transporte, sobretudo naquelas áreas vinculadas à transmissão de dados e de imagens, base da nova civilização do saber e do conhecimento. Estabelecimento de completa abertura à concorrência nessas áreas, com a finalidade de baratear custos e democratizar o acesso.

Manifesto do Partido Comunista, 1848:
7. Multiplicação das fábricas nacionais, dos instrumentos de produção, desbravamento de terras e melhoramento dos terrenos agrícolas de acordo com um plano comunitário.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
7. Privatização de todas as atividades produtivas não vinculadas à ação precípua do Estado — saúde, educação, segurança, justiça — uma vez que as empresas estatais ou nacionalizadas no passado criaram quistos de privilégios corporativos e focos de ineficiência administrativa, quando não de corrupção direta, numa nação inspirada por princípios igualitários e animada pela justa e proporcionada retribuição pelos esforços dos funcionários do Estado, sem privilégios individuais ou de casta. Não haverá estabilidade de cargos, senão naquelas funções temporariamente vinculadas a um tipo de desempenho que se requer autônomo e independente das instâncias políticas e econômicas, em setores tidos como envolvendo uma responsabilidade coletiva (juízes, membros por mandato definido do Conselho Monetário ampliado, etc.).

Manifesto do Partido Comunista, 1848:
8. Obrigatoriedade do trabalho para todos, instituição de exércitos industriais, em especial para a agricultura.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
8. Igualdade de chances na intervenção do Estado nos serviços públicos de saúde e de educação básica e no sistema de seguridade social, com a unificação progressiva dos regimes existentes. Disseminação da aposentadoria complementar por sistemas de capitalização, poderoso indutor da poupança privada. Investimentos maciços no ensino básico e introdução de mecanismos de compensação no ensino médio e superior. Estabelecimento de serviço civil de utilidade pública para atuação nos setores carentes e marginalizados.

Manifesto do Partido Comunista, 1848:
9. Unificação da exploração da agricultura e da indústria, atuação com vista à eliminação gradual da oposição entre cidade e campo.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
9. Abertura irrestrita de todos os setores produtivos e de serviços ao regime de livre concorrência, inclusive com a participação do capital estrangeiro, sem nenhum tipo de reserva ou restrição que não seja justificada pela segurança nacional (estritamente definida), defesa do meio ambiente ou ordem pública.

Manifesto do Partido Comunista, 1848:
10. Educação pública e gratuita de todas as crianças. Eliminação do trabalho das crianças nas fábricas na sua forma atual. Integração da educação com a produção material etc.
Paulo Roberto de Almeida, 1998:
10. Educação livre, pública e gratuita para todas as crianças no sistema de ensino básico, com atribuição de sistemas de retribuição para os setores carentes, que deverão ser objeto de atenção especial, retirando-se as crianças do exercício de atividades econômicas até a adolescência. Padrões uniformes de ensino no nível médio, com intervenção pontual do Estado se necessário. O ensino superior se organizará com base em critérios de mercado, inclusive as universidades públicas, que definirão mecanismos equivalentes aos de mercado na aferição da qualidade do ensino, na avaliação das atividades acadêmicas e na retribuição daqueles engajados em setores de pesquisa e desenvolvimento. Sistema de bolsa-educação para o amplo acesso da universidade por parte de todos aqueles qualificados nos escalões inferiores de ensino.

Ainda parafraseando o jovem Marx, no lugar da velha sociedade burguesa, com seus antagonismos sociais e de classe, se construirá progressivamente uma associação de cidadãos, na qual o livre desenvolvimento de cada um será a condição para o livre desenvolvimento de todos.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 1256: 9 de maio de 2004
Revisto e republicado em 14.02.2010.

1342) Radioatividade persa: contaminacao diplomatica (subsidios)

Sobre o post 1338, abaixo, com o mesmo título, um leitor atento, e bem informado, remeteu-me, em comentário anônimo, a um site de um instituto especializado no estudo e follow-up dos proliferadores habituais (que aliás são muitos).
O Institute for Peace and International Security (link) segue as atividades nucleares de uma serie de Estados, nomeadamente os seguintes:

Countries
* Algeria
* India
* Iran
* Iraq
* Korean Peninsula
* Libya
* Myanmar
* Pakistan
* South Africa
* Syria
* Taiwan
* Yugoslavia

(PRA: A "península coreana" não é exatamente "um" país, mas dois, mais passons...)

Transcrevo o início e o final de um relatório sobre nosso aliado no Oriente Médio:

ISIS Reports
Iran’s Gas Centrifuge Program: Taking Stock
by David Albright and Christina Walrond
February 11, 2010

Table of Contents
1. Understanding Enrichment at Natanz
2. First Principles
3. More advanced centrifuges coming? A secret site?
4. Natanz and the P1 Centrifuge
5. Separative Capacity of Iran’s P1 Centrifuge
6. Building a Centrifuge Plant
7. LEU Production
8. Taking Stock, Analyzing FEP Performance
9. Reasons for Sub-Optimal Performance
10. Implications on the Fordow Enrichment Site
11. Findings and Conclusion
12. Figures and Tables
13. Appendix: LEU Production Data

1. Understanding Enrichment at Natanz
The Natanz Fuel Enrichment Plant (FEP) has now operated for over two years with several thousand IR-1 centrifuges. Iran has enough centrifuges to produce a significant quantity of weapon-grade uranium, if it decided to do so. Yet, it is far from being able to produce enough enriched uranium for a nuclear power reactor.
It is natural to ask how well the IR-1 centrifuges are operating and to chart their performance. But assessing what Iran has achieved at the FEP remains difficult because Iran reveals little centrifuge performance information to the International Atomic Energy Agency (IAEA), and the IAEA in turn reveals even less publicly in either its safeguards reports or during interviews. Complicating any assessment, the public information has often been ambiguous or subject to subsequent revision. Thus, the data contained in IAEA reports are not sufficient alone to answer many questions about Natanz’s progress.
For example, every three months in its safeguards reports, the IAEA reveals the number of IR-1 centrifuges operating with uranium hexafluoride (UF6) on a given day.The inspectors do not however verify whether that number of centrifuges is actually producing low enriched uranium (LEU), or whether they receive enough information from Iran to determine the average number of centrifuges enriching during any extended period. The absence of such information, which would incorporate data about breakdowns and maintenance, complicates any comparison of the FEP’s production of low enriched uranium to expected LEU output.
One useful measure of a plant’s enrichment output is to estimate the average enrichment output, or separative capacity, of an IR-1 centrifuge. But doing this requires knowing the number of centrifuges actually enriching, the very value that is unreliable. Similar problems confront other standard measures of enrichment performance. Nonetheless, a comparative analysis of the FEP’s performance is possible.

(...)

11. Findings and Conclusion

Iran is likely to concentrate on increasing its LEU output at Natanz, improving operation of its centrifuges, and building the Fordow enrichment plant. Now that Fordow is discovered, it could be planning or building another secret enrichment site.

Iran’s problems in its centrifuge program are greater than expected one year ago. How much this has slowed Iran’s ability to make weapon-grade uranium is difficult to determine. However, Iran has almost 9,000 centrifuges at Natanz and the ability to make many thousands more either at Natanz or elsewhere. Despite the problems demonstrated at the FEP, Iran is unlikely to face significant delays in making weapon-grade uranium at Natanz, if it decided to build nuclear weapons. Starting with natural uranium, Iran could likely still produce enough weapon-grade uranium for a nuclear weapon in a year; it could do so considerably faster if it started with its stock of already produced low enriched uranium. But in 2010 Iran may be limited in its ability to produce weapon-grade uranium outside of the Natanz site, either in a breakout mode using its existing stock of LEU or in a parallel effort in a secret site starting with natural uranium.

In the end, Iran can solve its centrifuge problems with time, either by improving the output of the P1 centrifuge or building more of them, or both. In the medium term, it can also deploy more advanced centrifuges. Given its announced plans to build ten more enrichment plants without notifying the IAEA about their location or status until six months before it introduces nuclear material, Iran’s capability to make weapon-grade uranium either in a secret parallel program or in a breakout is likely to grow with time.

Iran’s progress at the FEP bears special watching to determine if Iranian technicians can overcome the plant’s problems and operate the centrifuges better. Because of the importance of this issue to the international community, the IAEA should release more data about the FEP’s operation.

Iran is expected to continue seeking equipment, materials, and technology abroad for its centrifuge effort. Disrupting these efforts through increased vigilance on stopping illicit trade of dual-use materials and components can delay its centrifuge program and prevent the transfer of knowledge that could help Iran solve its problems in building and deploying not only the IR-1 centrifuge but more advanced ones as well.

One can also expect more efforts by western intelligence services to place defective equipment in Iran’s centrifuge program. Given that Iran acquires much of this equipment illegally, such efforts are hard to condemn. However, predicting the impact of such efforts is impossible.

The best way to constrain Iran’s enrichment program remains negotiations aimed at achieving a suspension of its program. Iran is unlikely to deploy enough gas centrifuges to make enriched uranium for commercial nuclear power reactors for a long time, if ever, particularly if sanctions remain in force. As such, one of the most striking lessons of reviewing Iran’s accomplishments at Natanz is just how unachievable a commercial enrichment program remains while how little is required to create a nuclear weapons capability. While Iran may take longer than expected to make sufficient weapon-grade uranium for a bomb, few believe it will fail in that effort.

Comentário final PRA:
O estudo tem uma série de tabelas com dados e gráficos para o público especializado. Para simples civis ignorantes em grande medida dos detalhes técnicos do programa nuclear iraniano, como este que aqui escreve, resta, porém, uma certeza: os dirigentes iranianos estão dispostos a seguir em frente.
Acredito, pessoalmente, que o mundo não ficará melhor com essa perspectiva...
Paulo Roberto de Almeida (14.02.2010)

1341) Sobre a responsabilidades dos intelectuais: comentário de um leitor

Recebi, a propósito do meu ensaio divulgado no post imediatamente anterior (ver abaixo), um longo comentário de um leitor, um estudante de ciências sociais do Rio de Janeiro, cujo nome omito por razões óbvias, mas que me parece refletir, inclusive na linguagem, os sentimentos de uma enorme parcela de nossa juventude universitária, tendo de suportar, atualmente, professores totalmente ineptos, despreparados e, adicionalmente (o que me parece mais grave), politicamente engajados num esforço doutrinário absolutamente irrelevante para a realidade em que vivem esses jovens. Esses professores, que se enquadram naquele comportamento que eu qualifiquei de desonestidade intelectual, continuam a oferecer aulas de pura embromação sociológica, ou de mistificação histórica, sem qualquer conexão com o mundo real.
Não creio que esse quadro seja "consertado" any time soon, ou seja, teremos de conviver com a empulhação acadêmica durante muito tempo mais...
Segue a mensagem (preservo totalmente a linguagem original, mesmo com os erros de Português e os pequenos equívocos de linguagem cometidos):

On 14/02/2010, at 01:42, R. M. wrote:

Boa Noite. Doutor Paulo Roberto de Almeida. Tudo bem com o senhor? Eu sou R., formando em Ciências Sociais da Uerj, e estou mandando-lhe este e-mail a fim de comentar o seu texto "sobre a responsabilidade dos intelectuais e se devemos cobrar-lhes os efeitos práticos de suas prescrições teóricas". Não tenho dúvida de que não devemos [sic], pois não só o Sociólogo alemão Ralf Dahrendorf, mas os próprios Sartre e Gramisci tinham em vista essa questão da responsabilidade do intelectual quanto a sociedade que fazem parte.
Eu devo relatar-lhe que nos meus anos na Uerj, vi de muito dos descalabros que foram descritos em seu ensaio. Eu estava refletindo com o meu irmão gêmeo que estuda História nessa mesma Universidade sobre as concepções que você encherga que são defendidas por determinados intelectuais dentro dos bancos das acadêmias que nós dois poderiamos julgar que no passado estavam presentes na sua realidade seja como professor ou estudante Universitário ou quem sabe nos circulos diplomáticos que o senhor esteve ao longo de sua carreira, mas, eu vejo que ela está presente na nossa realidade estudantil em fins da década de 2000 e principios da década de 10.
Quando eu entrei na Universidade em idos do ano de 2007, eu admito que entrei de forma ingenua pensando que a "solução" para as grandes questões de nossa sociedade estavam na Universidade e o curso de Ciências Sociais era o seu motor de combustão para essas mudanças, eu admito que me desiludi com o que vi no primeiro semestre e em muito me chateou a ponto de cogitar abandonar o curso.
No primeiro ano de curso nas aulas de Sociologia tive um semestre inteiro de Marx, estudamos as seguintes obras: "A Questão Judaica", "Crítica a Economica Política", "A Ideologia Alemã" e o "Manifesto Comunista" , vou ser honesto com o senhor que me senti desencontrado (e enojado), pois, o que estava sendo ensinado pela professora num tom de catequese (pois ela dedicou um semestre exclusivo para o estudo dessas obras) não correspondiam com a mesma perspectiva de vida e experiência pessoal de trabalhador assalariado que eu tinha de fora da Universidade e até mesmo porque, nas aulas de Ciência Política nesse mesmo semestre indo de encontro com os clássicos gregos como Platão e Aristóteles, se vê que as coisas sempre foram constituídas com base onde enquanto uns mandam, outros devem obedecer. Então, ficava a questão na minha cabeça: o que pensar? Será que estão me "enrolando" na acadêmia?
Então, com o passar desses dois anos (eu procurei antecipar a minha formatura e defender monografia em algo relacionado as Relações Internacionais e o Mercosul em particular, inclusive utilizando alguns textos seus, pois, não dava para pensar em compor nenhum projeto de monografia com Sociologos "Marquissistas" ou Antropologos "democratas raciais", pois a sintonia com os professores era muito diferente da minha vivência), a insistência principalmente em defender de forma tão incontestável essa concepção ideologica como projeto viável em pleno século XXI em termos sociais e até mesmo economico soava de um anacrônismo enorme para não dizer como você mesmo tinha colocado em seu ensaio "como pura desonestidade intelectual" por parte de acadêmico que não conseguem reconhecer o óbvio nas entrelinhas da História.
E o que isso tudo tem ligação com o seu ensaio? Que de fato a Universidade tem uma parcela de responsabilidade (e os seus acadêmicos) com os rumos que a sociedade vai de fato, pois, muitos desses professores pensam que estão numa "redoma de vidro" contra qualquer tipo de responsabilidade tanto com o teor dos artigos que escrevem quanto as aulas que ministram nas acadêmias e a defesa de idéias e teorias de forma dogmática que defendem com tanto afinco.

Então, Doutor Paulo Roberto de Almeida. Eu fico por aqui, não vou lhe escrever um testamento, pois, sei que o senhor é bastante ocupada.

Obrigado e desde já aguardo uma resposta do senhor quando lhe for possível responder.

==========
Meu caro R,
Muito grato por seu enorme comentario ao meu texto, que buscava apenas e tao somente tratar de um problema que eu ja detectei ha muito tempo, e que voce constatou agora por sua própria experiencia.
Sou reconhecido pela sua atencao em escrever-me e se voce me permitir vou partilhar seu texto com outros, sem revelar sua identidade, pois creio que nao convem personalizar o fato do seu lado.
O abraco do
-------------
Paulo Roberto de Almeida
(14.02.2010)

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Addendum:
Depois que eu postei o que vai acima, o mesmo comentarista, escreveu o que segue:

On 14/02/2010, at 17:53, R. M. wrote:

Prezado Doutor Paulo Roberto de Almeida, muito obrigado pela atenção quanto a essa questão citada em seu ensaio. É algo que estou sempre compartilhando e refletindo com os meus colegas de cursos que possuem alguma lucidez quanto a questão que se segue analisando de forma crítica esse modelo de Universidade que tem um papel muito mediocre partindo dos seus próprios acadêmicos e quanto àquilo que o senhor mesmo classificou como "desonestidade intelectual".

Gostaria de saber se o senhor têm propostas para a questão que está imersa a Universidade Brasileira nesse contexto com base na vivência que o senhor possui viajando para outros países e por ter estudado no exterior também? Eu tenho algumas idéias, mas, eu como simples graduando não me arriscaria a propor exceto no caso de uma conversa informal e troca de e-mails como essa que estamos tendo.
Pois, eu converso com algumas pessoas de algumas Universidades do exterior e as coisas não são desse jeito definitivamente partindo do principio da "desonestidade intelectual" como o senhor fez questão de expor.
Pois, é uma questão que possui uma grande influência nos rumos que o País dá (para o bem ou para o mal).
Aguardo respostas. Um abraço e mais uma vez muito obrigado.
---------

Prometi selecionar alguns trabalhos meus e enviar...
Paulo Roberto de Almeida (14.02.2010; 18h44)

sábado, 13 de fevereiro de 2010

1340) A responsabilidades dos intelectuais - P. R. Almeida

O mais recente trabalho publicado:

“Sobre a responsabilidade dos intelectuais: devemos cobrar-lhes os efeitos práticos de suas prescrições teóricas?”
Espaço Acadêmico (vol. 9, n. 105, fevereiro 2010, p. 149-159; ISSN: 1519-6186)
link: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/9275/5252

Transcrevo apenas o começo e o final desse trabalho:

O tema é bastante conhecido e eu começo imediatamente pelo enunciado do problema: deveriam os intelectuais ser responsabilizados por suas ideias, por seus livros e ensinamentos? Ou, dito mais precisamente: deveriam ser considerados responsáveis pela utilização que se faz ou que se fez de suas ideias e prescrições? Quem sabe até por suas omissões, conivências e silêncios?
(...)
Estes argumentos não se referem apenas à dimensão dos desastres econômicos e dos sofrimentos sociais infligidos a populações inteiras por uma ou duas gerações (e se supõe que isso seja por demais conhecido de todos, em vista das estantes vazias dos empórios socialistas). Deve-se mencionar, principalmente, os crimes cometidos contra os direitos humanos mais elementares, ou ainda aqueles situados no plano das misérias morais do socialismo: um regime de mentiras, de fraudes, de delações organizadas, de regimes policialescos e de mediocridades intelectuais como jamais ocorreu em muitas, talvez a maioria, das ditaduras ditas de direita por aqueles mesmos acadêmicos que pretendem ainda defender a causa do socialismo marxista.
Em relação a esses regimes, que por boa parte do século 20 se estenderam a territórios e populações imensas durante praticamente três gerações, pode-se parafrasear a conhecida frase marxiana do Dezoito Brumário: doravante, se espera apenas que a história jamais se repita, sequer como farsa.
Não é correto que a ignorância do processo histórico possa ser invocada em defesa dos que continuam a exibir equívocos monumentais do tipo aqui discutido; em todo caso, um procedimento básico se aplica aos que fazem da academia o centro de suas atividades: a honestidade intelectual é a primeira exigência de quem trabalha com o registro dos fatos históricos e sua interpretação no plano das ciências humanas. Espero apenas que esta não seja mais uma frase vazia...

Brasília, 19 janeiro 2010.
Revisto: 3.02.2010.

1339) A vida sob o comunismo (como devia ser insuportável...)


Estou lendo este livro:

The Rise and Fall of Communism
by Archie Brown
London: Bodley Head, 2009, 736pp, £25

Mais abaixo uma das muitas resenhas publicadas na imprensa inglesa. Li a introdução e o capítulo sobre o começo do comunismo (o que eu já conhecia).
Agora que o comunismo acabou, em larga medida, os jovens de hoje não tem uma ideia clara sobre o que representou o comunismo -- e o socialismo de maneira geral -- para as gerações precedentes. Mas ele sobrevive apenas em dois pequenos Estados: Cuba (irracionalmente apoiada por "inteliquituais" brasileiros) e Coréia do Norte. O caso da China é diferente: se trata de um país capitalista com um Estado comunista (deu para entender?; eu posso desenhar, ou explicar melhor...).

Estou lendo agora o capítulo 28, "Why Did Communism Last So long?".
Claro, no caso dos países da Europa central e oriental, foi por causa da ocupação soviética, do contrário as sociedades teriam rejeitado o sistema. Bem que tentaram, na DDR, em 1953, na Hungria, em 1956, na Tchecoslováquia, em 1968, mas os tanques soviéticos estavam ali para garantir a sobrevivência de regimes altamente impopulares.
No caso da própria URSS, foi pela eficiência repressora dos mecanismos de controle social do sistema, baseados no terror, nos tempos de Lênin e Stalin, e nos constrangimentos policialescos, na censura extensiva, e no uso da "repressão econômica", ou seja, deixar o dissidente sem trabalho e sem remuneração, o que simplesmente tornaria a sua vida impossível.

Refletindo sobre esse aspecto, isso também ocorre em certos países capitalistas, digamos assim. Por exemplo: deixar um funcionáario do Estado -- e no comunismo TODOS eram funcionários do Estado -- sem função específica e sem remuneração adequada durante muito tempo. Como sob o comunismo, isso atua como um forte desincentivo à contestação e à dissidência individual. Não sei se funciona sempre, mas deve funcionar para a maioria. No meu caso, não funcionou... (de que é exemplo este blog).
Acredito que quem pratica esse tipo de repressão econômica tem uma alma de ditador soviético. Aliás, tem muita gente por aí com alma de ditador soviético...
Paulo Roberto de Almeida (13.02.2010)
PS: leiam a introdução, as primeiras páginas, nesta versão eletrônica para Kindle, no site da Amazon, neste link.

The Rise and Fall of Communism by Archie Brown: review
Simon Heffer praises a book by Archie Brown that strips away the romance of communism
By Simon Heffer
Daily Telegraph, 30 May 2009

As an academic historian, Archie Brown has become possibly Britain’s leading expert on communism. Of an age to have travelled widely behind the Iron Curtain when the Cold War was still raging, he brings to his study of the subject not merely decades of immersion in archives and books, but also first-hand observation and experience. All these qualities inform this superb book, which in just over 700 pages gives not only the history of communism, but also the background to it and the reasons for its decline.

Although the doctrine still prevails in one enormously significant country – China – and in four smaller ones (North Korea, which is becoming a bigger problem by the day, Vietnam, Laos and Cuba), Brown’s work is largely in the nature of a retrospective. He traces the philosophical beginnings of the creed through to its implementation in what became the Soviet Union after the 1917 revolution: and it is the Soviet Union that is the bedrock of his book from then on. It is not simply, of course, that the USSR was first: it was that it had the manpower, the resources, the firepower and (until Gorbachev) the ruthlessness to impose its will and its system on its satraps and imitators.

The key figure in this was Stalin, whose doctrines (if not his methods of enforcing them) prevailed right up until the mid Eighties. During the Terror Stalin created a rule that was truly totalitarian, and which Brown distinguishes to an extent from communism. He is correct to do so, though he is equally correct to point out that communism, because of its anti-freedom ideology, can only be imposed with varying degrees of coercion. He says communist regimes imposed as a result of indigenous revolution turn out to be more durable than those enforced from outside. The history of what used to be called the Soviet bloc bears that out exactly.

Brown’s relatively concise but also precise exposition of Stalin’s regime is a masterpiece, laced with flashes of dark humour but never understating the sheer monstrousness of a man who goes down in history as a mass murderer on a scale that puts even Hitler in the shade. The brutality that he inflicted on those whom he conquered – such as the unfortunate Latvians, Lithuanians and Estonians – becomes more comprehensible when one reads of the arbitrary viciousness he used on people who were supposed to be his adherents, supporters and colleagues.

Although Nikita Khrushchev famously denounced Stalin and his crimes at the 1956 party congress, three years after the tyrant’s death, the ethos did not crack. The Hungarian uprising later that year was put down with typical brutality, for the Soviets then knew no other way. At home, dissidents were no longer shot in the back of the head for having a difference of opinion, and the Gulag became considerably less populated: but Khrushchev himself was happy, in defence of Russian hegemony, to push the world to the brink of war during the Cuban missile crisis in 1962.

When Leonid Brezhnev succeeded him in 1964 the tone became even more Stalinist: Brezhnev was conscious of having to protect what was effectively Stalin’s inheritance, and did not hesitate to do so. It may have been a time of stability for the USSR, but it also remained one of repression. Just as in Hungary 12 years earlier, Soviet troops put down an attempt by Czechoslovakia to reform after the Prague Spring. As late as 1981, a tame Polish leader, General Wojciech Jaruzelski, was prevailed on to squash dissidence in that country, contingent on the rise of the Solidarity movement. Communism could not be allowed to be diluted in the Soviet bloc, for it would challenge the Marxist-Leninist doctrines that underpinned the Soviet Union: so the old Stalinist methods of compliance by coercion were brought back whenever necessary.

Brown has crammed an amazing amount of information and analysis into a hugely readable book. He gives the most comprehensible breakdown of how Chinese communism developed, and how the apparent capitalist society the country now has is still, in fact, communist. But his greatest achievement is to strip away, without any partisanship, what some have held to be the romance of communism. He details how corrupt the regime was in Cuba before Castro overthrew it, and he talks of the wonders done in Cuba in the field of health care, in particular. But he equally leaves us in no doubt that Cuba remains a repressive and impoverished place thanks to communism. There are constant reminders of the basic liberties denied to those in communist countries in order to maintain the doctrine; and reminders too of how painfully aware so many of those people were of the freedoms and luxuries of the West.

If this book has any deficiency it is that I should have liked to read more about the systems of repression in places like the Baltic states, where museums exist to catalogue Soviet barbarism against the Baltic peoples. It is most amazing of all that this was so widespread just 20 years ago. Brown’s book is, above all, a monument to the triumph of liberty.

1338) Radioatividade persa: contaminacao diplomatica...

O ataque das formigas atômicas
Duda Teixeira
Revista Veja, edição 2152 - 17 de fevereiro de 2010

Passo a passo, o Irã caminha para onde sempre quis chegar: a fabricação da bomba atômica. Já avançou no material necessário, o enriquecimento de urânio a 20% em suas centrífugas. E pode fazer mais do que isso, jactou-se Ahmadinejads

BOMBA, BOMBA, BOMBA
Ahmadinejad aponta o caminho acelerado do desastre: "Somos uma potência nuclear"

Mentir, mentir sempre. E, nos arroubos de entusiasmo, abandonar momentaneamente o fingimento e deixar entrever as verdadeiras intenções. Assim tem se comportado o regime iraniano em relação ao programa nuclear que, ostensivamente, é para a produção de energia, mas em todos os aspectos práticos caminha para a fabricação de uma bomba atômica. As consequências para o mundo inteiro têm um potencial calamitoso. Israel, que por motivos óbvios considera a bomba iraniana uma ameaça vital, pode desfechar um ataque preventivo, de alcance arrepiante para o mundo todo, em especial nessa fase de sensibilíssima economia pós-crise. Ou o Irã continua fazendo mais do mesmo: enfrenta novas sanções, desafia os organismos internacionais e alcança, por fim, a bomba, o que lhe garante uma espécie de tenebrosa imunidade. Até lá, o regime dos aiatolás continuará fingindo que negocia, aceitando inspeção parcial da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e, na sua visão, talvez cruelmente correta, fazendo de bobos os países que propõem saídas honrosas como o processamento no exterior do urânio, o minério que move usinas ou produz bombas, dependendo do grau de manipulação (veja o quadro). Na semana passada, em clima de exaltação nacional, o Irã anunciou que começou a enriquecer urânio a 20% no complexo nuclear de Natanz. "O Irã já é uma potência nuclear", jactou-se o presidente Mahmoud Ahmadinejad diante das habituais massas de manobra. "Podemos enriquecer o urânio a 20% ou 80%, mas não chegamos a isso porque não precisamos."

Fora o tom de blefe que permeia os discursos de Ahmadinejad e a confusão de porcentagens – entre o enriquecimento a 20% e o processo a 90%, necessário para a bomba, existe um intervalo tecnológico de dois a três anos –, a chantagem fica mais do que explícita. É como se dissesse: se quisermos, poderemos fazer. E como querem. Em setembro do ano passado, fotos de satélite revelaram que o Irã construiu secretamente uma central nuclear subterrânea que poderia comportar 3 000 centrífugas para enriquecer urânio. O complexo, perto da cidade de Qom, segue o mesmo padrão de Natanz, onde as máquinas estão a 23 metros de profundidade, cobertas por um escudo de concreto. É um formigueiro atômico, no meio das montanhas, feito para resistir a ataques aéreos como os que, segundo as previsões mais sombrias, Israel inevitavelmente des-fechará. Existem bombas que alcançam os bunkers mais protegidos, mas o processo demanda bombardeios prolongados – e, mais complicado ainda, os aviões só atingiriam o Irã através do espaço aéreo de Líbano, Síria, Iraque, Arábia Saudita ou Turquia; em suma, uma infindável encrenca. O Irã afirma que vai produzir entre 3 e 5 quilos de urânio por mês para fins de pesquisa médica e geração de eletricidade. "Não há uso civil para tudo isso. O país tem apenas um reator funcionando adequadamente, o de Bushehr, que consome 10 quilos de urânio russo ao longo de um ano inteiro", disse a VEJA a especialista americana Jacqueline Shire, analista do Instituto para a Ciência e a Segurança Internacional, em Washington.

A possibilidade de que novas sanções funcionem é pouca, mas, diante da falta de opções, Estados Unidos e Europa prepararam um novo programa punitivo no âmbito do Conselho de Segurança da ONU. A Rússia insinuou que apoiaria. A China, não. O Brasil, atual integrante do Conselho como membro rotatório, deve seguir, vergonhosamente, os chineses. A diplomacia lulista tem se desdobrado em manifestações de apoio ao regime iraniano, movida pelos equívocos de sempre – antiamericanismo, discurso nacionalista (distorcido, claro, pois contraria os interesses fundamentais do Brasil) e uma relação carnal que ultrapassa amplamente o necessário para manter laços diplomáticos corretos com um país complicado. Um leão para defender, em vão, as mais terríveis punições à Honduras do interregno pós-zelaysta (encerrado pelo voto), o chanceler Celso Amorim virou um gatinho persa ante a proposta de sanções internacionalmente aceitas contra o Irã da bomba atômica clandestina. "Há sempre pedidos de medidas mais e mais severas", admoestou. "Não vemos realmente que seja o caso." E qual seria a opção? "Não adianta nada fazer uma proposta e ficar parado esperando que o outro lado faça exatamente aquilo que foi proposto." Ou seja, a culpa é de quem propõe saídas para o caso iraniano. Se paira alguma dúvida sobre os "culpados", esclareça-se: o presidente Barack Obama, que nobremente ofereceu a mão estendida ao Irã (e levou um tapa na cara), e os principais países europeus, que articularam a proposta do enriquecimento do urânio iraniano na França e na Rússia, como garantia de seu uso pacífico. Como o Irã quer é fazer a bomba, a oferta foi empurrada com a barriga, com o apoio explícito do chanceler Amorim. "Uma coisa é pagar mico em Honduras, que não traz grandes consequências", diz o embaixador Rubens Barbosa. "Outra coisa é, no caso do Irã, dar vexame perante o mundo." Em retribuição à gentil visita de Ahmadinejad no ano passado, o presidente Lula tem viagem marcada para Teerã em maio. Será uma apoteose. E depois, vem o quê? O apocalipse?

NA MESMA SINTONIA
Celso Amorim com Ahmadinejad em Teerã e ato de exaltação ao regime: um quer a bomba,
o outro quer ser amigo

1337) Global Warming?: not so fast, not so extensive...


IPCC: cherish it, tweak it or scrap it?

Nature, February 2010

Abstract As calls for reform intensify following recent furores about e-mails, conflicts of interest, glaciers and extreme weather, five climatologists propose ways forward for the Intergovernmental Panel on Climate Change. Their suggestions range from reaffirming the panel' governing principles to increasing the number and speed of its publications to replacing the volunteer organization with a permanently staffed structure.

Split into three panels Mike Hulme Coordinating lead author, lead author, review editor (AR3), University of East Anglia, Norwich, UK Much has changed since the late 1980s when the Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) was designed, notably the nature of scientific practice and its relationship with society. How the world's knowledge communities are mobilized to enlighten policy deliberations also needs to be different. The assessments published by the IPCC have firmly elevated anthropogenic climate change to one of the major international political issues of our time. But they have made this impact by drawing in an ever-widening subset of the social, technological, environmental and ethical dimensions of climate change - well beyond the physical sciences. The IPCC is no longer fit for purpose. It is not feasible for one panel under sole ownership - that of the world's governments, but operating under the delegated management of the United Nations Environment Programme (UNEP) and the World Meteorological Organization (WMO) - to deliver an exhaustive 'integrated' assessment of all relevant climate-change knowledge. As I remarked three years ago in these pages, "The IPCC needs a complete overhaul. The structure and process are past their sell-by dates." My suggestion for radical reform is to dissolve the IPCC after the Fifth Assessment Report (AR5) in 2014. The work would be split into three types of assessment and evaluation, each rather different to the three existing IPCC working groups. The first would be a Global Science Panel (GSP). An IPCC-like assessment process should continue to operate for the physical sciences that observe and predict the Earth system. Rather than comprehensive reports every six years, this panel would commission, on a rolling basis, a larger number of smaller, sharply focused syntheses of knowledge on fast-moving topics that have great scientific or policy salience. Perhaps two or three would be in production at any one time and each would be no more than 50 pages in length. These would need to be globally coordinated and could be governed either through an intergovernmental process as now, or devolved to a governing council of representative national academies of science. The second group would be made up of Regional Evaluation Panels (REPs). The cultural, social, economic and development dimensions of climate change are essentially regional in nature. Each region - five to ten continental or sub-continental regions in all - should conduct its own evaluation of relevant knowledge. This should use the work of the GSP, but also draw in a much more diverse set of expertise, knowledge and scholarship. As well as being structured according to the concerns of each region, the ownership and governance patterns of these REPs would vary regionally, but should ideally involve a consortium of national governments, civil-society organizations and businesses. The third group would be the Policy Analysis Panel (PAP) - a standing panel of expertise, global in reach, with interdisciplinary skills and a diverse analytical capacity. Perhaps 50-100 strong, this panel would undertake focused and rapid (6-12 months) analyses of specific proposed policy options and measures that have global significance. These could be subjects such as environmental effectiveness of controlling black carbon, economic implications of carbon border tariffs or new financing options for reducing emissions from deforestation. The policy options to be analysed can be brought forward by UN bodies, non-governmental organizations (NGOs), businesses and groupings of national governments. The PAP could be governed by a council of women and men of international stature and strong cultural significance to represent the breadth of civil society around the world. Such high quality and transparent policy evaluation would broaden the options available for national and international deliberations. This restructuring would allow clearer distinctions to be made in areas that have been troublesome for the IPCC: assessments of published knowledge versus policy analysis and evaluation; the globalized physical sciences versus more geographically and culturally nuanced knowledge; a one-size, top-down model of ownership and governance versus more inclusive, representative and regionally varying forms of governance. It would better serve the world, and its peoples, in understanding and responding to anthropogenic climate change.

Independent agency needed
Eduardo Zorita Contributing author (AR4), GKSS Research Center in Geesthacht, Germany

Like the financial sector last year, the IPCC is currently experiencing a failure of trust that reveals flaws in its structure. This presents the climate-change community with the opportunity to address these faults. The IPCC currently performs as a diffuse community of government-nominated academic volunteers occupying a blurred space between science and politics, issuing self-reviewed reports under great stresses and unmanageable deadlines. Its undefined structure puts it at the mercy of pressure from advocates. The IPCC should be made stronger and independent. We do not need to reinvent the wheel; there are excellent examples of agencies that society has set up when credibility is of the utmost importance. The European Central Bank, the International Atomic Energy Agency (IAEA), the International Energy Agency and the US Congressional Budget Office all independently navigate their way through strong political pressures, delivering valuable assessments, advice, reports and forecasts, tapping academic research when necessary. These agencies are accountable and respected. An international climate agency (ICA) along such lines would have a staff of around 200 full-time scientists who would be independent of government, industry and academia. Such an agency should be resourced and empowered to do the following: issue streamlined biennial state-of-the-climate reports; be a repository and quality-controller of observational climate data; advise governments on regional assessments of climate impacts; and coordinate the suite of future-climate simulations by research institutes. An ICA could be built, for instance, on the IAEA template, encompassing many more countries than the IAEA but with a smaller staff. ICA reports should be independently reviewed in a transparent process, draw only on established, peer-reviewed literature, and highlight research gaps. External reviews would then be incorporated into the reports to form white papers to include possible opposing views in a transparent way. The process of moving towards such an ICA could start now, alongside the preparation of the next IPCC assessment report, and culminate after its completion. Those climate researchers in the IPCC Bureau who have widely recognized credibility could initiate this transformation, supported by lead authors and review editors more numerous and with a bigger say than presently. These review editors should be elected not by governments but directly by scientific unions, for instance the American Geophysical Union, the European Geosciences Union and similar associations from Asia. As with finance, climate assessment is too important to be left in the hands of advocates.

Apply best practice rules Thomas F. Stocker Co-chair IPCC Working Group I (AR5), coordinating lead author (AR3, AR4), University of Bern, Switzerland

The basis of the IPCC is the voluntary contributions of thousands of dedicated scientists from all over the world. The Principles Governing IPCC Work (IPCC, 1998) provide a clear framework for an open, transparent and robust process. This bottom-up endeavour is a unique model of providing scientific information, mainly from the peer-reviewed scientific literature, for decision-making on a challenging problem. It has worked extremely successfully for the past 21 years. Recent controversies have demonstrated both the value and the limitations of these procedures. The team structure of the chapter authors, the multiple reviews by peers and governments, and the full and public documentation of this process largely eliminate personal views or biases in the science assessment. But procedures are only as strong as their enforcement at all levels of the assessment process. When I served as a coordinating lead author of Working Group I in the Third and Fourth Assessment Reports (AR3 and AR4), I was deeply impressed by the strict adherence to these principles by the co-chairs who ensured that these standards were applied at all levels. The combination of the best scientists and clear procedures constitute the authority of the IPCC. Calls for reform of the IPCC have been made before. Changes were discussed after the completion of the Fourth Assessment Report in 2007. One possibility mooted was the production of more frequent assessments, more limited in scope. Fast-track assessments in support of the United Nations Framework Convention on Climate Change process were also considered. However, the panel concluded that the production of comprehensive reports roughly every six years is preferable because it ensures the robustness required for a thorough and rigorous assessment. Faster turnover would jeopardize the multi-stage review and thus compromise authority and comprehensiveness. In asking scientists to produce reports and assessments every year, say, we could lose their support rather quickly. The IPCC has served as an honest broker in the past and will do so, hopefully, in the future. Now that the problem of climate change is on the radar screen of the world, there are many NGOs and other groups, even groups of scientists and institutions, that provide climate-change information in various forms and quality, often lacking comprehensiveness and proper recognition of uncertainties. There is a strong pressure to provide 'just-in-time' scientific updates for policy-makers and stakeholders, as was the case in the preparations for the 2009 climate-change conference in Copenhagen. The IPCC must not yield to this pressure. In this field of different and divergent forces, confusion may arise. An honest broker therefore is an asset. From my perspective, the IPCC has fulfilled this role with remarkable rigour and integrity. This role is now at risk, as the stakes are higher than ever before. The requirement that assessments are policy relevant but never policy prescriptive, as formulated in the Principles Governing IPCC Work, is of paramount importance. Our task is to inform the policy-makers and the public strictly in a 'what if' mode. Any other approach must be left to NGOs, negotiators or individuals. Only with strict adherence to procedures and to scientific rigour at all stages will the IPCC continue to provide the best and most robust information that is needed so much.

Produce more reports faster Jeff Price Lead author (AR3, AR4), director, climate-change adaptation, WWF United States

The IPCC is accepting nominations (until 12 March 2010) from governments and participating organizations for authors for its Fifth Assessment Report. One recommendation for the IPCC that could be implemented immediately is in how its coordinating lead authors and review editors are selected.
A new class of short, rapidly prepared, peer-reviewed reports is needed. Currently, authors are selected to represent "a range of views, expertise, gender and geographical representation". However, given the importance placed on these assessments, the most senior positions should be filled by the nominees most expert in their field, regardless of balance. These authors should be the most knowledgeable nominee about the range of topics in their chapter, best able to cooperatively work with a team of international scholars. Preferably, they should have previously been involved in an IPCC assessment and be familiar with IPCC standards and methodologies. Geographic and gender balance should then be used in selection of lead authors. The level of work required in preparing an assessment is large. Increasing the number of lead authors would provide better balance and give more scientists the ability to participate in the process. A new class of short, rapidly prepared, peer-reviewed reports is also needed. At present, publication options include supplemental material (no peer review required), technical papers (based on existing assessments) or assessments and special reports that undergo two reviews (expert and government/expert, usually taking more than two years to complete) (fig. 1). For topics of emerging importance or uncertainty, we need reports based on expert meetings and literature synthesis that undergo only a single round of extensive peer review with review-editor oversight before publication. The IPCC should also expand the number of specialist task forces, task groups and hold more expert meetings to provide additional scientific review and oversight for the broadening array of models (including model comparisons and validation) and methodologies used in emissions reporting, estimating and monitoring impacts, and in developing assessments and adaptation plans. Finally, the current period between assessments is too long. One option would be for the IPCC, or another body, to produce an annual review, assessment and synthesis of the literature for policy-makers (for example, three annual review volumes with a synthesis chapter in each volume) prepared by experts in the field. Although the editors of the volumes should ideally be drawn from past IPCC authors and editors, the review articles could be submitted by any author, as they would for a journal, with appropriate peer review and assessment for publication.

Open debate: Wikipedia-style

John R. Christy Lead author (AR3), University of Alabama in Huntsville, USA

Since 1992 I have served as an IPCC contributor and in 2001, as a lead author. My experience has left me of the firm conviction that the IPCC should be removed from UN oversight. The IPCC selects lead authors from the pool of those nominated by individual governments. Over time, many governments nominated only authors who were aligned with stated policy. Indeed, the selections for the IPCC Fourth Assessment Report represented a disturbing homogeneity of thought regarding humans and climate. Selected lead authors have the last word in the review cycle and so control the message, often ignoring or marginalizing dissenting comments. 'Consensus' and manufactured-confidence ensued. The recent leaking of e-mails from the Climatic Research Unit at the University of East Anglia in Norwich, UK, put on display the unsavoury cycle of marginalizing different viewpoints. Now several errors of overstatement, such as that of the melting rate of the Himalayan glaciers, have been exposed. Unfortunately, prestigious media, including Nature, became cheerleaders for these official reports, followed then by governments trying to enact policies that drastically reduced emissions to 'stop global warming' while increasing energy costs. I recommended last year that the next IPCC report invites published authors to write about the evidence for low climate sensitivity and other issues. The IPCC then would be a true reflection of the heterogeneity of scientific views, an 'honest broker', rather than an echo chamber. My recommendation assumed a business-as-usual IPCC process. However, voluminous printed reports, issued every six years by government-nominated authors, cannot accommodate the rapid and chaotic development of scientific information today. An idea we pitched a few years ago that is now worth reviving was to establish a living, 'Wikipedia-IPCC'. Groups of four to eight lead authors, chosen by learned societies, would serve in rotating, overlapping three-year terms to manage sections organized by science and policy questions (similar to the Fourth Assessment Report). The authors would strike a balance between the free-for-all of true science and the need for summary statements. Controversies would be refereed by the lead authors, but with input from all sides in the text, with links to original documents and data. The result would be more useful than occasional big books and would be a more honest representation of what our fledgling science can offer. Defining and following rules for this idea would be agonizing, but would provide greater openness. The truth, and this is frustrating for policy-makers, is that scientists' ignorance of the climate system is enormous. There is still much messy, contentious, snail-paced and now, hopefully, transparent work to do.

See also Perspectives, page 747. Have your say on the future of the IPCC here.

FOX NEWS On line - analysis

Top Science Journal Calls for Climate Science Reform AP A steady drip of errors in the top report on global warming -- and the erosion they are causing in public confidence of the science behind it -- have some scientists calling for drastic changes in how future United Nations climate reports are done. WASHINGTON -- A steady drip of errors in the top report on global warming -- and the erosion they are causing in public confidence of the science behind it -- have some scientists calling for drastic changes in how future United Nations climate reports are done. A push for reform being published in Thursday's issue of the prestigious scientific journal Nature comes on top of a growing clamor for the resignation of the chairman of the Intergovernmental Panel on Climate Change. The work of the climate change panel, or IPCC, is often portrayed as one massive tome. But it really is four separate reports on different aspects of global warming, written months apart by distinct groups of scientists. No errors have surfaced in the first and most well-known of the reports, which said the physics of a warming atmosphere and rising seas is man-made and incontrovertible. So far, four mistakes have been discovered in the second report, which attempts to translate what global warming might mean to daily lives around the world. "A lot of stuff in there was just not very good," said Kevin Trenberth, head of climate analysis at the National Center for Atmospheric Research and a lead author of the first report. "A chronic problem is that on the whole area of impacts, getting into the realm of social science, it is a softer science. The facts are not as good." It's been a dismal winter for climate scientists after the high point of winning the 2007 Nobel, along with former Vice President Al Gore, for championing efforts to curb global warming and documenting its effects. --In November, stolen private e-mails from a British university climate center embarrassed a number of scientists for their efforts to stonewall climate skeptics. The researchers were found to have violated Britain's Freedom of Information laws. --In December, the much anticipated climate summit of world leaders in Copenhagen failed to produce a meaningful mandatory agreement to curb greenhouse gases. --Climate legislation in the United States, considered key to any significant progress in slowing global warming, is stalled. --Some Republican U.S. senators, climate skeptics and British newspapers have called for Rajendra Pachauri, chairman of the IPCC, to resign. They contend he has financial conflicts of interest involving his role with the climate panel and a green-energy foundation he set up. He has vigorously denied any conflicts. --And in recent weeks, a batch of mistakes have been uncovered in the second of the four climate research reports produced in 2007. That second report -- which examines current effects of global warming and forecasts future ones on people, plants, animals and society -- at times relied on government reports or even advocacy group reports instead of peer-reviewed research. Scientists say that's because there is less hard data on global warming's effects. Nine different experts told The Associated Press that the second report -- because of the nature of what it examines -- doesn't rely on standards as high or literature as deep as the more quoted first report. And they say communication problems between lead authors of different reports make it harder to spot errors. The end result is that the document on the effects of climate change promotes the worst of nightmares and engages in purposeful hyping, said longtime skeptic John Christy of the University of Alabama, Huntsville. David King, Britain's former chief scientific adviser who once lectured at the University of East Anglia, home to the climate center where scientist e-mails were hacked, said that scandal laid bare the weaknesses in the IPCC. In a telephone interview, he said those who challenged the IPCC's assessment "are seen to be rocking the boat, and this in my view is extremely unfortunate." Scientists -- including top U.S. government officials -- argue that the bulk of the reports are sound. "The vast majority of conclusions in the IPCC are credible, have been through a very rigorous process and are absolutely state of the science, state of the art about what we know of the climate system," said National Oceanic and Atmospheric Administration chief Jane Lubchenco, who runs the agency that oversees much of the U.S. government's climate research. The problems found in the IPCC 2007 reports so far are mostly embarrassing: --In the Asian chapter, five errors in a single entry on glaciers in Himalayas say those glaciers would disappear by 2035 -- hundreds of years earlier than other information suggests -- with no research backing it up. It used an advocacy group as a source. It also erroneously said the Himalayan glaciers were melting faster than other glaciers. --A sentence in the chapter on Europe says 55 percent of the Netherlands is below sea level, when it's really about half that amount. --A section in the Africa chapter that talks about northern African agriculture says climate change and normal variability could reduce crop yields. But it gets oversimplified in later summaries so that lower projected crop yields are blamed solely on climate change. --There's been a longstanding dispute about weather extremes and economics. The second report says that there are more weather disasters than before because of climate change and that it is costing more. The debate continues over whether it is fair to say increased disaster costs are due to global warming or other societal factors such as increased development in hurricane prone areas. Scientists say the nature of the science and the demands of governments for a localized tally of climate change effects and projections of future ones make the second report a bit more prone to mistakes than the first report. Regional research is more often done by governments or environmental groups; using that work is allowed by IPCC rules even if it is seen as less rigorous than traditional peer-reviewed research, said Martin Parry, chairman in charge of the report on climate effects. The second report includes chapters on each region, which governments want to be mostly written by local experts, some of whom may not have the science credentials of other report authors. That's where at least three of the errors were found. In Thursday's issue of the journal Nature, four IPCC authors call for reform, including Christy, who suggests the outright dumping of the panel itself in favor of an effort modeled after Wikipedia, the online encyclopedia. A fifth author, writing in Nature, argues the IPCC rules are fine but need to be better enforced. In response, Chris Field of Stanford University, the new head of the second report team, said that he welcomes the scrutiny and vows stricter enforcement of rules to check sources to eliminate errors in future reports; those are to be produced by the IPCC starting in 2013. Many IPCC scientists say it's impressive that so far only four errors have been found in 986 pages of the second report, with the overwhelming majority of the findings correct and well-supported. However, former IPCC Chairman Bob Watson said, "We cannot take that attitude. Any mistakes do allow skeptics to have a field day and to use it to undermine public confidence, private sector confidence, government confidence in the IPCC."

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

1336) Surpresas da geografia... ou a falta que faz um bom mapa do mundo...

Esse pessoal não consultou nem o Google Earth, sairam sem GPS.
E o pior é que não levaram calção de banho ou prancha de surf.
Vejam vocês mesmos:

http://www.youtube.com/watch?v=MQMP7d4Qqr4

1335) As voltas da História - Martin Wolf

No dia 10 de fevereiro de 2010, eu postei neste blog o link para um podcast do jornalista econômico Martin Wolf, sobre os desafios de nosso mundo pos-crise:

The challenges of managing our post crisis world (December 29, 2009)

Bem, continuei, nas noites seguintes, aproveitando as promenades philosophiques avec mon chien, para ouvir outros podcasts do Martin Wolf, certamente um dos melhores comentaristas da economia global, obviamente do Financial Times (FT) que, junto com o Wall Street Journal e a Economist, não é apenas um dos melhores jornais econômicos do mundo, mas um dos melhores jornais, tout court.

Foi assim que ouvi mais um podcast que recomendo vivamente aos meus habituais visitantes, este aqui:

How the noughties were a hinge of History (23 December 2009)

A despeito do que pedem os editores do FT (Please don't cut articles from FT.com and redistribute by email or post to the web), vou contrariar essa recomendação e não apenas dar o link para o podcast, como transcrever o teor do mesmo.

Antes, porém, cabe esclarecer por que o estou fazendo, já que não pretendo me converter em promotor publicitário do jornalista em questão.
A razão é que encontrei inúmeros pontos de contato e alguma similaridade conceitual entre esse podcast, ou esse ensaio de natureza histórica, e um trabalho meu já concluido desde o final de 2009 -- portanto, na mesma época em que Martin Wolf escrevia o seu texto -- mas que não foi ainda publicado.
O trabalho é este aqui:

O Bric e a substituição de hegemonias: um exercício analítico
(perspectiva histórico-diplomática sobre a emergência de um novo cenário global)

Paulo Roberto de Almeida
(Brasília, 31 dezembro 2009, 32 p.)
Trata-se de um ensaio preparado para um livro sobre o Brasil e os outros Brics e que, se não encontrar objeção de certas cabeças iluminadas, deveria, em princípio, ser publicado em meados de 2010, sob a coordenação de um economista conhecido.

Transcrevo o sumário e os dados de indexação:

1. Introdução: por que o Bric e apenas o Bric?
2. Bric: uma nova categoria conceitual ou apenas um acrônimo apelativo?
3. O Bric na ordem global: um papel relevante, ou apenas uma instância formal?
4. O Bric e a economia política da nova ordem mundial: contrastes e confrontos
5. Grandezas e misérias da substituição hegemônica: lições da História
6. Conclusão: um acrônimo talvez invertido

Resumo: Exercício analítico de caráter histórico-prospectivo sobre o grupo Bric a partir de um exame sobre os fundamentos conceituais da iniciativa diplomática e de uma discussão acerca de suas peculiaridades econômicas e políticas, nos contextos regionais e mundial. Argumentos reflexivos e considerações de natureza histórica sobre as implicações diplomáticas do processo de substituição de hegemonias globais.
Palavras-chave: Bric, Brasil, Rússia, Índia, China, G7, Ordem global, Governança mundial, Substituição de hegemonias.
(quem tiver curiosidade em lê-lo, pode me pedir em mensagem particular)

Agora, Martin Wolf:

How the noughties were a hinge of history
By Martin Wolf
Financial Times, December 23 2009

The only truly global power was in rapid relative decline. Not long before, it had won a pyrrhic victory in a costly colonial war. New great powers were on the rise. An arms race was under way, as was competition for markets and resources in undeveloped areas of the world. Yet people still believed in the durability of the free trade and free capital flows that had nurtured prosperity and, many believed, had also underpinned peace.

That was how the world looked to many at the end of the “noughties” of the 20th century. Yet catastrophe lay ahead: a world war; a communist revolution; a Great Depression; fascism; and then another world war. The world order – built on competing great powers, imperialism and liberal markets – proved incapable of providing the public goods of peace and prosperity. It took calamity, the cold war and the replacement of the UK by the US as hegemonic power to re-establish stability. That then facilitated decolonisation, unprecedented economic expansion, the collapse of communism and yet another epoch of market-led global integration.

“History does not repeat itself, but it rhymes,” as Mark Twain is supposed to have said. The noughties of the 21st century now have the same fin de regime feeling as those of a century ago. Then the US, Germany, Russia and Japan were on the rise; now it is China and India. Then it was the Boer war; now it is the wars in Iraq and Afghanistan. Then it was an arms race between Germany and the UK; now it is the military build-up in China. Then the protectionism of the US undermined liberal trade; now conflicts between the US and China undermine our ability to tackle climate change. Then the US was isolationist; now China and other rising powers demand untrammelled sovereignty.

The noughties of the 21st century were marked by historic changes.

First, we are seeing at least the beginning of the end not just of an illusory “unipolar moment” for the US, but of western supremacy, in general, and of Anglo-American power, in particular. The UK was the only power with global reach in the 19th century. The US held the same role in the second half of the 20th. The transition between these two eras was a catastrophe. Now we have a possibly even more difficult transition of power to manage.

Second, the west, in general, and the US, in particular, have suffered a disastrous loss of authority. Assertion of an unchecked right to intervene destroyed trust in the US. The chaos that followed the wars in Iraq and Afghanistan and, far more, the financial crisis have destroyed the west’s reputation for competence. The rest of the world was inclined to believe that the west, whatever its faults, knew what it was doing, particularly where running a market economy was concerned. But then the teacher failed the examination.

Third, globalisation has also fallen into difficulty. Thirty years of surging growth in private sector leverage, in the balance sheets of the financial sector and in notional profitability of the financial sector in the US and other high-income countries has ended in calamity. The emergence of massive global current account “imbalances” has proved highly destabilising. Friction over exchange rates threatens even the maintenance of liberal trade.

Fourth, the provision of basic global public goods now demands co-operation between the established powers and emerging countries. This was shown in the inability to complete the Doha round of multilateral trade negotiations; in the rising influence of the Group of 20 leading countries and the parallel decline of the Group of Seven high-income countries during the financial crisis; and in the centrality of China, the world’s leading emitter of greenhouse gases, in the climate change negotiations in Copenhagen.

Yet, quite rightly, the world also demands the provision of far more public goods than a century ago. Then a modicum of peace, monetary stability and open markets was all that was expected. Now the world demands that leaders not only sustain peace and prosperity, but also promote development and environmental sustainability. All this is to be achieved via co-operation among some 200 states of vastly different capacities. Meanwhile, a host of non-state actors, some benign and many malign, impose conflicting pressures. Sometimes, they subvert states entirely.

The good news is that the world has not made mistakes as big as those that followed the noughties of a century ago: thanks, partly, to nuclear weapons, direct conflicts among great powers have been avoided; a liberal world economy has survived, so far; the lessons of the 1930s were applied to the financial crisis of the 2000s, with at least short-run success; climate change negotiations remain open; and many developing countries – though far from all – have made economic progress. While the movement towards democracy of the early 1990s has slowed, the number of grossly malign totalitarian regimes is now small, at least by the worst standards of the 20th century.

So where should we go in the next decade? For all its difficulties, the US is not the UK of 1910. Its economy remains the world’s most productive and innovative and its military capacity remains unmatched. The western world, as a whole, remains potent, with about 40 per cent of global output, at purchasing power parity. But other countries and forces are now on the rise, while the challenges ahead are also more complex and global than ever before.

“We must all hang together or assuredly we shall hang separately.” All countries – above all, incumbent and rising great powers – must recognise this truth, enunciated by Benjamin Franklin at the signing of the US declaration of independence. History has hardly been dominated by the benign spirits of co-operation, foresight and self-restraint. I would at least give Barack Obama credit for trying to provide the right sort of leadership. But will the world produce sufficient followers, at home or abroad? Alas, I rather doubt it.

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