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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

terça-feira, 7 de julho de 2009

1199) Alberto Tamer sobre o Mercosul

Esse Mercosul não interessa ao Brasil
Alberto Tamer
O Estado de São Paulo, 5.07.2009

Para que serve hoje o Mercosul?, pergunta editorial do Estado de sexta-feira. Para nada, respondemos. Só para atrapalhar. Como está aí, é obsoleto, ultrapassado, não interessa mais ao Brasil. Na verdade, nunca existiu. Foi uma figura de retórica, pois Paraguai e Uruguai não contam, não contaram nunca, e o Mercosul nada mais é do que um acordo comercial entre Brasil e Argentina, que definha mês a mês.

Entre janeiro e junho, último dado oficial do Ministério de Desenvolvimento, a receita das exportações brasileiras para a Argentina despencou 42,7% em relação ao mesmo período do ano anterior. Um ritmo bem superior à queda de 22% das nossas vendas totais. O valor das nossas importações caiu menos, 19,5%, porque temos um mercado mais
aberto que o argentino.

MAS ELES ESTÃO EM CRISE…
E precisam de ajuda! Sei, sei sim, mas só não entendo porque só se fecham com o Brasil e abrem generosamente para a China. As exportações brasileiras que precisam de licença prévia caíram 61% neste ano enquanto as chinesas apenas 39%. Eles continuam nos roubando nichos importantes de mercado. Estão desalojando nossas indústrias.

O seu governo já deu a entender que não se trata de uma política temporária. A proteção do seu mercado veio para ficar. E continuamos a fazer concessões unilaterais. Nossos empresários querem salvar o que podem enquanto nossos amigos argentinos prometem mas não cumprem. Acho que aprenderam com o pessoal do G-8…

MAS O MERCOSUL PESA MUITO!
Pesava, não pesa mais. Em 2007, chegou a representar 17% das exportações brasileiras. Recuou para 10% em 2008 e em maio (último dado oficial) não passava de 8,7%. Vem declinando a cada mês. É o efeito Argentina que é, na verdade, o Mercosul. A sua participação nas exportações brasileiras só vem caindo. Vamos aos números. Perdoe,
leitor, sei que cansam, mas às vezes são inevitáveis e, neste caso, imprescindíveis.

1 – Entre 1997 e 2000 representavam 13% das nossas exportações totais.
2 – De 2006 a 2007 a participação caiu para 8%, em média.
3 – No ano passado, ainda representou 8,9%.

Agora, fique atento. Nos quatro primeiros meses deste ano, recuou para 7%. Não é porque o Brasil exportou mais para outros mercados – ao contrário, exportou menos. É que a Argentina passou a nos trocar pela China e por outros parceiros mais interessantes.

É mais do que justo que a Argentina se aproxime da China, um parceiro novo e promissor, e se afaste do Brasil, que já deu o que pode dar. Ela está defendendo seus interesses. Concordo. Mas, e os nossos, onde ficam? Vamos continuar amarrados ao Mercosul, enquanto a Argentina não nos faz nenhuma concessão? Vamos continuar não podendo fechar acordos com outros países sem a aquiescência do Mercosul? Ora, está na hora de “virar a mesa”e acabar com isso.

PRESIDENTE, VAMOS MUDAR?
Nós até poderemos conviver com menos comércio, mas jamais podemos continuar impedidos de fazer acordos com quem atender aos nossos interesses sem ter de “pedir autorização” a esse Mercosul agonizante. Está lá, escrito nos estatutos! Não podemos continuar dependendo da Argentina, que com frequência está contra nós na OMC e em outros fóruns internacionais. O Mercosul, nos termos atuais, não ajuda nada, só atrapalha. O acordo que se discute com a União Europeia se arrasta sabem há quanto tempo? Mais de 10 anos!

Ora, sr. presidente. Vamos dar um chega pra lá nisso? Não querem importar mais? Muito bem, mas não encham, vão cuidar da vida. Podemos até ajudar, mas não atrapalhem. Vocês dançam um tango chorado e nós um sambinha gostoso com os Estados Unidos, a UE e a China e com quem mais quisermos. Foi o que fizeram o Chile, o México e outros países
sul-americanos.

VAMOS AOS BILATERAIS
Presidente, o senhor deve ordenar – sim, ordenar – ao Itamaraty que cumpra promessa feita há pelo menos dois anos, de iniciar e concluir rapidamente acordos bilaterais com outros países. E, se a Argentina, o Paraguai, o Uruguai reclamarem, é problema deles! Que se mude o acordo ou saímos dele. Ah! mas eles ainda são nosso terceiro parceiro comercial, senhor colunista! Sim, mas 70% do que importam vêm dos Estados Unidos, da China, da União Europeia e de outros países, informa o ministro Miguel Jorge.

Mas 95% das nossas exportações são de produtos industrializados, o ponto fraco do nosso comércio exterior! Sim, mas eles só importam porque precisam, seus empresários já estão entrosados com os nossos, uma linha comercial mais antiga e deixarão logo de importar quando a China oferecer condições, preço e crédito melhores.

OLHA O CHÁVEZ AÍ!
E, a propósito, sr. presidente, já imaginou o que pode acontecer se a Venezuela entrar mesmo no Mercosul? Será um deus nos acuda! O “generalíssimo” Chávez é capaz de perfilar as tropas na fronteira e ameaçar invadir o Brasil se fecharmos algum acordo com os EUA, o grande Satã do Norte. Sr. presidente, vamos refazer esse Mercosul, pois esse que está aí não interessa mais ao Brasil.

2 comentários:

Glaucia disse...

Ficam valendo os comentários do Vinicius lá em cima: é non sequitur atrás de non sequitur. O comentarista carrega nas suas paixões ideológicas, esperando a simpatia do leitor disposto a ouvir satisfeito qualquer coisa contra o atual governo; se botar Chávez no sopão das críticas, então, é o êxtase. O que tem Chávez que ver com o resto? Nada. Como é a balança comercial Brasil-Venezuela, hoje?

A pergunta é: quem quer fazer acordo de livre-comércio com a China? Façamos uma pesquisa. Com a Coreia? O Japão? Com EUA, sabemos mais ou menos o que significa: liberalização total, exceto para os produtos de interesse do Brasil. Duvido que com a UE vá ser diferente...

O mais curioso é que, historicamente (e bem antes do governo Lula), quem não quer liberar geral pra acordos bilaterais é...o Brasil! O país que tem a economia mais diversificada, exporta manufaturados para os demais e teria mais a perder com acordos de livre-comércio assinados por todos os membros.

Como de costume, pode até ser que elementos no artigo sejam impertinentes: mas um mínimo de visão crítica demonstra um articulista mais preocupado com a própria popularidade entre o Clube dos 16% do que com resolver os problemas do Mercosul e do Brasil.

Ou, pra citar Celso Lafer, que não pode ser acusado de ser lulista: "O Mercosul é destino".

Paulo Roberto de Almeida disse...

Qualquer discussão séria sobre o Mercosul tem de partir de elementos objetivos, de fatos, não de intenções, promessas, visões otimistas, utopias integracionistas e outras ilusões sobre a suposta identidade de propósitos ou de metas comuns.
Seria preciso considerar o perfil econômico próprio do Brasil, seu modo de inserção econômica internacional, sua estrutura e pauta exportadora, suas complementaridades possíveis com as economias regionais e, a partir daí, verificar o que pode e o que não pode fazer o Mercosul por todos esses objetivos e identidades, verificar o peso do Mercosul, e suas limitações e impedimentos para o Brasil.
Ele até pode ser importante no plano microeconômico e setorial, mas seria preciso examinar se ele não está dificultando outros objetivos macroeconômicos e definições no plano regional mais amplo e internacional, inclusive no que se refere à liberdade de se formular e implementar uma política econômica externa (comercial, de investimentos, tecnológica) que se coadune melhor com os interesses do Brasil.
Seria preciso considerar, por exemplo, que o Mercosul ocupa uma interface muito pequena no setor externo brasileiro (um pouco para comércio, pouco, ou nada, para investimentos, para dentro, quero dizer, zero em know-how e tecnologia, zero para financiamentos, etc).
A partir dai, pergunta-se: será que nossa política econômica externa tem de ser determinada por apenas 10 ou 12 por cento de nossa interface externa?
Uma discussão objetiva teria de partir dessas questões...

Finalmente, essa coisa de destino é uma bobagem completa. Nenhum país tem de ter o destino de sua geografia, no máximo ele pode explorar essas possibilidades, não se deixar determinar por elas. Um país consciente sobre quais são os seus interesses reais, traça o seu destino em função de suas maiores possibilidades positivas, não em função de suas circunstâncias geográficas...