Nova história econômica?
Marcelo de Paiva Abreu
Luiz Aranha Correa do Lago
André Arruda Villela
Nota sobre o artigo de Edmar Bacha em O Globo de 6/10/2025
As diferenças de opinião sobre regimes políticos tendem a ser apaixonadas, até no Brasil, opondo simpatias republicanas e monarquistas. É saudável que as diferenças sejam baseadas em avaliações históricas objetivas.
Edmar Bacha, ao anunciar o seu artigo com Guilherme A. Tombolo e Flávio Rabelo Versiani (BTV), “Secular stagnation? A new view on Brazil’s growth in the 19th century” na Revista de História Econômica, em O Globo de 6.10.25, escolheu como título “Nova história econômica”. Pretensão descabida.
O principal argumento do artigo é que, ao contrário do que sugere a interpretação dominante na literatura, entre 1820 e 1850 o PIB per capita brasileiro, longe de estar estagnado, cresceu 0,8% ao ano. A argumentação revisionista não se sustenta. Se o PIB per capita do Brasil tivesse crescido 0,8% entre 1820 e 1850, como argumentado por BTV, teria superado o desempenho do PIB per capita da Europa Ocidental (incluindo o Reino Unido) e da América Latina (ambos 0,5% ao ano) e estaria próximo do crescimento do PIB per capita no mesmo período do Reino Unido (0,9%) e dos EUA (1,0%). Os resultados são questionáveis, a despeito de afirmações como a de que “o ritmo do crescimento brasileiro foi aparentemente bastante normal no contexto do padrão geral do século”.
As referências históricas de BTV são seletivas. Reconhecem que o Brasil esteve sujeito a uma tempestade perfeita na última década do século XIX. Mas, curiosamente, silenciam sobre as tempestades que afligiram o Brasil no período 1820-1850: Guerra da Independência 1821-1824, Guerra Cisplatina 1825-1828, crises de governabilidade, revolta dos Malês de 1835, Revolução Farroupilha 1835-1845, revolta Liberal da década de 1840, consequências do Bill Aberdeen de 1845 sobre o tráfico de escravos.
Entre as contribuições que, segundo BTV, endossariam a tese de estagnação no Brasil Império estaria o livro de Marcelo de Paiva Abreu, Luiz Aranha Correa do Lago e André Arruda Villela, A passos lentos. Uma história econômica do Brasil Império, São Paulo, Edições 70, 2022 [ALV]. Leitura desatenta: o livro de ALV não sugere estagnação no Brasil Império e sim, como pode ser lido à página 56, “uma conjectura de intervalo amplo para a taxa de crescimento do PIB per capita entre 0,2% e 0,5% para o período imperial poderia ser adotada como hipótese preliminar.”
Fragilidades metodológicas afetam a geração das duas séries centrais na pretendida revisão de BTV: o produto nominal e o deflator necessário para gerar o produto real. Os autores estimaram o produto nominal pela arbitrária combinação de três variáveis: a média aritmética das importações e exportações nominais, a média aritmética das receitas e despesas do governo e a oferta de moeda. A discutível agregação é resultado da inacreditável aplicação à primeira metade do século XIX de pesos computados para o período 1900-1947. E, já que até recentemente não existiam índices de preços confiáveis para o período anterior a 1870, os autores utilizaram a média dos índices de preços reconhecidamente precários de Mircea Buescu e Eulália Lobo et al. A tônica é: “quando não há dados, nós os criamos”. São ousadias analíticas indefensáveis.
Nova história econômica? O afã revisionista de BTV parece ter resultado da convergência de banzo monarquista – como os autores reconhecem – com empirismo inconsequente. A despeito da jactância, os resultados são fracos: a fragilidade da argumentação compromete de forma decisiva o ímpeto revisionista.
Nota PRA: Eu postei o artigo do Edmar Bacha no meu blog Diplomatizzando, em 6/10/2025, neste link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2025/10/nova-visao-da-historia-economica-do.html
![A PASSOS LENTOS; UMA HISTÓRIA ECONÔMICA DO BRASIL IMPÉRIO (Portuguese Edition) by [MARCELO DE PAIVA ABREU, LUIZ ARANHA CORREA DO LAGO]](https://m.media-amazon.com/images/I/71X4K6eh25L.jpg)

