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terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Percival Puggina (1): O ENEM, um simulacro de exame

Para bem compreender o ENEM
Percival Puggina *

É provável que você, leitor, não saiba como funciona o Enem, o tal Exame Nacional do Ensino Médio. Nem imagina como um aluno possa prestar exame no Amazonas e ser qualificado para cursar Direito no Rio Grande do Sul. Menos ainda haverá de entender a lógica dessa migração acadêmica num país de dimensões continentais.
Pois eu também não sei como funciona o Enem. Mas sei algo sobre ele que, segundo tudo indica, poucas pessoas sabem. O Enem é um dos muitos instrumentos de concentração de poder político nacional nas mãos de quem já o detém e a ele se aferrou de um modo que causa preocupação. É parte de um projeto de hegemonia em implantação há vários anos. Tudo se faz solerte e gradualmentel, de modo que a sociedade não perceba estar perdendo sua soberania e se tornando politicamente imprestável. Se não fazemos parte desse projeto e não compomos quaisquer das minorias ou grupos de interesse  que se articulam no país, tornamo-nos inocentes inúteis, cidadãos de última categoria, numa democracia a caminho da extinção por perda de poder popular, por inanição do poder local.
É possível que o leitor destas linhas considere que estou delirando. Que não seja bem assim. Talvez diga que mudei de assunto e que o primeiro parágrafo acima nada tem a ver com o segundo. Pois saiba que tem, sim. Peço-lhe que observe a realidade do município onde vive. Qual o poder do seu prefeito, ou de sua Câmara Municipal? O que eles, efetivamente, podem realizar pela comunidade? Quais os sinais de progresso, da ambulância ao asfaltamento da avenida, que acontecem sem que algo caia da mão dadivosa da União?  Quais são as leis locais que você considera importante conhecer? E no Estado? Tanto o Legislativo quanto o Executivo constituem poderes cada vez mais vazios, que vivem de discurso, de promessas, de criação de expectativas. Empurrando a letargia com a barriga.
Observe que todas as políticas de Estado que podem fazer algum sentido na vida das pessoas são anunciados no plano federal (que venham a acontecer é outra conversa). Por quê? Porque é lá que estão concentrados os recursos tributários e os bancos oficiais realmente significativos. O poder político que comanda o país conta muito com seu elenco de prerrogativas exclusivas. Mas o poder que tudo pode, como temos testemunhado à exaustão, pode até o que não deve poder. Esse monstrengo chamado Enem não é apenas uma fonte de colossais trapalhadas. É um instrumento de poder, centralizando currículos, ordenando pautas, agindo contra as diversidades regionais, ideologizando as provas (não é por mero acaso que a primeira questão do Enem deste ano começa com um texto de Marx), e criando nos estudantes a sensação de que a Educação, o exame, o ingresso no ensino de terceiro grau são dádivas federais.
As cartilhas, os livros distribuídos às escolas, os muitos programas nacionais voltados ao famigerado "politicamente correto", tudo isso atende a um mesmo e único objetivo, do qual o Enem faz parte. É um projeto de poder. O único projeto que de fato mobiliza as energias do governo. Por isso, segue firmemente seu curso e seu cronograma no país.

* Percival Puggina (68) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, membro do grupo Pensar+.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

MEC confirma sua incompetencia sistemica e total alienacao

Dizer que vai punir erros de Português é uma confissāo de incompetência e uma profunda incompreensāo quanto às suas funçōes. O MEC continua um dinossauro inútil...
Paulo Roberto de Almeida

Erros de português serão punidos com maior rigor no Enem 2013
Mariana Tokarnia
Agência Brasil, 9/05/2013

Além de regras mais rigorosas para os candidatos, mudanças no edital também atingem os corretores, que terão mais horas de capacitação e serão acompanhados e avaliados

O Ministério da Educação fez alterações no edital deste ano do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) tornando-o mais rigoroso. Uma das medidas é que as redações com inserções indevidas serão zeradas. Outra mudança prevê que serão aceitos apenas desvios gramaticais excepcionais e que não caracterizem reincidência. Antes, eram permitidos "escassos" desvios.

A correção das redações será mais rígida. A expectativa é que uma a cada três redações irá para um terceiro corretor, antes o índice era de aproximadamente 21%. Isso ocorrerá quando houver uma discrepância de mais de 100 pontos entre os dois primeiros corretores. No ano passado, a discrepância tinha que ser de mais de 200 pontos para que fosse encaminhado a um terceiro avaliador.

O edital também prevê maior rigor para os corretores, que terão mais horas de capacitação e serão acompanhados e avaliados. Eles poderão ser dispensados inclusive durante a correção.

Segundo o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, as mudanças foram implantadas porque as regras aplicadas anteriormente não mostraram resultado satisfatório. Apesar do maior rigor, sobre as questões gramaticais, Mercadante diz que caberá à banca considerar o erro uma exceção ou não. "A regra é clara, mas a interpretação do juiz nem sempre é um consenso. Tem um grau que compete à banca, não tem como prever o grau que será aceito ou não. O que podemos dizer é que será mais rigoroso", diz.

Ele explicou também que tanto para a nota máxima na redação, que é mil, quanto para erros gramaticais considerados exceção será preciso uma justificativa dos avaliadores.

Outra novidade é que será divulgado no cartão de inscrição um telefone pelo qual candidatos com alguma condição especial (gestantes, pessoas com deficiência) serão orientados. Essa edição trará também dois modelos de prova com letra maior - uma com fonte tamanho 18 e outra 24.

Os candidatos com renda mensal per capita de até 1,5 salário mínimo estão isentos da taxa de inscrição. Antes, eram isentos apenas aqueles com renda de até um salário mínimo per capita. Os estudantes de escolas públicas continuam sem ter de pagar pela inscrição.

Mercadante desmente a intenção de cobrar a taxa daqueles que faltarem à prova, mas ressalta que o gasto é calculado pelo número de inscrições. "Apelo para aqueles que se inscreverem para que realmente façam o Enem. Os custos levam em conta os inscritos e temos tido uma diferença importante". No ano passado, foram 5,8 milhões de inscritos. Desses, 4,3 milhões fizeram a prova.

As inscrições começam na próxima seguna-feira (13) até o dia 27 de maio. Os candidatos podem pagar a taxa de inscrição até o dia 29 de maio. As provas serão aplicadas nos dias 26 e 27 de outubro. Os portões serão abertos às 12h (horário de Brasília).

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 MEC vai anular redação do Enem com deboche
Folha de São Paulo, 9/05/2013

As inscrições para a nova edição do exame começam segunda (13) e se estendem até o dia 27
O Ministério da Educação anunciou que anulará redações do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) deste ano que fugirem do tema proposto --com deboches ou trechos inusitados.

A decisão visa impedir situações como as verificadas no ano passado, quando dois textos que continham respectivamente trechos do hino do Palmeiras e uma receita de miojo, sem relação com o assunto sugerido, receberam notas válidas.

As inscrições para a nova edição do exame começam segunda (13) e se estendem até o dia 27. As provas serão nos dias 26 e 27 de outubro.

Outra mudança para evitar questionamentos sobre as redações será a ampliação dos casos em que um terceiro avaliador terá que examinar os textos, de maneira independente.
 

terça-feira, 5 de março de 2013

ENEM: tropecando na redacao (e no MECssauro)...

Esse triste resultado é obviamente a consequência da má educação que os alunos recebem, por um lado, mesmo nas escolas privadas, e, por outro lado, da incompetência do MEC, que não consegue reunir gente habilitada para fazer exames sensatos. Os companheiros sempre têm uma proposta gramsciana para fazer.
Destaco apenas duas passagens que evidenciam meu argumento:
1) O estudante paulista André Luis dos Santos Valente, de 17 anos, fez o último Enem. Só não tirou nota 1.000 por causa da avaliação dessa exigência. "Em todas as competências tive 100% de aproveitamento, mas na última, fiquei com 80%", diz ele, que critica o modelo. "Não sei bem como eles avaliam, mas é difícil exigir que nós estudantes tenhamos uma intervenção que nem os governos conseguiram."
2)  Para a consultora em educação Ilona Becskeházy, a diferença entre as médias de cada competência é sinal de que há problemas no modelo. "Os critérios são subjetivos o suficiente para confundir tanto quem faz a prova como quem corrige", diz ela. "Como mensurar a qualidade de uma proposta de intervenção?
Pois é, juntou a ruindade, em geral, do ensino no Brasil, sobretudo o domínio da norma culta da língua -- já que o MEC ensina que "nós pega o peixe" é aceitável -- com a ruindade intrínseca das saúvas freireanas, que acham que conscientizar o cidadão no besteirol gramsciano é melhor do que simplesmente ensinar as três matérias fundamentais de modo correto e intensivo.
Paulo Roberto de Almeida

Exigência em redação do Enem derruba nota
Paulo Saldaña
O Estado de São Paulo, 4/03/2013

Na prova de 2011, 37,4% conseguiram elaborar de forma precária proposta de intervenção ao tema, uma das competências avaliadas
Dados do Enem de 2011 mostram que 37,4% dos candidatos conseguiram elaborar "apenas de forma precária" uma proposta de intervenção ao tema da redação. Além de demonstrar domínio da norma padrão da língua, entender a proposta e argumentar, o candidato precisa apresentar uma proposta de resolução ou conscientização do problema - que ainda respeite os direitos humanos.

Essa competência, que vale um quinto da nota da redação, tem jogado para baixo a média geral dos alunos.

As redações do Enem têm cinco competências avaliadas. Cada uma vale 200 pontos e a nota final vem da soma dessas cinco avaliações (mais informações nesta página). Na média do País, a competência que avalia a proposta de intervenção é de 82,30 pontos. O número é no mínimo 25% mais baixo do que a média de qualquer competência. A diferença pode chegar a 35%.

"É possível ver que as notas baixas nessa competência correspondem a redações nas quais os alunos elaboram respostas com intervenções precárias ou tangenciais ao tema, ou até redações nas quais os alunos não elaboram intervenção alguma", explica o economista Felipe Cocco, do portal dadosdoenem.org, responsável pelo levantamento. Cocco utilizou os microdados do exame de 2011, quando o tema da redação foi "Viver em rede no século XXI: os limites entre o público e o privado".

A pontuação que o candidato consegue em cada competência avaliada representa sua capacidade em atender aos critérios que o exercício pede. Assim, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) estipula uma escala de faixas de pontuação para cada quesito.

Diferença. Nessa divisão, é possível perceber que 35% dos participantes até conseguem elaborar a proposta, "mas pouco articulada à discussão desenvolvida no texto". Apenas 5,5% conseguiram elaborar uma ideia "clara e inovadora", tirando nota máxima nessa parte. Como comparação, na competência 3, que tem a segunda menor média, mais de 11% conseguiram nota máxima.  

O estudante paulista André Luis dos Santos Valente, de 17 anos, fez o último Enem. Só não tirou nota 1.000 por causa da avaliação dessa exigência.
"Em todas as competências tive 100% de aproveitamento, mas na última, fiquei com 80%", diz ele, que critica o modelo. "Não sei bem como eles avaliam, mas é difícil exigir que nós estudantes tenhamos uma intervenção que nem os governos conseguiram." No Enem 2012, a proposta foi "O movimento imigratório para o Brasil no século XXI" - considerado difícil e complexo. Os dados do último exame ainda não estão disponíveis.

A diferença em cada parte da correção do texto foi ainda maior na prova de José Albérico da Silva Dantas Filho, de 18 anos, de Maceió. Nas outras quatro competências a nota variou entre 100 e 160. Mas na avaliação da proposta, ficou com 20. "Perdi qualquer chance de concorrer a uma vaga", diz.

O Enem é o único vestibular do País a exigir que o candidato faça uma proposta de intervenção à problemática do tema. Nas últimas edições do exame, a redação centralizou as reclamações de alunos, que se queixavam das correções.

Na opinião da professora de redação Angela Maria de Souza, do colégio Albert Sabin, de São Paulo, os professores ainda não estão acostumados a trabalhar com os alunos essa habilidade. "Não é fácil para o aluno. Se ele não treinar exaustivamente, não consegue ir bem", diz. Pela dificuldade, Angela conta que trabalha a competência desde o primeiro dia de aula. "Acho que é a parte mais importante, que diferencia um dos outros."

Para a consultora em educação Ilona Becskeházy, a diferença entre as médias de cada competência é sinal de que há problemas no modelo. "Os critérios são subjetivos o suficiente para confundir tanto quem faz a prova como quem corrige", diz ela. "Como mensurar a qualidade de uma proposta de intervenção?

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

A indigencia intelectual do Enem (a de seus formuladores, mais exatamente...)

A coisa se repete a cada ano: seja nos vestibulares, seja nos Enems da vida, nos Enads que não representam nada, em vários concursos enviesados (e isso inclui a diplomacia, também), sem falar, obviamente, do ensino médio, possivelmente o maior repositório mundial, de longe e hors concours, de besteirol por centimetro quadrado que é possível angariar no planeta, nos últimos dois ou três séculos (e isso graças aos professores debiloides que praticam a mais vulgar das contrafações "humanitárias", a favor dos pobres e dos oprimidos, contra o capitalismo perversos, os mercados desregulados e os loiros de olhos azuis, responsáveis por todas as nossas desgraças...
Eu gostaria de ter tempo, como esse jornalista, de escrever a respeito, pois certamente teria muita matéria prima para a minha série das falácias acadêmicas e para gozações sobre esses fatos da vida, que nas mãos (e nos pés) dos energúmenos do MEC (e seus apaniguados) se transformam em teorias sobre a salvação dos povos por via das políticas de inclusão, de benefícios sociais, ou de simples progressismo debilóide.
Mas, como não tenho tempo, deixo a tarefa para quem tem tempo e paciência para escrever sobre bobagens.
Realmente, eu tenho uma imensa pena dos nossos estudantes, obrigados a escutar, repetir e ter de concordar com a indigência intelectual que os companheiros da educação e as "saúvas freirenas" despejam encima deles. Pobres alunos, acabam ficando, pelo menos uma parte, como os quadrúpedes que dão aulas para eles...
Paulo Roberto de Almeida 


Reinaldo Azevedo, 5/11/2012

Não vi no detalhe a prova do Enem. Sei que professores de cursinho divergem sobre a resposta de algumas questões, a maioria relacionada a interpretação de texto, que costuma mesmo ser terra de ninguém. Mas não vou me ater a isso agora. Quero aqui comentar o tema da redação.
Poucas pessoas se deram conta de que o Enem — quem quer tenha elaborado a prova — deu à luz uma teoria e obrigou os pobres estudantes a escrever a respeito, a saber: “O movimento imigratório para o Brasil no século XXI”. Ainda que houvesse efetivamente um fenômeno de dimensão tal que permitisse tal afirmação — não há —, cumpre lembrar que estamos apenas nos 12 primeiros anos do referido século.
“Século”, em ciências humanas, não é só uma referência temporal. É também um tempo histórico. Mais 30 anos podem se passar, sem que tenhamos chegado à metade do século 21, e podem diminuir drasticamente as correntes — que nem são fluxo nem são movimento — de migração para o Brasil. Tratar esse evento como característica de século é burrice. Provo: “O PT é o partido que mais elegeu presidentes no século XXI”. O que lhes parece? Ou ainda: “O PSDB é o maior partido de oposição do século XXI no Brasil”. Ou isto: “O PMDB, no século 21, participa de todos os governos”.
Ao estudante, são apresentados três textos de referência. Um deles trata da imigração para o Brasil no século 19 e começo do século 20 e de sua importância na formação do país. Um segundo aborda a chegada dos haitianos ao Acre, e um terceiro trata dos bolivianos clandestinos que trabalham em oficinas de costura em São Paulo.
Vejam que curioso. O examinador acabou fazendo a redação — e das ruins, misturando alhos com bugalhos. Tenta-se induzir os alunos a relacionar essas duas ocorrências recentes — a chegada de haitianos e de bolivianos — aos fluxos migratórios do passado, quando houve um claro incentivo oficial à entrada de imigrantes. Os fatos de agora não guardam qualquer relação de forma ou conteúdo com o que se viu no passado.
Mas e daí? O Enem não está interessado em rigor intelectual — e bem poucos alunos do ensino médio teriam, com efeito, crítica suficiente para estabelecer as devidas diferenças. A prova não quer saber dessas diferenças — e chego a temer que um aluno mais preparado e ousado, coitado!, possa quebrar a cara. Um ou outro poderiam desmoralizar a “teoria”, com o risco de ser desclassificado.
Na formulação da proposta, pede-se que o aluno trate do tema “formulando proposta de intervenção que respeite os direitos humanos”. Assim, exige-se do pobre que, além de defender e sustentar com argumentos uma tese estúpida, ainda se comporte como um verdadeiro formulador de políticas públicas ou, sei lá, um especialista em populações.
Essas duas exigências foram já incorporadas às provas de redação do Enem. Muito bem: digamos que um estudante seja contrário a que se concedam vistos a quaisquer pessoas que cheguem clandestinas ao Brasil, defendendo que sejam repatriadas. Esse aluno hipotético estaria apenas cobrando respeito à lei — pela qual deve zelar o Poder Público — o mesmo Poder Púbico que realiza a prova.
Digam-me cá: a repatriação de clandestinos é uma “intervenção aceitável”, ou o estudante está obrigado a concordar com o examinador, como há de ceder que, afinal, dois mais dois são quatro? A repatriação, no caso, seguindo os passos das leis democraticamente instituídas no Brasil, caracteriza um atentado aos direitos humanos? Até agora, o próprio governo federal não sabe o que fazer com os haitianos, e o Ministério Público do Trabalho não consegue coibir a exploração da mão de obra boliviana. Por que os estudantes teriam de ter para isso uma resposta?
Atenção! Eu nem estou aqui a defender isso ou aquilo. Noto apenas que a imigração ilegal divide opiniões no mundo inteiro e que é um absurdo, uma arrogância inaceitável, que se possa, depois de inventar uma tese, estabelecer qual é a opinião correta que se deve ter a respeito, exigindo ainda que os estudantes proponham “intervenções”, porém vigiados pelo “Tribunal dos Direitos Humanos”. Aí o bobinho esperneia: “Mas defender os direitos humanos não é um bem em si, um valor em si?”. Claro que é! Assim como ser favorável ao Bem, ao Belo e ao Justo. A questão é saber que tribunal decide quando “os direitos humanos” estão ou não a ser respeitados. Eu, por exemplo, considero que seguir leis democraticamente instituídas ou referendadas, segundo os fundamentos da dignidade humana (a integridade física e moral), é uma expressão eloquente dos… direitos humanos!
A prova é apenas macumbaria multiculturalista mal digerida — não que possa haver uma forma agradável de digeri-la, é bom deixar claro! As provas de redação do Enem — e de vários vestibulares — têm cobrado que os alunos sejam mais bonzinhos do que propriamente capazes.
Não por acaso, nas escolas e nos cursinhos, as aulas de redação têm-se convertido — sem prejuízo de o bom professor ensinar as técnicas da argumentação — numa coleção de dicas politicamente corretas para o aluno seduzir o examinador. Com mais um pouco de especialização, o pensamento será transformado numa fórmula ou numa variante do “emplastro anti-hipocondríaco”, de Brás Cubas (o de Machado de Assis), destinado “a aliviar a nossa pobre humanidade da melancolia”.
É o que têm feito os professores: um emplastro antipoliticamente incorreto, destinado a “aliviar os nossos pobres alunos da tentação de dizer o que eventualmente pensam”.
Isso, como todo mundo sabe, é o contrário da educação.
A partir de hoje, começo a escarafunchar as teses de especialistas brasileiros em geografia humana e populações em busca do “Movimento Migratório para o Brasil no século 21″ — nada menos. Segundo critérios estritamente intelectuais, essa prova de redação deveria ser simplesmente impugnada.
Sei que não é conforto para os alunos que fizeram a prova, mas escrevo mesmo assim: se vocês não tinham muito o que dizer a respeito, não fiquem preocupados — vocês foram convidados a falar sobre uma falácia, sobre o nada.

domingo, 25 de setembro de 2011

Peculiaridades das estatisticas e o ENEM - Claudio Moura Castro


Mentiras e mistificações na Estatística
Claudio de Moura Castro
Revista Encontro 

Já foi dito que a Estatística é a arte de mentir com números. Na prática, há mais desconhecimento do que mistificação proposital. Mas gostemos dela ou não, a estatística é a única maneira segura e poderosa de lidar com fenômenos descritos por grupos de números. Por exemplo, as centenas de milhões de números gerados no ENEM são  uma fonte preciosa de informações, desde que soubermos ler o que dizem. Se não, o besteirol domina.

1. “Sou contra o ranqueamento das escolas”. Em ciências sociais, não há quilos ou metros, apenas comparações. Os números não têm qualquer significado em si.  No limite, a estatística não diz que uma escola é boa, apenas que é melhor que  outra com menor pontuação. Portanto, ser contra o “ranqueamento” é ser contra o uso das estatísticas de avaliação, pois estas só adquirem sentido quando comparadas. Naturalmente, podemos discordar quanto ao grau de transparência adotado: publicado no jornal ou somente a escola sabe a sua nota? Mas sem comparar, não sai nada de interessante.

2. “52,98% dos alunos ficam abaixo da média”. Esta manchete, em um dos melhores jornais do país, prefacia um tom acusatório. Mas é uma tolice sem tamanho. A média é um número cuja fórmula de cálculo permite encontrar o meio da distribuição. Portanto, próximo da metade das escolas obrigatoriamente estará abaixo da média. E isso será sempre verdade, qualquer que seja a distribuição.  Se tomarmos a média das dez melhores escolas do ENEM, cinco estarão abaixo dela.

3. “Que horror, os alunos só acertaram metade das questões”. Quando uma prova é construída, manda a técnica, é preciso adicionar perguntas difíceis, para separar os sabidos dos muito sabidos. A maioria não vai acertar, pois foram pensadas apenas para os mais preparados. Em uma prova formulada refletindo esses critérios, próximo da metade das perguntas serão acertadas. Tecnicamente, é uma prova bem feita, sob medida para a sua clientela. Mas sendo construída assim,  a proporção de acertos nada diz sobre a suficiência ou insuficiência do aprendizado dos alunos. Resulta de uma tecnicalidade requerida para dar precisão aos resultados, na cauda da distribuição. As autoridades ou o consenso podem convergir para essa ou aquela proporção de acertos, como caracterizando um mínimo aceitável de desempenho. Mas esse é apenas um julgamento postiço e subjetivo, não é intrínseco à prova (como é o caso do exame da OAB que define um limiar de acertos para a aprovação).

4. “O São Bento tem 761 pontos, portanto é melhor do que o Santo Antônio, com apenas 740”.  Tecnicamente, é verdade. Mas essa diferença entre o primeiro colocado e o quinto é tão pequena que  torna-se perfeitamente irrelevante. Se fossem 100 perguntas, seriam duas a mais respondidas certo. A margem de erro em um teste desse tipo é muito maior. No último ENEM, com a redação valendo metade da pontuação total, aumenta a faixa de ruído, pois as correções dos textos são subjetivas e mais imprecisas. Diferenças pequenas são convenientes para o marketing de colégios que ultrapassaram seus concorrentes, nada mais. Em contraste, grandes vantagens na pontuação refletem um nível de aprendizado superior, com certeza absoluta.

5. “O ENEM prova, o colégio A é pior do que o B”.  Suponha-se que A é um colégio excelente e que todos os alunos fazem o ENEM. O colégio B é medíocre e somente os melhores 10% se animam a fazer a prova. É bem provável que A teria mais pontos do que B se apenas forem considerados os seus melhores 10%. Ou, se todos do colégio B tivessem que fazer a prova. Isso porque, a presença dos alunos mais fracos puxa a média para baixo. Ou seja, as comparações entre colégios apenas são válidas quando a proporção que faz o teste é parecida.