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segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Simples regras para a boa qualidade da escola - Claudio de Moura Castro

 Simples regras para a boa qualidade da escola

 

Claudio de Moura Castro

 

 (,,,)

[Na] educação [o] segredo da qualidade é a religiosa atenção a todos os detalhes. E são muitos. É o feijão com arroz feito com obstinação. Não necessitamos teorias novas, complicadas ou miraculosas. Boa educação pode acontecer sem tecnologias revolucionárias na sala de aula. Mas é óbvio, cumpre corrigir os erros mais egrégios.

 

Para começar, sem gestão competente, nada de bom vai acontecer. O solo do pianista Nelson Freire encanta seu público, do primeiro ao último minuto. Mas se os carregadores do seu piano não se entenderem, brucutu, se vai para o chão! Se são muitos para a missão, é preciso coordenar. Portanto, gestão é essencial. Sem lideres capazes de comandar e boas regras instaladas, não há como produzir um bom ensino.

 

Uma escola precisa definir suas prioridades – poucas. E não pode ficar saltitando de uma para a outra. Todos têm que conhecê-las bem e embarcar nelas de corpo e alma. Essas são as primeiras regras da gestão. Não há boas escolas que não as pratiquem.

 

diretor é um elo crítico. É o comandante do barco, velando para que todos remem na mesma direção. Nas escolas bem dirigidas, as decisões fluem e o astral é bom. Porém, as escolas públicas carecem dos instrumentos para assegurar a boa marcha. Não podem punir e ou recompensar. Não escolhem os professores e nem podem se livrar dos fracos. Suas armas são apenas carisma e capacidade de sedução. É pedir demais deles.

 

Não fosse o bastante, os diretores são escolhidos pelos piores métodos. Ou são indicações políticas, passando longe dos melhores candidatos ou são eleições que politizam a escola e reduzem sua autonomia, tolhidas nas promessas de campanha. Não obstante, há hoje melhores métodos de escolha.

 

Sua Excelência, o professor. Em suas mãos acontece – ou não acontece – a boa educação. Infelizmente, sua preparação é equivocada. Nem aprendem o que vão ensinar e nem aprendem a dar aula. Talvez a maior prioridade hoje seja revolucionar a sua formação. 

 

E. Hanushek estimou que os alunos de um professor muito ruim ficam meio ano para trás. E os de um muito bom ganham um ano e meio. Ou seja, se trocarmos um muito ruim por um muito bom, o aluno ganha dois anos! Nada teria impacto comparável.

 

Porém, selecionamos mal. Tirar boa nota no concurso em nada contribui para sua eficácia. Diplomas de mestrado ou doutorado tampouco. Só se revela sua aptidão quando é testado em uma sala de aula de verdade. Daí que a seleção deveria ser após um estágio. 

 

Pior, a carreira não é atraente e charmosa. Os salários iniciais são baixos, atraindo poucos dentre os mais talentosos. Pior, a estabilidade garante que, por décadas, péssimos professores estarão na sala de aula. Some-se a isso regras lenientes para o absenteísmo. 

 

A avaliação é o GPS da educação. Se não sabemos se o ensino é bom, se melhorou ou piorou, como pilotar essa nave chamada escola? Hoje temos bons sistemas de avaliação – ainda que insuficientemente usados. Mas como o professor não aprendeu a fazer provas inteligentes, é fraquinha a avaliação pelas notas. Premia-se o decoreba.

 

Formal ou informalmente, qualquer empregado é avaliado ao longo da carreira. E o voto avalia os políticos. Os bons, avançam. Os trôpegos vão ficando para trás. Os professores da rede privada são informalmente avaliados pelos donos das escolas. Por que os sindicatos acham que a única classe que não pode ser avaliada é a dos professores da rede pública? 

 

Há uma ciência e uma arte de dar aulas. Faz um século, concebeu-se uma revolução na sala de aula. E de meio século para cá, tudo isso foi testado, através de pesquisas sérias. Por que a maioria das escolas ignora esse legado e segue usando métodos que vem da Idade Média?

 

Por exemplo, hoje sabemos: mais ênfase nas habilidades básicas (ensinar menos para aprender mais) O aluno aprende mais quando a aula é ativa. Só se aprende quando se aplica. Com bagunça não se aprende. 

 

Por que os erros não são corrigidos? Dentre observadores mais qualificados e serenos, há amplo acordo com relação ao que foi dito acima. Mas quase nada muda. Para obter os módicos avanços que conseguimos, ainda dependemos de líderes heroicos e obstinados. Nos países de boa educação, poucos conhecem o nome do Ministro.

 

Demos grandes saltos no passado recente, quando faltava tudo. Agora, a qualidade depende de medidas que pisam nos calos de muitos: mais esforço, mudanças penosas e, por aí afora. Para vencer tais resistências, é necessário que a sociedade exija impiedosamente uma educação de qualidade. Infelizmente, isso ainda não acontece. Toleramos a mediocridade. Por isso, temos uma educação medíocre.

 

 

terça-feira, 6 de novembro de 2018

Palpites para o novo Ministro da Educação - Claudio de Moura Castro (+ PRAlmeida)

Palpites para o futuro Ministro da Educação 

Claudio de Moura Castro

Vem aí um novo Ministro da Educação. Segundo um antigo ditado espanhol, “más sabe el diablo por viejo que por diablo”.  Como entro e saio do edifício do MEC, faz muito tempo, atrevo-me a oferecer alguns palpites.

1.    Ministro da Educação manda pouco (pode até mandar, mas ninguém obedece). Que inveja do da Fazenda! Canetadas não funcionaram, mesmo no período militar.

2.    Consertar a educação básica alçará o Ministro para a história. Mas quem o derruba é a universidade. Disse isso ao Portella, quando era Ministro. Apeado, por bulir com a universidade, alguém encontrou no seu gabinete o papelzinho em que ele anotou a frase. Outros ministros, por pouco, escaparam de igual sina. 

3.    E. Schiefelbein, reconhecido educador chileno, em determinado momento da sua vida virou Ministro da Educação. Como me disse, a lição mais importante desta experiência é ser necessário escolher três ou quatro metas e ir a fundo. Não dá para fazer muito mais. Pouco tempo depois de alçado à Presidência da República Checa, Vacla Vavel desabafou a um jornalista: “Como escritor, fui sempre cobrado pela originalidade. Como Presidente, tenho que repetir a mesma coisa mil vezes, até que todos se lembrem!”. Foco é tudo.

4.    O MEC aprendeu a fazer estatísticas e avaliar. Além disso, está encarregado de oferecer orientações para a Educação. Se cumprir bem esta agenda, já está ótimo. Mas usa mal os incentivos que poderiam ser embutidos em seus financiamentos. Por exemplo, poderia financiar as universidades em função do número de alunos formados ou por maiores pontuações no ENADE. Não faltam possibilidades, em todos os níveis. 

5.    O MEC não tem escolas, quase não as financia e não manda em quem as têm, os estados e municípios. Ainda assim, espera-se que seja responsável pela educação. Data vênia, muita humildade!

6.    O MEC atrapalha os estados mais maduros e deixa de socorrer os mais fracos. Deveria dar mais autonomia a uns e assistência bem próxima a outros. Isonomia é uma praga, não só nesse caso.

7.    Não se subestime a enorme força da burocracia do MEC.  Logo que entrou, F. Haddad, me ouviu falar dos “subterrâneos” do MEC. Perguntou a um amigo comum se, de fato, existiam. Suponho que ao sair estava mais do que convencido.

8.    Os políticos vão atazanar, pedindo empregos para parentes e buscando maneiras de tirar uma casquinha dos orçamentos.  Perigo à vista! 

9.    Na ordem geral das coisas, tudo indica que haja pouca corrupção na órbita do MEC, Afora alguns fundos mais vulneráveis, o resto ou é limpo ou é coisinha da raia miúda. Portanto, para quem quer reforçar seu caixa, não é uma boa opção. 

10. Depois da limpa feita por Paulo Renato, voltou a crescer a árvore de Natal dos programinhas disso ou daquilo, financiados e operados pelo MEC. Sua gestão é um petisco para os burocratas da casa. Até podem ser iniciativas simpáticas, mas falta-lhes massa crítica para fazerem diferença nacionalmente. Trocá-los por outros de menor número e mais impacto é uma bela missão. 

11. Há um bando de gente bem informada e serena, com ideias claras sobre o que precisa ser feito. Melhor ouvi-las que embarcar em soluções miraculosas.

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Permito-me acrescentar os meus próprios palpites (PRA):

12. Esqueça, rejeite, descarte qualquer proposta de “Escola Sem Partido”, ou desses grupos “anti-sexistas” nas escolas; concentre-se, única e exclusivamente, em reforçar o ensino de Português, de Matemática e de Ciências elementares, repito: única e exclusivamente, com poucas adições no currículo dos primeiros anos.

13. Exclua totalmente a obrigatoriedade do espanhol (ou portunhol) do currículo do fundamental; substitua pelo inglês e pelo uso da internet.

14. Exclua totalmente o caráter compulsório do ensino de Sociologia e Filosofia no médio, que isso é boquinha para marxistas desempregados; torne essas matérias opcionais, aliás, como sempre foi.

15. Não esqueça de dar pêsames ao seu colega astronauta, o tal que vai comandar o MCT, e que agora ganhou as universidades também; diga que você se sente compungido pelo inferno que ele vai enfrentar; ah, não se esqueça de dizer a ele que tente convencer o presidente a esquecer essa coisa de nomear reitores; isso seria criar uma guerra civil inutilmente, sem nenhum proveito para as universidades, ou para os alunos.

16. Acabe com o princípio da isonomia, esse prêmio à preguiça e à burrice progressiva.

17. Acabe com a estabilidade no professorado; como no caso da reforma previdenciária de capitalização, de longo prazo, comece a criar uma carreira paralela de professores, orientada pelo princípio da meritocracia, premiados por bons salários mas sem estabilidade; em mais ou menos 40 anos a educação pública vai melhorar…

domingo, 29 de outubro de 2017

Sobrevivendo a um ataque de abelhas - Claudio de Moura Castro

Só posso dizer que o relato é impressionante.
Paulo Roberto de Almeida


Escalada, abelhas... e quatro dias na UTI!

Claudio de Moura Castro

Era um passeiozinho menor. A estrada abandonada virou picada e logo acabou. Decidi subir o restante pelo meio do mato. Mas virou escalada. De repente, topo com uma casa de abelhas (das que moram no chão). Não havia volta. Continuei, sendo acompanhado por um séquito cada vez maior das moradoras. Logo perdem a cerimônia e começam a picar. Pouco adiante, perco as forças. Como avançavam nas pálpebras, não conseguia discar o celular. Finalmente, atendeu o gerente do Condomínio que mobilizou o socorro. Duas horas depois, fui achado. Com cordas e grande competência os bombeiros guindam-me do buraco.

Na ambulância, comecei a vomitar abelhas, enquanto me davam adrenalina e morfina. Fui para a respeitada UTI do Hospital João XXIII. Com Gilettes, as enfermeiras retiraram quase mil ferrões. Para a família, a médica informa que julgava o caso perdido. Mas parafraseando Mark Twain, as notícias da minha morte foram amplamente exageradas. Sobrevivi!

Por quatro dias fiquei, como assombração, em uma sala com uma dúzia de camas. À minha frente estava alguém que tentou assaltar um ônibus mas foi defenestrado pelos passageiros. Uma pesada corrente atava seu pé à estrutura da cama e, a porta, policiais brandiam metralhadoras.

Dia e noite, brilhavam as luzes.  Como estão quase todos entubados e parecendo mais para lá do que para cá, as dezenas de funcionários e médicos conversavam, sem qualquer esforço para moderar o volume. Alguns falavam de medicamentos, uma do biquíni novo, outra da troca de turno com a colega. Em certas horas, entravam bandos de estudantes de medicina, bebendo as doutas palavras do médico.

Cada um tinha seu serviço. À minha cama, um vinha com remédio para isso, outro com injeção para aquilo, um medir a glicemia, outro para aplicar insulina, um para fazer eletro, outro examinava os pulmões. A pressão e temperatura eram conferidos amiúde. O toxicologista aparecia de vez em quando. O otorrino, para tirar abelhas do nariz e ouvido. A endocrinologista comandava o espetáculo. Ninguém mais do que eu reconhece a competência de cada um e a capacidade do time de interagir produtivamente com os colegas. Não havia a correria nem o nervosismo dos filmes de TV. Todos numa boa, conhecendo a sua missão.

Mas neste ambiente - e na pobreza orçamentária de um hospital público - a prioridade é manter vivo o corpo. A alma e o conforto do paciente que esperem. Entrei e saí sem por os pés no chão. Não há vaso sanitário ou chuveiro. Todos só de fralda e ganhando banho de gato. Pedi uma pastilha para a garganta, a médica olhou para mim como se estivesse exigindo uma taça de Veuve Clicquot. Tampouco havia pasta e escova de dentes. As pálpebras mordiscadas pediam um banho de soro fisiológico a cada tantos minutos. Era um luxo que os atendentes relutantemente acediam.

Mais dois dias em outro hospital e voltei para casa. Um amigo perguntou-me se tentei  identificar as abelhas na Internet, contemplando as suas fotos. Selecionei meus melhores palavrões para a resposta.

domingo, 25 de setembro de 2011

Peculiaridades das estatisticas e o ENEM - Claudio Moura Castro


Mentiras e mistificações na Estatística
Claudio de Moura Castro
Revista Encontro 

Já foi dito que a Estatística é a arte de mentir com números. Na prática, há mais desconhecimento do que mistificação proposital. Mas gostemos dela ou não, a estatística é a única maneira segura e poderosa de lidar com fenômenos descritos por grupos de números. Por exemplo, as centenas de milhões de números gerados no ENEM são  uma fonte preciosa de informações, desde que soubermos ler o que dizem. Se não, o besteirol domina.

1. “Sou contra o ranqueamento das escolas”. Em ciências sociais, não há quilos ou metros, apenas comparações. Os números não têm qualquer significado em si.  No limite, a estatística não diz que uma escola é boa, apenas que é melhor que  outra com menor pontuação. Portanto, ser contra o “ranqueamento” é ser contra o uso das estatísticas de avaliação, pois estas só adquirem sentido quando comparadas. Naturalmente, podemos discordar quanto ao grau de transparência adotado: publicado no jornal ou somente a escola sabe a sua nota? Mas sem comparar, não sai nada de interessante.

2. “52,98% dos alunos ficam abaixo da média”. Esta manchete, em um dos melhores jornais do país, prefacia um tom acusatório. Mas é uma tolice sem tamanho. A média é um número cuja fórmula de cálculo permite encontrar o meio da distribuição. Portanto, próximo da metade das escolas obrigatoriamente estará abaixo da média. E isso será sempre verdade, qualquer que seja a distribuição.  Se tomarmos a média das dez melhores escolas do ENEM, cinco estarão abaixo dela.

3. “Que horror, os alunos só acertaram metade das questões”. Quando uma prova é construída, manda a técnica, é preciso adicionar perguntas difíceis, para separar os sabidos dos muito sabidos. A maioria não vai acertar, pois foram pensadas apenas para os mais preparados. Em uma prova formulada refletindo esses critérios, próximo da metade das perguntas serão acertadas. Tecnicamente, é uma prova bem feita, sob medida para a sua clientela. Mas sendo construída assim,  a proporção de acertos nada diz sobre a suficiência ou insuficiência do aprendizado dos alunos. Resulta de uma tecnicalidade requerida para dar precisão aos resultados, na cauda da distribuição. As autoridades ou o consenso podem convergir para essa ou aquela proporção de acertos, como caracterizando um mínimo aceitável de desempenho. Mas esse é apenas um julgamento postiço e subjetivo, não é intrínseco à prova (como é o caso do exame da OAB que define um limiar de acertos para a aprovação).

4. “O São Bento tem 761 pontos, portanto é melhor do que o Santo Antônio, com apenas 740”.  Tecnicamente, é verdade. Mas essa diferença entre o primeiro colocado e o quinto é tão pequena que  torna-se perfeitamente irrelevante. Se fossem 100 perguntas, seriam duas a mais respondidas certo. A margem de erro em um teste desse tipo é muito maior. No último ENEM, com a redação valendo metade da pontuação total, aumenta a faixa de ruído, pois as correções dos textos são subjetivas e mais imprecisas. Diferenças pequenas são convenientes para o marketing de colégios que ultrapassaram seus concorrentes, nada mais. Em contraste, grandes vantagens na pontuação refletem um nível de aprendizado superior, com certeza absoluta.

5. “O ENEM prova, o colégio A é pior do que o B”.  Suponha-se que A é um colégio excelente e que todos os alunos fazem o ENEM. O colégio B é medíocre e somente os melhores 10% se animam a fazer a prova. É bem provável que A teria mais pontos do que B se apenas forem considerados os seus melhores 10%. Ou, se todos do colégio B tivessem que fazer a prova. Isso porque, a presença dos alunos mais fracos puxa a média para baixo. Ou seja, as comparações entre colégios apenas são válidas quando a proporção que faz o teste é parecida.