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sexta-feira, 12 de abril de 2013
Margareth Thatcher e o euro - Jorge Costa
Jorge Costa, Jornalista
Negócios on-line, 12 Abril 2013
Margaret Thatcher sobe ao poder em 1979 e anuncia: "Não sou um político de consensos, sou de convicções". Depois foram 12 anos de demonstração do que isso queria dizer, com uma intensidade e consistência talvez sem paralelo. Uma estadista cuja principal marca era o rigor doutrinário? Não só. O que fez dela o ser memorável que agora lembramos foi também o seu extremo pragmatismo, isto é, uma agudíssima capacidade de compreender a realidade e agir em consequência. Os termos parecem antitéticos. Salvo se estivermos perante Margaret Thatcher: uma estadista excepcional.
Ser pragmático quer dizer que também se pode perder em toda alinha. Basta que o entendimento da realidade, com a noção dos perigos que ela comporta, esteja em choque com o dos pares e, além disso, se conserve pela verdade e as fronteiras do inegociável mais cuidado do que amor pelo poder. Thatcher foi a primeira vítima do euro. Por ele não perdeu a alma nem o juízo. Mas perdeu o controlo do partido conservador e acabou por sair.
Thatcher opunha-se radicalmente à ideia de União Económica e Monetária (UEM). Em entrevista a Robert Lenzner, da Forbes, já retirada, em 1992, explica como Maastricht, ao dar o salto de uma comunidade de mercado para uma união política ameaçaria de morte a democracia inglesa: "Sob Delors, 80% das decisões económicas da Grã-Bretanha serão tomadas em Bruxelas". Nem pensar. A Inglaterra nunca entrou, mas a resistência de Thatcher ao consenso que se começava a formar no país a favor da entrada ditou o fim da sua carreira política.
O que hoje mais nos interessa foi o que aconteceu pouco antes desse fim. No Verão de 1990, recorda Thatcher no primeiro volume das suas autobiografias, "Downing Street Years" (1993), ela ainda acalenta a esperança de convencer os restantes 11 países da CEE do desastre que a todos espera do lado de lá do salto para União Monetária. Explica a John Major, seu ministro das Finanças, acomodatício e favorável a um tratado que contemplasse a possibilidade de cada um decidir entrar ou ficar de fora, que não. "Rejeitei isso. Disse-lhe que seria psicologicamente errado pormo-nos numa atitude mental em que aceitássemos a inevitabilidade do passo em direcção à UEM, em vez de atacarmos o conceito na íntegra". Como? "Tínhamos argumentos que poderiam persuadir tanto alemães – que ficariam preocupados com o enfraquecimento das políticas anti-inflacionárias – como os países mais pobres – a quem se deve dizer que não serão salvos das consequências da moeda única, que devastará, em consequência, as suas economias ineficientes" (realce meu).
É na já referida entrevista, de 92, fresca ainda a tinta do tratado, que Thatcher elabora melhor o que, aparentemente, só para ela era uma evidência: "Todas as taxas de câmbio fixas acabaram por ruir. Estamos em diferentes níveis de desenvolvimento económico. Alguns países, pura e simplesmente não conseguirão estar à altura das exigências de uma moeda única. Esta acabaria por significar subsídios suplementares maciços da nossa parte ou maciços movimentos migratórios deles para os nossos países". Thatcher sabia o que era, e levava a sério, a teoria das zonas monetárias óptimas.
Portugal, duas décadas depois. O diferencial de inflação que a economia portuguesa acumulou, entre 1995 e 2012, em relação à Alemanha traduziu-se numa apreciação de 31,3%. A perda de competitividade expressa nessa tendência díspar dos preços relativos, sem mecanismos de reequilíbrio cambial, devastou literalmente a competitividade externa do país. Endividado para além de todos os limites razoáveis e condenado a uma desvalorização interna alternativa, afunda-se numa depressão, cujas consequências estão ainda longe de estar totalmente materializadas. As maciças transferências do Norte revestem a forma – até ver – de créditos do Bundesbank e pacotes de resgate. A emigração acelera.
Thatcher não convenceu e saiu vencida. Agradeço-lhe quase tudo. Inclusive a coragem de ter lutado até perder. Tenho a certeza de que ainda não percebemos a dimensão da derrota, dela e nossa. A ela desejo-lhe paz. E a nós que não nos percamos no cansaço da aprendizagem pela devastação.