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sábado, 11 de janeiro de 2014

Um Global Bond companheiro a 13,4%: o maior da história economica

Eles merecem ficar com mais este recorde os companheiros: um título brasileiro sendo lançado a 13,4% significa a perda completa de credibilidade da política econômica companheira.
Eles merecem ficam com mais esse recorde, esse Guiness da incompetência e da irresponsabilidade.
Paulo Roberto de Almeida

Um nariz de Pinóquio no índice de inflação

11 de janeiro de 2014 | 2h 03
 Rolf KROLF KUNTZ - O Estado de S.Paulo
Como um nariz de Pinóquio, o número final da inflação, 5,91%, desmentiu as promessas de um resultado melhor que o do ano anterior, desmoralizou mais um pouco a intervenção nos preços e comprovou, mais uma vez, a inépcia de uma política populista, voluntarista e irresponsável. A letra V, de verdade, mostra graficamente, com a graça de um desenho animado, a evolução do índice oficial de preços ao consumidor. Na primeira fase, de janeiro a julho, os números decrescem de 0,86% até 0,03%, muito perto de zero. Na segunda, há uma subida quase contínua, a partir do vértice, até 0,92%, uma taxa surpreendente. No mercado financeiro, a mediana das projeções para dezembro indicava uma variação de 0,75%. Seria uma elevação muito grande pelo padrão de qualquer país bem administrado, mas ainda insuficiente para levar a alta acumulada no ano aos 5,84% de 2012. Na primeira parte do V aparecem o efeitos da manipulação dos preços da eletricidade, da gasolina e do transporte público e dos cortes de impostos. Na segunda, os truques se esgotam, as pressões inflacionárias se manifestam mais abertamente e o nariz pinoquiano se expande com rapidez.
Se a estatística, como dizem os incréus, é a arte de mentir com números, faltou arte a quem tentou administrar, pelo voluntarismo, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O governo errou, dirá talvez algum companheiro, ao fazer só uma parte do serviço. Interveio na fixação de alguns preços, mas deixou livre a elaboração dos índices. Na Argentina da família Kirchner o trabalho foi mais ambicioso: a intervenção nos preços, além de muito mais ampla e quase rotineira, foi complementada pela manipulação das estatísticas oficiais e pela censura aos índices privados. A inflação medida por especialistas independentes anda perto de 30%. É o triplo da apresentada pelas fontes oficiais.
A situação no Brasil ainda é outra, apesar do culto, oficiado no Palácio do Planalto, aos modelos cubano, bolivariano e kirchneriano. O pessoal do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) continua trabalhando sem restrições políticas e produz números e relatórios sem censura. Até o Banco Central (BC) tem divulgado avaliações e projeções constrangedoras para o Executivo, como as estimativas de inflação acima da meta ainda por longo tempo. Bom para o governo: embora prejudicada, sua credibilidade é maior, por enquanto, que a da administração Kirchner.
A presidente Dilma Rousseff e seus auxiliares - pelo menos alguns deles - passaram a cuidar com mais atenção, nos últimos tempos, da credibilidade. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, prometeu fechar o balanço fiscal de 2013 sem recorrer à contabilidade criativa. A promessa foi recebida com sinais de otimismo no mercado financeiro. Mas é difícil consertar em pouco tempo, e apenas com base numa declaração de bons propósitos, uma reputação comprometida por uma longa série de trapalhadas e de truques malsucedidos.
Para acalmar os nervosinhos, como ele mesmo afirmou, o ministro anunciou com antecipação de umas três semanas o resultado das contas do governo central. Foi alcançado, segundo ele, um superávit primário de R$ 75 bilhões. Ficou R$ 2 bilhões acima da meta, mas só obtido com a ajuda de pelo menos R$ 15 bilhões de receitas atípicas. O anúncio pode ter impressionado a velhinha de Taubaté. Para os menos generosos, o governo continua devendo demonstrações mais convincentes. Mas até a fixação da meta fiscal para 2014 foi deixada para mais tarde, como se a presidente e o ministro da Fazenda tivessem medo, na virada do ano, de prometer um resultado muito difícil.
O problema da credibilidade continua sem solução. A agência Moody's anunciou nesta semana a manutenção da nota de crédito do Brasil, já levando em conta as hipóteses de um crescimento econômico medíocre em 2014 (cerca de 2%) e de um superávit primário pouco melhor que o do ano passado (aumento de 1,8% para 2,1%). Mas o anúncio foi acompanhado de uma advertência: a decisão poderá ser revista, nos próximos meses, se o quadro for pior que o previsto e a deterioração econômica se acentuar. A Standard & Poor's, na mesma semana, reafirmou a possibilidade de um corte da nota antes das eleições. Essa possibilidade havia sido indicada no trimestre final de 2013.
Um bom complemento do cenário foi o leilão de títulos federais na quinta-feira. Para vender seu novo papel de longo prazo, a NTN-F-2025, o Tesouro teve de oferecer a taxa de 13,3899%, a mais alta já registrada no lançamento de um título desse tipo. O mercado absorveu todas as notas e o responsável pela operação classificou a venda como um sucesso: o custo foi até um pouco menor que o esperado pelo governo. Do outro lado do balcão as opiniões foram diferentes: as condições do mercado mudaram e o financiamento da dívida pública tende a ser mais caro. Isso se explica tanto por fatores externos - um mercado internacional menos folgado - quanto por problemas internos, a qualidade da política econômica e a baixa credibilidade do governo.
O histórico do governo inclui a tolerância à inflação, a tendência à gastança, a incapacidade de promover um crescimento econômico mais veloz e a má administração das contas externas, em visível deterioração. O aperto financeiro externo, consequência previsível de uma política monetária menos frouxa nos Estados Unidos, nem de longe pode servir como desculpa. Quem tinha juízo e alguma competência tratou de se prevenir e de se manter atraente para o capital estrangeiro. Isso é mais complicado que fazer discursos eleitorais em palanques arrumados pelos companheiros e diante de plateias amigas. A presidente e sua equipe só parecem ter descoberto essa diferença há pouco tempo. Ainda estão, tudo indica, assimilando a novidade.
ROLF KUNTZ É JORNALISTA


sábado, 28 de dezembro de 2013

Mentiras, mentiras e publicidade enganosa, eis a politica economica oficial... - Rolf Kuntz

Além de muita incompetência, claro, dessas que só se aprende (ou desaprende) depois de anos vivendo de ilusões econômicas fornecidas pelo keynesianismo de pacotilha que caracteriza os "çabios" do governo.
Vamos pagar, e já estamos pagando, um alto preço por tudo isso.
Paulo Roberto de Almeida 

O modelo é feito de botox, maquiagem e remendos

28 de dezembro de 2013 | 2h 03
ROLF KUNTZ - O Estado de S.Paulo
Maquiagem, botox e remendos são os principais componentes do chamado modelo de crescimento em vigor há uma década, aperfeiçoado nos últimos três anos e pelo menos tão eficiente quanto a pedra filosofal procurada pelos alquimistas. Segundo se dizia, essa pedra, ou fórmula, poderia transformar em ouro metais menos valiosos. Com o tal modelo, o governo converteu um déficit primário de R$ 6,2 bilhões num superávit mensal de R$ 28,8 bilhões, um recorde. A mágica foi realizada basicamente com a inscrição de duas receitas atípicas - R$ 15 bilhões do bônus de concessão do campo de Libra, no pré-sal, e R$ 20,4 bilhões de pagamentos do novo Refis, o programa de parcelamento de impostos atrasados. Com esse resultado em novembro, a administração federal terá uma chance muito maior de fechar o ano com R$ 73 bilhões de resultado primário, o dinheiro destinado ao pagamento parcial dos juros da dívida pública.
As contas de novembro do governo central foram apresentadas pelo secretário do Tesouro, Arno Augustin, principal auxiliar do ministro da Fazenda, Guido Mantega, no setor de alquimia contábil. Mas o modelo composto principalmente de botox, maquiagem e remendo serve também para embelezar a inflação e as contas externas. Por sua aplicação variada, esse instrumento sintetiza as propriedades da pedra filosofal e do Bombril, o das mil e uma utilidades. O noticiário do dia a dia tem confirmado suas virtudes.
Neste ano o Brasil acumulou um superávit comercial de US$ 1,02 bilhão até a terceira semana de dezembro, segundo as últimas informações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. No fim de novembro o saldo acumulado era um déficit de US$ 93 bilhões. O resultado continuou fraquinho nas duas semanas seguintes, mas na terceira foi registrada mais uma exportação de plataforma de exploração de petróleo e gás, no valor de US$ 1,15 bilhão. Pronto. De repente, a conta comercial passou do vermelho para o azul. Mas essa plataforma, como outras exportadas neste ano e em 2012, nunca deixou o País, porque a operação é meramente contábil e seu propósito é a geração de um benefício fiscal.
Neste ano, até a terceira semana de dezembro, as exportações dessas plataformas proporcionaram receita de US$ 7,73 bilhões, 351,41% maior que a obtida com o mesmo produto um ano antes. Terá sido um surto de sucesso comercial ou uma emergência na conta de comércio exterior? Outro detalhe notável: em 2013, essas plataformas foram a maior fonte de receita com as vendas externas de manufaturados.
Automóveis de passageiros apareceram em segundo lugar, com US$ 5 bilhões, e óleos combustíveis em terceiro, com US$ 3,46 bilhões. Em seguida apareceram partes e peças para veículos e tratores (US$ 3,1 bilhões) e aviões (US$ 3,02 bilhões). Mas todos esses produtos foram para fora. Muitos brasileiros devem ter voado, no exterior, em aviões da Embraer. Muito mais difícil será encontrar uma daquelas plataformas.
Sem essa operação quase milagrosa, o saldo comercial até a terceira semana de dezembro teria sido um déficit de US$ 6,71 bilhões. O resultado teria sido menos mau, é claro, se parte das importações de petróleo e derivados tivesse sido contabilizada - corretamente - em 2012, em vez de só aparecer neste ano (esta é mais uma bizarria das contas brasileiras). Mas esses produtos de fato foram comprados e chegaram ao País. Se essas compras tivessem entrado nas contas de 2012, o saldo comercial do ano passado teria ficado abaixo dos US$ 19,4 bilhões oficialmente registrados.
Problemas da Petrobrás, incluída a necessidade de importação de óleo e derivados, também têm relação com o uso do modelo de botox, maquiagem e remendo. Preços dos combustíveis têm sido politicamente contidos, há anos, como parte do esforço para administrar os índices de inflação (coisa muito diferente de combater as pressões inflacionárias). Essa política impôs perdas à empresa, reduziu sua geração de caixa e diminuiu sua capacidade de investir com recursos próprios. Além disso, prejudicou os investimentos na produção de etanol, porque a contenção dos preços da gasolina se refletiu na formação de preços do álcool. Depois de muita pressão, os novos dirigentes da Petrobrás conseguiram autorização para elevar os preços, mas em proporção inferior à necessária. A depreciação das ações da empresa, nas bolsas, é consequência dessa e de outras interferências políticas na administração da estatal.
O modelo de enfeite foi aplicado amplamente no esforço de controle dos índices de inflação. O governo forçou a redução das tarifas de eletricidade ao impor às concessionárias um novo esquema de renovação de contratos. Também manobrou para retardar os aumentos de passagens de transporte público e para anular, no meio do ano, os ajustes concedidos.
Esse esforço produziu algum efeito imediato. Os indicadores de inflação subiram mais lentamente durante alguns meses, mas a quase mágica logo se esgotou. Os índices de preços ao consumidor voltaram a aumentar cada vez mais velozmente a partir de agosto. O IPCA-15, uma espécie de prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo, a medida oficial de inflação, acumulou alta anual de 5,85% até dezembro. Se o resultado final do IPCA será igual ou inferior ao do ano passado (5,84%) só se saberá no começo de janeiro, quando conhecidos os números de todo o mês de dezembro. Mas, na melhor hipótese, a inflação será muito parecida com a do ano passado e as pressões continuarão fortes em 2014.
Nenhuma pessoa informada leva a sério o tabelamento de preços, o disfarce das contas externas e o enfeite das contas públicas. Operações atípicas podem gerar ganhos fiscais imediatos, mas corroem a credibilidade de quem governa. Com botox e maquiagem, alguns números ficam mais apresentáveis para os ingênuos. Paras os outros a cara do governo se torna cada vez mais disforme.
*JORNALISTA

domingo, 24 de novembro de 2013

A unanimidade de Nelson Rodrigues e a mediocridade economica brasileira - Rolf Kuntz

Muitos anos atrás, mais exatamente 2005, eu escrevi um texto perguntando se o Brasil poderia crescer 5% ao ano, como pretendiam certos entusiastas do regime dos companheiros. Minha resposta obviamente era negativa, mas fundamentada nos dados econômicos disponíveis naquele momento, e que não mudaram desde então.
O Brasil surfou na bonança do pico das commodities, patrocinada pela China, e parece ter esquecido que para crescer pelo menos 5% seria preciso investir algo como 25% do PIB, algo que ele não faz há muito tempo.
Baseado em dados primários como esse, mas também numa série de outras evidências objetivas, eu sempre achei que não tínhamos, como não temos, condições de crescer a taxas mais robustas, a menos de fazer uma série de reformas que o governo anterior, e o atual, nunca fez e não parece disposto a fazer.
Bem, o resultado é esse mesmo: mediocridade em toda linha.
Sabem em quanto tempo a renda de vocês vai dobrar? Em 60 ou 70 anos, ou seja, apenas para os seus netos e bisnetos. Essa é a herança do keynesianismo de botequim que nos aporrinha há muito tempo.
Paulo Roberto de Almeida

O Brasil emperrado e a tese de Nelson Rodrigues
O Estado de S.Paulo, 22 de novembro de 2013
Rolf Kuntz

Se toda unanimidade for mesmo burra, como escreveu Nelson Rodrigues, respeitados economistas nacionais e estrangeiros devem estar errados, porque as avaliações negativas da economia brasileira estão ficando quase unânimes. A Standard & Poor’s, uma das principais agências de classificação de risco, poderá mudar a nota do País antes das eleições de 2014, se a situação das contas públicas continuar piorando, disse em Nova York, na quarta-feira, o diretor responsável pelo acompanhamento do Brasil, Sebastian Briozzo. Ele também revelou a previsão de crescimento econômico para este ano e para 2014, em torno de 2,5%. Um dia antes o Conference Board, organismo especializado em estudos macroeconômicos, havia indicado uma projeção pouco menor para o próximo ano, 2,3%. Estimativas semelhantes haviam sido divulgadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE): expansão de 2,2% neste ano, 2,5% no próximo e 3,1% em 2015. Os cálculos anteriores, publicados no primeiro semestre, haviam sido mais otimistas – 3% para 2013 e 3,6% para 2014. Mas essas estimativas são apenas uma parte – e a menos preocupante – da unanimidade em formação.
As coincidências mais importantes referem-se à qualidade da política econômica, ao ambiente de negócios e ao fiasco brasileiro no cenário internacional, sintetizado recentemente na capa da revista The Economist pela queda do Redentor-foguete. Na pesquisa da OCDE, as economias emergentes e em desenvolvimento continuam perdendo impulso, mas ainda devem crescer em média 4,5% em 2013, 5% em 2014 e 5,3% em 2015. A zona do euro continuará em marcha lenta, mas a recessão vai ficando para trás. Os Estados Unidos, mesmo com a trava nos gastos públicos, devem manter-se em aceleração.
Na sondagem de clima econômico, realizada pelo instituto alemão IFO em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), a projeção de crescimento para o Brasil nos próximos três a cinco anos ficou em 2,6%, número modestíssimo quando confrontado com aqueles previstos para Chile (3,8%), Colômbia (3,9%), Equador (4,1%) e Peru (5%). Na avaliação do clima econômico o Brasil aparece em 9.º lugar numa lista de 11 latino-americanos. Os principais problemas detectados nas entrevistas são três faltas: de confiança na política econômica, de competitividade internacional e de mão de obra qualificada.
Bem conhecidos no País, esses pontos negativos se tornaram lugares-comuns nas avaliações divulgadas por entidades internacionais públicas e privadas, como a OCDE, o Banco Mundial, o Fórum Econômico Mundial e as agências de classificação de risco.
A quase unanimidade internacional a respeito das más condições do País tem sido alimentada por informações e avaliações também de entidades oficiais brasileiras. O Banco Central (BC) tem chamado a atenção, há um bom tempo, para as limitações do lado da oferta, para o desajuste no mercado de trabalho, para a demanda de consumo perigosamente aquecida e para a inflação resistente, mas a cúpula do Executivo continua agindo como se o grande entrave ao crescimento brasileiro estivesse do lado dos consumidores. Como consequência, o governo tem queimado dezenas de bilhões de reais em estímulos fiscais ao mercado, com pouquíssima ou nenhuma resposta da indústria. Mesmo o dinheiro do Tesouro entregue aos bancos públicos para financiar o investimento produziu efeitos abaixo de pífios nos últimos anos. O valor investido pelo governo e pelo setor privado continua na vizinhança de 19% do produto interno bruto (PIB), uns cinco pontos abaixo da média latino-americana.
Os sinais de estagnação continuam pipocando. O mais recente é o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), considerado uma prévia do PIB. O número de setembro foi 0,01% inferior ao de agosto e 2,68% maior que o de um ano antes na série com ajuste sazonal. O índice do terceiro trimestre foi 0,12% inferior ao do segundo e o acumulado em 12 meses chegou a 2,48%.
A estimativa do PIB atualizada até o período de julho a setembro só deve ser divulgada no começo do próximo mês pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por enquanto, os levantamentos indicam um resultado muito fraco. Isso inclui o crescimento industrial de apenas 1,1% nos 12 meses até setembro, segundo os últimos dados do IBGE.
Enquanto isso, a alta dos preços ao consumidor continua em aceleração, mesmo com a acomodação dos preços no atacado (IPA). O IGP-10 de novembro subiu 0,44%, freado por seu componente de maior peso: o IPA, com elevação de 0,4%, avançou bem menos que no mês anterior (1,48%). Mas os preços ao consumidor, também cobertos pela pesquisa, aumentaram 0,61%, com variação de 5,44% em 12 meses. Em outubro haviam subido 0,33%. A nova apuração mostrou alta de preços em seis dos oito grupos de bens e serviços pesquisados, com destaque, novamente, para os serviços – mais um forte sinal de excesso de demanda.

Toda unanimidade pode ser burra, mas pode causar muito prejuízo antes de ser descoberta a burrice. A movimentação no mercado financeiro já tem mostrado os efeitos da desconfiança em relação à política fiscal, muito frouxa, e às possibilidades de crescimento econômico nos próximos anos. Além disso, restam dois motivos de preocupação. Primeiro: talvez haja algum exagero na tese de Nelson Rodrigues. Nesse caso, pelo menos algumas unanimidades poderão ser fundamentadas. Segundo: mesmo avaliações defeituosas podem motivar profecias autorrealizáveis. Pelo sim, pelo não, a presidente Dilma Rousseff deveria pensar nessas possibilidades, para tentar garantir nos próximos anos uma economia mais bonitinha e menos ordinária.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Governo meia boca, politica economica sem qualificacao - Rolf Kuntz

Parece que estamos condenados à mediocridade dos resultados, e à inconsistência das políticas econômicas.
Paulo Roberto de Almeida

O vilão da inflação é também o da estagnação

09 de novembro de 2013 | 2h 02
Rolf Kuntz - O Estado de S.Paulo
Esqueçam o tomate, a carne e as passagens aéreas. Não falem mal das leguminosas, dos hortigranjeiros ou dos salões de beleza. O vilão da inflação nunca será encontrado na lista de bens e serviços comprados pelos consumidores. A imagem usada pela imprensa é mera repetição de uma velha metáfora criada lá pelos anos 80 ou pouco antes. Ninguém deve entender literalmente essa figura de linguagem. O vilão existe, sim, mas é de outro tipo. É o mesmo da estagnação econômica, da irresponsabilidade fiscal e da erosão das contas externas. Em uma palavra, é o governo, embora esse nome pareça um tanto inadequado para designar a presidente Dilma Rousseff e a trupe espalhada por 39 ministérios, uma porção de estatais e outros órgãos da administração indireta.
Explicar e justificar uma sucessão de números muito ruins tem sido, há algum tempo, uma das principais atividades desse pessoal. Mas nenhuma retórica disfarça o péssimo desempenho fiscal de setembro, quando até o resultado primário foi negativo, ou a aceleração contínua da inflação mensal desde agosto. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, ainda classificou como bom resultado a alta de 0,57% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no mês passado. Não há nada de bom nesse número, nem se pode - ao contrário da afirmação do ministro - considerá-lo normal para esta época do ano.
Só se pode falar de normalidade em outro sentido: esgotado o efeito dos truques com as tarifas de transporte e as contas da energia, o recrudescimento da alta de preços foi absolutamente natural. Que mais poderia ocorrer, quando há um desajuste inegável entre a demanda, principalmente de consumo, e a capacidade de oferta da indústria nacional? Esse desajuste, é bom lembrar, é alimentado principalmente pela política oficial, marcada pela gastança e pelos estímulos ao consumo e reforçada pela expansão do crédito.
Sem esses fatores, nenhum aumento do preço do tomate ou da carne bovina produziria um impacto tão amplo sobre todos os mercados. Além disso, o efeito da depreciação cambial seria muito menos sensível, como tem sido em outras economias emergentes. Aquelas, como a da Índia, com problemas graves de inflação, têm também, como o Brasil, sérios desajustes fiscais e limitações importantes do lado da oferta.
O efeito da demanda é também evidente na evolução dos preços dos serviços, com alta de 0,52% em outubro e 8,74% em 12 meses. No caso dos bens, o aumento de preços tem sido atenuado, em parte, pela importação crescente, mas essa é uma solução inviável quando se trata de aluguel residencial, conserto de automóvel, consultas médicas ou serviços de manicures, para citar só alguns itens de uma lista muito ampla de atividades. O mesmo desequilíbrio entre a demanda crescente e a capacidade de oferta muito limitada reflete-se também no déficit comercial de US$ 1,83 bilhão acumulado de janeiro a outubro. Nesse período, o valor exportado, US$ 200,47 bilhões, foi 1,4% menor que o de um ano antes, pela média dos dias úteis, e o gasto com importação, US$ 202,3 bilhões, 8,8% maior.
O aumento das compras de petróleo e derivados - diferença de US$ 6,64 bilhões de um ano para outro - foi um fator importante, mas o total da importação foi determinado principalmente por outros fatores. A elevação de US$ 17,29 bilhões na despesa com bens estrangeiros refletiu acima de tudo os desajustes internos e especialmente a perda de eficiência da economia nacional.
Não há como disfarçar a redução da produtividade e do poder de competição, resultante principalmente de uma coleção de falhas da política econômica. A agropecuária ainda é produtiva em grau suficiente para compensar os problemas sistêmicos da economia brasileira e conquistar espaços no mercado internacional. A maior parte da indústria tem sido incapaz de vencer esses obstáculos. Os mais comentados são as deficiências de infraestrutura e a tributação irracional, mas a lista é ampla e um dos mais importantes, embora nem sempre lembrado, é o despreparo da mão de obra.
Há pouco tempo a Confederação Nacional da Indústria divulgou pesquisa sobre a escassez de trabalhadores qualificados para o setor de transformação. Outra sondagem, nesta semana, tornou o quadro ainda mais dramático: 74% das empresas de construção consultadas indicaram dificuldades para encontrar pessoal aproveitável. Quase todo esse grupo - 94% - reclamou da escassez de trabalhadores preparados até para serviços básicos, como os de pedreiro e ajudante.
Em outros tempos, a construção exercia, entre outras, a função estratégica de absorver pessoal de baixa qualificação. Isso mudou. As construtoras progrediram tecnologicamente e a educação ficou para trás, principalmente nos níveis fundamental e médio. Pessoas um pouco mais atentas apontaram a má escolha do objetivo, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu cuidar prioritariamente do acesso a faculdades, por meio de bolsas, cotas e maior oferta de vagas. O País paga caro, hoje, por essa decisão obviamente demagógica e eleitoreira.
Ninguém deve esperar grandes avanços na política educacional em curto prazo. No Rio Grande do Sul, nesta sexta-feira, a presidente Dilma Rousseff repetiu, como se fosse algo muito bom, uma ameaça muito ouvida nos últimos tempos: por meio dos recursos do petróleo, a educação será transformada no "caminho fundamental" do desenvolvimento. Essa é uma assustadora conversa mole. O Brasil precisa de educação há muito tempo, é preciso cuidar do assunto imediatamente e há recursos mais que suficientes para isso. Apostar no hipotético dinheiro do pré-sal equivale a encontrar mais uma desculpa vergonhosa para nada fazer de sério pela educação.
*Jornalista

domingo, 20 de outubro de 2013

Governo brasileiro: sorrindo enquanto o barco afunda - Rolf Kuntz

ROLF KUNTZ
O Estado de S.Paulo, 19/10/2013

Há uma notícia pior que a mistura de inflação em alta, economia quase parada, contas públicas piorando e balanço externo em deterioração. O fato mais assustador, mas nada surpreendente, é a tranquilidade, quase alegria, exibida pela presidente Dilma Rousseff e por sua solerte equipe econômica diante desse quadro. Este ano foi difícil para todos, disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega, na apresentação do oitavo balanço do PAC 2, o atual Programa de Aceleração do Crescimento. Foi realmente um ano difícil, mas ele parece haver esquecido alguns detalhes. A economia americana continuou em recuperação, com mais investimentos e mais exportações, a União Europeia começou a sair da recessão, o Japão continuou avançando e a maior parte dos emergentes, embora perdendo impulso, continuou crescendo mais que o Brasil. A economia brasileira, disse nesta semana o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, será uma das poucas, neste ano, com crescimento superior ao de 2012. Ora, alvíssaras! E quantas terão crescido 0,9% no ano passado, depois de alcançar o ritmo quase alucinante de 2,7% em 2011?

Se a presidente e seus ministros levam a sério o próprio discurso, ninguém deve esperar medidas mais produtivas nos próximos meses, até porque a campanha para a reeleição é o primeiro item da agenda presidencial. A inflação e as contas públicas estão absolutamente sob controle, disse a presidente em Salvador, na terça-feira.Pelos dados oficiais, essa inflação “controlada” continua em alta. O IPCA-15, prévia do Índice de Preços ao Consumidor Ampliado, subiu 0,27% em setembro e 0,48% em outubro, continuando a ascensão iniciada em agosto. Em julho havia ficado em 0,07%, mas no mês seguinte já avançou 0,16%.
Acabado o efeito dos truques com tarifas de ônibus e de eletricidade, o conjunto dos preços voltou ao curso normal numa economia com muita gastança pública, muita demanda privada de consumo e capacidade produtiva defasada. Além disso, a difusão dos aumentos de preços passou de 59,5% em setembro para 65,8% em outubro, no IPCA-15, segundo cálculo da Votorantim Corretora.
O indicador de difusão ─ porcentagem de itens com majoração de preços ─ é rotineiramente calculado pelas instituições do mercado financeiro. É um importante sintoma da vulnerabilidade dos vários segmentos do mercado às pressões inflacionárias. Quando a alta se espalha por quase dois terços dos preços e a alta geral acumulada em 12 meses, 5,75%, continua longe da meta, discutir se a inflação está controlada ou descontrolada é um exercício de escassa utilidade. Além disso, o resultado em 12 meses deve continuar acima da meta de 4,5% nos próximos dois anos, até o terceiro trimestre de 2015, segundo projeção do Banco Central (BC) repetida na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária.
Além dessa ata, o BC divulgou também, nesta semana, seu índice de atividade econômica, o IBC-Br, uma espécie de prévia do produto interno bruto (PIB). Esse indicador subiu apenas 0,08% em agosto, depois de ter caído 0,33% em julho. Mesmo com um resultado melhor em setembro, a comparação do terceiro com o segundo trimestre deverá apresentar uma variação muito próxima de zero, talvez negativa, segundo a maior parte das projeções do mercado.
Esse e outros números parecem apontar, passados três quartos do ano, um crescimento pífio em 2013, embora maior que o do ano passado. O ministro da Fazenda já declarou aceitar a projeção de 2,5%, formulada pelo BC e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
Mas o FMI, ao contrário do governo brasileiro, projeta a mesma taxa também para 2014 e uma expansão anual média, nos próximos cinco anos, de 3,5%, se os investimentos em infraestrutura começarem a deslanchar. As previsões são melhores para a maior parte dos emergentes da Ásia, da Europa ex-socialista e da América Latina. Quase todos, além disso, continuarão com inflação menor que a do Brasil.
O crescimento brasileiro, garante o ministro da Fazenda, será puxado, a partir deste ano, principalmente pelos investimentos. Mas, como ele mesmo reconhece, o valor investido em equipamentos produtivos, em instalações e em infraestrutura tem continuado próximo de 18% do PIB, poderá subir um pouco este ano e caminhar – esta é a meta oficial – para 24% dentro de alguns anos. Ninguém sabe quando essa proporção será alcançada, Quando isso ocorrer, o Brasil ainda investirá menos, proporcionalmente, do que investem hoje as economias mais dinâmicas da América do Sul.
Se esse avanço depender do governo, o caminho será muito longo, Até setembro o Tesouro investiu 35,7% dos R$ 91,2 bilhões previstos no Orçamento federal, valor menor que o do ano passado, descontada a inflação. A infraestrutura continua muito deficiente e o setor privado, por muitas razões, também tem investido menos que o necessário.
A piora da balança comercial é uma das consequências. O saldo oficial de 2013 até a segunda semana de outubro foi um superávit de US$ 964 milhões. Na semana anterior, a exportação fictícia de uma plataforma de petróleo havia adicionado US$ 1,9 bilhão à receita. Essa e outras plataformas contabilizadas neste ano jamais foram embarcadas. A operação tem finalidade tributária, mas é contada como receita.

A presidente e seus auxiliares costumam insistir, também, no discurso da boa gestão fiscal. Podem convencer quem ignora a contabilidade criativa e as ligações perigosas do Tesouro com os bancos federais – dados conhecidos internacionalmente e objetos de gozação dentro e fora do País. Pelo menos isto se pode dizer a favor da retórica e dos truques oficiais: são divertidos.

sábado, 21 de setembro de 2013

Governo promove e estimula a inflacao - Rolf Kuntz

O principal responsável pela inflação no Brasil não é o tomate, nem o petróleo, nem o câmbio. Tem nome e endereço: chama-se governo brasileiro e mora (pelo menos enquanto durar este) no Palácio do Planalto, e sua obra nefasta em FAVOR da inflação tem a ajuda de keynesianos de botequim, que estão espalhados pela Esplanada dos ministérios, com o apoio entusiasta de milhares de outros keynesianos de araque espalhados pelas faculdades de economia do Brasil afora.
O governo indexou a economia, prometendo aumentos do salário além e acima das taxas de inflação e dos ganhos de produtividade (que são poucos, é verdade, mas estimados pelo governo generosamente e de forma geral para todos os setores da economia, independentemente do seu comportamento efetivo).
O governo concede reajustes tarifários para suas empresas monopolistas e outros carteis privados, em lugar de obrigar as empresas a reduzir preços para os consumidores, com base em ganhos de produtividade, que toda empresa sempre deve buscar (e o governo também).
O governo continua estimulando o consumo, pela via do crédito e outros subsídios pornográficos, em lugar de estimular o investimento e a produção.
O governo taxa demasiadamente, obrigando as empresas a remarcar preços para poder conservar margens de lucro.
O governo protege a economia exageradamente, permitindo que os industriais domésticos cobrem sobrepreços dos consumidores obrigados.
Enfim, o governo gasta demais consigo mesmo, com seus mandarins e marajás, com suas dezenas de milhares de aspones que contribuem para o partido totalitário, com seu intervencionismo nefasto na economia, com suas bolsas-isso e bolsas-aquilo.
O governo é o principal promotor da inflação no Brasil. E o principal violador da legalidade constitucional.
O governo é o principal obstáculo ao crescimento econômico, e a uma vida normal, sem corrupção...
Pronto, já disse o que tinha a dizer, agora podem ficar com o artigo.
Paulo Roberto de Almeida

De novo uma gravidez pequena, mas nem tanto

ROLF KUNTZ - O Estado de S.Paulo, 21/09/2013

A velha comparação da inflação pequena com a pequena gravidez pode ser tão detestável quanto qualquer lugar-comum, mas lugares-comuns podem ser didáticos. Além disso, a inflação mensal brasileira, por enquanto próxima de 0,3% e com tendência de alta, só é pequena para um país acostumado a taxas muito maiores que as do mundo civilizado e, de modo especial, que as de seus concorrentes. Mas os sinais da gravidez são cada vez mais visíveis. A inflação volta a mover-se com vigor crescente, depois de uma breve e enganadora acomodação dos índices. Todos os principais indicadores pioraram nos últimos dois meses, enquanto a presidente Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, continuaram alardeando a contenção da alta de preços.
O sinal de alerta mais recente veio com o IPCA-15, prévia do indicador oficial, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Este é medido entre o começo e o fim de cada mês. O outro, entre o dia 16 de um mês e o dia 15 do seguinte. O IPCA-15, divulgado nesta sexta-feira, havia ficado quase estável em julho, com variação de apenas 0,07%. A taxa mais que dobrou em agosto (0,16%) e continuou a aumentar em setembro, quando atingiu 0,27%. A acomodação no meio do ano foi enganadora, para quem gosta de ser enganado, é claro, porque resultou de pequenos truques de um governo empenhado em jogadas eleitorais.
Durou pouco o efeito, nada mais que ilusório, da redução política das tarifas de transporte urbano. Em agosto, ainda em consequência desse lance, o custo dos transportes incluído no IPCA-15 recuou 0,3% Em setembro, cresceu 0,3%, apesar da queda de preços do etanol e da gasolina. O custo da alimentação subiu 0,04%, bem pouco, mas havia diminuído 0,09% no período anterior. A alta poderia ter sido maior, sem o sensível barateamento de hortaliças. Mas o ponto mais importante para a avaliação da política oficial é outro.
Não tem sentido cuidar da inflação como se a alta geral de preços fosse ocasionada por um ou outro aumento localizado. Há poucas imagens mais enganadoras que a do famigerado vilão da inflação. Num mês é o preço do tomate, em outro, o do petróleo, num terceiro, o conjunto das cotações internacionais dos produtos agrícolas. De vez em quando o culpado é o câmbio, um preço com potencial para afetar muitos outros.
Esse tipo de palavrório pode dar colorido ao noticiário dos meios de comunicação, mas ninguém deveria tomá-lo ao pé da letra. Todos os países, na maior parte em desenvolvimento, foram afetados pela alta das cotações internacionais dos alimentos, nos últimos anos, assim como foram atingidos, na maior parte de 2013, pelo recuo desses preços. Mas nem todos enfrentaram inflação tão alta quanto a brasileira, embora, em muitos casos, a alimentação seja um componente importante do custo de vida.
No Brasil, a escalação dos vilões tem mudado e a inflação nunca desapareceu. Por isso mesmo voltou a ganhar força, depois das intervenções eleitoreiras do governo, O índice de preços por atacado, componente mais importante do IGP-10, da Fundação Getúlio Vargas, aumentou 1,46% em setembro, muito mais velozmente que no mês anterior, quando havia subido 0,19%.
Os produtos agropecuários haviam ficado 0,45% mais baratos em agosto e aumentaram 1,83% em setembro. Os bens industriais também ficaram bem mais caros, com alta de 1,32%. Ainda no atacado, os preços dos bens finais diminuíram 0,02%, mas, excluídos alimentos in natura e combustíveis para consumo, sobrou uma alta de 0,63%, nada desprezível.
Nem sempre esses aumentos chegam ao consumidor final. Isso depende das condições da demanda - fatores como o nível de renda, a oferta de crédito, o grau de resistência aos aumentos, a possibilidade de substituição de bens ou serviços e, naturalmente, as expectativas dos indivíduos e das famílias. A taxa de juros e o controle do crédito são os principais instrumentos de administração da demanda, no Brasil e em muitos países, mas o gasto público também é um componente importante desse quadro. Se houver alguma dúvida quanto à importância da demanda, bastará consultar o encarecimento dos serviços, 0,61% em agosto e 0,62% em setembro, no IPCA-15. Além disso, houve aceleração em todos os núcleos calculados pelos economistas para eliminar a influência de componentes mais instáveis.
No fim de agosto de 2011 o Banco Central (BC) iniciou uma baixa de juros e manteve essa política até abril deste ano, embora a inflação tenha sido muito alta durante todo esse tempo e até superado o limite anual de 6,5%. Além disso, a expansão do crédito continuou - e ainda continua. O governo jamais conteve a gastança e ainda estimulou o consumo com redução de impostos sobre alguns produtos, sem cuidar do aumento da produção interna.
Sem as famigeradas intervenções pontuais - contenção dos preços dos combustíveis e redução das tarifas de transportes e de energia - os números teriam sido muito piores. Todos esses fatos tornaram ainda mais grotesca a tentativa, repetida várias vezes, de atribuir a inflação brasileira à alta das cotações internacionais dos produtos agrícolas.
A única demonstração de juízo nos últimos meses foi a elevação de juros iniciada em abril pelo BC. O resto do quadro interno pouco mudou, exceto por alguma retração dos consumidores e pela redução do emprego no setor industrial.
Mas o governo mostra-se pouco preocupado e a presidente repete sua ladainha. Segundo ela, a inflação continuará dentro da meta. Mas isso vale para qualquer resultado até 6,5% ao ano, o limite de tolerância para situações excepcionais. A meta, em sentido próprio, é 4,5%, um alvo pouco ambicioso. Nem esse alvo deve ser atingido até o segundo trimestre de 2015, segundo o BC.   
*JORNALISTA

sábado, 17 de agosto de 2013

Governo: um PIBao de erros, um PIBinho de realizacoes: o ministerio da incompetencia - Rolf Kuntz

Um governo preso numa teia de erros

O Estado de S. Paulo, 17 de agosto de 2013

Rolf Kuntz*

Trem-bala, conta de luz, câmbio, Copa, inflação, pré-sal, gasolina, orçamento - por onde começar? Com pouco mais de um ano de mandato pela frente, a presidente Dilma Rousseff só realizará alguma coisa se romper uma teia de trapalhadas construída por ela mesma, com a colaboração de um dos Ministérios mais incompetentes da História e com material em parte próprio e em parte deixado por seu antecessor. Algumas decisões serão especialmente complicadas. Se continuar reprimindo os preços dos combustíveis, com ajustes insuficientes, agravará a situação da Petrobrás, já complicada por erros acumulados em vários anos - incluída a obrigação de controlar pelo menos 30% dos poços de petróleo do pré-sal.
Se atualizar os preços da gasolina e do diesel, as pressões inflacionárias ficarão mais soltas. Isso será melhor que represar os índices, mas será preciso apertar e talvez ampliar a política anti-inflacionária. Outras decisões serão tecnicamente mais fáceis, como o abandono do projeto do trem-bala. Mas falta saber se o governo estará politicamente disposto a admitir o recuo e reconhecer a acumulação de custos inúteis. Mesmo sem sair do papel, o projeto custará pelo menos R$ 1 bilhão até o próximo ano, somadas os valores acumulados a partir de 2005 e o do projeto executivo, segundo informou O Globo.
O trem-bala é só um exemplo de objetivos mal concebidos, mal planejados e perseguidos com invulgar incompetência, A Copa do Mundo, com projetos em atraso e custos multiplicados, talvez seja o caso mais visível de um compromisso assumido de forma irresponsável e sem avaliação de prioridades.
Parte da herança recebida pela presidente Dilma Rousseff, esse compromisso, além de impor despesas crescentes e graves constrangimentos ao governo, limita seu espaço de ação. A menos de um ano do começo dos jogos, um recuo parece impensável. Para garantir a conclusão pelo menos das obras mais importantes o governo terá de intervir com dinheiro. Quando o prazo ficar muito apertado, será inútil jogar a responsabilidade sobre os parceiros privados. Será preciso gastar e ampliar o buraco nas contas públicas.
Essas contas já vão muito mal e tendem a piorar nos próximos 12 meses também por causa das eleições. Mas o governo, até agora, tem exibido muito mais preocupação com a aparência do que com a situação efetiva de suas finanças. O quadro tem piorado com o uso crescente de maquiagem para enfeitar o quadro fiscal e os números da inflação.
Essa maquiagem, a mais cara e menos eficiente do mundo, tem borrado os limites das políticas fiscal, de crédito e de combate à inflação. Um dos grandes retrocessos dos últimos anos tem sido a crescente promiscuidade entre o Tesouro e os bancos federais, principalmente com o BNDES. Recursos fiscais também têm sido usados na maquiagem de preços. Para disfarçar os custos, em vez de combatê-los de forma efetiva, o governo criou uma embrulhada com as empresas de energia elétrica.
As tarifas foram contidas e isso se refletiu por algum tempo nos índices de inflação, mas a conta para o governo está saindo bem maior do que as autoridades haviam calculado. O custo para o Tesouro, segundo informou o Estado, pode chegar a R$ 17 bilhões, o dobro do valor estimado pelas autoridades no começo do ano. O novo cálculo, mais completo, é atribuído ao consultor Mário Veiga, um especialista em energia. Só esse acréscimo anularia 85% do corte de R$ 10 bilhões prometido na última revisão do Orçamento - se esse corte fosse para valer.
A isso ainda seria preciso somar, entre outros itens, os R$ 6 bilhões anunciados pelo governo para emendas orçamentárias, principalmente, é claro, de parlamentares aliados. Mas os desembolsos com as emendas ficarão maiores e mais difíceis de comprimir, nos próximos anos, se o projeto de orçamento impositivo, já aprovado na Câmara, passar pela etapa final, Os vereadores federais, também conhecidos como congressistas, poderão mais facilmente realizar sua política paroquial, mais uma forma de pulverizar e desperdiçar recursos do Tesouro Nacional.
Sem apoio firme no Congresso, sem competência gerencial, sem ministros capazes de planejar e de executar políticas e sem coragem de reconhecer e de enfrentar os desafios mais sérios, o governo da presidente Dilma Rousseff criou e deixou acumular-se a maior parte de seus problemas, Por mais de dois anos insistiu na prioridade à expansão do consumo, sem cuidar da eficiência econômica e da capacidade produtiva. Foi incapaz de reconhecer o esgotamento da política de ampliação do mercado interno - um objetivo importante, mas insuficiente quando tratado de forma isolada.
Inflação, descompasso entre importações e exportações e erosão das contas externas foram as consequências mais visíveis desse erro. Em vez de atacar a inflação, o governo manteve a gastança, tentou maquiar os preços e ainda promoveu de forma voluntarista uma prolongada redução dos juros.
Uma política mais prudente, mais corajosa e mais voltada para o longo prazo teria tornado a economia nacional mais eficiente e menos dependente do câmbio para a competição global. Ao mesmo tempo, uma inflação mais baixa, como em outras economias emergentes, tornaria mais fácil absorver os efeitos da depreciação do real.
Como toda a política foi errada, também nesse caso a escolha é muito custosa: o País fica mais competitivo com o dólar bem mais caro, mas o combate à inflação, nesse caso, tem de ser mais duro.
Não há decisão fácil e confortável num ambiente de erros acumulados por muito tempo. Com a aproximação das eleições, quantos erros o governo estará disposto a atacar seriamente, em vez de apenas continuar disfarçando?   * Jornalista

domingo, 11 de agosto de 2013

Politica economica para ETs e outros seres bizarros - Rolf Kuntz

Os seres bizarros, na verdade, são os próprios formuladores (???) e executores (!!!) dessa coisa que pretende se passar por política econômica.
Começa pelo fato de se apropriarem de fenômenos naturais como se fosse de sua feitura. Por exemplo: como a inflação do mês foi só 0,03%, o pessoal bizarro começa festejar e a dançar, proclamando gloriosamente: "Viram, viram?" Como aqueles índios que fazem dança da chuva, acreditando realmente ter tal poder.
Quanto ao ufódromo, mencionado ao final da matéria, ele na verdade já existe, sob a forma de um museu para o ET de Varginha no qual o governo federal já colocou 1 milhão e hoje está abandonado inacabado, como aliás já postado aqui.
Paulo Roberto de Almeida

Falta saber se o ET de Varginha crê no governo

Rolf Kuntz
O Estado de S.Paulo,10/08/2013

É quase uma crueldade pedir à presidente Dilma Rousseff a substituição do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Sem ser almas irmãs, são pelo menos espíritos complementares. Ambos atribuem a alta da inflação nos primeiros meses deste ano à quebra da safra americana. Nenhuma relação com a demanda, disse recentemente o ministro. A presidente reafirmou a tese da seca nos Estados Unidos na quarta-feira, ao comentar triunfalmente o resultado de julho, uma alta de apenas 0,03% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Onde encontrar um parceiro tão adequado para esse dueto?
Talvez no Ministério da Educação, mas essa hipótese tem sido negada no Palácio do Planalto. Outra possibilidade seria chamar o ET de Varginha, merecedor do "maior respeito", segundo a presidente. Mas seria preciso saber, em primeiro lugar, se ele acredita na existência do governo instalado em Brasília ou se o considera mais uma alucinação coletiva ou produto da crendice popular. Mas todos esses detalhes, neste momento, são pouco importantes. Quarta-feira, esta é a grande notícia, foi um dia glorioso para a presidente e para Mantega.
A inflação, disseram os dois, está e sempre esteve sob controle, sem prejudicar a economia. O ministro, no entanto, foi mais cauteloso e admitiu aumentos de preços mais acelerados nos próximos meses - "como em todos os anos", segundo ele. Com a mesma prudência, evitou previsões mais detalhadas. Quando lhe perguntaram se a taxa acumulada no fim do ano será menor que a do ano passado, quase tirou o time de campo. "Não sei, provavelmente sim", foi a resposta registrada pela Agência Estado.
Sem a seca americana e com boa oferta de alimentos no Brasil, fica difícil entender essa hesitação. Talvez ele tenha lido, num momento de folga, as projeções de mercado mantidas no site do Banco Central (BC). Na sexta-feira de manhã o BC ainda registrava a estimativa para o mês de julho: 0,01%, um número pouco melhor que o divulgado oficialmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os números projetados para os meses seguintes crescem de forma quase contínua: 0,26% em agosto, 0,43% em setembro, 0,55% em outubro, 0,55% em novembro e 0,67% em dezembro.
Para o ano a série indica uma alta acumulada de 5,72%, bem pouco inferior à do ano passado, 5,84%. Talvez se possa falar em convergência para a meta, de 4,5%, mas o avanço é lento e, nesse ritmo, o percurso dificilmente será concluído nos 12 meses seguintes.
Mas o governo parece continuar satisfeito com acumulados anuais abaixo de 6,5%. Sua meta efetiva é qualquer ponto na faixa de 4,5% a 6,5%, um detalhe traído mais de uma vez pelo próprio ministro em suas declarações. Politicamente é este o ponto mais importante: a inflação estará "bastante sob controle", segundo a linguagem presidencial, enquanto as taxas de 12 meses ficarem nessa área. O "compromisso com a estabilidade", mencionado mais uma vez pela presidente na quarta-feira, tem como referência esse limite.
É um compromisso frouxo, próprio de quem pouco se incomoda com a alta persistente dos preços. Em dez anos, uma inflação anual média de 4,5% resulta numa taxa acumulada de 55,3%. Uma inflação de 2,5%, mais próxima das metas adotadas nos países desenvolvidos e em vários emergentes, produziria uma alta de preços de 28% no mesmo período. Uma das consequências seria um considerável desajuste cambial no País com taxa mais elevada.
O ministro Mantega falou muitas vezes em guerra cambial, nos últimos cinco anos. A presidente Dilma Rousseff acusou os governos dos países desenvolvidos de criarem um tsunami monetário e com isso afetarem o câmbio e o poder de competição dos emergentes. Ambos seriam muito mais realistas, e mais eficientes na política econômica, se dessem mais atenção à diferença entre as taxas de inflação no Brasil e em outros países.
Mas isso parece muito improvável. As pressões inflacionárias, segundo o governo, vêm de fora, juntamente com a crise causadora, também segundo a versão do Planalto, da estagnação brasileira. Além disso, a meta de 4,5% foi estendida até 2015, com a margem de tolerância de 2 pontos para mais ou para menos (na prática, para mais). Um resultado anual de 6,4% continuará sendo alardeado como prova do compromisso com a estabilidade.
Tudo isso combina perfeitamente com o desleixo fiscal. Como os truques de maquiagem estão cada vez mais evidentes, o governo tem desistido, com jeito de criança flagrada em molecagem, de alguns expedientes escandalosos, como a antecipação de recebíveis da Itaipu Binacional. É cada vez mais difícil encontrar meios para entregar no fim do ano um superávit primário de 2,3% do produto interno bruto, já bem menor que a meta inicial de 3,1%. Enquanto isso, continua a política fiscal expansionista apontada mais de uma vez pelo pessoal do BC nas avaliações dos fatores inflacionários.
Sem melhora na gestão das finanças públicas - nem corte de gastos, nem aumento da eficiência no uso do dinheiro -, mantém-se uma das causas principais do desarranjo dos preços. As possíveis pressões derivadas do aumento do dólar apenas complicarão um quadro já bastante ruim.
A tarefa de frear a inflação continuará entregue aos formuladores da política monetária. Nenhum diretor do BC entenderá a taxa de 0,03% de julho, explicável basicamente pela redução política das tarifas de transportes e pelo recuo temporário dos preços dos alimentos, como um sinal de vitória. Muito mais fácil será declarar respeito ao ET de Varginha e abrir licitação para um ufódromo. Uma nova estatal poderá cuidar do assunto. Em cinco anos as obras estarão incompletas, talvez nem começadas, mas o orçamento terá aumentado barbaramente.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Comercio exterior, na ladeira declinante - Rolf Kuntz

No comércio exterior, o buraco dos erros políticos

Rolf Kuntz
O Estado de S. Paulo, 03/08/2013

O Brasil só precisa conseguir um superávit comercial de US$ 4,99 bilhões em cinco meses – média mensal de US$ 998 milhões – para encerrar o ano com o saldo zerado, o pior em 13 anos, mas, ainda assim, muito melhor que o acumulado nos últimos sete meses. Nada mais fácil, se os preços e o volume de vendas de commodities ajudarem, se a indústria se tomar mais competitiva e os ventos forem mais favoráveis no mercado internacional. O entusiasmo criado pelos últimos números da indústria, com crescimento de 1,9% de maio para junho, combina com essa aposta. Olhados com um pouco mais de atenção, no entanto, os dados justificam alguma cautela: a produção industrial está apenas voltando aos níveis de 2011. Não se deve esquecer o tombo do ano passado. Da mesma forma, convém olhar com mais cuidado as cifras da balança comercial. São mais feias do que podem parecer à primeira vista.
O resultado oficial de janeiro a julho inclui, na coluna da receita, US$ 2,81 bilhões de exportações fictícias de plataformas para extração de petróleo. Foram US$ 380 milhões só no mês passado. Em sete, meses, esse tipo de operação ficou no segundo lugar na lista de vendas de manufaturados. Situou-se logo abaixo de automóveis de passageiros (US$ 2,99 bilhões) e logo acima de óleos combustíveis (US$ 2,1 bilhões) e de autopeças (US$ 2,05 bilhões). Só há um problema nessa classificação. O Brasil de fato produz e exporta veículos, óleos, autopeças e aviões (US$ 1,81 bilhão), mas as plataformas são contabilizadas sem necessidade de embarque e sem a realização efetiva de uma operação comercial. Sua “exportação” é apenas uma formalidade para reduzir a tributação sobre equipamentos do setor petrolífero. A operação é legal, mas sua inclusão na balança de comércio distorce as contas. Sem essa receita fictícia, o rombo teria chegado a US$ 7,8 bilhões.
O país, segundo a secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Tatiana Prazeres, ainda poderá ter um saldo positivo este ano, embora muito menor, certamente, que o de 2012 (US$ 19,41 bilhões). O resultado é em grande parte explicável, disse a secretária, pelas operações com petróleo e derivados. Foi um déficit de US$ 15,44 bilhões, 270,31% maior que o de um ano antes. A observação pode parecer razoável, mas o problema da conta petróleo está longe de ser acidental ou passageiro. No ano passado, o rombo, no mesmo período, havia sido 164,26% maior que o de janeiro a julho de 2011. Também isso é conseqüência da política econômica.
O cardápio da política econômica permanece quase invariável com pequenas mudanças para pior


As importações de combustíveis e lubrificantes têm aumentado porque a Petrobrás deixou de produzir petróleo e derivados em volumes suficientes. Isso resulta do estilo de gestão adotado no governo anterior, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva subordinou a estatal a seus objetivos políticos. A alardeada autossuficiência nunca foi muito além do marketing presidencial.
O acúmulo de erros minou as finanças e a capacidade produtiva do grupo. Houve investimentos mal planejados, prioridades mal escolhidas, controle de preços e uso da empresa como instrumento de uma política industrial voluntarista. As correções iniciadas pela atual administração tiveram efeitos até agora limitados. A política de preços, apenas atenuada nos últimos tempos, causou danos enormes à produção de etanol, porque o álcool se tomou proporcionalmente mais caro.
O mau estado das contas externas mais uma vez reflete os grandes erros da política econômica. As exportações de produtos básicos e semimanufaturados somaram 60,2% da receita comercial acumulada nos sete meses. A participação dos manufaturados cresceu ligeiramente, de 36,8% para 37,5% (o resto da conta corresponde às chamadas operações especiais). Mais uma vez, portanto, o Brasil se caracterizou como fornecedor de commodities e pagou um preço pesado por isso. Pela média diária, houve redução de 1,6% na receita dos básicos e de 6% na de semimanufaturados.
Esse efeito foi particularmente sensível em julho, quando os preços de 12 das 22 principais commodities foram menores que os de um ano antes. Os valores desses bens são normalmente mais afetados pelas oscilações da demanda que os preços dos manufaturados. Mas a diplomacia comercial, ao desprezar acordos com os mercados mais desenvolvidos, tornou o Brasil mais dependente da América Latina para as vendas desses produtos.
Também na região os produtores chineses vêm tomando espaços dos brasileiros. Nada parece mais natural. Basta levar em conta a baixa qualidade dos acordos comerciais firmados até com os vizinhos e as condições de competição, minadas pelo encarecimento da produção, pelo alto custo do investimento e pelo ambiente -incluído o sistema de transportes – altamente desfavorável aos negócios. A atenção maior ao consumo que à produção afeta a balança comercial desde 2007, quando as importações começaram a crescer mais que as exportações.
Nem o aparente arrefecimento da inflação justifica maior otimismo. Com a pioradas contas públicas, pressões inflacionárias continuarão forçando o Banco Central a manter juros elevados. Mudanças no cenário global complicam o quadro. A alta do dólar é mais um fator de elevação de preços e o financiamento externo tende a ficar mais difícil.
Enquanto isso, o cardápio da política econômica permanece quase invariável com pequenas mudanças para pior. Enquanto ministros da área econômica encenam um corte de gastos de R$ 10 bilhões – tesourada no vento, na maior parte -, a presidente se dispõe a liberar R$ 6 bilhões para amansar uma base parlamentar indócil. A eleição continua dominando as atenções do governo, como se todo o resto, incluída uma economia de uns R$ 4,5 trilhões (cerca de US$ 2,2 trilhões), pudesse esperar.

domingo, 28 de julho de 2013

Pai e filha (com alguma perda pelo caminho...) - Rolf Kuntz

ROLF KUNTZ
O Estado de S.Paulo, 27/07/2013

Nenhum governante, diz o bom senso, pode ter desempenho melhor que o de seu governo. No caso do Brasil, trata-se de uma administração fracassada, com dois anos e meio de estagnação econômica, inflação alta, contas públicas em mau estado, contas externas em deterioração e resultados gerais muito inferiores aos de outros latino-americanos.

As possibilidades de melhora até o fim do mandato parecem muito escassas. Mas o senso comum dos brasileiros tem algumas peculiaridades notáveis. Parte substancial dos cidadãos considera a presidente Dilma Rousseff melhor que seu pífio governo. Enquanto só 31% avaliam o governo como ótimo ou bom, 45% aprovam o desempenho da presidente. Os dados são da última pesquisa CNI-Ibope e confirmam, de modo geral, as tendências indicadas em sondagens recentes.
Quanto à avaliação da presidente, é importante ressaltar o detalhe: a pergunta é sobre sua maneira de governar. Não se trata de sua pessoa. O entrevistado poderia considerá-la honesta, esforçada, gentilíssima, simpática e movida pelas melhores intenções, mas frustrada em seu empenho por divindades invejosas. O Olimpo é um ninho de maldades. Mas a história é outra, e aí está o dado intrigante. O modo de agir da chefe de governo é avaliado mais favoravelmente que a ação do próprio governo, embora ela seja responsável pela escolha dos ministros e, como todos sabem, centralizadora, mandona e habituada a distribuir broncas e a maltratar seus subordinados.
Essa notável dicotomia entre o presidente e a administração federal pode parecer misteriosa, mas é um velho componente da política nacional. Para milhões de brasileiros, houve sempre uma distância imensa entre a figura de Getúlio e as práticas de seus subordinados. O presidente João Figueiredo sempre foi mais popular que seu governo, embora seu período tenha sido marcado por uma recessão pavorosa, com muito desemprego, empobrecimento e fome. Nessa fase, muitas famílias só conseguiram consumir alguma proteína de origem animal, de vez em quando, porque supermercados passaram a vender separadamente asas de frango. Mas o presidente nunca foi tão mal avaliado quanto qualquer de seus ministros.
Apesar da estranha separação entre o Palácio do Planalto e os ministérios, ainda mais estranha no caso de uma presidente centralizadora, os brasileiros parecem ter noções claras de alguns dos principais defeitos da administração. A avaliação dos impostos e do uso do dinheiro público é inequívoca. Os entrevistados deveriam dizer se, em sua opinião, “o governo já arrecada muito e não precisa aumentar mais os impostos para melhorar os serviços públicos”. Essa dupla afirmação foi classificada como total ou parcialmente verdadeira por 87% dos consultados. Para 82%, “a baixa qualidade dos serviços públicos deve-se mais à má utilização dos recursos públicos do que à falta deles”. Para 91%, os impostos são elevados ou muito elevados.
A presidente discorda. Na quinta-feira, quando a CNI divulgou a nova pesquisa realizada pelo Ibope, o Diário Oficial registrou o veto ao projeto de extinção da multa adicional de 10% do FGTS nos casos de demissão sem justa causa. Segundo a mensagem presidencial, os parlamentares deixaram de indicar fontes para compensar a perda de cerca de R$ 3 bilhões e, além disso, a falta desse dinheiro forçaria o governo a reduzir investimentos em infraestrutura e no programa habitacional.
As duas alegações são furadas. A multa adicional, paga diretamente ao governo, foi criada para compensar o custo de esqueletos fiscais deixados pelos Planos Verão e Collor 1. Essa função, segundo informou há um ano e meio a Caixa Econômica, gestora do fundo, estaria concluída em julho do ano passado. Não tem sentido, portanto, cobrar dos congressistas a indicação de como compensar a “perda”. Em segundo lugar, o governo jamais deveria ter tratado essa receita como recurso permanente.
Esse erro, uma velha tendência da administração brasileira, torna-se mais forte num governo propenso à confusão na área fiscal. A maior parte dos cidadãos acompanha muito de longe as aventuras da administração. Acaba sentindo, depois de algum tempo, os efeitos dos erros acumulados, como os problemas de saúde, segurança e educação. Nenhuma das grandes questões apontadas pelos entrevistados é nova na imprensa independente.
A comparação entre o governo atual e o do presidente Lula é outra aparente esquisitice revelada pela pesquisa. Para 46% dos entrevistados, o governo da presidente Dilma Rousseff é pior que o do antecessor. Em junho, 25% dos consultados haviam expressado essa opinião. Essa avaliação seria mantida, se as pessoas se dispusessem a pensar alguns minutos?
Afinal, o presidente Lula quase se limitou a aproveitar, durante a maior parte de seus oito anos, da herança de reformas deixada pela administração anterior e de um quadro internacional muito favorável até o fim de 2008. Elevou o salário mínimo, transferiu renda com recursos públicos e ampliou o mercado interno, sem nada ter feito para fortalecer a capacidade produtiva do país.

Sua melhor realização foi também a mais fácil. Ele jamais enfrentou para valer as tarefas mais complicadas. Além disso, rejeitou a proposta do ministro Antônio Palocci de iniciar um programa sério de equilíbrio das contas públicas. A presidente Dilma Rousseff apenas manteve o estilo de seu antecessor. Ao insistir nesse caminho, acelerou a desorganização das contas federais, alimentou a inflação e deixou a economia estagnar-se, porque as fontes internas e externas de dinamismo estavam esgotadas. “Dilma não é mais do que uma extensão da gente”, disse Lula a companheiros, na terça-feira, num aparente impulso de veracidade. Não faz sentido, neste caso, avaliar a extensão sem levar em conta sua fidelidade à origem.

sábado, 20 de julho de 2013

Sem agenda economica, sem agenda, simplesmente - Editorial economico Estadao

Um governo atolado vai desemperrar a economia?

Rolf Kuntz
O Estado de S.Paulo, 20/07/2013

Tiririca estava errado. No Brasil, sempre dá para piorar, como têm provado com notável diligência a impropriamente chamada classe política e o governo da presidente Dilma Rousseff. Qual a distância, hoje, entre otimismo e pessimismo nas previsões econômicas? A economia brasileira crescerá em média 3,2% ao ano entre 2014 e 2018, segundo a nova bola de cristal operada em parceria pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e pela instituição de pesquisas The Conference Board, o indicador antecedente composto. No discurso oficial, um crescimento inferior a 4% ou 5% ao ano jamais foi admitido, até há pouco tempo, como padrão normal para o Brasil. Poderia ocorrer como consequência de choques externos ou em fases de ajuste muito forte, mas sempre como situação excepcional. Hoje, até uma expansão pouco superior a 3% por vários anos pode parecer improvável, quando se considera a crise de produtividade da economia nacional.
Não há cálculo seguro do potencial de crescimento do País, mas os números estimados vêm caindo nos últimos anos - da faixa de 3,5% a 4% até há pouco tempo para algo entre 2,5% e 3% nas últimas avaliações. O número de 2,5% foi indicado esta semana pela economista Alessandra Ribeiro, da consultoria Tendências, segundo o jornal Valor.
Calcular o produto potencial pode ser muito complicado, mas, apesar disso, economistas e formuladores de políticas têm excelentes motivos para levar em conta esse conceito. A existência de limites tem sido mostrada amplamente pela experiência. Pode-se ultrapassá-los de vez em quando, mas insistir na aventura acaba normalmente em desastre. Inflação e desequilíbrio externo são consequências bem conhecidas e muito frequentes na História do Brasil.
Inflação e desajuste crescente no balanço de pagamentos já estão presentes no cenário brasileiro, apesar do crescimento pífio dos últimos dois anos e meio. Ninguém deveria iludir-se com o recuo de alguns índices desde o mês passado. A redução dos preços dos alimentos tem efeito passageiro na formação dos indicadores, assim como a redução das tarifas de transporte coletivo. Grandes fatores inflacionários, como o desarranjo fiscal, a expansão do crédito e os aumentos salariais acima dos ganhos de produtividade, foram apontados, mais uma vez, na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada na quinta-feira, A ata destoou claramente do discurso presidencial do dia anterior.
Os autores do texto, no entanto, apontaram a possibilidade de um arrefecimento da demanda se nada for feito para reverter a tempo a crise de confiança do setor empresarial e das famílias. Por enquanto, "a demanda doméstica tende a se apresentar relativamente robusta, especialmente o consumo das famílias", segundo a ata. Mas os sinais de alerta já estão acesos. O texto contém o suficiente para indicar o risco de uma estagnação mais ampla, mas seus autores poderiam ter ido mais longe. Se o consumo cair, o investimento continuar insuficiente e a indústria continuar em marcha lenta, como ficarão as já estropiadas finanças públicas?
Não há resposta para o problema do crescimento, no Brasil, sem a ação do governo, mas o governo está atolado na própria incompetência gerencial, na indigência de ideias de seus formuladores de políticas e num esquema pegajoso e sufocante de alianças políticas.
No Brasil, dizem especialistas, nenhum presidente pode governar sem acordos, às vezes com parceiros da pior espécie. Pode ser. Em muitos países coalizões são indispensáveis à operação do governo. Alianças, no entanto, são em geral precedidas de algum entendimento a respeito de objetivos e métodos. É o caso, em países da Europa, da formação de gabinetes para enfrentar a crise fiscal e financeira.
A peculiaridade brasileira é outra: programas são secundários e o fundamento das alianças é a partilha dos benefícios do poder. Não se divide o governo como responsabilidade, mas como butim. Esse padrão se fortaleceu com a disposição petista de aparelhar e lotear a máquina federal. Nada mais natural, quando um partido chega ao Palácio do Planalto com um projeto de poder e nenhum projeto real de governo.
Sem alianças em torno de um programa, o governo é forçado a negociar com a base a votação de cada projeto, como se nenhuma ideia geral desse um sentido comum às várias propostas. Não se pode sequer confiar na aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias, condicionada pelos companheiros à adoção de um impropriamente chamado orçamento impositivo - na prática, uma simples manobra para tornar obrigatória a liberação de verbas para emendas.
A um governo com essas condições de funcionamento - e comandado por uma presidente cada vez mais isolada - cabe a missão de promover a mudanças necessárias para destravar a economia, aumentar seu potencial de crescimento e impor ao País um ritmo de expansão mais parecido com o dos emergentes mais dinâmicos.
Nenhuma tarefa importante será cumprida se a presidente Dilma Rousseff e sua equipe forem incapazes de começar a arrumação das próprias contas. Para isso será necessário desfazer a confusão de incentivos temporários e permanentes, trocar as ações pontuais pelas chamadas políticas horizontais e cortar o vínculo incestuoso entre o Tesouro e os bancos controlados pela União.
Tudo isso deverá ser apenas o começo de uma lista enorme de mudanças. Elevar a eficiência na elaboração e na condução de projetos de infraestrutura será outro desafio tão duro quanto urgente. Sem isso, até como exportador de matérias-primas o País será cada vez menos competitivo.
Que dirão dessa agenda os marqueteiros eleitorais da presidente?

sábado, 13 de julho de 2013

"Nao e' comigo! Se vire ai, negao" (ops, com perdao dos proprios, que nao tem nada a ver com a incompetencia do governo)

A arte autoritária de passar a responsabilidade

ROLF KUNTZ*
O Estado de S.Paulo, 13 de julho de 2013
Num país quase desgovernado, a notícia mais animadora do mês foi o novo aumento de juros anunciado pelo Banco Central (BC), um raro sintoma de responsabilidade no alegre mundo brasiliense. Pode-se aprovar o arrocho monetário ou abominá-lo. Mas pelo menos em uma área da administração federal, é preciso admitir, há uma resposta organizada e racional a um desafio do dia a dia. Essa resposta é formulada para um problema bem definido, uma inflação persistente e distante da meta oficial, 4,5% ao ano. Além do mais, essa estratégia contribui para a restauração da credibilidade do BC, condição essencial para uma das funções principais da autoridade monetária, a administração de expectativas. Qual deveria ser a decisão, se essa autoridade tivesse de seguir os padrões agora dominantes, por exemplo, na área da saúde?
Como primeiro passo para se ajustar a esses padrões, o Comitê de Política Monetária (Copom) deveria jogar o problema para outro organismo, talvez para empresários e consumidores - de toda forma, para alguma entidade, grupo ou pessoa sem responsabilidade direta pela solução. O governo seguiu esse critério para cuidar - mais precisamente, para se livrar - do problema da saúde, um dos temas das manifestações de rua em todo o País. O exemplo é instrutivo.
Prover assistência médica universal e outros serviços de saúde, como sabe qualquer pessoa medianamente informada, é responsabilidade do poder público. A presidente Dilma Rousseff decidiu, no entanto, jogar o encargo para os estudantes de Medicina. Repetiu a façanha de outro petista, ministro da Previdência no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com o pretexto de combater fraudes, esse ministro obrigou milhões de pessoas a um trabalhoso recadastramento. Para cumprir a tarefa, muitos aposentados e pensionistas foram obrigados a buscar agências bancárias em outras cidades. Houve casos de velhinhos em cadeiras de roda forçados a enfrentar filas.
Houve protestos e demonstrações de indignação. Mesmo sem aquelas barbaridades, no entanto, a decisão ministerial ainda seria condenável. Nada poderia justificar a transferência de um problema gerencial, o controle de fraudes, para milhões de pessoas inocentes e sem a mínima obrigação de fazer o serviço do setor público. Mas essa foi a solução escolhida pelo ministro da Previdência, com a bênção do presidente da República. O nó da questão, a transferência arbitrária de responsabilidade, nunca foi suficientemente discutido.
Em relação às políticas de preços, hoje é preciso buscar fora do Brasil os grandes modelos de repasse de tarefas. A arte de empurrar problemas para os outros tem sido praticada com virtuosismo pelo governo da Argentina e com menor brilho pelo da Venezuela. A presidente Cristina Kirchner tem usado o conhecido poder de persuasão de seu secretário do Comércio, Guillermo Moreno, para jogar para produtores e comerciantes a tarefa e o custo de conter a inflação.
Com essa redivisão do trabalho, o governo pode continuar gastando e o BC fica livre da missão de usar a política monetária para conter a alta de preços. A estratégia é complementada pela publicação regular de indicadores ao gosto do governo e pelo veto à divulgação de índices calculados por economistas independentes.
Apesar da evidente admiração da presidente Dilma Rousseff por sua colega argentina, o governo brasileiro ainda se abstém de comandar os preços do comércio varejista e de intervir no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para controlar seus indicadores. Nessa áreas, o jogo de empurrar custos e responsabilidades permanece quase encerrado - atenção ao quase - nos limites do setor público. Envolve, por exemplo, a contenção de preços da Petrobrás e o uso de bancos e outras empresas do Estado para ajeitar as contas fiscais. As perdas impostas à Petrobrás por meio da intervenção nos preços de combustíveis são conhecidas. Parte do custo é transferida, naturalmente, aos acionistas minoritários, convocados, contra sua vontade, para a generosa missão de conter os preços.
A política recém-traçada para a saúde é um salto qualitativo em relação a esses padrões. Até agora os estudantes de Medicina só precisam, para conquistar o diploma, enfrentar com sucesso as tarefas e os testes acadêmicos. Terminada essa etapa, sua formação se completa com a residência - depois de mais um exame - e com a especialização. Os degraus seguintes, mestrado e doutorado, são opcionais. Mas o governo decidiu condicionar a formatura à prestação compulsória de um serviço público.
Além de ser mais uma tentativa escandalosa de transferir responsabilidade, essa pseudossolução é uma evidente demonstração de incompetência. Não se implanta uma política minimamente razoável de assistência à saúde sem investimentos em hospitais, postos de atendimento, transportes e serviços laboratoriais, por exemplo. É preciso pensar tanto nas condições de trabalho quanto na remuneração e na carreira dos profissionais. Se faltam médicos dispostos a entrar no serviço público, tanto nas capitais quanto no interior, o problema deve estar nas condições do próprio serviço, como apontaram nos últimos dias médicos experientes e altamente qualificados. Mesmo para um governo incompetente todos aqueles pontos deveriam ser óbvios.
Se a transferência de responsabilidades se tornar padrão em todo o setor público, a adoção do modelo Kirchner de política de preços poderá ser uma das próximas novidades. Não faltarão patriotas dispostos a fiscalizar os supermercados e - por que não? - a apoiar pela força qualquer tentativa de controle da informação. Afinal, modelos desse tipo são essencialmente autoritários. Autoritarismo é complemento frequente da incompetência.   
* Jornalista