Dos meus arquivos implacáveis: matérias de 2005, ou seja, mais de 11 anos atrás, quando Chávez, com o apoio material, logístico e intelectual da ditadura de Fidel Castro, deu os passos decisivos para consolidar um regime ditatorial, com total apoio do governo de Lula 1 (2003-2006).
Paulo Roberto de Almeida
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Jornal Valor Econômico - 12/04/2005 - Editorial
Chávez dá novos passos em direção à ditadura
A Venezuela caminha para uma ditadura ou uma nova fase de mais instabilidade política, ou ambas. A trajetória crescente de radicalização interna do presidente Hugo Chávez está perto de destruir os poucos vestígios de democracia de sua "revolução bolivariana" para mergulhar em uma aventura autoritária. O principal artífice da instabilidade é o próprio Chávez. A decisão oficial de criar milícias civis armadas é um passo largo em direção à intimidação política e à conquista de um poder pessoal no pior estilo dos caudilhos que infernizaram o continente no século passado.
O decreto que criou as milícias, que poderão agrupar 1,5 milhão de pessoas, diz que sua função será a de "ajudar na defesa e sustentação da segurança da nação" e "integrar progressivamente a sociedade civil ao exercício do dever de co-responsabilidade na manutenção da paz nacional". Os objetivos são claros e não se restringem ao temor sempre presente de Chávez de ser assassinado por inspiração do governo de George Bush ou de ter seu país invadido pelos marines. A manutenção da "paz nacional" poderá se dar a partir de agora com ruidosos chavistas armados atemorizando a oposição ao governo, que vem minguando a olhos vistos, ao passo que o presidente concede a si mesmo cada vez mais poderes.
A trajetória do mandonismo de Chávez segue passos lógicos e céleres. O plebiscito convocado pela oposição para destroná-lo fracassou. Na sua esteira, em vez de gestos conciliadores, o presidente fechou progressivamente o caminho institucional para a manifestação dos partidos políticos que não aceitam seus preceitos. Em um país onde o Estado é o maior dono das terras, iniciou-se uma reforma agrária com o confisco de fazendas de propriedade de estrangeiros. A reforma educacional recém-encaminhada pelo presidente pode abrir caminho à lavagem cerebral típica de regimes stalinistas em decomposição. O passo mais grave, porém, foi a legislação aprovada pelo Congresso que torna objeto de retaliação do Estado manifestações típicas da democracia, como críticas ao presidente ou realização de passeatas em defesa de reivindicações políticas ou econômicas.
Após fracassar em uma tentativa de golpe de Estado, Chávez foi levado à presidência pelas urnas em 1998 e parece decidido a se perpetuar no poder. Há poucas dúvidas de que conseguirá se reeleger por um período de mais seis anos em 2006. Seu populismo autoritário não faz mal apenas às instituições políticas, mas se estende à economia, onde está minando as forças da fonte quase única de recursos do país - a estatal de petróleo PDVSA. Há sinais de que a empresa começa a sofrer de penúria de capitais para cumprir sua meta de chegar a produzir 5 milhões de barris por dia em cinco anos. Segundo a revista americana "BusinessWeek", alguns importantes poços estão tendo seu nível de produção reduzido em um quarto a cada ano e o número de novas perfurações para novos poços caiu pela metade entre 1997 e 2005.
Chávez resolveu também apertar o cerco às companhias estrangeiras de petróleo, que respondem por quase metade da produção. Ele elevou os royaties de 1% para 16,6% das empresas que operam na bacia do Orinoco e estabeleceu que novas parcerias terão termos mais favoráveis ao governo - 30% de royalties e 51% de participação da PDVSA. Com a produção estabilizada ou cadente e medidas que afugentam investidores, o governo venezuelano poderá em breve ficar com recursos menores para programas sociais.
Durante décadas, conservadores e liberais esbanjaram as receitas de petróleo venezuelano e deram às costas à miserável população do país. A eleição de Chávez rompeu com esse esquema político decrépito, que sofreu novo revés com o golpe de Estado fracassado de 2003. Chávez está sendo incapaz de livrar-se da dependência do petróleo e de dar novas esperanças e força ao jogo democrático. Ao retirar o monopólio da força do Exército e ameaçar deslocá-lo para as milícias sob comando de acólitos, Chávez está mexendo com fogo e incentivando insatisfação entre os militares, que lhe foram leais até agora. É uma jogada de altíssimo risco.
O aventureirismo de Chávez tem contado com o beneplácito do governo Lula, que dá um manto protetor retórico à escalada ditatorial do vizinho. "Não aceitamos difamações contra companheiros", disse recentemente Lula, diante do primeiro-ministro espanhol, José Luiz Zapatero. Resta saber o que ele fará diante da verdade. Há riscos para a democracia na Venezuela e a diplomacia brasileira, por enquanto, dá a Chávez atestados de bom comportamento.
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Diego Casagrande, 13.04.2005, 16h06
O FAROL CHAVISTA
por Denis Rosenfield, filósofo
A ascensão de Hugo Chávez ao poder e a sua forma de conservação expressam o grande sonho da esquerda latino-americana. Nem nos seus maiores devaneios, ela considerou possível que a conquista do poder por meios democráticos redundaria com tanta perfeição na supressão dessa mesma democracia. Habilidoso no discurso e nas manobras, o ditador tem conseguido passar a imagem de que governa democraticamente, com o povo, quanto tudo faz para enfraquecer as instituições republicanas, abrindo a via para o exercício autocrático do poder. Só os incrédulos e os de má-fé acreditam que tudo está normal na Venezuela. Incrédulos, porque não crêem que um processo democrático possa conduzir dessa maneira à abolição da democracia. A ascensão de Hitler ao poder seria um desses exemplos. E os de má-fé são aqueles que sabem que não se trata de democracia, porém fingem o contrário. A instauração de um regime próprio da esquerda autoritária ou totalitária, como os que povoaram os horrores do século XX, aparece, então, como a consumação da igualdade.
O recente episódio de compra de armamentos é apenas o último dos atos que comprovam o processo revolucionário em curso. Que a Venezuela compre aviões de reconhecimento ou barcos que ajudem a defender as suas fronteiras é um ato próprio, normal, de um país soberano que cumpre com certas de suas funções. Comprar, no entanto, 100.000 fuzis AK-7 com o propósito de armar milícias populares revela a execução de um velho preceito marxista-leninista, cubano ou maoísta, o de formar um para-exército que responda às ordens diretas do Líder máximo. A melhor forma de conservação de uma ditadura consiste no aperfeiçoamento de seus métodos repressivos, tanto mais eficientes que eles se apóiem em milícias populares, que fazem o arremedo da “soberania do povo”. Nada disso é novo historicamente, pois Fidel Castro consegue, policialmente, arrebanhar multidões, como o fizeram Mussolini, Stálin, Hitler ou Mao. Trata-se aqui da encenação autoritária ou totalitária da “democracia popular”.
Contudo, nada disto foi feito sem preliminares “jurídicas” e “civis”. O Supremo Tribunal teve o número de seus juízes substancialmente aumentado, de tal maneira que os novos juízes chavistas, de extrema obediência ao ditador, fossem maioria. Dessa maneira, qualquer ato arbitrário de Hugo Chávez se torna potencialmente, senão efetivamente, “legal”. A esquerda latino-americana, fã desses engodos, sempre poderá dizer que o “estado de direito” foi respeitado. No mesmo diapasão, foi “aprovada” pelo Legislativo, também totalmente controlado pelo Líder máximo, uma lei que pune severamente todo aquele que proferir uma palavra contrária ao Chefe ou uma declaração que por esse seja considerada danosa para sua figura. A liberdade de imprensa e de expressão em geral foi severamente limitada, apesar de várias manifestações indignadas de órgãos de defesa dos direitos humanos e de liberdade de expressão. Ou seja, um direito civil básico foi “legislativamente” suprimido, obedecendo ao ritual “democrático” de uma ditadura.
Nada disto, no entanto, seria de espantar se a nossa diplomacia e um setor considerável do PT não considerassem tais atos como perfeitamente normais. O anormal do ponto de vista democrático ganha o contorno do terrivelmente normal, o da normalidade dos regimes de esquerda autoritária ou totalitária. Quando lemos ou ouvimos declarações de altos responsáveis de nosso governo aceitando ou elogiando a política chavista, não podemos deixar de nos perguntar se essa ausência de condenação não á uma forma indireta de aprovação ao que lá está acontecendo. A atuação de nossa diplomacia em relação à Venezuela, controlada diretamente pelo Palácio do Planalto, expressa o que muitos desse governo pensam. Se acrescentarmos a isso que em torno de um terço dos membros do PT comunga dessas mesmas posições, constataremos que a esquizofrenia política atual também se nutre de outros modelos. Enquanto a esquerda brasileira não fizer o luto de suas posições passadas, o farol de Chávez continuará despontando no horizonte.
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Diego Casagrande
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