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terça-feira, 6 de março de 2018

Conselhos de um contrarianista a jovens internacionalistas - Paulo Roberto de Almeida

Conselhos de um contrarianista a jovens internacionalistas

Paulo Roberto de Almeida
Alocução de patrono na XI turma (2º semestre de 2004) de
Relações internacionais da Universidade Católica de Brasília
(10 de março de 2005, 20hs, Auditório S. João Batista de La Salle)

Senhora representante da Magnífica Reitora da Universidade Católica,
Senhor Paraninfo, Geraldo Magela,
Senhores professores homenageados,
Senhoras e senhores demais membros da mesa e autoridades presentes,
Meus caríssimos alunos e agora formandos em relações internacionais,

Confesso que quando a Comissão de Formatura desta turma de relações internacionais da Universidade Católica me procurou, cerca de dois meses atrás, para formular este honroso convite de “patrono” de sua formatura, me senti verdadeiramente orgulhoso de tê-lo feito por merecer. Já lá se vai mais de um quarto de século que me exerço nas lides da diplomacia profissional, com uma dedicação paralela às “coisas internacionais”. Por “coisas”, vão aqui compreendidas a pesquisa, geralmente solitária, o ensino, sempre voluntário e irregular, ao sabor de uma vida nômade a serviço do Brasil, e a redação e publicação de textos de caráter didático em torno das questões das relações internacionais, da história diplomática e, sobretudo, da inserção internacional do Brasil. No entanto, ao longo desse tempo todo, não havia tido ainda a satisfação de receber um convite como este que vocês me fizeram, o que me desvaneceu, de verdade.
Minhas primeiras palavras, portanto, são de agradecimento sincero a todos vocês pela lembrança, pelo gesto simpático e pelo carinho demonstrados. Isso me incita a continuar retribuindo, nos anos que ainda tenho de exercício profissional e acadêmico, produzindo de forma ainda mais intensa no campo das relações internacionais, sempre com sentido didático. Isso nada mais representa, afinal de contas, do que uma modesta retribuição de minha parte à sociedade brasileira, por tudo que ela me deu em termos de formação educacional nos quadros do ensino público.

Vocês também me prestaram a homenagem de transcrever no convite, ainda que de forma abreviada e livremente adaptadas, mas muito bem resumidas, as dez novas regras de diplomacia que eu havia elaborado, em agosto de 2001, a partir da leitura de um velho livro do século XIX sobre quatro regras de diplomacia, para justamente ilustrar as reflexões contemporâneas de meus jovens colegas diplomatas e outros tantos candidatos à carreira. Esse gesto me incita a retomar algumas delas e tentar elaborar, nesta noite, alguns poucos conselhos que um velho contrarianista do século XX, como eu, poderia dar a jovens internacionalistas do século XXI, como vocês.
Digo “contrarianista” sem qualquer espírito opositor ou anarquista, ainda que estes sentimentos sejam igualmente legítimos em sociedades plenamente democráticas, como pretende ser a nossa. Meu espírito contrarianista deriva do fato de que eu nunca quis ou pretendi me submeter ao argumento da autoridade, mas sim aceito, com prazer e voluntariamente, a autoridade do argumento. Num cenário de diálogo socrático e de dedicação honesta à busca da verdade, como deve ser o ambiente acadêmico, desejo reformular algumas dessas regras, para melhor iluminar o que me parecem ser qualidades essenciais ao jovem internacionalista de nossos tempos.

Inicialmente, eu destacaria a última regra e, agora, a colocaria em primeiro lugar. Não se deve fazer da carreira profissional, seja no campo da diplomacia ou em outras atividades ligadas de perto ou de longe com as questões internacionais, o foco exclusivo de sua vida e, sobretudo, não se deve passar a carreira à frente da família, dos amigos e das pessoas com quem convivemos no ambiente familiar ou de trabalho.
A carreira profissional, qualquer que seja ela, é importante, mas as pessoas, sobretudo os indivíduos que nos são caros, são ainda mais importantes do que ela. Podemos, por certo, mudar de carreira, uma ou várias vezes na vida, podemos até mudar nossos relacionamentos individuais, mas os familiares e nossos amigos mais chegados estarão sempre lá para nos ajudar nas horas difíceis, para nos confortar em determinados momentos, para nos trazer alegrias em várias ocasiões.
Por isso, meus caros formandos, contrariem o carreirismo e sejam, antes de mais nada, profissionais que vêem nas pessoas, de fato, o centro da vida.

Eu diria, em segundo lugar, que algo se ganha ao contrariar o próprio princípio da autoridade, desde que, é claro, vocês tenham absoluta certeza sobre a fundamentação da posição de vocês sobre um assunto qualquer. Regras hierárquicas e disciplina são boas de serem cumpridas na execução de tarefas que exigem uma linha de comando definida, inquestionável, em função da implementação de uma decisão maduramente refletida e alcançada graças a um processo decisório bem estruturado e solidamente bem estabelecido.
Mas, a hierarquia e a disciplina não podem entravar a liberdade de pensamento, em especial a defesa de posições de maior valor agregado, que conseguem realizar uma otimização “paretiana” dos recursos e meios disponíveis para a tomada de ação. A contestação, pelo simples prazer de contrariar, não me parece levar a resultados ótimos, mas sim pode-se e deve-se praticar o questionamento honesto, o ceticismo sadio, a desconfiança metodológica em relação às verdades reveladas, por mais que elas tenham sido formuladas por alguma autoridade imbuída do seu poder autocrático.
Por isso, não tenham medo de expor e de defender com firmeza suas opiniões, se elas refletem, efetivamente, um conhecimento fundamentado do problema em pauta, e isso mesmo que uma “autoridade superior” ostente uma opinião diversa da de vocês.

Por esse motivo, e aqui vai minha terceira regra, contrariem o desejo, ainda que compreensível, de aposentar os livros e deixar os estudos de lado, agora que vocês têm um canudo na mão e algumas idéias na cabeça. Ao contrário, sejam opositores sistemáticos da aposentadoria precoce nos estudos, e voltem imediatamente às leituras, às bibliotecas, às livrarias, às pesquisas de internet.
Não parem de estudar, em nenhum momento da vida. Aliás, comecem a fazê-lo imediatamente, assim que saírem daqui. Afinal de contas, até agora, vocês fizeram, em grande medida, aquilo que os professores determinaram que vocês fizessem, com uma série de leituras chatas e outras tantas obrigações impostas.
Neste momento, cabe a vocês mesmos imporem a si mesmos um programa sistemático de estudos e de leituras que melhor se conformar às habilidades, gostos e orientações particulares de cada um. Sejam, portanto, contrários ao estudo dirigido e estabeleçam, vocês mesmos, um plano regular de dedicação à formação metódica da especialidade que vocês pretendem ter na vida.
A universidade é uma grande fonte de generalidades e mesmo de algumas banalidades repassadas ao longo dos anos, numa repetição por vezes aborrecida do saber acumulado. O que vocês devem fazer agora é construir o seu próprio saber e para isso vão precisar continuar estudando. Apenas com base num saber específico, que dê a cada um de vocês o melhor desempenho possível numa determinada vertente profissional, vocês terão sucesso na vida e no trabalho. Por isso, mãos à obra: coloquem o canudo de lado e comecem a estudar de novo.

Dessa característica de estudo constante, e totalmente dedicado à expansão contínua do saber em todos os ramos do conhecimento humano, derivam duas outras regras que eu havia inscrito em meu decálogo de quatro anos atrás: possuir o domínio total de cada assunto do qual nos vamos ocupar profissionalmente, o que significa aprofundar o conhecimento daquele tema em pesquisas paralelas e correlatas, adotando, ao mesmo tempo ou paralelamente, uma perspectiva histórica e estrutural de cada tema, situando-o no seu contexto próprio.
Apenas com base nesse conhecimento suplementar, vocês saberão se opor, se for o caso, ao princípio primário da autoridade e ter condições de manter independência de julgamento em relação às idéias recebidas e às “verdades reveladas”. A autoridade do argumento só se sustenta com um saber superior, solidamente embasado nos dados da realidade e apoiado em pesquisas comparativas ou no conhecimento de outras experiências que podem ser relevantes para um caso porventura similar.
O “ser contrário” significa, em princípio, possuir um argumento dotado de autoridade superior, embasado em dados mais amplos e um domínio mais seguro da realidade. Claro, podemos ser vencidos pela força bruta, pela imposição da hierarquia ou do poder simplesmente incontestável e incontrastável. Mas aí não estamos falando de métodos socráticos de busca da verdade ou de formação de um consenso no processo decisório, e sim da vontade unilateral, o que não deveria valer no ambiente sadio da pesquisa acadêmica ou mesmo da organização burocrática racionalmente estruturada.
A regra é esta: para vocês serem contrários ao lugar comum, ao déjà vu, ao habitual costumeiro, vocês precisarão construir um saber superior e expô-lo com clareza. E isso nos faz voltar à necessidade já referida do estudo constante, do esforço feito sob a forma da pesquisa individual e de leituras contínuas. A geração de vocês leva uma enorme vantagem em relação àquelas que a precederam: hoje em dia, com os recursos existentes on-line, praticamente 90% do estoque acumulado de conhecimento produzido pela humanidade, até aqui, está livremente disponível na internet, bastando um pouco de destreza lingüística para desfrutar desse imenso saber.

Vocês também podem ser contrários aos interesses político-partidários, às ideologias do momento e às conjunturas políticas de uma dada maioria governamental, mas isto não é uma regra absoluta. Digo isto porque várias carreiras, sobretudo aquelas fortemente dependentes de uma determinada estruturação hierárquica que tem no seu pináculo uma autoridade política qualquer, podem ser levadas ao fenômeno bem conhecido do “adesismo”, ou seja, aquela aderência momentânea aos senhores da hora, às idéias temporariamente dominantes, às situações de adequação oportunista às novas condições do exercício do poder, que sempre vem associado às benesses e favores distribuídos em direção daqueles que partilham, ou fingem fazê-lo, as mesmas opiniões daqueles que justamente ocupam o poder naquele dado momento.
Não estou excluindo, por certo, que algum partido ou agrupamento político consiga encarnar, num determinado momento da vida da Nação, os anseios ou as aspirações da maioria, conseguindo traduzir de modo prático aquilo que normalmente se chama de “vontade nacional”. Este é um fato, aliás corriqueiro nas democracias. O que estou dizendo é que vocês precisam ter absolutamente claros, para vocês e no exercício de alguma atividade profissional, quais são os grandes princípios de atuação do país a serviço do qual se colocam, isto é, quais são, se é que possível saber de verdade, os chamados “interesses nacionais permanentes”.

É com base numa compreensão desse tipo que eu formulei minha primeira regra e uma outra que dela também deriva: servir a pátria, mais do que aos governos, e afastar ideologias ou interesses político-partidários das considerações relativas à política externa do país, que precisa assumir um caráter nacional abrangente, e não meramente setorial ou corporativo.
Para que isso se faça, é preciso, repito ainda uma vez, conhecer profundamente os interesses permanentes da nação e do povo aos quais se serve, e por isso volto ao tema do estudo contínuo.
É preciso, da mesma forma, não aderir a modismos em matéria de “explicações definitivas” das causas das nossas mazelas e iniqüidades: elas são certamente muitas e provavelmente têm causas mais complexas do que certas “racionalizações inovadoras” que pretendem deter a chave milagrosa para a solução de todos os problemas brasileiros. O ser contrário à subserviência ao poder político do momento é também uma atitude de coragem moral e de honestidade intelectual, já que a razão do poder nem sempre se coaduna com o poder da razão, mas esta é, como disse, uma regra não absoluta.

Em resumo ‑ e terminando por aqui este meu exercício de contrarianismo bem intencionado ‑, não pretendo que minhas regras subjetivas, certamente derivadas de um espírito inquieto e ainda rebelde, mas sempre aberto à causa do conhecimento, sirvam de guia absoluto na determinação do itinerário profissional que vocês empreenderão a partir daqui. Cada um definirá com base em sua própria experiência de vida, com o apoio e os conselhos dos familiares, dos professores e dos amigos, qual o melhor curso a seguir no plano profissional ou ainda da continuação dos estudos, agora em nível de pós-graduação, o que recomendo vivamente.
O que eu pretendi inculcar em vocês é a idéia da mente aberta, dotada de ceticismo sadio, contestadora das verdades reveladas e orientada para a busca honesta do saber e da maior eficiência possível no desempenho das atividades profissionais ou dos estudos futuros no terreno da especialização. Vocês agora vão deixar para trás uma etapa da vida e começar outra, mas devem sempre encarar os próximos desafios com toda a modéstia que requer o enfrentamento de cada nova situação de vida: deixar a suficiência de lado e buscar a excelência, em tudo e de todas as maneiras, sabendo que só a dedicação plena ao estudo continuado lhes poderá abrir o caminho para algumas rotas de sucesso profissional e pessoal.
Eu aprendi dessa maneira: vindo de uma família modesta, como é a maioria daquelas dos que aqui se formam hoje, consegui, à custa de muito estudo e dedicação pessoal, distinguir-me na carreira profissional e nas atividades acadêmicas, a ponto de me fazer merecedor da homenagem que vocês tão gentilmente quiseram me prestar nesta data, ao me fazer patrono desta turma de relações internacionais.
Vocês podem, em primeiro lugar, agradecer e retribuir à família e a todos aqueles que os ajudaram a conseguir o diploma que a partir de hoje passam a ostentar. Vocês devem ter, em segundo lugar, consciência de que o maior motivo de orgulho, não é necessariamente o canudo certificador do mérito alcançado, mas mais precisamente o fato de que vocês adquiram nesta escola algumas técnicas de aprendizado que devem ser internalizadas e aproveitadas em todo e qualquer momento da vida futura. Vocês aqui aprenderam tão simplesmente a aprender: comecem agora a estudar de verdade, e tenham sucesso na vida profissional e pessoal. Mãos à obra, de volta aos livros, e sejam felizes na vida.
Meus sinceros parabéns e, por esta oportunidade que me foi dada de me dirigir a alguns dos meus, até aqui, desconhecidos leitores, meu muito obrigado a todos vocês.

Paulo Roberto de Almeida
6-8 de março de 2005 

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Análise Econômica do Discurso na Assembleia Geral da ONU - P. R. Almeida


Análise Econômica do Discurso na Assembleia Geral da ONU (25/09/2012)
Paulo Roberto de Almeida
Destaco, unicamente, os parágrafos econômicos, iniciais, do discurso inaugural da presidente do Brasil na abertura dos debates da Assembleia Geral da ONU, em 25/09/2012. Os parágrafos, numerados sequencialmente de 1 a 14, são todos os que correspondem aos elementos de economia. Agrego, no imediato seguimento de cada um deles, meus comentários, com observações de caráter geral ao final.

1) A grave crise econômica, iniciada em 2008, ganhou novos e inquietantes contornos. A opção por políticas fiscais ortodoxas vem agravando a recessão nas economias desenvolvidas com reflexos nos países emergentes, inclusive o Brasil.
PRA: Certamente: depois de breve retomada, os EUA continuam a enfrentar o que alguns economistas já chamam de “grande recessão”. Não é a depressão dos anos 1930, mas se apresenta como uma lenta retomada, com alto desemprego e taxas extremamente moderadas de crescimento e um alto endividamento público, sem ameaça, no momento, de impulso inflacionário em função, justamente, do marasmo nos negócios e no emprego. Por outro lado, a Europa, atingida no lado financeiro pela crise americana de 2009, enfrenta, no momento, a crise das dívidas soberanas e dos déficits fiscais elevados, que assume aspectos dramáticos em alguns países mediterrâneos.
O discurso da presidente, entretanto, faz crer que foram políticas ortodoxas que agravaram a recessão, quando todos os países aprofundaram os dispêndios – com exceção dos já altamente endividados e deficitários – e promoveram medidas keynesianas, não ortodoxas, portanto, de recuperação. Os países emergentes podem ser impactados, de modo mais acentuado, pelo canal comercial, o que não é exatamente o caso do Brasil, que possui baixo coeficiente de abertura externa, é bem menos dependente dos mercados externos e vem, de todo modo, aprofundando seu isolamento do comércio mundial.
2) As principais lideranças do mundo desenvolvido ainda não encontraram o caminho que articula ajustes fiscais apropriados e estímulos ao investimento e à demanda indispensáveis para interromper a recessão e garantir o crescimento econômico.
PRA: Um tom professoral que permanece em constatações extremamente vagas, sem qualquer especificação detalhada quanto ao “caminho” correto da articulação. Pode parecer que o Brasil, ou a presidente, detém a chave das receitas milagrosas para combinar ajuste e estímulo, nas proporções exatas para inverter o ciclo.
3) A política monetária não pode ser a única resposta para resolver o crescente desemprego, o aumento da pobreza e o desalento que afeta, no mundo inteiro, as camadas mais vulneráveis da população.
PRA: Provavelmente não, mas suspeita-se que os dirigentes econômicos nacionais e os responsáveis do BCE, como do próprio FMI, tenham aprendido algo mais do que política monetária, e podem igualmente usar instrumentos fiscais e outros.
4) Os Bancos Centrais dos países desenvolvidos persistem em uma política monetária expansionista que desequilibra as taxas de câmbio. Com isso, os países emergentes perdem mercado devido à valorização artificial de suas moedas, o que agrava ainda mais o quadro recessivo global.
PRA: Mas todos, absolutamente todos os interlocutores, com exceção de alguns poucos economistas austríacos, recomendaram justamente isso. Paul Krugman não diz outra coisa a cada artigo, Joseph Stiglitz também, sob aplausos dos mesmos setores que recomendam políticas de estímulo. Seria possível fazer isso sem expandir o meio circulante? E não é o que estava justamente pedindo a presidente?: estímulos?
Resta provar que esse expansionismo monetário, que se destina basicamente à atividade econômica interna, é responsável pela valorização do câmbio nos países emergentes. Que tal olhar o diferencial de taxas de juros? Nem americanos, nem europeus, japoneses ou chineses têm qualquer responsabilidade nos juros elevados praticados no Brasil, quatro a cinco vezes mais elevados do que nos países centrais. Em todo caso, mesmo que isso ocorresse, não existe nenhuma possibilidade de que isso provoque o agravamento do quadro recessivo mundial, uma vez que moedas artificialmente valorizadas ou desvalorizadas sempre estimulam importações ou exportações, não é verdade?
5) Não podemos aceitar que iniciativas legítimas de defesa comercial por parte dos países em desenvolvimento sejam injustamente classificadas como protecionismo. Devemos lembrar que a legítima defesa comercial está amparada pelas normas da Organização Mundial do Comércio.
PRA: Vejamos: defesa comercial é um conceito que se aplica a salvaguardas (por definição temporárias e objeto de comunicação ao Gatt), a dumping, a subsídios ilegais ou a outros expedientes desleais de comércio. Aumento linear de tarifas – que podem ser de natureza mais do que temporária – não é defesa comercial, e sim protecionismo. Não há injustiça em classificar protecionismo de protecionismo. Licenciamento preventivo, como feito pela Argentina, por exemplo, também é protecionismo, não defesa comercial.
6) O protecionismo e todas as formas de manipulação do comércio devem ser combatidos, pois conferem maior competitividade de maneira espúria e fraudulenta.
PRA: Absolutamente correto. Todas as formas devem ser combatidas. O MDIC sabe...
7) Não haverá resposta eficaz à crise enquanto não se intensificarem os esforços de coordenação entre os países e os organismos multilaterais como o G-20, o FMI e o Banco Mundial. Esta coordenação deve buscar reconfigurar a relação entre política fiscal e monetária para impedir o aprofundamento da recessão, controlar a guerra cambial e reestimular a demanda global.
PRA: Os ingleses, ou americanos, chamam isso de wishful thinking, os franceses de voeux pieux, ou seja: aspirações ingênuas. Nunca, em nenhum foro, nem mesmo no G7, se conseguiu coordenar todas essas políticas. No máximo foram alcançados objetivos parciais, como desvalorizações administradas, que funcionaram durante certo tempo, e apenas para evitar quedas brutais de alguma paridade mais relevante, como o dólar, por exemplo. Com exceção dos líderes brasileiros, nenhum outro falou ou pratica algo chamado “guerra cambial”, pelo menos não no sentido de desvalorizações maciças ou agressivas. Quanto a desvalorizações administradas, parece que é exatamente isso que o Brasil vem praticando nos últimos meses, mantendo o dólar num patamar praticamente fixo; seria isso guerra cambial, contra vizinhos e outros parceiros?
8) Sabemos, por experiência própria, que a dívida soberana dos Estados e a dívida bancária e financeira não serão equacionadas num quadro recessivo, ao contrário, a recessão só agudiza esses problemas. É urgente a construção de um amplo pacto pela retomada coordenada do crescimento econômico global, impedindo a desesperança provocada pelo desemprego e pela falta de oportunidades.
PRA: More of the same: wishful thinking, voeux pieux, e coordenação impossível.
9) Meu país tem feito a sua parte. Nos últimos anos mantivemos uma política econômica prudente, acumulamos reservas cambiais expressivas, reduzimos fortemente o endividamento público e com políticas sociais inovadoras, retiramos 40 milhões de brasileiros e brasileiras da pobreza, consolidando um amplo mercado de consumo de massa.
PRA: De fato: as reservas são mais do que suficientes, aliás excessivas. Economistas recomendam em geral 3 ou 4 meses de importações, e o Brasil parece dispor agora de mais de 2 anos de importações garantidas por suas enormes reservas, que por sinal possuem um custo fiscal equivalente a 10% de seu montante global. Já se mencionou esse aspecto menos brilhante da política atual? Por outro lado, gastar sempre mais do que o crescimento do PIB ou a taxa de inflação não parece uma política prudente. Quanto a retirar pessoas da pobreza, apenas uma observação: subsídio ao consumo é diferente de retirar da pobreza. Se o subsídio terminar as pessoas retornam à pobreza; apenas emprego e capacidade gerar sua própria renda retiram as pessoas da pobreza.
10) Fomos impactados pela crise, como todos os países. Mas, apesar da redução conjuntural de nosso crescimento, estamos mantendo o nível de emprego em patamares extremamente elevados. Continuamos reduzindo a desigualdade social e aumentando significativamente a renda dos trabalhadores. Superamos a visão incorreta que contrapõe, de um lado as medidas de incentivo ao crescimento, e de outro, os planos de austeridade. Esse é um falso dilema. A responsabilidade fiscal é tão necessária quanto são imprescindíveis medidas de estímulo ao crescimento, pois a consolidação fiscal só é sustentável em um contexto de recuperação da atividade econômica.
PRA: Muito bem. O mundo não espera menos do Brasil. Aliás, o Brasil não faz mais do que sua obrigação ao manter a estabilidade de sua economia. Este é um dever e uma “bondade” que o Brasil faz a si mesmo, não ao mundo.
11) A história revela que a austeridade, quando exagerada e isolada do crescimento, derrota a si mesma. A opção do Brasil tem sido a de enfrentar, simultaneamente, esses desafios.
PRA: Bom conselho, sem dúvida. Os dirigentes dos demais países fariam bem em aproveitar essas boas lições de puro bom senso.
12) Ao mesmo tempo em que observamos um estrito controle das contas públicas, aumentamos nossos investimentos em infraestrutura e educação.
PRA: Os três argumentos mereceriam ser apoiados em dados fiáveis quanto aos indicadores conjunturais e de tendência. As contas públicas têm apresentado superávits primários decrescentes, o que significa que teremos de aumentar os impostos, aumentar a dívida pública ou elevar a inflação. Talvez acabemos fazendo todas essas coisas, não muito recomendáveis no plano macroeconômico. Quanto à infraestrutura, se isso fosse verdade, o governo não precisaria privatizar ou oferecer em regime de concessão a exploração de estradas, portos, aeroportos, ferrovias e outros setores. No que se refere à educação, os problemas mais graves não são exatamente vinculados a verbas públicas.
13) Ao mesmo tempo em que controlamos a inflação, atuamos vigorosamente nas políticas de inclusão social e combate à pobreza. E, ao mesmo tempo em que fazemos reformas estruturais na área financeira e previdenciária, reduzimos a carga tributária, o custo da energia e investimos em infraestrutura, em conhecimento para produzir ciência, tecnologia e inovação.
PRA: A inflação jamais voltou ao centro da meta desde muitos anos, e não parece ser intenção do governo forçar esse retorno rapidamente. De toda forma, o centro da meta representa três vezes a média mais recomendável. De fato, inclusão social e combate à pobreza têm sido as marcas deste governo, mas isso tem sido feito mais sobre os estoques (ou seja, com aumento da arrecadação e redistribuição entre-classes) do que sobre os fluxos, ou seja, novos patamares de riqueza.
14) Há momentos em que não podemos escolher entre uma coisa ou outra. Não há este tipo de alternativa. Há que desenvolvê-las de forma simultânea e articulada.
PRA: Novamente, sábios conselhos, que muitos deveriam aproveitar. Ainda bem que nós, brasileiros, podemos ficar tranquilos quanto a isso.
Brasília, 26/09/2012

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Discurso da presidente na AGNU: texto integral

Abaixo transcrevo o discurso inaugural da presidente Dilma Rousseff na abertura do debate na Assembleia Geral da ONU.
Depois comentarei algumas seções econômicas, segundo minhas modestas competências.

Senhor presidente da Assembleia Geral, Vuk Jeremic,
Senhor secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon,
Senhoras e senhores Chefes de Estado e de Governo,
Senhoras e senhores,
Mais uma vez uma voz feminina inaugura o debate na Assembleia-Geral das Nações Unidas. Para muitos, nós, mulheres, somos a metade do céu, mas nós queremos ser a metade da Terra também, com igualdade de direitos e oportunidades, livres de todas as formas de discriminação e violência, capazes de construir a sua emancipação, e com ela contribuir para a plena emancipação de todos.
Senhor Presidente,
Um ano após o discurso que pronunciei nesta mesma tribuna, constato a permanência de muitos dos problemas que nos afligiam já em setembro de 2011. Quero hoje voltar a discutir algumas destas questões cuja solução é cada vez mais urgente.
Senhor Presidente,
A grave crise econômica, iniciada em 2008, ganhou novos e inquietantes contornos. A opção por políticas fiscais ortodoxas vem agravando a recessão nas economias desenvolvidas com reflexos nos países emergentes, inclusive o Brasil.
As principais lideranças do mundo desenvolvido ainda não encontraram o caminho que articula ajustes fiscais apropriados e estímulos ao investimento e à demanda indispensáveis para interromper a recessão e garantir o crescimento econômico.
A política monetária não pode ser a única resposta para resolver o crescente desemprego, o aumento da pobreza e o desalento que afeta, no mundo inteiro, as camadas mais vulneráveis da população.
Os Bancos Centrais dos países desenvolvidos persistem em uma política monetária expansionista que desequilibra as taxas de câmbio. Com isso, os países emergentes perdem mercado devido à valorização artificial de suas moedas, o que agrava ainda mais o quadro recessivo global.
Não podemos aceitar que iniciativas legítimas de defesa comercial por parte dos países em desenvolvimento sejam injustamente classificadas como protecionismo. Devemos lembrar que a legítima defesa comercial está amparada pelas normas da Organização Mundial do Comércio.
O protecionismo e todas as formas de manipulação do comércio devem ser combatidos, pois conferem maior competitividade de maneira espúria e fraudulenta.
Não haverá resposta eficaz à crise enquanto não se intensificarem os esforços de coordenação entre os países e os organismos multilaterais como o G-20, o FMI e o Banco Mundial. Esta coordenação deve buscar reconfigurar a relação entre política fiscal e monetária para impedir o aprofundamento da recessão, controlar a guerra cambial e reestimular a demanda global.
Sabemos, por experiência própria, que a dívida soberana dos Estados e a dívida bancária e financeira não serão equacionadas num quadro recessivo, ao contrário, a recessão só agudiza esses problemas. É urgente a construção de um amplo pacto pela retomada coordenada do crescimento econômico global, impedindo a desesperança provocada pelo desemprego e pela falta de oportunidades.
Senhor presidente,
Meu país tem feito a sua parte. Nos últimos anos mantivemos uma política econômica prudente, acumulamos reservas cambiais expressivas, reduzimos fortemente o endividamento público e com políticas sociais inovadoras, retiramos 40 milhões de brasileiros e brasileiras da pobreza, consolidando um amplo mercado de consumo de massa.
Fomos impactados pela crise, como todos os países. Mas, apesar da redução conjuntural de nosso crescimento, estamos mantendo o nível de emprego em patamares extremamente elevados. Continuamos reduzindo a desigualdade social e aumentando significativamente a renda dos trabalhadores. Superamos a visão incorreta que contrapõe, de um lado as medidas de incentivo ao crescimento, e de outro, os planos de austeridade. Esse é um falso dilema. A responsabilidade fiscal é tão necessária quanto são imprescindíveis medidas de estímulo ao crescimento, pois a consolidação fiscal só é sustentável em um contexto de recuperação da atividade econômica.
A história revela que a austeridade, quando exagerada e isolada do crescimento, derrota a si mesma. A opção do Brasil tem sido a de enfrentar, simultaneamente, esses desafios.
Ao mesmo tempo em que observamos um estrito controle das contas públicas, aumentamos nossos investimentos em infraestrutura e educação.
Ao mesmo tempo em que controlamos a inflação, atuamos vigorosamente nas políticas de inclusão social e combate à pobreza. E, ao mesmo tempo em que fazemos reformas estruturais na área financeira e previdenciária, reduzimos a carga tributária, o custo da energia e investimos em infraestrutura, em conhecimento para produzir ciência, tecnologia e inovação.
Há momentos em que não podemos escolher entre uma coisa ou outra. Não há este tipo de alternativa. Há que desenvolvê-las de forma simultânea e articulada.
Assim como em 2011, senhor presidente, o Oriente Médio e o Norte da África continuam a ocupar um lugar central nas atenções da comunidade internacional. Importantes movimentos sociais, com distintos signos políticos varreram regimes despóticos e desencadearam processos de transição cujo sentido e direção ainda não podem ser totalmente estabelecidos.
Mas não é difícil identificar em quase todos esses movimentos um grito de revolta contra a pobreza, o desemprego, a realidade da falta de oportunidades e de liberdades civis, impostas por governos autoritários a amplos setores dessas sociedades, sobretudo às populações mais jovens.
Não é difícil, igualmente, encontrar nesses acontecimentos as marcas de ressentimentos históricos, provocados por décadas de políticas coloniais ou neocoloniais levadas a cabo em nome de uma ação supostamente civilizatória. Pouco a pouco, foram ficando claros os interesses econômicos que estavam por de trás daquelas políticas.
Hoje, assistimos consternados à evolução da gravíssima situação da Síria. O Brasil condena, nos mais fortes termos, a violência que continua a ceifar vidas nesse país.
A Síria produz um drama humanitário de grandes proporções no seu território e em seus vizinhos. Recai sobre o governo de Damasco a maior parte da responsabilidade pelo ciclo de violência que tem vitimado grande número de civis, sobretudo mulheres, crianças e jovens. Mas sabemos também da responsabilidade das oposições armadas, especialmente daquelas que contam com apoio militar e logístico de fora.
Como presidenta de um país que é pátria de milhões de descendentes de sírios, lanço um apelo às partes em conflito para que deponham as armas e juntem-se aos esforços de mediação do representante especial da ONU e da Liga Árabe. Não há solução militar para a crise síria. A diplomacia e o diálogo são não só a melhor, mas, creio, a única opção.
Ainda como presidenta de um país no qual vivem milhares e milhares de brasileiros de confissão islâmica, registro neste plenário nosso mais veemente repúdio à escalada de preconceito islamofóbico em países ocidentais. O Brasil é um dos protagonistas da iniciativa generosa “Aliança de Civilizações”, convocada originalmente pelo governo turco.
Com a mesma veemência, senhor Presidente, repudiamos também os atos de terrorismo que vitimaram diplomatas americanos na Líbia.
Senhor Presidente,
Ainda com os olhos postos no Oriente Médio, onde residem alguns dos mais importantes desafios à paz e à segurança internacional, quero deter-me mais uma vez na questão israelo– palestina.
Reitero minha fala de 2011, quando expressei o apoio do governo brasileiro ao reconhecimento do Estado Palestino como membro pleno das Nações Unidas. Acrescentei, e repito agora, que apenas uma Palestina livre e soberana poderá atender aos legítimos anseios de Israel por paz com seus vizinhos, segurança em suas fronteiras e estabilidade política regional.
Senhor presidente,
A comunidade internacional tem dificuldade crescente para lidar com o acirramento dos conflitos regionais. E isto fica visível nos impasses do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Esse é um dos mais graves problemas que enfrentamos. A crise iniciada em 2008 mostrou que é necessário reformar os mecanismos da governança econômica mundial. Na verdade, isto até hoje não foi integralmente implementado.
As guerras e os conflitos regionais, cada vez mais intensos, as trágicas perdas de vidas humanas e os imensos prejuízos materiais para os povos envolvidos demonstram a imperiosa urgência da reforma institucional da ONU e em especial de seu Conselho de Segurança.
Não podemos permitir que este Conselho seja substituído – como vem ocorrendo – por coalizões que se formam à sua revelia, fora de seu controle e à margem do direito internacional.
O uso da força sem autorização do Conselho, uma clara ilegalidade, vem ganhando ares de opção aceitável. Mas, senhor Presidente, definitivamente, não é uma opção aceitável. O recurso fácil a esse tipo de ação é produto desse impasse que imobiliza o Conselho. Por isso, ele precisa urgentemente ser reformado.
O Brasil sempre lutará para que prevaleçam as decisões emanadas da ONU. Mas queremos ações legítimas, fundadas na legalidade internacional. Com esse espírito, senhor presidente, defendi a necessidade da “responsabilidade ao proteger” como complemento necessário da “responsabilidade de proteger”.
Senhoras e senhores,
O multilateralismo está hoje mais forte depois da Rio+20.
Naqueles dias de junho, realizamos juntos a maior e mais participativa conferência da história das Nações Unidas, no que se refere ao meio ambiente, e pudemos passos firmes rumo à consolidação histórica de um novo paradigma: crescer, incluir, proteger e preservar, ou seja, a síntese do desenvolvimento sustentável.
Agradeço especialmente o empenho do secretário-geral Ban Ki-moon e do embaixador Sha Zukang, que tanto colaboraram com o Brasil, antes e durante a Conferência.
O documento final que aprovamos por consenso no Rio de Janeiro não só preserva o legado de 1992, como constitui ponto de partida para uma agenda de desenvolvimento sustentável para o século XXI, com foco na erradicação da pobreza, no uso consciente dos recursos naturais e nos padrões sustentáveis de produção e consumo.
As Nações Unidas tem pela frente uma série de tarefas delegadas pela Conferência do Rio, somos parceiros. Menciono aqui, em particular, a definição dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.
A Rio+20 projetou um poderoso facho de luz sobre o futuro que queremos. Temos de levá-lo avante. Temos a obrigação de ouvir os repetidos alertas da ciência e da sociedade, no que se refere à mudança do clima. Temos de encarar a mudança do clima como um dos principais desafios às gerações presentes e futuras.
O governo brasileiro está firmemente comprometido com as metas de controle das emissões de gás de efeito estufa e com o combate, sem tréguas, ao desmatamento da Floresta Amazônica.
Em 2009, voluntariamente, adotamos compromissos e os transformamos em legislação. Essas metas são particularmente ambiciosas para um país em desenvolvimento, um país que lida com urgências de todos os tipos para oferecer bem-estar à sua população.
Esperamos que os países historicamente mais responsáveis pela mudança do clima, e mais dotados de meios para enfrentá-la, cumpram também com suas obrigações perante a comunidade internacional. Outra iniciativa das Nações Unidas que o Brasil também considera importante, que saudamos, é o lançamento da Década de Ação pela Segurança no Trânsito – 2011/2020. O Brasil está mobilizado nas ações de proteção à vida, que assegurem a redução dos acidentes de trânsito, uma das principais causas de morte entre a população jovem do mundo. Para isso, nosso governo está desenvolvendo uma ampla campanha de conscientização em parceria com a Federação Internacional de Automobilismo.
Senhor Presidente,
Em um cenário de desafios ambientais, crises econômicas e ameaças à paz em diferentes pontos do mundo, o Brasil continua empenhado em trabalhar com seus vizinhos por um ambiente de democracia, um ambiente de paz, de prosperidade e de justiça social.
Avançamos muito na integração do espaço latino-americano e caribenho como prioridade para nossa inserção internacional. Nossa região é um bom exemplo para o mundo. O Estado de Direito que conquistamos com a superação dos regimes autoritários que marcaram o nosso continente está sendo preservado e está sendo fortalecido.
Para nós, a democracia não é um patrimônio imune a assaltos, temos sido firmes, – Mercosul e Unasul – quando necessário, para evitar retrocessos porque consideramos integração e democracia princípios inseparáveis.
Reafirmo também o nosso compromisso de manter a região livre de armas de destruição em massa. E nesse ponto, quero lembrar a existência de imensos arsenais que, além de ameaçar toda a humanidade, agravam tensões e prejudicam os esforços de paz.
O mundo pede, em lugar de armas, alimentos, para o bilhão de homens, mulheres e crianças que padecem do mais cruel castigo que se abate sobre a humanidade: a fome.
Por fim, senhor Presidente, quero referir-me a um país-irmão, querido de todos os latino-americanos e caribenhos: Cuba. Cuba tem avançado na atualização de seu modelo econômico. E para seguir em frente nesse caminho, precisa do apoio de parceiros próximos e distantes.
Precisa do apoio de todos. A cooperação para o progresso de Cuba é, no entanto, prejudicada pelo embargo econômico que há décadas golpeia sua população. É mais do que chegada a hora de pôr fim a esse anacronismo, condenado pela imensa maioria dos países das Nações Unidas.
Senhor presidente,
Este ano, assistimos todos aos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos, organizados brilhantemente pelo Reino Unido. Com o encerramento dos Jogos de Londres, já começou, para o Brasil, a contagem regressiva para as Olimpíadas do Rio de Janeiro, em 2016, que serão precedidas pela Copa do Mundo de 2014.
A cada dois anos, durante os Jogos de verão e de inverno, a humanidade parece despertar para valores que nos deveriam inspirar permanentemente: a tolerância, o respeito pelas diferenças, a igualdade, a inclusão, a amizade e o entendimento, princípios que são também os alicerces dos direitos humanos e desta Organização.
Ao inaugurar esta sexagésima sétima Assembleia Geral, proponho a todas as nações aqui representadas que se deixem iluminar pelos ideais da chama olímpica.
Senhoras e senhores,
O fortalecimento das Nações Unidas é extremamente necessário neste estágio em que estamos, onde a multipolaridade abre uma nova perspectiva histórica. É preciso trabalhar para que assim seja. Trabalhar para que, na multipolaridade que venha a prevalecer, a cooperação predomine sobre o confronto, o diálogo se imponha à ameaça, a solução negociada chegue sempre antes e evite a intervenção pela força.
Reitero que nesse esforço, necessariamente coletivo, e que pressupõe busca de consensos, cabe às Nações Unidas papel privilegiado. Sobretudo, à medida que a Organização e suas diferentes instâncias se tornem mais representativas, mais legítimas e, portanto, mais eficazes.
Muito obrigada