Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
Sem poder fazê-lo pessoalmente, gostaria de agradecer por esta via a todos os velhos e novos amigos, aos curiosos intelectuais, interessados no personagem, tutti quanti compareceram à Livraria Argumento na noite do dia 17 de abril, no exato centenário do nascimento de Roberto Campos, para receber (aliás contra pagamento, mas neste caso vale a máxima de Milton Friedman) o livro O Homem que Pensou o Brasil (convite reproduzido abaixo).
Transcrevo, in fine, os nomes, tal como registrados nas papeletas de compra, de cada um que acolhi pessoalmente na mesa do lançamento, e desde já me desculpo por alguma omissão ou deslize de notação, involuntários, assim como me desculpo pelas palavras rápidas, necessariamente repetivas, nas várias dezenas de dedicaces que tive de fazer naquela noite. Ainda tive de fazer várias outras (embora não registradas), no dia seguinte, no seminário do Palácio do Itamaraty, um evento descontraído (ok, um ou outro entrevero conceitual), que serviu sobretudo de ambiente para um divertissement intelectual, com a presença de tão distinguidos palestrantes e participantes na ocasião. Desculpo-me por qualquer defeito na organização dos trabalhos, apenas a mim atribuível, mas agradeço, uma vez mais o carinho do reconhecimento e a gentileza do comparecimento, a um ou outro evento, ambos podendo ser considerados um sucesso total, pelo personagem, pela presença de muitos amigos, pelos que trabalharam na montagem do seminário.
AUTORES: don't panikiert! Eu tenho livros para encaminhar a cada um de vocês, mas estava esperando a redação de uma carta bem cuidada, explicando todo o processo de elaboração, confecção editorial, revisão e as escolhas que tive de fazer ao longo de um processo trabalhoso (mas plenamente satisfatório no plano intelectual) e, sobretudo, expedito, dada a pressa para a impressão a tempo do centenário. Vai chegar, prometo, antes do Papai Noel...
Muito grato pela compreensão, e pelo dispêndio adicional de um exemplar antecipado.
O abraço a todos, do
Paulo Roberto de Almeida
PS.: A lista dos "ratos de livraria", mesmo num dia chuvoso, como foi o 17 de abril:
Passei parte do dia atualizando o CV Lattes, o que ainda não havia feito este ano, registrando os trabalhos do primeiro quadrimestre de 2017, e aproveitando para ver onde andava o velocímetro, ou o contador dos diversos trabalhos publicados. Transcrevo aqui alguns dos resultados (mas apenas os mais recentes e os primeiros):
338. O Momento Político Brasileiro: Notas sobre a conjuntura política atual. Plural, São Paulo, v. 1, n.2, p. 89-95, 1978.
339. Soljenitzyn nas pegadas de Lênin. Opinião, São Paulo, v. 181, n.23 abril, p. 23-24, 1976.
340. La Fable du Miracle Économique: le développement de l?économie mondiale
capitaliste au Brésil. America Presse, Paris, v. 14, n.Avril-Mai, p.
4-5, 1974.
341. L'Etat Brésilien. La Revue Nouvelle, Bruxelles, n.11, p. 426-432, 1973.
342. Le Brésil: un miracle aux pieds d'argile. L'Entreprise et l'Homme, Bruxelles, v. 9, Novembre, p. 466-472, 1973.
Livros publicados/organizados ou edições
1. (org./autor) O Homem que Pensou o Brasil: trajetória
intelectual de Roberto Campos. 1. ed. Curitiba: Appris, 2017. v. 1. 373p
.
2.Die brasilianische Diplomatie aus historischer Sicht: Essays über die
Auslandsbeziehungen und Außenpolitik Brasiliens. 1. ed. Sarrebrucke:
Akademiker Verlag, 2015, 206p .
3. Révolutions Bourgeoises et Modernisation Capitaliste: Démocratie et
autoritarisme au Brésil. 1. ed. Sarrebruck, Alemanha: Éditions
Universitaires Européennes, 2015. 390p .
4.Nunca Antes na Diplomacia...: A política externa brasileira em tempos
não convencionais. 1. ed. Curitiba: Appris, 2014, 289p .
(...)
28.Relações internacionais e política externa do Brasil: dos
descobrimentos à globalização. 1. ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS,
1998, 360p .
29. Mercosul: Fundamentos e Perspectivas. 1. ed. São Paulo: LTr, 1998, 160p .
(...)
33.O Mercosul no contexto regional e internacional (São Paulo: Edições
Aduaneiras. 1. ed. São Paulo: Editora Aduaneiras, 1993, 204p .
Capítulos de livros publicados
1. Roberto Campos: o homem que pensou o Brasil. In: Paulo Roberto de
Almeida (org.). O Homem que Pensou o Brasil: trajetória
intelectual de Roberto Campos. 1ed. Curitiba: Appris, 2017, p.
19-33.
2. Roberto Campos: uma trajetória intelectual no século XX. In: Paulo
Roberto de Almeida (org.). O Homem que Pensou o Brasil:
trajetória intelectual de Roberto Campos. 1ed. Curitiba: Appris, 2017, p. 203-256.
3. Bretton Woods: o aprendizado da economia na prática. In: Ives Gandra da
Silva Martins; Paulo Rabello de Castro (orgs.). Lanterna na Proa:
Roberto Campos ano 100. 1ed. São Luís, MA: Resistência Cultural Editora,
2017, p. 52-56.
4. Fundando um banco de desenvolvimento: o BNDE. In: Ives Gandra da Silva
Martins; Paulo Rabello de Castro (orgs.). Lanterna na Proa: Roberto
Campos ano 100. 1ed. São Luís, MA: Resistência Cultural Editora, 2017, p. 71-74.
5. Roberto Campos: receita para desenvolver um país. In: Ives Gandra da
Silva Martins; Paulo Rabello de Castro (orgs.). Lanterna na Proa:
Roberto Campos ano 100. 1ed. São Luís, MA: Resistência Cultural Editora,
2017, p. 245-248.
6. Oswaldo Aranha: in the continuity of Rio Branco?s Statesmenship. In:
José Vicente Pimentel (org.). Brazilian Diplomatic Thought:
policymakers and agents of Foreign Policy (1750-1964). 1ed. Brasilia:
Funag, 2017, v. 3, p. 685-730 (available:
http://funag.gov.br/boletim-editorial/PDB-EN/livros/PDB-Ingles-VOL-3.pdf).
7. O pensamento estratégico de Varnhagen: contexto e atualidade. In:
Sérgio Eduardo Moreira Lima (org.). Varnhagen (1816-1878): diplomacia e
pensamento estratégico. 1ed.Brasília: Funag, 2016, p. 125-197 (disponível:
link:
http://funag.gov.br/loja/download/1156-varnhagen-1816-1878.pdf).
(...)
117. Os Anos 80: da nova Guerra Fria ao fim da bipolaridade. In: Flávio
Sombra Saraiva (org.); Amado Luiz Cervo; Wolfgang Döpke; Paulo Roberto de
Almeida. Relações internacionais Contemporâneas: da construção
do mundo liberal à globalização, 1815 a nossos dias. Brasília: Paralelo
15, 1997, p. 303-353.
118. Mercosur y Unión Europea: de la cooperación a la asociación. In:
Georges Couffignal e Germán A. de la Reza (orgs.). Los Procesos de
Integración en América Latina: enfoques y perspectivas. Estocolmo:
Institute of Latin American Studies, University of Stockholm, 1996, p. 113-130.
119. The ?New? Intellectual Property Regime and its Economic Impact of
Developing Countries: a preliminary overview. In: Giorgio Sacerdoti.(org.). Liberalization of Services and Intellectual Property in the
Uruguay Round of GATT. 1ed. Friburgo: University Press of Firbourg, 1990,
p. 74-86.
120. A Diplomacia do Liberalismo Econômico: As relações econômicas
internacionais do Brasil durante a Presidência Dutra. In: José Augusto
Guilhon de Albuquerque (org.). Sessenta Anos de Política Externa
Brasileira. São Paulo: Cultura Editores associados, 1990, v. 1, p.
173-210.
121. O Paradigma Perdido: a Revolução Burguesa de Florestan Fernandes. In:
Maria Angela d?Incao (org.). O Saber Militante: Ensaios sobre Florestan
Fernandes. 1ed. São Paulo - Rio de Janeiro: UNESP - Paz e Terra, 1987,
p. 209-229.
77. Roberto Campos: dois anos sem bons combates de idéias, Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 06 out. 2003.
78. O Brasil e o Consenso de Washington, Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 04 set. 2003.
79. Robert Levine: um gigante do brasilianismo acadêmico, Jornal da Ciência, Rio de Janeiro, SBPC, v. 2253, 04 abr.
2003.
80. O Brasil e o FMI: meio século de idas e vindas, Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 27 jan. 2003.
81. Ricos e Arrogantes (Entrevista concedida à revista Veja: Páginas
Amarelas). Veja, São Paulo, n. 723, p. 11-15, 24 out. 2001.
Apresentações de Trabalho
1. Roberto Campos, 100 anos: atualidade de suas ideias. 2017.
2. Da velha guerra fria geopolítica à nova guerra fria econômica: cenários
prospectivos das relações internacionais. 2017.
3. A política externa e a diplomacia brasileira no século XXI. 2017.
4. Velhos e novos movimentos políticos na crise brasileira recente. 2016.
5. Da democracia na América do Sul: o que Tocqueville diria das atuais
mudanças políticas e econômicas no continente?. 2016.
(...)
40. O impacto da economia nas relações internacionais contemporâneas. 2012.
41. Pensamento brasileiro em Relações Internacionais. 2012.
42. A política externa das relações Sul-Sul: um novo determinismo
geográfico?. 2012.
43. Brazil as a regional player and as an emerging global power: Foreign
policy strategies and the impact on the new international order. 2007.
Outras produções bibliográficas
1.Volta ao Mundo em 25 Ensaios: Relações Internacionais e Economia Mundial.
Hartford, CT, EUA:
Autor, 2014 (livro digital).
2. Rompendo Fronteiras: a Academia pensa a Diplomacia.
Hartford, CT, EUA:
Autor, 2014 (livro digital).
3.Codex Diplomaticus Brasiliensis: livros de diplomatas brasileiros.
São Paulo:
Autor, 2014 (livro digital).
4.Polindo a Prata da Casa: mini-resenhas de livros de diplomatas.
São Paulo:
Autor, 2014 (livro digital).
Participação em eventos, congressos, exposições e feiras
1. O que esperar de 2017? Política, economia
e relações internacionais. 2017. (Seminário).
2.Latin American Studies Association.
Presidential leadership and economic regimes in Brazil: structural
transformations, institutional building up. 2014. (Congresso).
3. Economic & Business History Society.
Brazilian Economic Historiography: an essay on bibliographical
synthesis. 2013. (Congresso).
4.Brazilian Studies at London's King's College. Emerging Brazil: the past, the present, and the future. 2012. (Oficina).
5. Dépasser les dichotomies: (comment)
penser autrement les Amériques?.La grande marche en arrière de
l'Amérique Latine. 2012. (Seminário).
6. La politique extérieure du Brésil: du
passé lointain au futur proche. 2012. (Oficina).
(...)
119.V° Corso sulla cooperazione e lo svluppo
internazionali: Città e campagna nei processi di sviluppo.Modernisation
et Urbanisation au Brésil: 1940-1990.
1990. (Simpósio).
120. V Encuentro Regional de História
(Montevideu).Internacionalismo Proletário no Cone Sul: a experiência
internacional do sindicalismo brasileiro no começo do século.
1990. (Simpósio).
121.Conferência comemorativa do 20°
aniversário do Instituto Universitario di Bergamo.The New Intellectual
Property Regime and its Economic Impact on Developing Countries.
1989. (Simpósio).
122. Europa e Brasil no limiar do Ano 2000. Retorno ao Futuro: a ordem internacional em direção do horizonte 2000.
1988. (Simpósio).
123. Seminário sobre a obra de Florestan
Fernandes. O Paradigma Perdido: a Revolução Burguesa de Florestan
Fernandes. 1986. (Seminário).
124. Conferência sobre os Partidos Políticos e a Política Externa no Brasil. Partidos Políticos e a Política Externa no Brasil.
1985. (Simpósio).
(Seleção dos títulos iniciais e finais de algumas séries selecionadas)
Itamaraty vive dia inteiro de homenagens ao diplomata liberal Roberto Campos
Seminário reuniu acadêmicos, ex-embaixadores e economistas para prestar tributo ao centenário liberal mato-grossense; o Boletim estava lá e conta como foi
- Boletim da Liberdade, dia
O tradicional Salão Nobre do Palácio do Itamaraty, no Rio de Janeiro, viveu nesta terça-feira (18/04) uma manhã-tarde histórica. Das nove da manhã até pouco depois das seis horas da noite, o espaço foi frequentado por figuras de relevo do universo da diplomacia e da Economia que vieram prestar seu tributo a uma das mais expressivas personalidades brasileiras: o liberal Roberto Campos, que completaria 100 anos no dia anterior.
O seminárioRoberto Campos: o homem que pensou o Brasilfoi organizado pelo diplomata Paulo Roberto de Almeida e pela Fundação Alexandre de Gusmão, com parceiros como o Instituto Millenium. Bem ao lado da entrada do salão, havia um estande com vários livros disponíveis para compra. Além de alguns clássicos de Campos, como o próprioA Lanterna na Popa, duas obras em homenagem ao seu centenário:O Homem que pensou o Brasil: Trajetória intelectual de Roberto Campos, organizado pelo próprio Paulo Roberto com outros onze intelectuais e lançado pela Appris Editora, eLanterna na Proa: Roberto Campos Ano 100, editado pela Livraria Resistência Cultural e organizado por Ives Gandra Martins e Paulo Rabello de Castro, com textos de 62 autores.
O seminário, de muitas maneiras, foi do jeito que Roberto Campos gostaria: repleto de piadas, referências divertidas às suas críticas mordazes à esquerda e até alguns princípios de discussão mais inflamada, ao estilo dos seus debates acalorados. OBoletimesteve presente e conta o que aconteceu em cada mesa do evento.
Mesa 1: O intelectual
Antes de os palestrantes se sentarem à mesa, aconteceu uma breve série de discursos de abertura. O destaque ficou para o próprio Paulo Roberto de Almeida, que contou uma divertida história. Durante a elaboração do livro que organizou, sua esposa lhe teria dito para escolher entre ela e Campos, tamanha a dedicação que estava investindo no projeto. “Felizmente, tudo se resolveu”, disse, entre risos. Almeida também disse que a intenção era que todos os palestrantes se “divertissem”, evocando o espírito bem humorado do próprio personagem homenageado.
Em seguida, teve início a mesa que tinha por tema sugerido a discussão sobre as concepções intelectuais de Roberto Campos. O primeiro a falar foi Ernesto Lozardo, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Ele contou como recuperou a famosa dissertação de mestrado de Campos em 1947 na universidade George Washington, uma raridade que o próprio economista havia perdido. Lozardo disse que Campos foi generoso com ele ao protege-lo do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social do regime militar) e salientou que acreditava na época em uma espécie de “socialismo cristão”, mas descobriu que o liberal mato-grossense é que tinha “a solução para o Brasil”. Anunciou ainda que está produzindo um livro sobre o pensamento econômico de Campos.
Ney Prado, presidente da Academia Internacional de Direito e Economia, ocupou quase todo o seu discurso lendo as duras críticas de Roberto Campos à Constituição de 1988, arrancando risos dos presentes. Em seguida, o professor Ricardo Vélez Rodríguez, docente da Faculdade Arthur Thomas, de Londrina, e autor de obras lançadas pelo Instituto Liberal, pesquisador do patrimonialismo brasileiro, comparou Campos aos liberais doutrinários franceses, com “coragem de chutar o pau da barraca” e um crítico radical das instituições, ao mesmo tempo em que crente nelas e na possibilidade de melhorá-las.
Reginaldo Perez, cientista político e professor na UFSM do Rio Grande do Sul, defendeu uma tese acadêmica sobre o pensamento político de Campos, e discursou sobre seu perfil de modernizador. Definiu-o como um dos maiores, “se não o maior”, pensadores brasileiros do século XX, e frisou: “ele era brasileiro e pensou o Brasil. O nome deste senhor não é Bob Fields, é Roberto Campos”. A mesa terminou com Eduardo Viola, professor da UnB, que ressaltou a evolução de Campos para um pensamento cada vez mais liberal e fez observações com um tom crítico à sua defesa da ideia de que o regime militar apresentava um “autoritarismo consentido”, o que, a seu ver, o afastaria da dimensão política do liberalismo, mas frisou que, em todas as suas fases, Campos defendeu com afinco o alinhamento do Brasil “à ordem liberal ocidental, dirigida pelos Estados Unidos”.
Mesa 2: O parlamentar
Como político, Roberto Campos foi senador e deputado federal. O jornalista Merval Pereira, membro da Academia Brasileira de Letras, definiu sua atuação no Congresso como Campos mesmo a sintetizava: “uma sucessão de derrotas”. Contou algumas curiosidades daquele tempo e ressaltou o pragmatismo do mato-grossense, que “respeitava intelectualmente Fernando Henrique Cardoso” e elogiou o líder chinês Deng Xiaoping pelas reformas mais pró-mercado que realizava, ainda que sob comando de um Partido Comunista.
O professor da UnB e consultor legislativo Antônio José Barbosa foi bastante aplaudido em um longo comentário em que abordou a missão do historiador, que comparou à de um detetive, e descreveu os grandes discursos de Campos como momentos memoráveis que nenhum parlamentar queria perder. No primeiro deles, “fez um inventário de sua vida e pediu para não ser interrompido, o que era anti-regimental. Mesmo assim, todos obedeceram”. Já o também professor da UnB e assessor legislativo, Paulo Kramer, fez uma comparação entre Campos e o francês Raymond Aron, e definiu Roberto como um pensador “dionisíaco” pelo seu espírito divertido. O clima esquentou quando um diplomata na plateia defendeu medidas do governo lulopetista na área da Educação e Kramer elevou a voz para contradizê-lo.
Mesa 3: O estadista e modernizador
Nesta mesa, após um intervalo para o almoço, grandes nomes da Economia se reuniram para destacar a importância de Campos em suas formações. A mesa foi logo aberta pelo ex-presidente do Banco Central, Gustavo Franco, conhecido pela sua importância no Plano Real. Franco fez uma crítica velada ao governo Dilma e disse que as críticas de Roberto Campos a Fernando Henrique ajudaram a ala mais liberal do ministério, da qual ele fazia parte, a tornar o Plano Real um sucesso.
Roberto Castello Branco, diretor da FGV-RJ e ex-diretor do Banco Central, afirmou que “o momento atual evidencia a atualidade e correção das ideias que Campos defendia”. Em discurso bastante focado na atualidade, ele atacou o Estado intervencionista e sua associação com os “capitalistas contra o capitalismo”, e se pôs a um interessante exercício: refutar todos os ataques sutis a Campos que encontrou em textos jornalísticos na semana.
O momento atual evidencia a atualidade e correção das ideias que Campos defendia
O economista e professor Luiz Alberto Machado afirmou que a fase intervencionista de Roberto Campos sempre foi marcada pelo esforço por redesenhar rumos e estruturas, nunca tornar o Estado empresário, e disse que o fio condutor da sua atuação sempre foi a meritocracia. Finalmente, o economista Rubens Novaes, que já escreveu artigos para o Instituto Liberal, disse que Campos e Milton Friedman foram seus dois gurus, e que o mato-grossense foi “o melhor dos nossos frasistas”, pondo-se a recitar algumas sentenças do homenageado.
A mesa terminou com algumas trocas interessantes de comentários. Em clima fraterno, Castello Branco e Gustavo Franco divergiram sobre a comparação entre o PAEG (plano econômico de Roberto Campos no primeiro governo militar) e o Plano Real. Franco disse que o Plano Real foi superior, ainda que talvez por certa “razão paternal”, e afirmou que pensadores como Roberto Campos deixaram o caminho aberto para as reformas que ele e seus colegas implementaram. O organizador Paulo Roberto de Almeida aproveitou para citar artigo que publicou no siteSpotniks,Dez grandes derrotados da nossa história, em que apontou Gustavo Franco como herdeiro intelectual de Campos.
Mesa 4: O diplomata
A última mesa do dia abordou a atuação diplomática de Roberto Campos. Primeiro falaram dois embaixadores que trabalharam com ele: Vitoria Alice Cleaver, presidente da ADB, e Marcilio Marques Moreira, ex-ministro da Fazenda no governo Collor. A embaixadora ressaltou a difícil relação entre Campos e o presidente Geisel, e definiu-o como “tímido, discreto, mas ativo, erudito e arguto”. Já o embaixador preferiu fazer menção honrosa à equipe que cercou Campos em suas tarefas, apontando-o como um competente “aliciador de talentos, inclusive sem discriminação ideológica”.
Em seguida, a palavra ficou com Rogério de Souza Farias, gestor público do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, que fez uma apresentação emPower Pointcom dados numéricos da atividade de Campos como diplomata em comparação com outras personalidades que ocuparam as mesmas funções desde a proclamação da República. O último palestrante foi José Mario Pereira, editor da Topbooks que publicouA Lanterna na Popa. José Mario leu um depoimento sobre sua convivência com o “doutor Roberto”, revelando gratidão por ter sido escolhido entre várias outras editoras e trazendo relatos engraçados.
O seminário terminou com um autêntico “puxão de orelha”. É que o embaixador Jerônimo Moscardo, convidado por Paulo Roberto de Almeida para dizer ao seu lado as palavras finais, foi entusiasticamente aplaudido ao dizer que, quando se fala em PAEG e Plano Real, os nomes dos ex-presidentes Castelo Branco e Itamar Franco precisam ser mencionados, porque foram as autoridades que permitiram a realização desses planos, e eles não tinham sido mencionados em destaque nenhuma vez durante todo o dia.
Errata (atualizado em 20/04, às 12h20): o embaixador que fez o discurso de encerramento ao lado de Paulo Roberto de Almeida foi Jerônimo Moscardo, vice-presidente da Funag, e não Sérgio Moreira Lima, o presidente, que esteve viajando.
Além de alguns clássicos de Campos, como "A Lanterna na Popa" (Topbooks), duas obras em homenagem ao seu centenário estiveram disponíveis no seminário: "O Homem que pensou o Brasil: Trajetória intelectual de Roberto Campos", organizado por Paulo Roberto com outros onze intelectuais e lançado pela Appris Editora, e "Lanterna na Proa: Roberto Campos Ano 100", editado pela Livraria Resistência Cultural e organizado por Ives Gandra Martins e Paulo Rabello de Castro, com textos de 62 autores.
"Felizmente, Campos foi poupado do
desgosto de assistir à enorme destruição de riqueza causada pela política
econômica do governo que ascendeu ao poder em 2003"
Paulo Roberto de Almeida*
16 Abril 2017 | 05h00
Foto: Reprodução
Capa do livro O homem
que pensou o Brasil
“Se formos reler, hoje, o Roberto Campos dos ensaios econômicos
mais elaborados dos anos 1950, o publicista dos artigos semanais nos grandes
jornais do Rio e de São Paulo nas décadas seguintes e até o final do século,
constataremos que tudo o que ele escreveu, tudo o que ele proclamou, tudo pelo
que ele se bateu, insistiu e até conseguiu implementar, pelo menos
parcialmente, retornou como um pesadelo a frequentar o cérebro das gerações
presentes das formas mais inesperadas e em uma rapidez surpreendente.
Ele foi, “felizmente”, poupado do desgosto de assistir à enorme
destruição de riqueza(...) causada pela política econômica irresponsável dos
companheiros que ascenderam ao poder em 2003, por haver falecido dois anos
antes. Em face dos cenários de terra arrasada, ele teria de reescrever, com
poucas mudanças substantivas, seus artigos de décadas passadas, quando alertava
continuamente para o perigo do “meio sucesso” ou do “meio fracasso” – uma
situação na qual o país não conhece o pleno sucesso da estabilização, que
induziria reformas suplementares e criaria o clima de confiança necessário para
alimentar um processo de crescimento sustentado, nem a ruína do fracasso
completo, que comandaria, sem hesitação, a realização de reformas estruturais
radicais.
Roberto Campos é provavelmente único, por suas características
pessoais e por suas posições independentes, no seio de um grupo bastante
reduzido de intelectuais públicos no Brasil: o dos livres-pensadores. Mais
ainda: dentro dessa pequena família, ele se filia a uma espécie ainda mais
escassa, a dos rebeldes com causa, a dos que não se prendem a qualquer escola
oficial, a dos que se recusam a deixar de exibir pensamento próprio apenas
porque são servidores do Estado, a dos que pensam fora dos dogmas oficiais, das
verdades estabelecidas e dos lugares comuns.
Roberto Campos nunca se esquivou de denunciar as falácias da
demagogia política e do populismo econômico, assim como da repartição de
benesses sem apoio no realismo econômico. Não hesitou em renunciar a posições oficiais
(a presidência do BNDE e a chefia da embaixada em Washington) quando achou que
não podia sustentar posturas irresponsáveis. Ele também foi único, em sendo
diplomata, em não hesitar em criticar – até de forma irônica – as tomadas de
posição equivocadas do Itamaraty e dos governos militares no plano externo.
Ele foi aquele que viu antes, mais e melhor do que qualquer outro
de sua geração ou mesmo das gerações atuais, um intelectual que pensou o Brasil
de forma tão completa, tão dedicada e tão racional que ele ainda está presente,
integralmente, nas soluções que nossa geração precisa encontrar para os
problemas atuais, com base nas mesmas recomendações que ele teve o cuidado de
formular décadas atrás.
Ele foi um “profeta responsável”, como se denominou ao final de
seu livro de memórias, um empreendimento inigualado na literatura brasileira e
que deveria ser leitura quase compulsória para todos os candidatos a integrar a
tecnocracia nacional Aos cem anos, Roberto Campos ainda vive.”
SERVIÇO:
Obra: O homem que pensou o Brasil
Autor: Paulo Roberto de Almeida
(organizador)
Editora: Appris
Preço: R$ 65 (edição impressa) e R$ 18
(edição digital
*PAULO ROBERTO DE ALMEIDA, ORGANIZADOR DO
LIVRO “O HOMEM QUE PENSOU O BRASIL”, É DIRETOR DO INSTITUTO DE PESQUISA DE
RELAÇÕES INTERNACIONAIS (IPRI)
Os trechos acimaforam retirados de uma seção de meu capítulo introdutório ao livro que organizei em homenagem ao Roberto Campos.