Um rebelde com
causa
"Felizmente, Campos foi poupado do
desgosto de assistir à enorme destruição de riqueza causada pela política
econômica do governo que ascendeu ao poder em 2003"
Paulo Roberto de Almeida*
16 Abril 2017 | 05h00
Foto: Reprodução
Capa do livro O homem
que pensou o Brasil
“Se formos reler, hoje, o Roberto Campos dos ensaios econômicos
mais elaborados dos anos 1950, o publicista dos artigos semanais nos grandes
jornais do Rio e de São Paulo nas décadas seguintes e até o final do século,
constataremos que tudo o que ele escreveu, tudo o que ele proclamou, tudo pelo
que ele se bateu, insistiu e até conseguiu implementar, pelo menos
parcialmente, retornou como um pesadelo a frequentar o cérebro das gerações
presentes das formas mais inesperadas e em uma rapidez surpreendente.
Ele foi, “felizmente”, poupado do desgosto de assistir à enorme
destruição de riqueza(...) causada pela política econômica irresponsável dos
companheiros que ascenderam ao poder em 2003, por haver falecido dois anos
antes. Em face dos cenários de terra arrasada, ele teria de reescrever, com
poucas mudanças substantivas, seus artigos de décadas passadas, quando alertava
continuamente para o perigo do “meio sucesso” ou do “meio fracasso” – uma
situação na qual o país não conhece o pleno sucesso da estabilização, que
induziria reformas suplementares e criaria o clima de confiança necessário para
alimentar um processo de crescimento sustentado, nem a ruína do fracasso
completo, que comandaria, sem hesitação, a realização de reformas estruturais
radicais.
Roberto Campos é provavelmente único, por suas características
pessoais e por suas posições independentes, no seio de um grupo bastante
reduzido de intelectuais públicos no Brasil: o dos livres-pensadores. Mais
ainda: dentro dessa pequena família, ele se filia a uma espécie ainda mais
escassa, a dos rebeldes com causa, a dos que não se prendem a qualquer escola
oficial, a dos que se recusam a deixar de exibir pensamento próprio apenas
porque são servidores do Estado, a dos que pensam fora dos dogmas oficiais, das
verdades estabelecidas e dos lugares comuns.
Roberto Campos nunca se esquivou de denunciar as falácias da
demagogia política e do populismo econômico, assim como da repartição de
benesses sem apoio no realismo econômico. Não hesitou em renunciar a posições oficiais
(a presidência do BNDE e a chefia da embaixada em Washington) quando achou que
não podia sustentar posturas irresponsáveis. Ele também foi único, em sendo
diplomata, em não hesitar em criticar – até de forma irônica – as tomadas de
posição equivocadas do Itamaraty e dos governos militares no plano externo.
Ele foi aquele que viu antes, mais e melhor do que qualquer outro
de sua geração ou mesmo das gerações atuais, um intelectual que pensou o Brasil
de forma tão completa, tão dedicada e tão racional que ele ainda está presente,
integralmente, nas soluções que nossa geração precisa encontrar para os
problemas atuais, com base nas mesmas recomendações que ele teve o cuidado de
formular décadas atrás.
Ele foi um “profeta responsável”, como se denominou ao final de
seu livro de memórias, um empreendimento inigualado na literatura brasileira e
que deveria ser leitura quase compulsória para todos os candidatos a integrar a
tecnocracia nacional Aos cem anos, Roberto Campos ainda vive.”
SERVIÇO:
Obra: O homem que pensou o Brasil
Autor: Paulo Roberto de Almeida
(organizador)
Editora: Appris
Preço: R$ 65 (edição impressa) e R$ 18
(edição digital
*PAULO ROBERTO DE ALMEIDA, ORGANIZADOR DO
LIVRO “O HOMEM QUE PENSOU O BRASIL”, É DIRETOR DO INSTITUTO DE PESQUISA DE
RELAÇÕES INTERNACIONAIS (IPRI)
Os trechos acima foram retirados de uma seção de meu capítulo introdutório ao livro que organizei em homenagem ao Roberto Campos.
Paulo Roberto de Almeida
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