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domingo, 5 de setembro de 2010

Xenofobia fundiaria e nacionalismo contraproducente: explico as razoes...

Já coloquei vários posts aqui mesmo sobre as medidas tomadas pelo governo para limitar a compra de terras por estrangeiro (recentíssima), ou para proibir qualquer compra de terras nas faixas de fronteira (esta uma excrescência do governo militar). Neste post, por exemplo:

Nacionalismo fundiário só pode atrasar o país...

Isso a propósito das declarações de "eminentes" economistas -- como o Delfim Netto, por exemplo -- que nas últimas semanas vem dando entrevistas ou publicando artigos alertando para o terrível perigo que consiste em deixar empresas chinesas comprarem empresas de mineração no Brasil ou terras, para plantar alimentos e exportar para a China. Eles consideram isso um atentado à soberania e um perigo para a defesa nacional, já que muitas dessas empresas chinesas são estatais, alegam os neonacionalistas fundiários.
Já troquei impressões com colegas e amigos a esse respeito, e reparei que eles também aprovam as medidas do governo -- que já provocaram, por exemplo, desistência de uma grande empresa de celulose, que pretendia investir no sul do Brasil para abastecer sua fábrica no Uruguai -- e também são contra a entrada de empresas chinesas no mercado brasileiro, entre outros motivos por elas serem estatais ou receberem apoio do governo.

Vou expor claramente minha posição, sem precisar chamar ninguém de idiota, como já fiz, de modo inadequado anteriormente (me desculpo, mas não consigo evitar uma reação desse tipo quando ouço algo que me parece um simples non-sense, para não dizer outra coisa).
Pois bem, vejamos quais são minhas razões, e convido qualquer um a expor as suas, contrárias às minhas, com base em argumentos que tenham consistência, não ofendam à lógica formal e sejam algo mais do que a simples exposição do nacionalismo superficial, epidérmico, que não serve como razão. São requeridas razões econômicas e políticas para fazê-lo, se posso colocar essa exigência.

A China vem crescendo de modo extraordinário nos últimos 20 anos, pelo menos. Nunca houve, nem provavelmente jamais haverá, no futuro previsível, um outro país como ela, com essa taxa de crescimento sustentado, durante tanto tempo: isso é inédito na história econômica mundial. Mesmo a China, dentro de alguns, vai diminuir o seu ritmo e deixar essas taxas fenomenais no passado.
A função de suas empresas, privadas ou estatais, e mesmo a função de seu governo, é a de assegurar que as empresas tenham insumos em volumes suficientes para atender à demanda (que, diga-se de passagem, é de origem estrangeira: a China presta um favor ao mundo, aos países desenvolvidos em primeiro lugar, ao acolher suas indústrias poluidoras e ao produzir bens de consumo corrente para eles). Os governantes chineses também têm a obrigação de garantir suficiente abastecimento alimentar ao seu povo.
Até agora -- e tudo indica que essa política "não-agressiva" vai continuar -- os chineses vêm agindo corretamente, ou seja, via mercados comerciais e via investimentos diretos no exterior. Eles têm o direito de fazer isso, e todos os países ocidentais já o fizeram no passado, inclusive com materiais estratégicos como petróleo.

Nesse processo, os chineses tem procurado comprar empresas mineradoras no Brasil e também terras. As mineradoras são geralmente empresas deficitárias, que custam barato. Os chineses pretendem investir e retirar minério para exportar para a China: que sejam empresas estatais ou não, dá no mesmo, pois elas são obrigadas a se registrar como empresas "brasileiras", a cumprir toda a legislação brasileira e vão pagar impostos e obter receita no Brasil, como aliás qualquer empresa estrangeira faria.
Com as terras ocorre o mesmo: elas vão investir, e depois exportar alimentos para a China. Como outras já fazem. Elas não vão exportar terras, obviamente, apenas o que a terra produzir.

Empresas brasileiras, podem quando desejarem, destinar toda a sua produção de minérios ou alimentos para a China, e ninguém vai achar nada de estranho nisso. Por que as empresas chinesas não poderiam fazê-lo?
"Ah, por que são estrangeiras", diriam alguns, ou "porque são estatais chinesas", dirão outros, como se isso fosse um pecado ou um probema para o Brasil.
O fato de elas buscarem atender ao mercado chinês muda alguma coisa para o Brasil, para o povo brasileiro, para o governo? O brasileira vai deixar de ter minério ou de se alimentar porque alguma empresa está exportando toda a sua produção?
Ora, não sejamos ingênuos...
A xenofobia, não tem NENHUMA razão econômica de ser, inclusive porque temos empresas que destinam TODA a sua produção para o exterior, qualquer que seja o país.
"Ah, os chineses podem manipular os preços", podem aventar a hipótese outros. E o que impede as empresas estrangeiras não chinesas ou as brasileiras de fazê-lo?
Onde está a diferença substancial?
Chega de xenofobia ingênua, portanto.

Mas, vou usar outro argumento, talvez absurdo, mas nenhuma hipótese é absurda no longo prazo.
Imaginemos que o Brasil destruiu todas as suas florestas, contaminou todas as suas terras, esgotou todos os seus recursos naturais, o que ele simplesmente não tenha mais terras agricultáveis para alimentar uma gigantesca população, que passou das centenas de milhões. A hipótese pode soar absurda agora, mas ela é pelo menos plausível, reconheçamos.
Frente a esse quadro, empresas brasileiras e o próprio governo brasileiro investem no exterior, depois de esgotadas todas as possibilidades comerciais para atender à demanda interna.
O que diriam esses mesmos brasileiros xenófobos se países estrangeiros viessem dizer: "Ah, desculpem, vocês não podem investir aqui, pois temos limitações contra estrangeiros, vocês são brasileiros, vocês destruiram todas as suas reservas naturais, vocês não têm esse direito de vir aqui destruir as nossas também..."

Pois é, suponho que os brasileiros se sentiriam discriminados e descontentes com esse tipo de limitação absurda, de impedimento irracional, não economicamente justificável, pois o que se quer, justamente, é investir, produzir, exportar, criar empregos e riquezas no país produtor.

Bem, estas são minhas posições. Quem tiver argumentos contrários que se sustentem com base na boa economia e na boa política, sem nacionalismos superficiais, pode expô-los aqui mesmo.

Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 5.09.2010)

terça-feira, 24 de agosto de 2010

De volta a era militar no Brasil - nacionalismo fundiario

O governo já adorava a política de planejamento e o estatismo exacerbado da era militar. Agora adota até suas leis preferidas.
Mais um pouco começa uma nova campanha "Brasil, Grande Potência". Aliás, já começou, sem esse título explícito, mas a intenção é a mesma...
Paulo Roberto de Almeida

União limita compra de terras por estrangeiros
Juliano Basile, de Brasília
Valor Econômico, 24/08/2010

O parecer é de teor nacionalista e retoma a visão da Lei nº 5.709, sancionada em outubro 1971 pelo general Emílio Garrastazu Médici

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu limitar a compra de terras por estrangeiros e empresas brasileiras controladas por estrangeiros. Ele assinou o parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que restringe as aquisições de imóveis rurais por empresas que possuem pelo menos 51% ou mais de seu capital votante nas mãos de pessoas que não são brasileiras.

O texto prevê que as empresas sob controle estrangeiro não vão poder adquirir imóvel rural que tenha mais de 50 módulos de exploração indefinida (entre 250 a 5 mil hectares, dependendo da região do país). Elas também terão de se limitar à implantação de projetos agrícolas, pecuários e industriais que estejam vinculados a seus objetivos de negócio previstos em estatuto. As áreas rurais pertencentes a empresas estrangeiras não poderão ultrapassar 25% do município.

O parecer é de teor nacionalista e retoma a visão da Lei nº 5.709, sancionada em outubro 1971 pelo general Emílio Garrastazu Médici durante o governo militar. Ela determinava que, em setores imprescindíveis ao desenvolvimento, só empresas de capital nacional poderiam comprar terras. O parecer assinado por Lula tem um tom muito parecido e sua conclusão é a de que a lei de 1971 é compatível com a Constituição de 1988.

A decisão de Lula foi motivada pelo interesse de estrangeiros no Brasil diante da valorização das commodities agrícolas, da crise mundial de alimentos e do desenvolvimento de biocombustíveis. O fato de o presidente ter assinado o texto da AGU torna obrigatório o seu cumprimento dentro da Administração Pública. Órgãos como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) terão de seguir essas diretrizes ao analisar pedidos de companhias internacionais para comprar terras no Brasil.

Lula demorou quase dois anos para decidir se assinava ou não o texto da AGU. O Ministério da Defesa entendia que a aquisição de terras por empresas estrangeiras era permitida pela Constituição, portanto, um parecer da AGU não poderia resolver o assunto - seria necessária a aprovação de emenda constitucional. Já o Ministério da Justiça defendia uma diferenciação para as compras realizadas na Amazônia.

O texto não tem efeito retroativo - não anula compras de terras feitas por estrangeiros até a semana passada. No mês passado, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou que os cartórios do país façam o registro de todos os casos de terras adquiridas por estrangeiros.