2020: o ano que não terminou
Paulo Roberto de Almeida
(www.pralmeida.org; http://diplomatizzando.blogspot.com; pralmeida@me.com)
[Objetivo: reflexão; finalidade: dar início a um novo ano de reflexões]
Até aqui tínhamos, ao que parece, apenas um ano que não terminou: 1968, segundo uma obra consagrada na nossa estante de literatura política sobre os anos da ditadura militar. Agora, já podemos contar com um segundo ano que não está perto de terminar: o de 2020, excepcional a mais de um título, por razões exógenas – um vírus animal transplantado para a espécie humana –, mas sobretudo por razões endógenas, que têm a ver com as atitudes, ativas ou passivas, tomadas pelos encarregados de enfrentar desafios externos e internos. Alguns o fizeram ao máximo, outros fizeram o mínimo, e outros, ainda, além de não fazerem nada contribuíram ativamente para agravar o quadro já por si pavoroso da pandemia, a pior desde a Peste Negra do século XIV e desde a “gripezona” de cem anos atrás.
Por que o ano de 2020 ainda não acabou? Porque seus efeitos adentram no novo ano do calendário e devem se prolongar por vários meses mais, talvez indefinidamente. A despeito das expectativas promissoras com a chegada de cinco ou mais vacinas, os mortos continuarão a se acumular por algum tempo mais, meses adicionais de angústias, de cuidados, de temores, de preocupações e de sofrimento, com os que ainda vão partir, seja por falta de cuidados próprios, ou pela falta de cuidados daqueles que foram eleitos para cuidar da coletividade. O ano só vai acabar quando a balança pender para o lado da esperança, não do desespero. Não sei quando será o “tipping point”, talvez no meio de 2021, talvez um pouco mais adiante. O mais importante é perseverar na luta, insistir na compaixão, reforçar os cuidados, acalentar os angustiados, confortar os que perderam os seus.
Toda experiência, sobretudo uma decisiva, tão relevante e impactante como esta, também oferece a oportunidade de refletir sobre seus ensinamentos, as lições que dela devem ser retiradas, e refletir sobre o que deveria ter sido feito, e não foi, avaliar pausadamente os resultados, pensar no que cabe fazer, doravante, planejar o futuro, retificar comportamentos, ajustar atitudes, cobrar responsabilidades, descartar decisões erradas, condenar não decisões e exigir respeito pela vida humana, pelo simples gesto que salva, que vem da empatia pelos que nos são próximos e também por cada membro da coletividade.
Refletir é o que tenho feito desde que me entendo como ser pensante, primeiro como leitor, depois como escrevinhador, finalmente como divulgador das poucas ideias inteligentes que possam ter surgido dessas interações entre o texto impresso, a observação da realidade, e a postura a ser assumida em face de todo e qualquer desafio que se apresente.
Persistirei.
Bom ano a todos, meus votos para um 2021 melhor à maioria, mas, se ouso inovar, um 2021 talvez pior para a meia dúzia de irresponsáveis e desprezíveis seres que tornaram a nossa coletividade menos fraterna do que poderia naturalmente ser.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 31 de dezembro de 2020, 20:01hs.