A ilustração desta matéria da Economist — montadoras americanas e chinesas destruindo suas concorrentes europeias —, na verdade um retrato da competição global entre impérios do passado, do presente e do futuro, dá uma ideia precisa sobre o embate geopolítico e geoeconômico da atualidade, o enfrentamento dos EUA contra a China — sim, importante sublinhar a UNILATERALIDADE da nova doutrina do containment — e simboliza todo o sentido da nova Guerra Fria Econômica.
Só tem um porém: a China já ganhou a contenda, simplesmente por ter a estratégia correta, por sinal, a mesma que levou a Grã-Bretanha à liderança da economia mundial no século XIX e, também, exatamente a mesma que garantiu a preeminência economica americana, e até sua supremacia militar, no decorrer do século XX.
Atualmente, todavia, G-B e EUA simplesmente desistiram de avançar, abandonaram a globalização e o livre comércio, levam um combate de retaguarda e seguem estratégias defensivas, o que significa que já perderam, o segundo a despeito da arrogância e da pretensão em responder pela ação do Estado a um complexo processo de modernização que na China é conduzido pelo Estado e pelo conjunto da população; no caso dos EUA, eles importam cérebros do resto do mundo, e podem, portanto, retardar o processo de esclerose, e mesmo manter-se por mais tempo na vanguarda de tecnologias inovadoras e descobertas científicas.
A fórmula da China é mais simples, aplicada ao conjunto da população: muito estudo, muito trabalho, muito investimento inovador e muita vontade dos chineses de ficarem tão ricos quanto americanos e europeus, o que vai exigir volumes imensos de commodities importadas e muita energia, sob todas as formas.
Eles o farão com grande sentimento nacionalista, evitando as grandes humilhações do passado, de ocidentais e japoneses, que submeteram o secular Império do Meio a uma submissão constrangedora para uma civilização que inventou tudo de útil que existe na humanidade, inclusive diversas vacinas experimentais. Os americanos e europeus estão focados unicamente em garantir os louros do passado, os chineses olham para a frente, o que é a melhor maneira de vencer.
Por isso, os americanos vão perder, a menos que abandonem a insanidade geopolitica da “armadilha de Tucídides” e a loucura militar e econômica da estratégia inaplicável de um novo Containment, contra um país que não pretende submeter o gigante ocidental, apenas inundá-lo com seus produtos e tecnologia. A moeda digital virá como reforço in due course.
O século XIX foi marcado pelo Grande Jogo entre a Grã-Bretanha e a Rússia expansionista na Ásia; o século XX pelo jogo decisivo entre os EUA e a União Sovietica pela dominação mundial. Não foram os EUA que ganharam, pois a URSS implodiu em sua própria ineficiência. O jogo agora é outro, mas os EUA insistem em jogar olhando para o passado, como esses generais de academia. Inventaram até um Tucídides prêt-à-porter: idiotas!
E o Brasil nisso tudo? O Brasil simplesmente não conta, ou interessa apenas como fornecedor de matérias básicas e um pouco de divertimento (futebol, música, turismo precário). Além da bossa nova, alguém pode citar alguma contribuição genial do Brasil para o estoque de conhecimento útil em favor da humanidade? Seria o “jeitinho”, aquele modo maroto de contornar a realidade, e que nunca contribuiu para consolidar entre nós o Estado democrático de Direito?
Estamos ficando para trás, não sem que eu aponte as razões do atraso e os caminhos da prosperidade: estabilidade macroeconômica, competição microeconômica, boa governança, alta qualidade do capital humano e abertura ao comércio internacional e aos investimentos estrangeiros. Nada menos do que tudo isso.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 5/06/2021