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Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
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Um Prometeu industrial desengonçado |
por Paulo Roberto de Almeida A tradução do título para o português é imprecisa: trata-se de um Prometeu unbound, isto é, liberado, não unchained. Mas isso não tira o valor da segunda edição deste clássico, agora com novo prefácio e epílogo - no mais o texto permanece igual ao de 1969, originalmente um ensaio da Cambridge Economic History. David Landes, professor emérito de Harvard, já tinha feito um complemento a Adam Smith, em A Riqueza e a Pobreza das Nações (Campus, 1998), soberbo nos desenvolvimentos globais, mas falho no que toca à América Latina e ao Brasil, analisados pela ótica enviesada da ("esqueçam-o-que-escrevi") teoria da dependência de FHC. O titã liberado é o sistema fabril: seu aparecimento na Inglaterra chocou Marx, que condenou a vil exploração do proletariado. Ele ainda não tinha visto nada, pois a China modorrava na imobilidade industrial. Hoje as fábricas chinesas não se distinguem, pelas condições de trabalho, das manufaturas de Manchester do século 19. A história é européia, mas esse Prometeu desajeitado que é a grande indústria leva seus grilhões ao mundo, o que desespera os antiglobalizadores, mas encantaria Marx, que confiava no papel revolucionário do capitalismo para destruir as "muralhas da China", o despotismo asiático e os reinos bárbaros do Oriente. A China, a Índia e as nações islâmicas fracassadas do Oriente Médio constituem, precisamente, o objeto do epílogo, a parte verdadeiramente nova do livro. Landes argumenta que a globalização "não é uma causa, nem uma ideologia. É simplesmente a procura de riqueza". A civilização industrial do Ocidente foi a mais formidável máquina de criação de riquezas da história, ao associar possibilidades tecnológicas com o faro pelos negócios de homens liberados das restrições do mercantilismo. Por que esse processo revolucionário ainda não conseguiu romper os grilhões do subdesenvolvimento? É que empréstimos, ensinamentos e presentes podem até ajudar, mas de nada adiantam se o movimento não for conduzido a partir de dentro. Landes demonstra como as condições tecnológicas e institucionais foram reunidas na Europa Ocidental e continuam a distinguir o Ocidente desenvolvido, ainda que países do Oriente - como o Japão, a Coréia e, agora, a China - lhe tenham seguido os passos. Esses bons alunos da escola européia, a começar pelos Estados Unidos, copiaram as técnicas, não necessariamente as instituições e as políticas econômicas. Landes diz que não é relevante que os "orientais" não tenham seguido a via do liberalismo, e sim que tenham integrado suas economias aos mercados globais, algo que os pregadores de uma industrialização à la List dificilmente reconhecem. O cerne do livro não é uma discussão das economic policies dos "copiadores" e sim um fascinante racconto storico do desenvolvimento tecnológico da industrialização européia. São seis capítulos, com poucas seções internas e relativamente poucas estatísticas, mas muitos dados qualitativos e análises sobre cada fase. Uma introdução metodológica explica por que a revolução industrial ocorreu na Europa e não em outros lugares. Coloca a questão - que será seguida ao longo do livro - das razões pelas quais as mudanças ocorreram em épocas e locais determinados da Europa, isto é, como o padrão de desenvolvimento diferiu de um país para outro. Nesse sentido, a Europa é um grande laboratório, por ter nações ricas e pobres, grandes e pequenas, todas as formas de governo e um rico mosaico de tradições culturais. Desde a Revolução Industrial inglesa, disseminada pelo continente, até o período entre guerras e a reconstrução subseqüente, Landes descreve as indústrias mais relevantes do ponto de vista tecnológico: têxtil, metalúrgica, química e de maquinaria, além da mineração de carvão por seu papel energético. Todas elas são situadas no contexto da organização industrial, isto é, da coordenação dos fatores de produção e do manejo dos produtos manufaturados. O resultado é um painel fascinante das raízes da "hegemonia" ocidental, não em virtude de uma história colonialista e opressora, e sim da capacidade de mobilizar e transformar as forças da natureza, liberando o Prometeu desengonçado do capitalismo industrial dos velhos grilhões da miséria educacional e da secular opressão da pobreza material. ======== Confesso que não conferi para ver se foi publicado in totum, por isso reproduzo aqui. Aliás, cansado dos cortes dos meus editores, comecei, finalmente, a fazer resenhas mais curtas...
Um
Prometeu Industrial Desengonçado
David S. Landes:
Prometeu Desacorrentado: transformação
tecnológica e desenvolvimento industrial na Europa ocidental, de 1750 até os
dias de hoje (2ª ed.; Rio de Janeiro: Campus, 2005, 628 p.)
O título do livro, em português, é impreciso: trata-se
de um Prometeu unbound, isto é
liberado, não unchained. Isso não
muda o valor da segunda edição deste clássico, agora com novo prefácio e
epílogo; no resto, o livro permanece igual ao texto de 1969, originalmente um
ensaio da Cambridge Economic History
(1965). David Landes, emérito de Harvard, já tinha feito um complemento a Adam
Smith, em A Riqueza e a Pobreza das
Nações (Campus, 1998), superbo nos desenvolvimentos globais, mas falho no
que toca a América Latina e o Brasil, vistos pela ótica enviesada da
(“esqueçam-o-que-escrevi”) teoria da dependência de FHC.
O titã liberado refere-se ao sistema fabril: seu
aparecimento, na Inglaterra, chocou Marx, que condenou a vil exploração do
proletariado. Ele ainda não tinha visto nada, pois a China, até ali a maior
economia, modorrava na imobilidade industrial, só voltando a praticar a abjeta
exploração mais de dois séculos depois. Hoje, as fábricas chinesas não se
distinguem, pelas condições de trabalho, das manufaturas de Manchester do
século XIX, mas as marcas são ocidentais. A história é européia, mas esse
Prometeu desajeitado que é a grande indústria leva seus grilhões ao mundo, o
que desespera os anti-globalizadores, mas encantaria Marx, que confiava no
papel revolucionário do capitalismo para destruir as “muralhas da China”, o
despotismo asiático e os reinos bárbaros do Oriente.
A China, a Índia e as nações islâmicas fracassadas do
Oriente Médio constituem, precisamente, o objeto do epílogo, a única parte
verdadeiramente nova do livro. Landes argumenta que a globalização “não é uma
causa, nem uma ideologia. É simplesmente a procura de riqueza” (p. 600). A
civilização industrial do Ocidente foi a mais formidável máquina de criação de
riquezas da história, ao associar possibilidades tecnológicas com o faro pelos
negócios de homens liberados das restrições do mercantilismo. Por que esse
processo revolucionário não conseguiu ainda romper os grilhões do
subdesenvolvimento no resto do planeta? É que empréstimos, ensinamentos,
presentes podem até ajudar, mas de nada adianta se o movimento não for
conduzido a partir de dentro.
Landes demonstra como as condições tecnológicas e
institucionais foram reunidas na Europa ocidental e continuam a distinguir o
Ocidente desenvolvido, ainda que países do Oriente – como o Japão a Coréia e,
agora, a China – lhe tenham seguido os passos. Esses bons alunos da escola
européia, a começar pelos Estados Unidos, copiaram as boas técnicas européias,
não necessariamente as instituições e as políticas econômicas. Landes diz que
não é relevante que os “orientais” não tenham seguido a via do liberalismo e
sim que eles tenham integrado suas economias aos mercados globais, algo que os
pregadores de uma industrialização à la List dificilmente reconhecem.
O cerne do livro não é uma discussão das economic policies dos “copiadores” e sim
um fascinante racconto storico dos
desenvolvimentos tecnológicos que permearam a industrialização européia. São
seis capítulos, com poucas seções internas e relativamente poucas estatísticas,
mas muitos dados qualitativos e análises sobre o estado das técnicas em cada
fase. Uma introdução metodológica visa explicar por que a revolução industrial
ocorreu na Europa, e não em outros lugares, e coloca a questão – que será
seguida ao longo do livro – de por que as mudanças ocorreram em épocas e locais
determinados da Europa, isto é, como o padrão de desenvolvimento diferiu de uma
nação para outra (nesse sentido, a Europa é um grande laboratório, por ter
nações ricas e pobres, países grandes e pequenos, todas as formas de governo e
um rico mosaico de tradições culturais).
Desde a revolução industrial inglesa, seguida de sua
disseminação no resto do continente, até o período do entre-guerras e a
reconstrução subseqüente, Landes retraça as indústrias mais relevantes do ponto
de vista tecnológico: têxteis, metalurgia, química e maquinaria, com a
mineração de carvão apenas pelo seu papel energético. Todas elas são situadas
no contexto da organização industrial, isto é, a coordenação dos fatores de
produção e o manejo dos produtos manufaturados. O resultado é um painel
fascinante das raízes da “hegemonia” ocidental, não em virtude de uma história
colonialista e opressora, e sim pela sua capacidade de mobilizar e transformar
as forças da natureza, liberando o Prometeu desengonçado do capitalismo
industrial dos velhos grilhões da miséria educacional e da secular opressão da
pobreza material.
Paulo
Roberto de Almeida (www.pralmeida.org)
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