O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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sexta-feira, 15 de maio de 2020

O mundo pós-pandemia - Ricupero, Paulo Almeida, Sandra Rios

O mundo pós-pandemia: contextos políticos e tendências internacionais
Rubens Ricupero, Paulo Roberto de Almeida e Sandra Rios
LIVRES

Programado para 25/05/2020 19:00

Qual o impacto da pandemia nas relações internacionais? Como a crise do Coronavírus vai afetar a relação entre Estados Unidos e China? Como as democracias liberais devem se relacionar com as autocracias? Os valores de liberdade individual estão em risco? A globalização e o livre mercado serão substituídos por isolacionismo e protecionismo? E o Brasil em meio a isso tudo?

Vamos debater tudo isso neste #LivresAoVivo desta segunda-feira, com os ilustres convidados Rubens Ricupero, Paulo Roberto de Almeida e Sandra Rios.

Quem são os convidados?
Rubens Ricupero é um jurista, historiador e diplomata brasileiro com proeminente atividade de economista. Ricupero é presidente honorário do think tank Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial. Foi ministro da Fazenda de 30 de março a 6 de setembro de 1994, durante o período de implantação do Plano Real.

Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais, Mestre em Planejamento Econômico e diplomata de carreira. Foi professor de Sociologia Política no Instituto Rio Branco e na Universidade de Brasília. Foi Diretor do Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (IPRI), afiliado à Fundação Alexandre de Gusmão (Funag), do Ministério das Relações Exteriores.

Sandra Rios é economista, diretora do CINDES e sócia da Ecostrat Consultores. Especialista em temas relacionados a negociações comerciais internacionais e a política de comércio exterior. Foi coordenadora da Unidade de Integração Internacional da Confederação Nacional da Indústria e pesquisadora do IPEA

Editoral Estadão: video da fatídica reunião no Planalto

O Brasil precisa saber

Se é verdade que o tal registro não revela nenhuma irregularidade cometida pelo presidente, como Bolsonaro diz e repete, então nada deveria obstar sua publicidade voluntária e imediata

Editorial Estadão, 14/05/2020


É imprescindível que o inteiro teor do vídeo da reunião do presidente Jair Bolsonaro com seu Ministério em 22 de abril seja tornado público. E essa iniciativa deveria partir não de uma ordem judicial, e sim do próprio presidente, certamente o maior interessado no esclarecimento dos fatos; afinal, se é verdade que o tal registro não revela nenhuma irregularidade cometida pelo presidente, como Bolsonaro diz e repete, então nada deveria obstar sua publicidade voluntária e imediata.
“Vocês vão se surpreender quando esse vídeo aparecer”, disse Bolsonaro. A Nação mal pode esperar para ser surpreendida. Por ora, os brasileiros conhecem apenas a versão fornecida por alguns dos espectadores do referido vídeo, exibido para procuradores da República, investigadores da Polícia Federal (PF) e o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, autor de denúncias contra o presidente e que citara a tal reunião como evidência de suas acusações. E a versão dessas testemunhas não surpreende ninguém: segundo algumas delas, Bolsonaro deixou claro que queria interferir na chefia da Superintendência da Polícia Federal no Rio para proteger sua família, que, segundo ele, estaria sendo “perseguida” pela PF. Tudo isso permeado por palavrões, gritaria, desrespeito e ameaças de demissão - ou seja, um dia comum na Presidência de Jair Bolsonaro.
Surpreendente, mesmo, seria se o vídeo mostrasse um chefe de governo equilibrado, consciente da função que desempenha e reverente em relação não apenas à liturgia do cargo, mas aos princípios básicos da República que preside - aquela em que ninguém, por mais poderoso que seja, pode se considerar acima da lei. Como até mesmo os camisas pardas que veneram Bolsonaro sabem a esta altura que isso é impossível, o único interesse no vídeo é verificar se o presidente realmente cobrou do então ministro Sérgio Moro que fizesse mudanças na Polícia Federal com o intuito de blindar seus filhos e amigos, enrolados com a Justiça - o que, segundo Moro, o motivou a pedir demissão do Ministério da Justiça.
Enquanto o vídeo não vem à luz na sua integralidade, para que se possa verificar o contexto de cada declaração, será a palavra de Bolsonaro - que nega tudo - contra a das testemunhas, e é ocioso discutir em quem se deve acreditar neste momento. O fato, por ora, é que há grossas suspeitas de que o presidente pode ter cometido delitos em série, e a divulgação do vídeo certamente ajudará a mostrar onde está a verdade.
Até que isso aconteça, é preciso muita prudência. A falta dela quase derrubou um governo, o do presidente Michel Temer, vítima de um escândalo irresponsável criado a partir da interpretação equivocada - maldosa até, pode-se dizer - de um diálogo dele com o empresário Joesley Batista, em 2017. Quando o diálogo afinal se tornou público, percebeu-se que nada havia ali que comprometesse o presidente a ponto de interromper seu mandato.
Espera-se que o procurador-geral da República, Augusto Aras, aja com a responsabilidade que faltou a Rodrigo Janot quando este, na condição de procurador-geral, fez as denúncias contra Michel Temer movido pelo desejo incontido de criminalizar toda a classe política, a começar pelo presidente.
Assim, o procurador Augusto Aras deve se ater exclusivamente às evidências e solicitar quantas diligências forem necessárias para ter um quadro completo. Se as provas forem frágeis, como afirma Bolsonaro, então o caso obviamente não pode seguir. Entretanto, se houver razões para levar adiante as investigações e oferecer uma denúncia contra o presidente, Augusto Aras - indicado para o cargo por Bolsonaro - deve fazê-lo, com a independência que a Constituição garante ao Ministério Público.
Processar e eventualmente cassar um presidente da República não é uma brincadeira inconsequente. É a mais séria das decisões políticas num regime presidencialista, razão pela qual é preciso ter sólidos argumentos para consumá-la. A incivilidade e o despreparo do presidente Bolsonaro, por mais que envergonhem o País, não são motivos para isso. Advocacia administrativa, prevaricação, obstrução da justiça, coação, falsidade ideológica e crime de responsabilidade são.

quinta-feira, 14 de maio de 2020

Fundação de pesquisa do Itamaraty vira think tank olavista durante a pandemia -

Fundação de pesquisa do Itamaraty vira think tank olavista durante a pandemia

Sob Ernesto Araújo, blogueiros, militantes, fundamentalistas religiosos e teóricos da conspiração substituem diplomatas e professores em palestras


André Duchiade
O Globo, 14/05/2020

Na gestão do chanceler Ernesto Araújo, diplomatas e professores de Relações Internacionais foram trocados por palestrantes cujo traço em comum é serem seguidores e alunos de Olavo de Carvalho.
Blogueiros, militantes e colunistas pró-governo federal, fundamentalistas religiosos e teóricos da conspiração, quase todos sem nenhuma atuação anterior na área diplomática ou internacional, têm promovido ideias anticientíficas e de teor doutrinário e ideológico em seminários na Fundação Alexandre de Gusmão (Funag), órgão de pesquisa e divulgação do Itamaraty.
As conferências, que começaram no ano passado, ganharam um fôlego renovado durante a pandemia de Covid-19. Alta consensualidade, paranoia, especulações desprovidas de evidências e pouco-caso com parâmetros científicos são marcas dos debates patrocinados pelo Ministério das Relações Exteriores durante o surto, que não contam com a presença de embaixadores ou de professores de Relações Internacionais.
Nos dois debates já realizados em torno do tema “A conjuntura internacional no pós-coronavírus”, nesta semana e na anterior, houve quem comparasse o uso de máscaras aos gulags de Stalin, quem dissesse que críticos de Ernesto Araújo o são por “uma questão psicológica e espiritual” e que o ex-presidente americano Barack Obama é um “radical de extrema esquerda”.
Nem todos os palestrantes são caricaturescos, e nem todos os temas e intervenções são necessariamente disparatados. Na primeira conferência, o jornalista Leonardo Coutinho, que por 17 anos foi da revista e Veja e hoje trabalha em um think tank em Washington, fez uma exposição ao mesmo tempo ponderada, pertinente e conservadora, questionando limitações e incongruências do multilateralismo.
Foi dele que partiu, salvo engano, o único vestígio de questionamento à atuação do governo brasileiro durante a pandemia:
— Organismos multilaterais não são poços de virtudes, imunes a interesses políticos ou infalíveis. Mas isto não nos exime da necessidade de tomar nossas próprias decisões. Erramos ao não pensarmos autonomamente, ao não ter a coragem de tomar decisões antecipadamente — afirmou.
Houve nas palestras, igualmente, a menção a assuntos que de fato dizem respeito ao presente e são merecedores de debate: as liberdades individuais frente aos poderes auferidos pelo Estado durante a pandemia, possíveis efeitos sociais do isolamento prolongado e tensões entre movimentos políticos nacionalistas e multilateralistas.
Por outro lado, em todas as exposições, não foi enfatizada uma só vez que acontece no mundo uma pandemia real, de uma nova doença altamente infecciosa e letal, que, caso não seja enfrentada com medidas de distanciamento social, provocará o sobrecarregamento de hospitais e milhões de mortes. Pelo contrário, seria possível assistir aos debates e concluir que a Covid-19 é imaginária.
À exceção de Coutinho, todos os oradores são ligados a Olavo de Carvalho e escrevem na internet. O ideólogo do governo insistentemente nega que haja perigos reais no novo coronavírus, tendo afirmado há apenas três dias que  “o medo de um suposto vírus mortífero não passa de historinha de terror para acovardar a população”.
Os discípulos de Olavo não chegaram tão longe na Funag, mas passaram perto nas teorias da conspiração: o youtuber e tuiteiro Leandro Ruschel começou relacionando a pandemia às “elites que buscam manipular a opinião pública” e “não fazem isso de forma tênue, mas através do conflito”; o português José Carlos Sepúlveda, oriundo da Tradição, Família e Propriedade (TFP), relacionou a emergência do trabalho remoto ao “velho hábito da esquerda de dizer que é preciso mudar o homem todo, e inclusive de misturar o lazer com o trabalho”.
De gravata borboleta, Evandro Pontes, ex-professor de direito comercial convertido em polemista reacionário, disse que “os países que têm sofrido confinamento viviam renascimento conservador, como Israel, Itália e Espanha”, enquanto não se “ouve falar em confinamento em Argentina, Cuba e México”. Os dois países europeus têm governos de centro-esquerda e já reabriram suas economias, assim como Israel, governado pela direita, enquanto os latino-americanos mantêm seus isolamentos.
Estes e comentários análogos foram feitos sob o beneplácito e os elogios de Roberto Goidanich, ministro de segunda classe do MRE (nível hierárquico uma etapa antes do de  embaixador) que foi promovido a presidente da Funag em março do ano passado e atuou como moderador.
Sob sua gestão, ainda no ano passado, diplomatas e professores de Relações Internacionais tornaram-se personas non-gratas na Funag, que, aos poucos, se converte em um centro de estudos da obra de Olavo de Carvalho. No ano passado, aconteceram mais de 10 de outras palestras como as sobre a Covid-19, sempre em mesas sem estudiosos que de fato atuam em âmbito internacional para fazer contrapontos.
A prática contrasta fortemente com a tradição da fundação, criada em 1971, seja em governos de esquerda ou direita. Tradicionalmente, seus presidentes eram embaixadores em final de carreira, como Jerônimo Moscardo, que foi secretário pessoal do ex-presidente Castelo Branco, e, mesmo conservador, presidiu a instituição durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, assim como Gilberto Saboia, também conservador e presidente em 2011 e 2012.
Procurado, o Itamaraty respondeu que os debatedores não foram pagos e que “todos os palestrantes dos seminários são pessoas reconhecidamente bem informadas e capacitadas. A Funag busca oferecer à sociedade brasileira elementos de reflexão para uma visão abrangente que possa se somar a outras já difundidas em vários setores, inclusive em veículos da grande mídia. A Funag espera que essa contribuição incentive o pluralismo do pensamento na sociedade brasileira”.
Professor de Relações Internacionais da FVG-SP, Guilherme Casarões afirma que a Funag sempre teve “gente de vários perfis intelectuais e perfis acadêmicos diferentes”, mas que isso apagou-se na gestão Araújo. Ele observa que, desde 2013, publicou muitas críticas às políticas externas dos governos Dilma e Temer, mas, na época, isso “nunca o impediu de ser convidado” a falar na fundação, pois “opositores ou críticos não eram tratados como inimigos”.
Para Casarões, o propósito dos encontros atuais são a agitação, a propaganda e o doutrinamento, com incitações às bases radicalizadas do governo que o ex-embaixador Rubens Ricupero chama de “franjas lunáticas”. Somados, os vídeos dos dois debates têm quase 8 mil visualizações, número pequeno para militantes digitais de direita, mas estratosférico para debates de política externa. Ao aproximar o Itamaraty do núcleo duro do bolsonarismo, o chanceler procura legitimá-la, à melhor maneira populista:
— É uma forma de dar legitimidade à política externa a partir da militância. Araújo escreveu que a política externa reflete os anseios do povo. É um discurso propriamente fascista, como se ele tivesse a única chave para entender o povo. Ao fazer eventos olavistas, ele busca que parte dos eleitores se engagem na política externa, de um modo que nunca aconteceu. Até o governo Dilma e Temer, a área era um detalhe. Ao aproximar a política externa da narrativa bolsonarista, seu objetivo é encontrar respaldo.
Há, ainda, a possibilidade de doutrinação de diplomatas, expostos a interlocutores que não teriam espaço em nenhuma grande chancelaria do mundo. Ademais, candidatos ao Instituto Rio Branco costumam estudar as palestras da Funag, e há o temor de que Olavo venha a se tornar referência no exame.
Para Rodolfo de Camargo Lima, professor de ciência política da Universidade Católica Temuco, no Chile, que estuda aparelhamento na política externa brasileira, ainda é cedo para saber a profundidade do alcance dos tentáculos olavistas na política externa brasileira, sendo necessária maior transparência do governo federal para a realização deste estudo. Ele observa contudo, que já é possível perceber um forte alinhamento na Funag:
— A Funag tinha um papel de think tank na área de Relações Internacionais, mas agora atua como instituto de pesquisa do núcleo ideológico presidencial. Há um ímpeto revolucionário, no sentido de repensar, de destruir o que vinha sendo feito — afirmou.

Diplomata amigo do chanceler recebe salario no exterior e diárias em Brasília - O Globo


Amigo de Ernesto Araújo recebeu em dólar e euro, como se estivesse em Paris, para trabalhar em Brasília

Diplomata acumulou diárias no Brasil, auxílio-moradia e salário no exterior

O diplomata Alberto Luiz Pinto Coelho Fonseca (à esquerda), próximo do ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo: pagamento em dólar e euro Foto: Reprodução
O diplomata Alberto Luiz Pinto Coelho Fonseca (à esquerda), próximo do ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo: pagamento em dólar e euro Foto: Reprodução

BRASÍLIA —  O diplomata Alberto Luiz Pinto Coelho Fonseca, próximo do ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo, recebeu um salário em dólar e auxílio-moradia em Paris, na França, para passar a maior parte do ano passado em Brasília, onde trabalhou junto ao chanceler. Segundo o Itamaraty, os pagamentos foram feitos de acordo com a lei vigente.
Além do salário mensal de cerca de US$ 12 mil (cerca de R$ 66 mil) e do auxílio-moradia de € 48,6 mil pelo ano todo, Fonseca ganhou R$ 36,6 mil em diárias para morar no Brasil por mais de oito meses em 2019, segundo dados obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI). Somando o salário a gratificações, diárias e passagens aéreas, o gasto com o servidor no ano foi de aproximadamente R$ 1 milhão.

Fontes do Itamaraty relatam que Fonseca teria ficado com lotação em Paris por mais tempo para formalmente completar seu período de experiência no exterior, necessário para a promoção na carreira. Por isso a demora para que ocorresse sua transferência definitiva ao Brasil, em janeiro 2020.
O diplomata foi convocado pela primeira vez em uma missão oficial no Brasil ainda no governo de transição de Bolsonaro, em dezembro de 2018, e só voltou a Paris em abril do ano seguinte. Depois, retornou para passar o mês de maio em Brasília. Do fim de julho até outubro de 2019, estava novamente na capital federal.
Segundo o Ministério das Relações Exteriores, o servidor foi chamado para trabalhar na criação da Assessoria Especial de Gestão Estratégica (AEG) do Itamaraty. "O período da chamada a serviço foi proporcional à demanda de trabalho necessária à consecução de seus objetivos", afirma o ministério.
"Ao final da chamada a serviço, decidiu-se pela remoção ex-oficio do referido diplomata para Brasília, encurtando-se, portanto, seu período original de serviço na embaixada do Brasil na França em cerca de um ano e meio. Todas as diárias referentes ao caso, que incluem também aquelas relativas a viagens do diplomata ao exterior em missões oficiais, foram calculadas e pagas em conformidade com a legislação vigente, em especial o art. 34 da Lei n. 5809/72, e observância às recomendações dos órgãos de controle", acrescenta o órgão.