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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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domingo, 25 de abril de 2021

Meu primeiro diário da pandemia: produção intelectual de março de 2020 a abril de 2021 - Paulo Roberto de Almeida

 Meu primeiro diário da pandemia:

produção intelectual de março de 2020 a abril de 2021

  

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 25 de abril de 2021

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

[Objetivo: relacionar produção completa e específica; finalidade: registros da pandemia]

  

Leitor diário, que sou, de todos os boletins informativos dos mais variados veículos da mídia – todos os grandes jornais e revistas internacionais, os periódicos nacionais, e os maiores canais nacionais e internacionais de noticiário televisivo –, acompanhei as primeiras notícias sobre a, até então, nova epidemia na China desde o final de 2019, ou seja, no mês de dezembro, quando as primeiras evidências de uma “nova gripe” – talvez equivalente àquelas conhecidas anteriormente: SARS, H1N1, gripe suína, aviária, etc. – foram veiculadas nos mais diferentes noticiários do mundo. Não registrei nada ao final de 2019 ou início de 2020, pois não se tinha ideia de sua disseminação mundial. 

Apenas em fevereiro de 2020 os alertas foram dados, com os primeiros casos na Itália e também no Brasil, mas ainda assim se tinha a ideia de que seriam casos isolados, oportunamente objeto de contenção das autoridades do setor, na Europa ou no Brasil. Lembro-me perfeitamente da negligência então demonstrada pelo prefeito de Milão, convidando turistas a continuar a visitar a cidade, pois não haveria nenhum risco naquela “gripezinha”. Quando a OMS decretou a existência de uma pandemia, comecei a seguir o assunto com maior atenção, ainda assim com menor prioridade em relação aos meus temas preferenciais, economia e relações internacionais.

Ainda assim, efetuei o primeiro registro acerca do “fenômeno” em meu blog Diplomatizzando, em 13 de março de 2020, sob este título: “O Covid, a globalização e os antiglobalistas”, mas se referia à transcrição de uma postagem de um site trumpista que eu também sigo metodicamente, o Daily Grind, cujo lema é “Helping Grind the Globosphere's Gears” – ou seja, ajudando a emperrar as engrenagens da globalização –, que é da tribo dos antiglobalistas. Nesse mesmo dia 13 de março eles publicavam uma postagem basicamente mentirosa, dizendo que “Globalization helped export China’s coronavirus”. Transcrevi a matéria, com uma introdução crítica, como sempre faço, dizendo basicamente o seguinte: 

O que transcrevo abaixo é justamente uma amostra dessa imbecilidade antiglobalista que pode se reforçar por causa do Coronavirus. A epidemia é evidentemente global, globalista, e a resposta está na globalidade, na globalização, no globalismo, pois só a intensa, imensa, acrescida cooperação internacional entre cientistas de TODOS os países, com a coordenação de entidades GLOBALISTAS como a OMS, terá condições de superar a pandemia. Os que querem se fechar na sua fortaleza nacional, sobretudo tendo líderes idiotas à sua frente, sofrerão as consequências dessa introversão. (ver minha postagem e a nota do Daily Grind, neste link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/03/o-covid-globalizacao-e-os.html).

 

Este foi, portanto, o marco inicial de meu seguimento da pandemia do Covid-19, como logo após ela foi denominada pela OMS, sem que soubéssemos, nessa fase inicial, que nos levaria a um isolamento completo por mais de um ano, com idas e vindas nas medidas restritivas decretadas por governos nacionais e entidades subnacionais. Meu blog e minhas postagens no Facebook e no Twitter reproduziram toda a amplitude e dramaticidade da nova praga mundial, o que me levou a ler bastante sobre a Peste Negra do século XIV e sobre a gripe espanhola do final da Grande Guerra. Não é o caso de reproduzir aqui – nem seria possível – a intensidade desse seguimento nessas centenas de postagens desde março do ano passado. Por isso mesmo vou concentrar-me em minha própria produção sobre a pandemia, a partir de uma transcrição sintética de tudo o que elaborei nesses treze ou catorze meses desde que eu também fui levado ao tele-trabalho e ao isolamento, a partir de meados ou final desse mesmo mês de março. 

Vou partir de uma primeira postagem, ainda antes mesmo desse dia 13 de março, e retomar a produção de forma linear, destacando em negrito os trabalhos que se referem precisamente à pandemia e a seus efeitos sobre o Brasil e o sistema internacional. Esta longa transcrição, mesmo resumida, talvez enfadonha, tem exatamente por objetivo confirmar que eu não fiquei parado durante a pandemia, não enfrentei nenhuma crise de abstinência de algum trabalho específico que eu estivesse fazendo – tanto porque estou sempre produzindo de modo contínuo, seja no plano profissional ou no pessoal –, nunca tive falta do que fazer e até encontrei, no isolamento forçado, maior lazer, espaço e estímulo, para produzir ainda mais, seja no contexto da pandemia, seja no contexto da produção intelectual de forma geral.

(A) 2020 (partir de março): 

3593. “Crise no mundo. E o Brasil, como fica?”, Brasília, 10 março 2020, entrevista concedida ao jornalista Mano Ferreira, do Livres, sobre os temas das crises internacionais (Covid-19, petróleo), do baixo crescimento brasileiro e das relações Brasil-Estados Unidos, a propósito da visita de Bolsonaro a Trump; canal YouTube do Livres (link:https://www.youtube.com/watch?v=KxhuWasxKmk&feature=youtu.be).

(...) 

3830. “2020: o ano que não terminou”, Brasília, 31 dezembro de 2020, 2 p. Nota sobre a persistência dos efeitos da pandemia no ano que se inicia e sobre as responsabilidades de cada um no quadro da governança. Divulgado às 20:00hs no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/12/2020-o-ano-que-nao-terminou-paulo.html).

  

(A) 2021 (desde janeiro): 

 

3831. “O Zaratustra do Cerrado Central e a angústia de não ser compreendido”, Brasília, 1 janeiro 2021, 2 p. Comentário superficial ao artigo do chanceler acidental pregando união liberal-conservadora para combater o marxismo, no blog Metapolítica 17; blog Diplomatizzando, (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2021/01/o-zaratustra-do-cerrado-central-e.html).

3832. “Mini-reflexão sobre a opção pelo declínio”, Brasília, 2 janeiro 2021, 2 p. Nota sobre tendências ao declínio de países como Brasil e Argentina; blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2021/01/mini-reflexao-sobre-opcao-pelo-declinio.html). 

(...)

3898. “Brincando de profeta: escrevendo a mim mesmo 20 anos à frente”, Brasília, 23 abril 2021, 8 p. Revisitando uma carta que escrevi a mim mesmo, em 2012, para ser lida 20 anos à frente, em 2032, com uma introdução e uma conclusão nova e remissão a meu livro de 2003, A Grande Mudança. blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2021/04/brincando-de-profeta-escrevendo-mim.html).

3899. “Meu primeiro diário da pandemia: produção intelectual de março de 2020 a abril de 2021”, Brasília, 25 abril 2021, 30 p. Síntese e transcrição sobre a produção própria desde o início do primeiro registro da pandemia em meus registros de trabalhos. 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3899, 25 de abril de 2021

Total de 306 trabalhos em treze meses; 23.5 trabalhos por mês, ou quase um trabalho por dia, mais exatamente um trabalho a cada 1,2 dias; número de trabalhos sobre a pandemia: 18.


Ler a íntegra desta relação no seguinte link: 

3899) Meu primeiro diario da pandemia: producao intelectual de março de 2020 a abril de 2021






sábado, 24 de abril de 2021

O aprendiz de feiticeiro do bolsolavismo diplomático (1/05/2020) - Paulo Roberto de Almeida

 Um texto que nunca foi divulgado quando foi escrito, e que se destinava a rechaçar as ofensas do chanceler acidental contra o Ricupero e outros diplomatas que criticaram a diplomacia subserviente que ele administrou de forma deplorável. 

O aprendiz de feiticeiro do bolsolavismo diplomático 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília,  1o. de maio de 2020

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

 [Objetivo: protesto; finalidade: informação pública]


 

Naquele antigo desenho animado de Walt Disney, o aprendiz de feiticeiro Mickey se vangloriava de ter acabado com sete de uma vez só; eram apenas moscas, mas a impressão que ele deu foi de que se tratava de gigantes. 

Metido a experiente feiticeiro, o aprendiz provoca a maior confusão na casa do seu mestre, que volta assustado e se apressa em restabelecer a ordem.

O aprendiz de feiticeiro do bolsolavismo diplomático se vangloria, numa postagem recente, de ser capaz de enfrentar não apenas quatro gigantes, mas quarenta, de uma vez só. 

Ele começou sua bravata por estas palavras:

 

1.             “Ex-chanceleres e ex-ministros despeitados decidiram criar o “grupo Ricupero” para falar mal de nossa política externa, que está ajudando o Brasil a se livrar da corrupção, da promoção de ditaduras, ou da letargia medrosa que caracterizaram as políticas deles ou dos seus governos.”

 

E terminou assim:

 

4.             “O fato de que quatro ex-Ministros se juntem num grupo, sob tão indigna inspiração, para atacar a mim, que sou apenas um, muito me honra. Dessa laia podem vir quatro, podem vir quarenta, e eu os enfrentarei feliz, fiel ao PR @jairbolsonaro e ao povo brasileiro.”

 

Sua pretensão é descabida em mais de um aspecto. 

Não são apenas quatro ex-ministros, nem quarenta, que o acusam, certamente não de conduzir uma política externa que simplesmente não existe, mas praticamente toda a diplomacia profissional — ou seja, centenas de colegas temporariamente silentes, pois que intimidados pela sua postura de tirano de aluguel — e virtualmente todas as pessoas sensatas do Brasil, entre industriais, empresários do agronegócio, acadêmicos, jornalistas e militares, que demonstram sua estupefação em face da destruição quase completa dos altos padrões de sempre foram os da diplomacia brasileira tradicional.

Todos estão fartos de saber que o aprendiz de feiticeiro do inaceitável desmantelamento do Itamaraty não comanda absolutamente nada; o chanceler acidental não é sequer capaz de formular diretrizes para uma diplomacia minimamente racional, sendo teleguiado de forma servil pelos aloprados e ineptos em política externa que o controlam de perto. 

Ficou já mais do que patente que o novo aprendiz de feiticeiro da extrema-direita tupiniquim só é capaz de tuitar desvarios típicos do subsofista expatriado que o colocou no cargo, atuando unicamente para afundar ainda mais o pouco que resta de credibilidade de uma diplomacia outrora respeitada internacionalmente.

Os brasileiros em geral, os diplomatas profissionais em especial, assim como todos aqueles que tinham orgulho da antiga política externa equilibrada, construída e cuidadosamente operada pelas gerações anteriores de mestres do ofício, estão estarrecidos pelo espetáculo medíocre que lhes é oferecido pela diplomacia bolsolavista. 

Todos anseiam por uma superação do pesadelo que representa a não diplomacia atual. Esse dia virá!

Como diz o ditado popular, “não há mal que nunca acabe...”

 

 

Paulo Roberto de Almeida 

No dia do trabalhador diplomático, 1ro de maio de 2020

 

 

China vs Australia (and USA): Australian government cancels Chinese economic deals - World Socialist Website

Australian government cancels Chinese economic deals


World Socialist Website, April 24, 2021

Australia’s government this week took to a new level its support for the US-backed confrontation with China and also set a global precedent for tearing up economic agreements previously signed with Beijing.

The Liberal-National Coalition invoked new powers introduced last December in order to cancel two deals previously struck by the Victorian state Labor government under the umbrella of China’s massive infrastructure Belt and Road Initiative (BRI).
The 2018 “Memorandum of Understanding” (MoU) and 2019 “Framework” agreements were vague and non-enforceable, and had never actually been activated. That only makes their overturn by Prime Minister Scott Morrison’s government more clearly a direct and deliberate attack on the BRI.
Washington regards with hostility, as a threat to US hegemony, the ambitious BRI project to link China by road, rail and sea with the rest of the Eurasian continent, right across to Europe, as well as to help build infrastructure in the Indo-Pacific and Africa.

The four-page 2018 MoU merely agreed to “cooperation within the Framework of the Silk Road Economic Belt and the 21st Century Maritime Silk Road Initiative.” Much of the language in the MoU consisted of motherhood statements, such as “form synergy in cooperation,”

Likewise, the nine-page 2019 agreed to “jointly promote” that “Framework” without any concrete proposals. It contained more general statements, such as a desire to “enhance two-way trade”

Evidently, Victorian construction companies hoped for lucrative opportunities in China, while Chinese infrastructure firms could tender for Victorian government projects. Amid growing US and Australian trade war measures against China and the stepping up of the US-led military build-up in Asia, however, no projects ever resulted.

Marise Payne, Australia’s Minister of Foreign Affairs. (Wikimedia Commons)

Nevertheless, Australian Foreign Minister Marise Payne formally declared these deals to be “inconsistent with Australia’s foreign policy or adverse to our foreign relations in line with the relevant test in Australia’s Foreign Relations (State and Territory Arrangements) Act 2020.” She gave no further reasons and provided no other explanation.

By further cutting across economic relations with China, on top of a series of bans on Chinese investment, and steps to stop reliance on “supply chains” from China, Canberra’s move points to the accelerating US-led preparations for a war against China to prevent it from challenging US power.

The White House was clearly involved in the decision. Asked if the Biden administration had been in touch with Canberra over the issue, White House Press Secretary Jen Psaki did not deny it.

Instead, Psaki revealed how much Washington is preoccupied with combating China. “How we can work together as a global community and in a coordinated fashion as it relates to China is part of nearly every discussion the President has with a European partner or country in the region,” she said.

Morrison defended scrapping the Chinese deals, saying his government would “always act in Australia’s national interest to protect Australia” and “advance our national interests of a free and open Indo-Pacific and a world that seeks a balance in favour of freedom.”

Such provocative language declares China to be a threat to Australia and world “freedom,” when in reality it is the US and its allies that have conducted barbaric neo-colonial wars for decades, from Vietnam to the Middle East, and are now menacing China.

Defence Minister Peter Dutton added to the belligerence by saying Australia would not be “bullied by anyone” in exerting its sovereign rights. He denounced the Victorian government for betraying the “national interest” by signing the two documents.

This anti-China campaign has bipartisan backing within the parliamentary establishment. For its part, the Victorian Labor government readily accepted the cancellation of its deals. Federal Labor Party leader Anthony Albanese sought to outbid the Morrison government, saying a proper explanation was needed about why Victoria’s deals were scrapped but not the 99-year lease of the civilian Port of Darwin to Chinese company Landbridge in 2015.

The Darwin lease is particularly sensitive because President Obama personally rebuked Morrison’s predecessor, Malcolm Turnbull in 2015 for allowing the lease of the northern Australian port to go ahead without consulting Washington.

Albanese’s stance is in line with his message at Labor’s recent national conference, where he said Labor governments were needed for periods of war and crisis, as a Labor government had proved by initiating the US military alliance during World War II. Backed by the trade unions, Labor’s conference passed no less than six resolutions denouncing China.

Murdoch media outlets and most others hailed the Morrison government for “standing up to” China. Some nervousness was voiced by sections of mining-related business, however, because China has become Australia’s largest export market over the past two decades, with iron ore sales and revenues soaring.

Today’s Australian Financial Review editorial criticised the government for “prodding” China “for no obvious gain on moribund Belt and Road agreements.” Malcolm Broomhead, the chairman of mining, oil and gas giant Orica and a BHP board member, told the Australian: “I just don’t understand the deliberate provocation of China which sits at odds with ‘we want to be friends.’”

Despite such qualms that the attacks on China are provoking restrictions on Australian exports to China, the ruling class as a whole depends heavily on US investment and on Washington’s support to pursue its own neo-colonial interests. That is why the Australian ruling elite has joined every major US war since World War II.

The Chinese government reacted angrily and lodged a formal protest. Foreign Ministry spokesman Wang Wenbin accused the Morrison government of “political manipulation and bullying” and setting a “bad” global precedent. He said China had signed BRI cooperation documents with 140 countries and 31 international organisations. “Australia is the first and only country to tear apart an agreement.”

Last year, the Chinese embassy issued a 14-point complaint against Australia’s discriminatory tariff and other economic measures against Chinese companies, including the ban on the teleco giant Huawei. That ban, imposed in 2018, was demanded by Washington and mirrored by other US allies.

More widespread cancellations of China-linked economic, educational and cultural agreements by state and local governments and universities are looming. So far, Payne said she had reviewed more than 1,000 existing or proposed deals and decided to cancel only four—the two with China and older Victorian agreements with Syria and Iran. Later, after landing in New Zealand, she said she expected further such decisions.

Universities have until June to submit their lists of exchange and other agreements with overseas universities and other entities. Already, the US-aligned and government-subsidised Australian Security Policy Institute is calling for the shutting down of the dozen or so Confucius Institutes on Australian campuses.

The rapidity of the shift against China is underscored by the fact that in 2017 Turnbull’s Coalition government reached its own BRI agreement with the Chinese government. Then trade minister Steven Ciobo said: “Australia supports the aims of initiatives such as the Belt and Road that improve infrastructure development and increased opportunities in the Asia-Pacific region.”

Over the past three years, the Australian government has become a frontrunner in measures against China, including the far-reaching, anti-democratic “ foreign interference ” laws passed in 2018, that Washington regards as a model for similar provisions internationally.

The International Youth and Students for Social Equality in Australia and New Zealand is today, April 24, at 4 p.m. [AEST] holding an online meeting in opposition to the drive to war against China. Register here


Cúpula militar se irrita com nova declaração de Bolsonaro sobre usar as FFAA contra o isolamento - Forum

 

Cúpula militar se irrita com nova declaração de Bolsonaro, de mandar Forças Armadas às ruas contra isolamento, diz jornal

Exaltado, Bolsonaro atacou as medidas de contenção da Covid-19 - como o uso da máscara - e disse em entrevista ao apoiador Sikêra Jr. que os militares podem ir às ruas para reestabelecer, entre outras, a "liberdade religiosa e de culto"


Plinio Teodoro

Jornalista, editor de Política da Fórum, especialista em comunicação e relações humanas.

Revista Forum,  

Menos de um mês após a demissão dos comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica, que ameaçaram colocar o cargo à disposição após declaração sobre “o meu Exército” de Jair Bolsonaro, a cúpula militar voltou a se irritar com uma fala do presidente, que em entrevista ao apresentador Sikêra Jr. voltou a falar que é o “chefe supremo das Forças Armadas” e ameaçou fazer uso da força contra as medidas de isolamento social para frear a propagação da Covid-19.

Segundo Igor Gielow, da Folha de S.Paulo, membros da cúpula militar ouvidos na manhã deste sábado (24) teriam dito que Bolsonaro “confunde conceitos” ao suar sua posição de comandante-em-chefe das Forças Armadas de forma política contra governadores.

Na entrevista, Bolsonaro afirmou que tem “plano” de colocar as Forças Armadas nas ruas para intervir nas políticas de isolamento social decretadas por governadores e prefeitos para reduzir a contaminação pelo coronavírus.

“Se tivermos problemas, nós temos um plano de como entrar em campo. Eu tenho falado, eu falo ‘o meu [Exército]’, o pessoal fala ‘não’… Eu sou o chefe supremo das Forças Armadas. O nosso Exército, as nossas Forças Armadas, se precisar iremos para a rua não para manter o povo dentro de casa, mas para reestabelecer todo o artigo 5º da Constituição. E se eu decretar isso vai ser cumprido”, afirmou Bolsonaro, diante da pergunta “bem bolsonarista” de Sikêra Jr.

Exaltado, Bolsonaro atacou as medidas de contenção da Covid-19 – como o uso da máscara – e disse que os militares podem ir às ruas para reestabelecer, entre outras, a “liberdade religiosa e de culto”.

“As nossas Forças Armadas podem ir para a rua um dia sim, dentro das quatro linhas da Constituição, para fazer cumprir o artigo 5º. O direito de ir e vir, acabar com essa covardia de toque de recolher, direito ao trabalho, liberdade religiosa e de culto; para cumprir tudo aquilo que está sendo descumprido por parte de alguns governadores e alguns poucos prefeitos, mas que atrapalha toda a sociedade. Um poder excessivo que lamentavelmente o Supremo Tribunal Federal delegou, então qualquer decreto, de qualquer governador, qualquer prefeito, leva transtorno à sociedade”.


Quem é o “cara da casa de vidro’“? Um tal de Jair - Paula Bianchi (The Intercept)

 

Sábado, 24 de abril de 2021
Exclusivo: quem é o 'Jair' nos grampos do caso Adriano?

As novas revelações do processo que investiga o chefe do Escritório do Crime.

Intercept publica hoje nova reportagem baseada no relatório da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Polícia Civil do Rio, elaborado a partir das quebras de sigilo telefônico de suspeitos de ajudar o miliciano Adriano da Nóbrega nos 383 dias em que circulou foragido pelo país. 

Desde fevereiro investigamos essa história e, pela primeira vez, os diálogos transcritos de interceptações telefônicas sugerem que o presidente Jair Bolsonaro foi contactado por integrantes da rede de proteção do chefe da milícia Escritório do Crime. 

O repórter Sérgio Ramalho mostra como logo após a morte do miliciano, cúmplices de Adriano fizeram contato com “Jair”, “HNI (PRESIDENTE)” e “o cara da casa de vidro” – que seria uma referência aos palácios do Planalto e da Alvorada, ambos com fachada inteiramente de vidro. 

Para fontes do Ministério Público do Rio de Janeiro, ouvidos na condição de anonimato, o conjunto de circunstâncias permite concluir que os parceiros de Adriano se referiam ao presidente Jair Bolsonaro.

Paula Bianchi
Editora 
 

sexta-feira, 23 de abril de 2021

Brincando de profeta: escrevendo a mim mesmo 20 anos à frente - Paulo Roberto de Almeida

 Brincando de profeta: escrevendo a mim mesmo 20 anos à frente 

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3898, 23 abril 2021 

 

 

Quase dez anos atrás, em 27 de agosto de 2012, eu escrevia uma carta dirigida a mim mesmo, mas para ser lida apenas 20 anos à frente, ou seja, em agosto de 2032, se por acaso eu estivesse vivo até lá. Esqueci completamente, mas revisando agora um trabalho dessa mesma época, perigosamente perto dessa peça fatídica de profetismo indevido – sempre fui dado a exercícios prospectivos, mas raramente desse gênero, a despeito de minhas “previsões imprevidentes”, mantidas por mais de dez anos, mas agora descontinuadas –, fui levado, por um desses impulsos de momento, a reler novamente esta carta esquecida (ela ainda estava em pleno mar, numa garrafa, esperando chegar em algum porto na data prometida) e a novamente postá-la, para ver no que acertei e no que errei, nesse meu exercício temerário de profetizar sobre o futuro do Brasil e do mundo.

Pois, ao reler agora essa carta enviada a enviada a mim mesmo, dez anos atrás e destinada a ser lida 20 anos à frente, isto é, em 2032, constato que meu relato do "passado", sobre o que fiz e como se “comportaram” o mundo e o Brasil nesse longo intervalo de duas décadas, não ficou muito longe da realidade, pelo menos nos últimos dez anos, mas não ouso mais profetizar sobre como será nos dez anos restantes. Pois é, ainda temos de verificar como será naquela data, se por acaso for muito pior – em vista do inacreditável que ocorreu a partir de 2018 –, ou se por acaso vamos conseguir nos recuperar a partir de 2023, já entrados no terceiro centenário desde a nossa independência.

O fato é que, assim que postei essa minha “carta ao futuro”, em agosto de 2012, um simpático leitor anônimo postou o seguinte, o que muito me envaideceu (mas também foi o único comentário que recebi): 

 

Anônimo disse...

Conheço este recurso literário de algum lugar... Lindo texto, verdadeiro e absolutamente corajoso. Talvez, alguém em algum lugar, um dia queira escrever sobre o senhor, professor. Talvez, alguém já escreva...Quem sabe ?
Portanto, este texto será registrado para a posteridade, obviamente, respeitando os direitos autorais.

27/08/2012 02:24

 

Vou postar novamente essa minha carta, exatamente como foi postada neste meu blog Diplomatizzando em 27/08/2012, com uma única mudança: a indicação de meu livro A Grande Mudança, agora inteiramente disponível para todos os interessados (ler neste link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2012/08/carta-mim-mesmo-20-anos-frente-paulo.html).

 

Carta a mim mesmo, 20 anos à frente

 

Paulo Roberto de Almeida

(Anywhere), 27 de Agosto de 2032

 

Bom dia Paulê, [Nota 2021: “Paulê” era como eu me chamava na adolescência]

Estou lhe escrevendo vinte anos à frente do seu tempo, no que é, obviamente, apenas um recurso literário para falar de várias coisas destas últimas duas décadas, como uma espécie de balanço, e de especulação sobre o futuro, o que todos temos o direito de fazer. Como você vai receber, vai ler, ou reler, esta carta daqui a exatas duas décadas (vou ajustar minha agenda eletrônica para isso, como uma garrafa atirada ao mar, e programada para chegar ao seu porto, à sua praia, na data exata que vai acima), posso esquecer as questões do presente e me concentrar no que será o seu mundo em 2032. Feita esta introdução técnica, vamos ao que interessa. 

 

Bom dia, portanto!

Em 2032, você já está aposentado há mais de dez anos e suponho que você ainda esteja vivo, se a medicina e a sua saúde assim o permitirem. Enfim, esta carta só tem sentido se você estiver vivo e com plena capacidade de trabalho ainda, a despeito da idade avançada. Se não fosse assim, eu teria feito esta carta apenas uma década mais à frente, quando o Brasil estiver completando dois séculos de independência, e você tendo se aposentado apenas dois anos atrás [Nota 2021: eu calculava que estaria aposentado em 2020, o que ainda não ocorreu, provavelmente depois do bicentenário, ou pouco antes]. Não importa, vamos manter a ficção de que sua boa disposição para o trabalho e as tecnologias médicas o permitirão chegar a 2032 e que ali começa nossa aventura prospectiva [Nota 2021: imprecisão terminológica, pois deveria ser “retrospectiva”]. O que serão, como serão o mundo, a América Latina e o Brasil, vinte anos mais a frente, e o que eu terei feito, em face e no contexto dessa interação, no intervalo que nos separa do ponto de destino?

Sei que minhas capacidades prospectivas são limitadas, ou até deficientes, a julgar pelo que pude “prever” nos últimos dez anos. Mas vou tentar mesmo assim. Em 2002, por exemplo, eu tinha absoluta certeza de que os companheiros que então chegavam no poder iriam praticar uma política econômica conservadora, ou de corte neoliberal, como eles depreciativamente se referiam às orientações então em curso no governo anterior. Não estou inventando nada agora: está tudo documentado em meu livro A Grande Mudança e não mudaria uma palavra do que escrevi ainda antes da eleição de Lula ([Nota 2021: esse meu livro não teve reedição e a editora desapareceu nos escombros da estagnação brasileira, assim que decidi colocá-lo inteiramente à disposição de todos:  https://www.academia.edu/42309421/A_Grande_Mudanca_consequ%C3%AAncias_econ%C3%B4micas_da_transi%C3%A7%C3%A3o_politica_no_Brasil_2003_]. Nisso fui presciente, embora esperasse alguma deterioração maior da posição fiscal, em vista dos previsíveis gastos sociais. Não esperava, está claro, a amplitude dos “investimentos” sociais, embora esperasse todos os benefícios feitos a banqueiros, industriais e outros membros da elite (velhas e novas, oportunistas ou não), e já previa, de certa forma, o aumento da carga fiscal, via tributos diretos ou indiretos. Meu grande erro – mas creio que esse foi de todos – foi acreditar que as alegações sobre a “ética na política” eram verdadeiras, e nisso pratiquei a mesma ingenuidade de muitos observadores: o governo dos companheiros revelou-se o mais corrupto já conhecido na história do Brasil, e isso porque o partido – habituado a velhas práticas bolcheviques da pior espécie – já era inerentemente corrupto em sua formação e em suas práticas políticas. 

Independentemente dessas previsões, mais ou menos certas, o fato é que o Brasil conheceu certos progressos sociais, mais à custa de redistribuição de renda e de estímulo ao consumo do que de investimentos produtivos, e uma grande involução política, institucional e educacional, com um aumento inédito da corrupção em todas as esferas, e uma deterioração sensível das instituições públicas, a despeito mesmo da relativa profissionalização das carreiras de Estado (mas convertidas numa classe de mandarins que se apossou do Estado como coisa própria). Os mesmos dez anos que vão de 2002 a 2012 foram minha travessia do deserto, em todo caso muito produtivas em termos de diversos trabalhos acadêmicos, alguns livros e muitos artigos publicados, sem contar as centenas de working files, aguardando uma oportunidade para emergir do pipeline da produção intelectual. Os dez anos seguintes, até 2022, foram os mais felizes no plano pessoal, com uma produção ainda mais intensa, embora o Brasil tenha avançado muito pouco, em termos educacionais e institucionais, para grande tristeza minha. 

E o que fiz depois, até chegar neste momento, vinte anos à frente desta carta, dez anos além de meu retiro profissional, e bastante mais maduro e satisfeito comigo mesmo? Fiz aquilo que sempre fiz, em toda minha vida, talvez em maior volume e extensão, sempre quando possível: li, intensamente; escrevi, compulsivamente; publiquei, no ritmo possível, dado pelas editoras ou permitido pelas novas formas de comunicação; ensinei, bastante, o tempo todo, diretamente e à distância, para apenas um punhado de alunos presenciais, a cada vez, mas provavelmente para milhares de outros, desconhecidos, à distância, sem sequer saber quem tomava conhecimento de meus materiais didáticos, dispersos nas correntes sempre multiplicadas da internet; viajei, a cada oportunidade oferecida pelos compromissos acadêmicos e visitei dezenas de novos lugares, por puro interesse cultural e curiosidade propriamente turística; também pratiquei gastronomia, das melhores, sempre acompanhando as viagens e desfrutando de novas cidades, grandes e pequenas, nos mais diversos cantos do planeta, que percorri como poucos que conheço.

 

Chegamos, pois, a 2032, Paulê, e você faz agora a reconsideração dos anos que se passaram, e passa a explicar, ao seu alter ego de 2012, como o mundo, a região, o Brasil se encontram, no estado que é o deles, o que eles são, neste período que já assiste ao meu ocaso. Vou tentar ser apenas sugestivo, uma vez que trabalho com tendências, não com certezas ou determinações obrigatórias.

O mundo não é muito diferente do que era no tempo em que foi pensada esta carta, embora ele certamente seja mais rico, mais seguro e mais estável, no plano da segurança e da paz internacionais. Os EUA e China, e as potências menores (ou seja Rússia e o que sobrou das grandes do século XX) jamais vieram a se enfrentar numa guerra, que necessariamente seria ou global, ou por atores interpostos (ou seja, local, ou “setorial”). Eles sempre mantiveram muitos pontos de conflito entre eles, e continuaram a gastar enormes somas com sua preparação militar, mas foram gastos inúteis, pelo menos no cenário traçado pelos seus estrategistas. Todo esse equipamento foi usado contra “vilões pés-de-chinelo”, se ouso dizer, ou seja, os ditadores remanescentes do planeta, uma espécie em quase extinção, pelo menos aqueles realmente malvados, não os ditadores de opereta, como os temos na América Latina, ou aqueles ridicularizados por Sacha Cohen no cinema. A própria China já enfrentou crises políticas, nos últimos 20 anos, e se encaminhou muito lentamente para um tipo de “democracia”, muito deficiente, é verdade, mas ainda assim, não mais o monopólio absoluto do PCC (enfim, um pouco parecida com aquela “democracia de fachada” que Max Weber apontava no caso do governo provisório saído da revolução de fevereiro de 1917, na Rússia).

Os países da América Latina terão melhorado um pouco, não muito: políticos corruptos, bandidos, traficantes, continuarão a frequentar o cenário, mas não mais dominarão países inteiros, como ainda ocorre atualmente. Infelizmente, a educação e a equalização de chances terão progredido muito lentamente em certos países, entre eles o Brasil, graças às políticas absolutamente erradas que adotamos durante o reinado dos companheiros (que pode se prolongar bem mais do que o desejável, em virtude da mediocridade da oposição política, ou seja, das forças centristas, para lidar com um partido neobolchevique a vocação totalitária). 

 

Não se iluda, portanto, Paulê, você terá passado os vinte anos que o separam desta data exatamente na posição em que estava em 2012: em minoria absoluta no país e na região, lutando contra a mediocridade intelectual, contra a erosão da moralidade na vida política, contra a indigência intelectual (acho que o segundo termo não se aplica) na academia, contra os mandarins do Estado extorsivo, ou seja, em verdadeiro bunker isolado, em uma espécie de quilombo de resistência contra os novos bárbaros. Não fique triste, Paulê, seu trabalho será reconhecido por alguns poucos, um pequeno bando de libertários que acredita naqueles velhos valores que não mais prevalecem – talvez nunca tenham prevalecido – entre nós, o da honestidade intelectual, o da tolerância política, o da democracia sem adjetivos, o da responsabilidade individual, do mérito e do esforço próprio. Tudo isso vai ser muito difícil de defender, mas eles acabarão prevalecendo, um dia... Talvez não para que você possa contemplar uma sociedade que você gostaria de ver implantada no Brasil, mas vai ocorrer. Seu trabalho é o de não desistir, persistir, lutar, resistir, continuar...

Os vinte anos decorridos desde então terão sido os melhores de sua vida, Paulê, e você estará orgulhará disso, mesmo sem glórias e sem vitórias. A paz com sua consciência, o fato de estar bem consigo mesmo, a certeza de que você estará lutando pelas boas causas são suas maiores recompensas.

Fique tranquilo e trabalhe. Até 2032, quando você abrir esta carta novamente...

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3898, 23 abril 2021 

 

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Voilà, era isso que eu escrevi em agosto de 2012, do que não me lembrava em absoluto, apenas “recordado” por uma visita ocasional à lista de trabalhos (este levava o número 2421, e esta minha retomada o 3898: ou seja, quase 1.500 trabalhos atrás, o que em dez anos dá uma média de quase 150 por ano; desculpem a metrificação, mas é que se eu não numerar, e registrar em listas anuais, eu me perco, e depois fica difícil localizar). 

Será que eu teria algo a agregar dez anos depois do texto acima e dez anos antes de sua “entrega” (via garrafa lançada ao mar) ao seu destinatário que sou eu mesmo? Si, tenho algumas coisas e tento resumir nos parágrafos seguintes, para não ficar um manuscrito aborrecido.

Surpreende a óbvia decadência MENTAL do Brasil nestes últimos três anos. Sim, tomo o cuidado de sublinhar mental, pois que nada impede o nosso progresso material, ainda que lento, retardado, delonga, incompleto e insuficiente. Como diria fatalisticamente Mário de Andrade (em 1924), “progredir, progredimos um tiquinho, que o progresso também é uma fatalidade”. Nosso retrocesso é mental porque fomos capazes de eleger um completo imbecil para a presidência da República, ainda que levando em conta a enorme rejeição despertada em grande parte do povo pela Grande Destruição causada pelos companheiros, a maior recessão econômica de toda a história e uma enorme, uma tremenda, uma gigantesca máquina de corrupção, plantada de forma institucional no coração do Estado, e que teria continuado – com eles ou sem eles no poder, isto parece agora claro – se não fosse por esses pequenos acidentes de percurso. Esse “acidente” se chamou Operação Lava Jato, que agora parece estar sendo completamente desmantelada (se já não o foi), o que remete o Brasil ao seu cenário habitual de corrupção “normal”, ou seja, sempre presente, extensiva (por vezes intensiva), inovadora, arrogante e avassaladora. 

O Brasil decepcionou mais do que o normal, portanto, e por normal eu não estava prevendo nenhuma grande dinâmica de crescimento ou de modernização. Eu estava prevendo a mediocridade “normal” de crescimento econômico, a persistência de enormes desequilíbrios regionais e de gigantescas desigualdades sociais, mastodôntica concentração de renda e outras iniquidades velhas nossas conhecidas. Muito disso era, é, devido a níveis baixíssimos de ganhos de produtividade, fruto de uma péssima educação de massa, terreno no qual eu via muito poucas chances de melhorias no futuro previsível. A má educação é a nossa MAIOR tragédia nacional, seguida pela corrupção política, e agora pela instabilidade jurídica, inacreditavelmente impulsionada pelas mais altas cortes da magistratura, esses aristocratas de Ancien Régime.

Na região eu também previa a continuidade da mediocridade geral, salvo um ou outro caso de melhoria temporária e talvez insustentável, dadas as propensões do continente para o caudilhismo habitual, para os populismos sempre presentes, para a má gestão e uma incrível propensão a se manter fora do mundo, com todos esses nacionalismos rastaqueras e idiotas. No mundo, a coisa se modificaria ligeiramente, com uma ascensão irresistível da China – o que já estava amplamente visível em 2012 – e as sempre renovadas tentativas americanas de manter uma supremacia que já foi absoluta, mas que dificilmente persistirá assim. Em todo caso, EUA e China serão os dois grandes atores dos cenários geopolíticos e geoeconômicos do século XXI, assim como a Grã-Bretanha e Alemanha (esta só na segunda metade) o foram no século XIX e os EUA e a URSS (esta por apenas quatro décadas) o foram no século XX. 

Mais de dez anos atrás eu já previa que não haveria retorno a uma “Guerra Fria”, mas que, se por alguma idiotice dos EUA, a nova “Guerra Fria Econômica” já tinha sido vencida pela China, não exatamente por grandes virtudes desta última – menos ainda por causa da liderança do PCC, o espantalho “comunista para certos beócios do anticomunismo primário –, mas por erros dos EUA, ao persistirem em sua arrogância imperial. A China se sairia “vitoriosa”, eu previa, não exatamente por algum “socialismo com características chinesas” – quando o que eles têm é apenas um “capitalismo com características chinesas” –, mas pelo fato de que a China sabiamente estava fazendo exatamente a mesma coisa que tinha sido feito pela Grã-Bretanha no século XIX e pelos EUA no século XX: uma estratégia de abertura econômica, liberalização comercial, promoção do livre comércio, dos investimentos produtivos, da educação do povo, da globalização e da interdependência ativa e inteligente. Simples assim: o normal seria a complementaridade entre as duas grandes economias planetária, a simbiose, ou até osmose, da “Chimérica”, o que parecia funcionar, mas começou a derrapar por causa das reações dos órfãos da globalização – os operários americanos da segunda revolução industrial –, seguidos zelosamente por políticos muito mal preparados (o que se precipitou sob o mandato do mentecapto do Trump).

O que me surpreendeu, verdadeiramente, nos últimos cinco anos, não foi a paranoia dos generais do Pentágono, que é normal, considerando-se que militares são pagos exatamente para serem paranoicos, e com isso gastarem inutilmente o dinheiro dos contribuintes. O que me assustou foi ver que essa paranoia se disseminou entre os “wisest and brightest” dos acadêmicos das melhores universidades, quase todos eles considerando realmente que a China era uma adversária e que os EUA deveriam se preparar para uma fantasmagórica – para eles possível – “armadilha de Tucídides”, uma leitura totalmente equivocada do clássico sobre a guerra do Peloponeso entre Atenas e Esparta. Isso me chocou, e espero que os colegas acadêmicos dos EUA se recuperem da paranoia, para não prejudicar os EUA e o mundo, em especial os países mais pobres, que precisam desesperadamente de duas grandes locomotivas de crescimento e de cooperação internacional. A Rússia? Ora, a Rússia! Vai continuar sendo esse império sempre deficiente, recalcado, mas pretensioso que sempre foi, perturbando a vida dos europeus com seu barbarismo antidemocrático. E a velha Europa? Nada de muito novo: continuará construindo sua integração, entre a “catedral gótica” de Bruxelas e as rebeldias provinciais dos membros menores.

Finalizo por aqui esta já longa carta enviada ao futuro. Tenho agora de enrolar o manuscrito, colocar dentro de uma nova garrafa e jogar novamente ao mar, para ver se consigo recolher em 2032. Se não conseguir, algum dos meus poucos leitores talvez faça o retrospecto do que eu previ, e coloque algum epitáfio em minha tumba, mais ou menos assim: 

‘Aqui jaz um sonhador, adepto da Idealpolitik em relações internacionais, do social-liberalismo no plano interno, e que tentou ser um educador, sem necessariamente o conseguir. Mas tentou, sinceramente e com todas as suas forças.”

Talvez fique muito grande, e sirva apenas para alguma aula memorial, pois que não desejo lápide em qualquer cemitério: que minhas cinzas sejam lançadas em algum rio ou lago das proximidades, em alguma breve cerimônia evocativa. Mas, vou tentar estar “presente” na cerimônia, senão em pessoa, pelo menos com meus escritos, neste blog Diplomatizzando – que já virou nome de “editora” – ou em qualquer outro suporte. 

Até lá passem bem, cuidem-se, e muito boa sorte. Mas lembrem-se: como dizia Einstein, Deus não joga dados...

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 23 de abril de 2011.