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sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Maquiavel: 500 anos da publicacao de O Principe: um pastiche moderno, por Paulo Roberto de Almeida

Cinco séculos depois de Maquiavel ter escrito sua obra, o diplomata e cientista político Paulo Roberto de Almeida segue os passos do secretário diplomático da República de Florença para atualizar O Príncipe. A partir da constatação de que a obra permanece atual, o autor utiliza a mesma estrutura e até títulos da obra do florentino para estudar a ciência de governar nos dias de hoje. Nesta obra singular por sua natureza original de pastiche e, ao mesmo tempo, de independência de pensamento, Almeida dialoga com o genial pensador, segue seus passos naquelas recomendações que continuam aparentemente válidas para a política atual, mas oferece inquietações sobre cenários contemporâneos para os velhos problemas de administração dos homens. Maquiavel preocupou-se com a estrutura de um Estado moderno, enquanto o brasileiro busca defender os direitos dos cidadãos, justamente contra a intrusão e a prepotência dos Estados. 

O moderno Príncipe: Maquiavel revisitado

R$15,00
Em estoque


sábado, 29 de junho de 2013

Maquiavel e a Arte da Guerra - Marco Cepik

Arte da guerra

A questão militar ocupa um lugar central nas preocupações de Maquiavel, que acredita que os conflitos são próprios à natureza da política. Sua contribuição singular para o pensamento político está na dimensão ética da articulação entre fins e meios.
Por: Marco Cepik
Ciência Hoje, 26/06/2013
Arte da guerra
No sexto artigo desta série, que comemora os 500 anos de 'O príncipe', o cientista político Marco Cepik apresenta as ideias de Maquiavel sobre o fazer da guerra. (arte: Ampersand)
Escrito entre 1519 e 1520, A arte da guerra foi publicada enquanto Maquiavel (1469-1527) ainda vivia. Suas máximas concisas e conselhos práticos ao príncipe e aos cidadãos são semelhantes a passagens encontradas no general e filósofo chinês Sun Tzu. Entretanto, apesar de sua influência sobre líderes e pensadores, a obra nunca rivalizou em popularidade com O príncipe, o livro mais conhecido de Maquiavel, muito menos com o Ping-Fa, de Sun Tzu, ambos encontráveis nas prateleiras de qualquer livraria de aeroporto ao redor do mundo. Vejamos então por que é importante conhecer as ideias de Maquiavel sobre o fazer da guerra.
Em primeiro lugar, a mensagem mais importante de Maquiavel nesse livro ecoa um tema presente nas demais obras histórico-políticas do autor: a intencionalidade da ação, o seu planejamento, uma visão que hoje se convencionou chamar de estratégica. Tudo isso aparece como uma qualidade da ‘virtú’ e uma necessidade de se construir meios consistentes com os fins para enfrentarmos as surpresas da ‘fortuna’, dois conceitos que atravessam seu pensamento.
Nas palavras de Maquiavel, aqui transcritas da edição da Editora Universidade de Brasília, “(...) quem pretende fazer alguma coisa deve primeiramente preparar-se de modo que, surgindo a ocasião, tenha condições de satisfazer suas intenções”.
A queda do governo republicano da cidade, em 1512, e o banimento de Maquiavel da vida governamental tornaram mais claro ainda esse princípio. Nas obras que escreveu nesse período, como destacou Newton Bignotto em Maquiavel republicano, evidencia-se a sua convicção de que o “processo de fundação e conservação de uma república não é independente da escolha de sua estratégia de defesa”.
Livro 'A arte da guerra'Seja em O príncipe (1513), nos Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio (1513-1519) ou na Arte da guerra (1519-1520), a questão militar ocupa um lugar central nas preocupações de Maquiavel, cuja contribuição singular para o pensamento político reside no realismo de sua concepção sobre as relações existentes entre força e convencimento, bem como na dimensão ética da articulação entre fins e meios.
Como observou o autor Félix Gilbert, longe de tentar eliminar os conflitos, inclusive a guerra, Maquiavel os considera próprios à natureza da política, encontro da liberdade humana com a natureza e as necessidades. A conquista e a conservação dos objetivos políticos são possíveis, mas o poder da fortuna limita a liberdade de ação e não permite o conhecimento completo. Portanto, a ética é constituída pela própria conduta na ação política, pelo conteúdo dos fins estabelecidos, pela maneira de lidar com as necessidades e pelo resultado objetivo que a ação ajuda a estruturar no tempo e no espaço.

O papel dos cidadãos

O segundo motivo mais importante para se ler A arte da guerra com atenção ainda hoje diz respeito ao papel dos cidadãos na defesa da república. O crescimento das empresas militares privadas no mundo contemporâneo e as recomendações para a conformação de forças armadas “enxutas e profissionais” atualizam a questão.
Escrevendo no alvorecer da era moderna, o secretário florentino ocupou-se da guerra e da organização militar desde 1500, quando uma nova fase da guerra entre Pisa e Florença levou-o a defender a criação de milícias regulares, não mais compostas principalmente por mercenários.
O segundo motivo mais importante para se ler A arte da guerra com atenção ainda hoje diz respeito ao papel dos cidadãos na defesa da república
Na verdade, a partir de 1505 dedicou-se pessoalmente a executar planos para o rearmamento de Florença. Dentre outros escritos, destaca-se o seu Discurso sobre a preparação militar florentina, de 1506. Nomeado para o Conselho dos Dez das Milícias, concentrou-se nas tarefas práticas de organização de uma força militar consistente com o duplo requisito da estabilidade dos Estados: a justiça e as armas.
Interpretando fatos da época e reinterpretando a história da República romana, Maquiavel estava convicto de que não se poderia fundar e manter uma República moderna confiando apenas em mercenários e senhores da guerra (condittieri), pois somente um exército de conscritos poderia garantir a independência das cidades-estado italianas.
Os aspectos financeiros, logísticos, táticos e morais do exército de conscritos também não escaparam à Maquiavel. Não apenas afirma ele que “na guerra, a disciplina pode mais do que o ímpeto”, mas vê no armamento e na conscrição de elementos urbanos e rurais, bem como nas formas de treinamento e comando de tal força pública, um elemento de enfraquecimento relativo das classes abastadas e de amalgamento de elementos populares ao tecido institucional, moral e social do qual é feito o governo.
“A descoberta de Maquiavel não é, portanto, a da importância de uma boa milícia, mas sim de que uma boa milícia exige uma forma democrática de governo”, escreve Bignotto. O apelo ao patriotismo dos cidadãos-soldados só é possível se as instituições militares são consistentes com as instituições políticas. Portanto, se refaz o nexo entre o chefe militar e o chefe político (que o subordina), seja ele o príncipe ou o povo, conforme o tipo de Estado e de regime do país.

Aceitação questionável

Por outro lado, também é possível mencionar pelo menos dois elementos que dificultam a aceitação das ideias de Maquiavel sobre a guerra por parte do leitor contemporâneo. Em primeiro lugar, o fato mesmo de que as suas prescrições e lições não chegam a configurar uma teoria moderna da guerra, entendida como um programa de pesquisa científico, o qual desenvolve-se apenas no século 19, especialmente a partir da obra de Clausewitz (1780-1831).
O autor de Vom Krieg conhecia e respeitava as posições de Maquiavel, mas ainda que tenha deixado sua obra inacabada, uma leitura mais cuidadosa mostra a recusa de Clausewitz em subordinar a análise conceitual e empírica da guerra a preceitos gerais de caráter normativo que teriam validade universal, erro incorrido por Maquiavel e que o leva, por exemplo, a não considerar adequadamente o papel revolucionário da artilharia e das armas de fogo, focado que estava na evocação da infantaria e da condução dos assuntos militares na República romana antiga como contraponto à prioridade dada à cavalaria no fazer a guerra da aristocracia medieval.
Armas de fogo
Alguns pontos relacionados à conduta de Maquiavel podem levar ao questionamento de suas ideias sobre a guerra. Um deles foi o fato de não considerar adequadamente o papel revolucionário da artilharia e das armas de fogo na época. (imagem: Wikimedia Commons)
Em segundo lugar, a própria forma utilizada por Maquiavel para redigir A arte da Guerra dificulta o acesso do leitor contemporâneo. A obra é dividida em um prefácio e sete livros (capítulos), na forma de um diálogo socrático que ocorre nos jardins construídos na década de 1490 para os aristocratas e humanistas florentinos.
O diálogo ocorre entre Cosimo Rucellai e Fabrizio Colonna (alter-ego de Maquiavel?) com outros patrícios e capitães da então recente república florentina, remetendo aos méritos das legiões romanas e procurando refutar a asserção de que a artilharia tornaria obsoletos os métodos clássicos.
Seja como for, vale estudar Maquiavel depois de 500 anos, lembrando, para citar palavras suas, que “os bons comandantes nunca se empenham numa batalha se a necessidade não os impele, ou a oportunidade não os chama”.

Marco Cepik
Diretor do Centro de Estudos Internacionais sobre Governo (CEGOV)
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Maquiavel: quase 500 anos - Paulo Roberto de Almeida

Aqui, minha homenagem a Maquiavel, um texto de síntese quando terminei de reescrever O Príncipe, no qual eu reflito sobre a atualidade do inventor da ciência política e pergunto: o que nos separa de Maquiavel?.
O Moderno Príncipe: Maquiavel revisitado
Paulo Roberto de Almeida 

Se, por alguma fortuna histórica, Maquiavel retornasse, hoje, ao nosso convívio, com as suas virtudes de pensador prático, quase meio milênio depois de redigida sua obra mais famosa, como reescreveria ele o seu manual “hiperrrealista” de governança política? Seriam os Estados modernos muito diversos dos principados do final da Idade Média?

Este Maquiavelrevisitado, voltado para a política contemporânea, dialoga com o genial pensador florentino, segue seus passos naquelas “recomendações” que continuam aparentemente válidas para a política atual, mas não hesita em oferecer novas respostas para velhos problemas de administração dos homens. Aqui, como em outros aspectos, a constância dos “príncipes” nos desacertos é notável. Essa capacidade de errar e de provocar danos aos cidadãos não parece ter evoluido muito, desde então.

De fato, Maquiavel permanece surpreendentemente atual – com o que concordariam os filósofos e cientistas políticos da atualidade –, mesmo (talvez sobretudo) nos traços malévolos exibidos pelos condottieri contemporâneos e pelos cappi dei uomine. Ainda que envenenamentos encomendados e assassinatos por adagas, tão comuns no Renascimento italiano, não estejam mais na moda – pelo menos fora do âmbito dos serviços secretos –, e que eles tenham sido substituídos por outros métodos para se desembaraçar de concorrentes e de adversários políticos, as técnicas para se apossar do poder e para mantê-lo exibem uma notável continuidade com aquelas descritas pelo experiente diplomata da repubblica fiorentina do Quatrocento.

O que pode estar ultrapassado, no seu “manual” de 1513, é meramente acessório, pois a essência da arte de comandar os homens revela-se plenamente adequada aos dias que correm, confirmando assim as finas virtudes de psicólogo político – avant la lettre – do perspicaz pensador do Cinquecento.

Este Príncipe Moderno representa, antes de tudo, uma singela homenagem ao diplomata italiano que “inventou” a ciência política, ainda que ele o tenha feito nas difíceis circunstâncias do ostracismo, na sua condição de funcionário de Estado “cassado” pelos novos donos do poder em Florença.

Obra de um momento político – talvez não muito diverso daqueles tempos vividos pelo segretario de cancelleria –, este novo Príncipe, que se pretende tão universal em seu escopo e motivações quanto seu modelo de cinco séculos atrás, oferece novos argumentos em torno dos velhos problemas da administração estatal. A bem refletir sobre a política contemporânea, pouco nos separa de Maquiavel, se não é algum desenvolvimento institucional e uma maior rapidez nas comunicações. Quanto aos homens, tanto os condottieri quanto o popolo, eles não parecem ter mudado muito...


Paulo Roberto de Almeida é cientista social e diplomata, com obras publicadas sobre temas de história diplomática, de relações internacionais e de política externa do Brasil.

Leia o prefácio, a dedicatória e uma carta a Maquiavel, neste link:


Maquiavel: 500 anos de O Principe - Renato Lessa

Faz meio milênio, um diplomata florentino caído em desgraça com a mudança de regime em sua república natal, escreveu, no ostracismo, a obra fundadora da política moderna, talvez a obra seminal de todas as políticas. Abaixo apresento um artigo do cientista político Renato Lessa, que trata da obra e do homem, e de seu impacto permanente não apenas na política prática, mas sobretudo no pensamento político moderno.
Eu também me dediquei a pensar sobre o homem e a obra, e a ele dediquei um de meus exercícios de "clássicos revisitados", reescrevendo O Príncipe para os nossos tempos, consignando, também, na introdução e na conclusão, meus sentimentos em relação ao personagem, seu papel na história e as lições que poderiam ser tiradas de certos episódios para nossa reflexão contemporânea.
Meus escritos sobre ele e sua obra podem ser conferidos neste link:
http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/95maquiavelrevisitadoSen.html
Ainda falaremos de Maquiavel neste ano de 2013.
Paulo Roberto de Almeida

1513-2013: uma aproximação ao Experimento Maquiavel

O cientista político Renato Lessa apresenta o pensamento do autor de 'O príncipe', que enxerga na política o remédio para a condição humana, sempre instável e falível.
Por: Renato Lessa
Revista Ciência Hoje,  31/01/2013
1513-2013: uma aproximação ao Experimento Maquiavel
Nesta série de artigos, publicada no ano da comemoração dos 500 anos de ‘O príncipe’, de Maquiavel, o sobreCultura+ abordará aspectos importantes da obra do pensador florentino, da ideia de representação política ao seu republicanismo, teatro e filosofia.
Maquiavel, Maquiavéis O príncipe, Maquiavel
Há cinco séculos, no ano de 1513, Nicolau Maquiavel, político e pensador florentino, escreveu uma carta a um embaixador de sua cidade noticiando que escrevera “um livreto”, que designa como De principatibus e tornou-se conhecido como O Príncipe. Os termos da carta exalam modéstia e engenho simples: trata-se de investigar o que é o principado – “de que espécie são, como se conquistam, como se mantêm, por que se perdem”. Tal concisão não impediu que o “pequeno livro” se tornasse uma das principais obras da cultura moderna, e não apenas do pensamento político moderno.
Em comemoração aos cinco séculos de O príncipe, o sobreCultura+ revisitará, em abordagem ampliada, vários ângulos da obra geral de Maquiavel. O pretexto da efeméride dará passagem à publicação mensal de ensaios elaborados por estudiosos especialmente convidados.
O título da série – Maquiavel, Maquiavéis – foi tomado de empréstimo do livro da cientista política Maria Tereza Aina Sadek, que gentilmente autorizou seu uso.
O tema da complexidade parece ser, hoje, apanágio das assim chamadas ciências exatas. De fato, complexos são os sistemas orgânicos e, por sua vez, os inorgânicos nada lhes ficam a dever. Tanto uns como outros são avessos à explicação monocausal e, com alguma frequência, manifestam-se de forma caótica, desafiando a velha crença da modernidade de que a estabilidade das causas é garantia da estabilidade dos efeitos.
Há exatos 500 anos, na cidade de Florença, Nicolau Maquiavel (1469-1527), homem público e intelectual, concluiu O príncipe. Não é exagero dizer que antes dos 'filósofos naturais' – nome que então se atribuía ao que hoje definimos como 'cientistas' – terem dado conta da complexidade presente nos fenômenos naturais, o livro introduziu na cultura ocidental o 'fato da complexidade' como constitutivo das relações entre os humanos.
O pequeno livro foi dedicado ao “Magnífico Lorenzo de Medici”, governante florentino e membro da família mais poderosa da cidade. A dedicatória pode sugerir a olhos precipitados um vínculo temático e estilístico do “pequeno volume” – como o designava Maquiavel – com o estilo literário e político conhecido como “espelho de príncipes”. O estilo tinha como traço central a enumeração, com frequência por parte de um autor protegido ou patrocinado para tal fim, das qualidades necessárias para o governo de um príncipe virtuoso. Quando não tendia para a bajulação aberta, procurava fixar uma coleção de bons preceitos diante dos quais o governante deveria se espelhar.
Já na dedicatória, Maquiavel indica a natureza distinta de seu empreendimento. Embora dedicado a um príncipe, a obra parte de uma curiosa e inovadora premissa. Como que se desculpando pela ousadia de dirigir-se a um príncipe como Lorenzo, Maquiavel – que se apresenta como “homem de baixa e ínfima condição” – sustenta que “para conhecer a natureza dos príncipes é preciso ser povo”, assim como “para bem conhecer a natureza dos povos, é preciso ser príncipe”. A natureza do governo, portanto, aparece não como fundada na consulta principesca de um catálogo de preceitos morais e religiosos, mas emerge da interação sempre complexa e um tanto imprevisível entre os 'grandes' e os 'pequenos'.
Se a natureza de um povo é constituída pela direção política à qual se submete, o significado do governo do príncipe é mais bem revelado pela observação que sobre ele fazem seus súditos, ou suas vítimas. Não sendo, pois, um 'espelho de príncipes', do que trata, afinal, este livro, um dos mais importantes da cultura ocidental moderna?

Complexidade política

O tema fundamental de O príncipe é o da 'complexidade da política' e, por extensão, da história. É isto que corre como pano de fundo para o tratamento de diferentes regimes políticos – os principados –, que têm em comum, ao contrário das repúblicas, a presença de sistemas monocráticos e de concentração de soberania.
Em obra iniciada em 1513 e concluída em 1517, os Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio, Maquiavel ocupou-se das repúblicas, tema de grande ancestralidade. A complexidade dos principados não deriva tanto da diversidade de suas formas: há os hereditários, os tomados por conquista, os novos, os eclesiásticos, todos com características próprias, desafios aos governantes e expectativas dos súditos. Mas pode-se dizer que há um suporte de complexidade básica que subjaz à variedade das formas políticas, e ele diz respeito ao lugar ocupado pela política nos assuntos humanos.
Se este é o foco, Maquiavel não pode, por outro lado, ser tomado como um 'pensador político', no sentido de um 'especialista' em política. Sua sensibilidade para fenômenos de natureza política foi envolvida por um conjunto amplo de questões e formas de conhecimento, tais como a antropologia – ou um exame da condição humana –, a história, a cosmologia e a filosofia. Para começar, a própria ideia de política – que comparece ao texto não como termo, mas como problema – deve ser clarificada.
Montagem 'O príncipe'
Em sua obra mais conhecida, 'O príncipe', Maquiavel mostra que a política, na modernidade, supõe a dominação de um soberano sobre seus súditos. Para ele, é justamente este exercício de soberania que torna a sociedade possível.
Os padrões estabelecidos pela Antiguidade – presentes na democracia ateniense e na república romana – fizeram da ideia de política algo que pode ser definido como uma prática de deliberação pública a respeito de assuntos de interesse comum. Se fossemos representar tal prática em termos gráficos, uma linha horizontal seria suficiente. É essa representação que decorre da própria noção grega de 'isonomia' política – ou de equivalência dos cidadãos na vida pública –, presente, como ideal, nas repúblicas.
A política no experimento de Maquiavel aproxima-se mais da linha vertical do que da horizontalidade dos antigos. Aqui, trata-se de mostrar que política, na abertura da modernidade, supõe exercício de dominação de um soberano sobre seus súditos, ou dos grandes sobre os pequenos.
A nostalgia deliberativa da democracia grega e da república romana cede lugar a um experimento que tem no exercício da dominação um 'princípio de vertebração' da sociedade, sem o qual ela colapsa. Em outros termos, o que torna a sociedade possível é o exercício da soberania: há ordem ali onde se faz clara a determinação de quem manda e de quem obedece. É este o sentido da política: instituir na vida social um fundamento implicado no próprio exercício do poder.

Cosmologia precisa

O valor e a necessidade desse fundamento podem ser dados pela antropologia de Maquiavel, apoiada, por sua vez, em uma cosmologia precisa. Os homens habitam, tal como no sistema aristotélico-ptolomaico, o domínio sublunar, distinto do padrão cosmológico do mundo supralunar. Este, de acordo com Aristóteles, é constituído por movimentos naturais, perpétuos e necessários. Perfeição e necessidade são seus atributos centrais, e o conceito de 'movimento natural', egresso da física aristotélica, é fulcral: trata-se do trajeto de um corpo na direção de seu lugar natural.
O cosmo aristotélico, em seu estrato supralunar, é o espaço por excelência dos movimentos naturais. 'Movimentos violentos', por oposição, são aqueles que dirigem corpos a lugares não-naturais – ou lugares que não são seus por natureza –, o que pressupõe a mediação de um agente que introduz no mundo um princípio de desordem e indeterminação.
O cosmo de Maquiavel, tal como ensinado em seu tempo pelos aristotélicos da cidade de Pádua, possui tal fisionomia. O mundo sublunar, mesmo que marcado por regularidades físicas, é o lugar natural dos movimentos não-naturais, pela simples razão de que é apenas nesse estrato inferior que podemos encontrar os humanos. A cosmologia dá, assim, passagem à antropologia, e vemo-nos diante da representação maquiaveliana da condição – ou natureza – humana.
Não são auspiciosas as imagens que disto se seguem. Não é que os humanos sejam maus por natureza, mas são erráticos nas suas paixões, desejam com frequência melhorar sua condição, são capazes de gestos de grandeza, mas podem odiar, invejar e abrigar ambições descabidas; no limite, são letais. Em uma palavra, não há na natureza humana um substrato mínimo de estabilidade; os humanos devem ser contidos de fora para dentro, até mesmo para que aprendam a conter-se de dentro para fora.
A política é tudo, menos estabilidade consolidada. Falar de política implica pôr-se no universo existencial da incerteza. Este é o mantra da 'ciência política' maquiaveliana
Não há em Maquiavel intenção condenatória: para ele essa antropologia é um fato da espécie e manifesta-se por toda parte e por todos os tempos. Se quisermos, é este mesmo um princípio de estabilidade: a instabilidade permanente do comportamento humano. Os humanos não cabem dentro de si. Espinosa e Freud bem entenderam, cada um em seu tempo, as implicações da antropologia de Maquiavel: para o primeiro, a potência da multidão excede sempre as formas institucionais que a procuram conter; para o segundo, por mais que a civilização exerça sobre nós sua disciplina, a energia pulsional segue vigente e igualmente excessiva.
Pois bem, a política é o remédio para a condição humana sempre instável e falível. Tal instabilidade, contudo, tem como um de seus princípios o fato de que tudo que é valioso para os humanos é objeto de inveja e disputa. Tal princípio não pode deixar de afetar a própria política, tornando-a, desta forma, igualmente instável. O próprio lugar do príncipe está, por definição, sempre em disputa; o príncipe não é, além disso, uma exceção antropológica. Ou seja, o princípio de instabilidade é responsável pela introdução continuada de instabilidade. A política é tudo, menos estabilidade consolidada. Falar de política implica pôr-se no universo existencial da incerteza. Este é o mantra da 'ciência política' maquiaveliana.

Fortuna e virtude

Nada mais distante de Maquiavel do que a pretensão de que foi o fundador de uma ciência capaz de tornar os fenômenos políticos explicáveis e previsíveis. Basta levar em conta o papel que atribuiu à 'fortuna' – ou o conjunto de fatores fora de nosso alcance, proporcionados pelo acaso – nos assuntos humanos.
Para ele, nada menos do que a metade de nossas ações é pautada pela fortuna. Isso vale tanto para o cidadão comum – que se agarra às rotinas do hábito como subterfúgio ao assédio do acaso – como para o príncipe, acossado sempre por inimigos e por amigos invejosos e inconfiáveis. Para o príncipe não há como escorar-se no hábito. O que se lhe impõe, na perspectiva de conservar e ampliar seu domínio, é a ação; uma ação que, diante do imponderável – da imprevisibilidade – da fortuna, exige uma qualidade específica, sem a qual tudo colapsa, a virtù.
Para Maquiavel, nada menos do que a metade de nossas ações é pautada pelo acaso
Não se trata aqui da virtude pregada aos príncipes pelos 'espelhos de príncipes'. Não há catálogo de virtudes morais e de preceitos religiosos que nos ensine a lidar com a política tal como ela é, é o que Maquiavel está a dizer. É a capacidade de extrair da fortuna – da indeterminação da vida e da volatilidade da política – um curso de ação positivo. Em linguagem corrente, trata-se de fazer do acaso uma estrutura de oportunidades para novas opções e para a sobrevida e ampliação da capacidade de exercer poder.
Quem detém essa capacidade, tão essencial para a política? Ninguém por direito divino ou de casta. A capacidade política – um dos sentidos da ideia de virtù – é sociologicamente cega: ou seja, não há em Maquiavel nada que a defina como monopólio de aristocratas; um condottiere de extração popular bem pode detê-la.
Por fim, Maquiavel estabelece premissas importantes para o conhecimento da política. Francis Bacon (1561-1626), um dos heróis da ciência moderna, nele reconhecerá uma inovação teórica fundamental, a de proceder segundo princípios indutivos, tomando por base os exemplos históricos.
Francis Bacon
Francis Bacon, considerado um dos pais da ciência moderna, reconhecerá em Maquiavel uma inovação teórica fundamental, a de proceder segundo princípios indutivos, tomando por base exemplos históricos. (imagem: Wikimedia Commons)
A política, assim como a história, são vulneráveis às artes do acaso, mas podem ser conhecidas, em alguma medida. Assim como a natureza se abre à observação do naturalista, os exemplos históricos constituem a ‘natureza’ do historiador Maquiavel. Aprender com o que fizeram, ao longo do tempo – para o bem ou para o mal –, soberanos e diversos potentados, verificar as condições nas quais decisões foram tomadas, seus efeitos etc. – tudo isso forma um grande catálogo de exemplos aplicáveis diante de situações semelhantes. Empreendimento imenso, ilimitado e inacabável. Mais do que isso, sempre vulnerável à imperita coleta de exemplos e à infeliz interpretação. Tudo isso agravado pelo fato de que o conhecimento político é uma exigência da ação política; ele tem o tempo da própria ação, o que lhe imprime imensa falibilidade.
Para entender a política é fundamental ler o livro da História. Mas ao lê-lo, não há qualquer garantia de infalibilidade. A ciência da política é uma tentativa de conhecimento sistemático daquilo que não se dá a conhecer sistematicamente. É esse o legado de Maquiavel e a sua utopia para o conhecimento humano.

Renato Lessa
Laboratório de Estudos Hum(e)anos
Departamento de Ciência Política
Universidade Federal Fluminense

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Olavo de Carvalho sobre Maquiavel, a proposito de seu livro

Neste sábado (30/Julho), às 19:30, o Prof. Olavo de Carvalho dará uma palestra sobre o seu novo livro:
Maquiavel, ou a Confusão Demoníaca

A palestra é aberta a todos que queiram assistir e será transmitida por vários sites, inclusive a Livraria do Seminário de Filosofia.

Gostaríamos ainda de destacar alguns títulos novos que chegaram recentemente às nossas prateleiras:

- Diário Filosófico – Constantin Noica
- Regras da Vida Cotidiana – Louis Lavelle
- Imposturas Intelectuais – Alan Sokal
- Como Escrever um Romance – Miguel de Unamuno
- Guia Politicamente Correto da História do Brasil – Leandro Narloch
- A Origem da Linguagem – Eugene Rosenstock-Huessy
- Astrologia Medieval – Raimundo Lúlio
- Diário de um Pároco de Aldeia – Georges Bernanos
- O Caminho da Servidão – F. Hayek

Gratos pela atenção,
Equipe da Livraria do Seminário de Filsofia
livraria.seminariodefilosofia.org
Rua Angelo Vicentim, 70 - Campinas - SP - 13084060

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Maquiavel agradece e promete reincidir...

Maquiavel, Paulo Kramer, Murillo Aragão e eu mesmo, nessa ordem, gostaríamos de agradecer a presença do distinto público em nosso lançamento debate em torno deste livro:

O Moderno Príncipe:Maquiavel revisitado,

evento realizado na quarta-feira última, dia 18 de maio, as 19hs, na Casa Thomas Jefferson da Asa Sul de Brasília, e aproveitamos para agradecer aqui, também, o inestimável trabalho da Ana Maria Assumpção, Elizabeth Daniel de Almeida e Luiz Carlos Costa, respectivamente diretora, vice e coordenador de eventos daquela Casa.

Foi uma noite agradável, pelo menos para quem gosta de debates inteligentes como o que -- desculpem a falta de modéstia - ocorreu. O Brasil anda descendo tão baixo na escala dos debates públicos que as pessoas parecem se emocionar com a simples declaração de uma professora reclamando dos baixos salários, geralmente pelos motivos errados e propondo políticos totalmente erradas. Meu "Maquiavel revisitado" tentou debater algumas questões reais em torno dos nossos principais problemas, com base no pensador político mais iconoclasta que possa ter havido na história do pensamento ocidental. Coitado do Maquiavel, se ele retornasse ao nosso convívio, hoje, a única maneira de tentar influenciar o debate público seria fazendo concurso para ser funcionário de Estado (o que aliás ele já era, mas sem garantia de estabilidade, o que me parece correto, como norma geral).

Em todo caso, ao agradecer os presentes pela presença e participação, gostaria de transmitir, abaixo, um texto que deveria ter servido como "orelhas" do livro, mas que pelo fato de eu estar no China no momento da edição, não pude controlar todas as etapas da produção.
A capa, pelo menos, ficou bonita, embora não tivessem dado crédito ao artista que a fez, meu filho arquiteto, Pedro Paulo Palazzo de Almeida (hoje mesmo partindo para um congresso de arquitetos na Croácia, em Split).

Já que o Maquiavel ficou sem orelhas, aqui segue um texto que prolonga o debate:

O Moderno Príncipe: Maquiavel revisitado
Paulo Roberto de Almeida

O que nos separa de Maquiavel?

Se, por alguma fortuna histórica, Maquiavel retornasse, hoje, ao nosso convívio, com as suas virtudes de pensador prático, quase meio milênio depois de redigida sua obra mais famosa, como reescreveria ele o seu manual “hiperrrealista” de governança política? Seriam os Estados modernos muito diversos dos principados do final da Idade Média?

Este Maquiavel revisitado, voltado para a política contemporânea, dialoga com o genial pensador florentino, segue seus passos naquelas “recomendações” que continuam aparentemente válidas para a política atual, mas não hesita em oferecer novas respostas para velhos problemas de administração dos homens. Aqui, como em outros aspectos, a constância dos “príncipes” nos desacertos é notável. Essa capacidade de errar e de provocar danos aos cidadãos não parece ter evoluido muito, desde então.

De fato, Maquiavel permanece surpreendentemente atual – com o que concordariam os filósofos e cientistas políticos da atualidade –, mesmo (talvez sobretudo) nos traços malévolos exibidos pelos condottieri contemporâneos e pelos cappi dei uomine. Ainda que envenenamentos encomendados e assassinatos por adagas, tão comuns no Renascimento italiano, não estejam mais na moda – pelo menos fora do âmbito dos serviços secretos –, e que eles tenham sido substituídos por outros métodos para se desembaraçar de concorrentes e de adversários políticos, as técnicas para se apossar do poder e para mantê-lo exibem uma notável continuidade com aquelas descritas pelo experiente diplomata da repubblica fiorentina do Quatrocento.

O que pode estar ultrapassado, no seu “manual” de 1513, é meramente acessório, pois a essência da arte de comandar os homens revela-se plenamente adequada aos dias que correm, confirmando assim as finas virtudes de psicólogo político – avant la lettre – do perspicaz pensador do Cinquecento.

Este Príncipe Moderno representa, antes de tudo, uma singela homenagem ao diplomata italiano que “inventou” a ciência política, ainda que ele o tenha feito nas difíceis circunstâncias do ostracismo, na sua condição de funcionário de Estado “cassado” pelos novos donos do poder em Florença.

Obra de um momento político – talvez não muito diverso daqueles tempos vividos pelo segretario de cancelleria –, este novo Príncipe, que se pretende tão universal em seu escopo e motivações quanto seu modelo de cinco séculos atrás, oferece novos argumentos em torno dos velhos problemas da administração estatal. A bem refletir sobre a política contemporânea, pouco nos separa de Maquiavel, se não é algum desenvolvimento institucional e uma maior rapidez nas comunicações. Quanto aos homens, tanto os condottieri quanto o popolo, eles não parecem ter mudado muito...

Paulo Roberto de Almeida é cientista social e diplomata, com obras publicadas sobre temas de história diplomática, de relações internacionais e de política externa do Brasil.

www.pralmeida.org

Leia o prefácio, a dedicatória e uma carta a Maquiavel, neste link.

Os dois posts anteriores que convidavam ao debate-lançamento:
http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/05/maquiavel-teria-algo-dizer-sobre.html

http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/05/maquiavel-pouco-maquiavelico.html

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Maquiavel redivivo (e visitando Brasilia): dia 18 de maio, as 19hs (livro Paulo R. Almeida)

Já anunciei aqui o lançamento deste livro que foi publicado enquanto eu passeava pela China:
O Moderno Príncipe: Maquiavel revisitado
(veja sumário e alguns textos neste link)

Em todo caso, gostaria de convidar os interessados num debate sobre "Maquiavel e a Política Contemporânea", com os cientistas políticos Paulo Kramer e Murillo Aragão, seguido de um coquetel de lançamento do livro,

na Casa Thomas Jefferson da Asa Sul de Brasília
(SEP Sul EQ 706/906, Conjunto B; tel.: 3442-5501; www.thomas.org.br)
na quarta-feira, dia 18 de maio, as 19hs.

O convite da Casa Thomas Jefferson figura aqui,

e o mesmo convite, em formato-texto, está aqui.

Paulo Roberto de Almeida

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Maquiavel pouco maquiavelico...

O convite da Casa Thomas Jefferson:


Maquiavel teria algo a dizer sobre a politica contemporanea? (e a brasileira?)

Sobre a contemporânea, em geral, certamente.
Sobre a brasileira, já não tenho tanta certeza, pois somos tão surrealistas em matéria de política que até a teoria política maquiavélica, ou maquiaveliana, como queiram, teria de se dobrar a nossas peculiaridades jabuticabais.
Isso aqui é um verdadeiro "samba do crioulo doido", como diria um dos menos maquiavélicos dos nossos filósofos tupiniquins, o saudoso Stanislaw Ponte Preta (e aposto como poucos de vocês poderiam dizer o verdadeiro nome deste nosso filósofo de bar).
Em todo caso, estou convidando para um debate-lançamento de livro, em Brasília, como abaixo.
Paulo Roberto de Almeida

Arte da capa: Pedro Paulo Palazzo de Almeida

CASA THOMAS JEFFERSON
Convida para o coquetel de lançamento de livro e debate sobre o livro de
Paulo Roberto de Almeida
O Moderno Príncipe (Maquiavel revisitado)
(Editora do Senado Federal)

Maquiavel e a política contemporânea
Debatedores: Paulo Kramer e Murillo Aragão

Data: Quarta-Feira, 18 de maio de 2011, 19 horas
Endereço: Casa Thomas Jefferson
SEP Sul EQ 706/906 Conjunto B
70390-065 Brasília, DF
(61) 3442-5501 www.thomas.org.br

Paulo Roberto de Almeida releu a mais famosa obra da teoria política, com os olhos na atualidade, e se questionou: e se, por alguma fortuna histórica, Maquiavel retornasse, hoje, ao nosso convívio, com as suas virtudes de pensador prático, quase meio milênio depois de redigido o seu manual hiper-realista de governança política, como reescreveria ele essa obra? Seriam os Estados modernos muito diversos dos principados do final da Idade Média? O livro O Moderno Príncipe dialoga com o pensador florentino, segue seus passos naquelas “recomendações” que continuam aparentemente válidas para a política atual, mas não hesita em oferecer novas respostas para velhos problemas de administração dos homens. Maquiavel se colocou claramente do lado do Estado em seu famoso livro que inaugura a moderna ciência política, uma postura diferente da que assumiria em sua outra obra clássica, Discursos Sobre a Primeira Década de Tito Lívio, quando é um republicano e um democrata. O Príncipe, no limite da tirania, era necessário nas circunstâncias excepcionais da Itália daqueles tempos, invadida, saqueada e humilhada por tropas estrangeiras. Na era contemporânea, o Estado cresceu demais, e agora se trata de defender os direitos do cidadão contra um Estado prepotente.

Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas, Mestre em Planejamento Econômico pela Universidade de Antuérpia, diplomata de carreira desde 1977, atuante na área econômica. Leciona Economia Política Internacional nos programas de Mestrado e Doutorado do Uniceub. Publicou diversos livros em temas de relações internacionais, integração regional e diplomacia brasileira. www.pralmeida.org

Paulo Kramer, professor do Departamento de Ciência Política da UnB, e Murillo Aragão, diretor da consultoria Arko Advice.

Debaterão o estado atual da política contemporânea, no Brasil e no mundo. Maquiavel continua atual, mas ele costuma ser lido, e repetido, apenas por alguma frases banais. Venha assistir a um debate inteligente sobre temas relevantes.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Maquiavel sem orelhas: nao, nao se trata de um novo Van Gogh...

Desculpem o título preocupante, mas é uma coisa simples.
Meu livro mais recente publicado foi O Moderno Príncipe (Maquiavel revisitado), editado pelo Senado Federal, com uma bela capa feita pelo meu filho Pedro Paulo, arquiteto e desenhista, aliás artista.

Acontece apenas que esta edição deixou de fora o texto que eu havia sugerido como "orelhas".
Como acho que ele pode resumir o espírito do livro, permito-me reproduzir aqui aquilo que ficou de fora dessa edição até simpática...
Acho que Maquiavel teria muita coisa a dizer sobre a política no Brasil atual, no bom e no mau sentido, ou seja: tanto as virtudes de alguns (poucos) políticos, que se esforçam por defender, desta vez contra Maquiavel, os cidadãos contra o despotismo do Estado, quanto a fortuna de alguns (muitos) pilantras que praticam tudo aquilo de perversidades que Maquiavel recomendava ao candidato a príncipe para conquistar e se manter no poder.
Assim vai o mundo. Em todo caso, assim vai o Brasil. E até daria um bom debate: Maquiavel e a política contemporânea no Brasil.
Vou pensar nisso como possível lançamento desse livro (sumário aqui).
Paulo Roberto de Almeida

(Sugestão de orelhas para o livro O Moderno Príncipe)

O que nos separa de Maquiavel?
Paulo Roberto de Almeida

Se, por alguma fortuna histórica, Maquiavel retornasse, hoje, ao nosso convívio, com as suas virtudes de pensador prático, quase meio milênio depois de redigida sua obra mais famosa, como reescreveria ele o seu manual “hiper-realista” de governança política? Seriam os Estados modernos muito diversos dos principados do final da Idade Média?
Este "Maquiavel revisitado", voltado para a política contemporânea, dialoga com o genial pensador florentino, segue seus passos naquelas “recomendações” que continuam aparentemente válidas para a política atual, mas não hesita em oferecer novas respostas para velhos problemas de administração dos homens. Aqui, como em outros aspectos, a constância dos “príncipes” nos desacertos é notável. Ela não parece ter evoluido muito, desde então.
De fato, Maquiavel permanece surpreendentemente atual – com o que concordariam os filósofos e cientistas políticos da atualidade –, mesmo (talvez sobretudo) nos traços malévolos exibidos pelos condottieri contemporâneos e pelos cappi dei uomine. Ainda que envenenamentos encomendados e assassinatos por adagas, tão comuns no Renascimento italiano, não estejam mais na moda – pelo menos fora do âmbito dos serviços secretos –, e que eles tenham sido substituídos por outros métodos para se desembaraçar de concorrentes e de adversários políticos, as técnicas para se apossar do poder e para mantê-lo exibem uma notável continuidade com aquelas descritas pelo experiente diplomata da repubblica fiorentina do Quatrocento.

O que pode estar ultrapassado, no seu “manual” de 1513, é meramente acessório, pois a essência da arte de comandar os homens revela-se plenamente adequada aos dias que correm, confirmando assim as finas virtudes de psicólogo político – avant la lettre – do perspicaz pensador do Cinquecento.
Este Moderno Príncipe representa, antes de tudo, uma singela homenagem ao diplomata italiano que “inventou” a ciência política, ainda que ele o tenha feito nas difíceis circunstâncias do ostracismo, na sua condição de funcionário de Estado “cassado” pelos novos donos do poder em Florença. Obra de um momento político – talvez não muito diverso daqueles tempos vividos pelo segretario de cancelleria –, este novo Príncipe, que se pretende tão universal em seu escopo e motivações quanto seu modelo de cinco séculos atrás, oferece novos argumentos em torno dos velhos problemas da administração estatal. A bem refletir sobre a política contemporânea, pouco nos separa de Maquiavel, se não é algum desenvolvimento institucional e uma maior rapidez nas comunicações. Quanto aos homens, tanto os condottieri quanto o popolo, eles não parecem ter mudado muito...

Paulo Roberto de Almeida é cientista social e diplomata, com obras publicadas sobre temas de história diplomática, de relações internacionais e de política externa do Brasil.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Maquiavel revisitado: e compravel tambem

Finalmente consegui a capa do meu mais recente livro, aliás feita pelo meu próprio filho Pedro Paulo, um sério Maquiavel de terno e gravata, como se fosse um executivo dos golpes de Estado (no bom sentido, claro)...

O Moderno Príncipe - Maquiavel Revisitado
Paulo Roberto de Almeida
R$ 15,00

(produto temporariamente limitado a 1 por cliente)
Também tem o link para a compra: http://www.senado.gov.br/publicacoes/Livraria/asp/publicacao.asp?COD_PUBLICACAO=1209&COD_CLASSIFICACAO=1

[Descrição a cabo da Editora do Senado:]
Cinco séculos depois que Maquiavel escreveu sua obra, o diplomata e cientista político Paulo Roberto de Almeida segue os passos do "segretario diplomatico" da República de Florença para atualizar "O Príncipe". A partir da constatação de que a obra permanece atual, o autor utiliza a mesma estrutura e até títulos da obra do florentino para estudar as estruturas políticas e a ciência de governar nos dias de hoje. Nesta obra singular por sua natureza de original pastiche e, ao mesmo tempo, de independência de pensamento, Paulo Roberto de Almeida dialoga com o genial pensador, segue seus passos naquelas recomendações que continuam aparentemente válidas para a política atual, mas oferece um elenco de inquietações sobre cenários contemporâneos para os velhos problemas de administração dos homens. Maquiavel preocupou-se com a estrutura de um Estado moderno, enquanto Paulo Roberto de Almeida busca defender os direitos dos cidadãos, justamente contra a intrusão e a prepotência dos Estados.

Descrição física: 195 páginas
Editor: Conselho Editorial do Senado Federal
Edição: 1ª
Ano: 2010
Comprar

Sumário:

Prefácio
Dedicatória

1. Dos regimes políticos: os democráticos e os outros
2. Das velhas oligarquias e do Estado de direito
3. Da variedade de Estados capitalistas
4. Do governo pelos homens e do governo pelas leis
5. Da transição política nos regimes democráticos
6. Da conquista do poder: a liderança política
7. Da eficácia do comando e da manutenção do poder
8. Da ilegitimidade política: da demagogia e da força
9. Das repúblicas democráticas e sua base econômica
10. Das forças armadas e das alianças militares
11. Do Estado laico e da força das religiões
12. Da profissionalização das forças militares
13. Dos gastos com defesa e da soberania política
14. Da preparação estratégica do líder político
15. Do exercício da autoridade
16. Da administração econômica da prosperidade
17. Do uso da força em política
18. Da mentira e da sinceridade em política
19. Da dissimulação como forma de arte
20. Da dissuasão e da defesa do Estado
21. Da construção da imagem: verdade e propaganda
22. Dos ministros e secretários de Estado
23. Dos aduladores e dos verdadeiros conselheiros
24. Da arte pouco nobre de arruinar um Estado
25. Do acaso e da necessidade em política
26. Da defesa do Estado contra os novos bárbaros

Carta a Niccolò Machiavelli
Recomendações de leituras

Todos os livros deste autor

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

O Moderno Principe (Maquiavel revisitado) - Sumario

O MODERNO PRÍNCIPE
(MAQUIAVEL REVISITADO)




Paulo Roberto de Almeida
Doutor em ciências sociais.
Mestre em economia internacional.
Diplomata.

(Edições do Senado Federal, volume 147
Brasília, Senado Federal, 2010, 195 p.

Sumário

Prefácio
pág. 13

Dedicatória
pág. 19

1. Dos regimes políticos:
os democráticos e os outros
pág. 27

2. Das velhas oligarquias
e do Estado de direito
pág. 31

3. Da variedade de estados capitalistas
pág. 36

4. Do governo pelos homens e
do governo pelas leis
pág. 45

5. Da transição política nos
regimes democráticos
pág. 51

6. Da conquista do poder:
a liderança política
pág. 58

7. Da eficácia do comando e
da manutenção do poder
pág. 72

8. Da ilegitimidade política:
da demagogia e da força
pág. 79

9. Das repúblicas democráticas
e sua base econômica
pág. 87

10. Das forças armadas e das
alianças militares
pág. 94

11. Do estado laico e da
força das religiões
pág. 104

12. Da profissionalização
das forças militares
pág. 111

13. Dos gastos com defesa e
da soberania política
pág. 116

14. Da preparação estratégica
do líder político
pág. 119

15. Do exercício da autoridade
pág. 123

16. Da administração econômica
da prosperidade
pág. 126

17. Do uso da força em política
pág. 130

18. Da mentira e da sinceridade
em política
pág. 134

19. Da dissimulação como forma de arte
pág. 139

20. Da dissuasão e da defesa do estado
pág. 143

21. Da construção da imagem:
verdade e propaganda
pág. 148

22. Dos ministros e secretários
de estado
pág. 154

23. Dos aduladores e dos
verdadeiros conselheiros
pág. 160

24. Da arte pouco nobre de
arruinar um estado
pág. 163

25. Do acaso e da necessidade em política
pág. 167

26. Da defesa do Estado contra
os novos bárbaros
pág. 172

Carta a Niccolò Machiavelli
pág. 182

Recomendação de leituras
pág. 187

Livros de Paulo Roberto de Almeida
pág. 191

O Moderno Principe (Maquiavel revisitado) - Paulo R. Almeida

Finalmente, de surpresa, acabou saindo, em novembro último, nas edições do Senado Federal, meu livro sobre -- eu até diria, de, em pelo menos 30% -- Maquiavel, adaptado aos tempos modernos. Procedi a uma releitura do seu clássico sobre o Príncipe, na minha série de "clássicos revisitados", mas colocando o cidadão, não o Estado, no centro da análise.
A capa, um Maquiavel de terno e gravata, sobre o modelo original de um óleo de Santi di Tito (ca. 1560-1600), a partir de um arquivo iconográfico Corbis, foi feita por meu próprio filho, Pedro Paulo, um Maquiavel do pincel e do lápis, sempre pronto a espantar os súditos e cidadãos com seu domínio das artes; infelizmente, e contrariamente a minhas recomendações, esta edição do Senado não lhe prestou o devido copyright, deixando de mencionar sua obra de arte, que pode ser mais admirada em clichê que vou postar aqui, em post seguinte, o que pretendo corrigir numa segunda edição.

O resumo abaixo, preparado no Senado, enquanto eu me encontrava na terra dos chins, foi feito a partir de algumas frases minhas, mas não discordo dele no essencial.

Eu teria colocado, também nesta edição, o texto original que preparei para servir de orelhas, que segue mais abaixo.
Aos que desejarem a ficha deste livro, e a informação sobre a maneira de obtê-lo, aqui segue de imediato:

O Moderno Príncipe (Maquiavel revisitado)
versão impressa: edições do Senado Federal volume 147: Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2010, 195 p.; ISBN: 978-85-7018-343-9; disponível: http://www.senado.gov.br/publicacoes/conselho/asp/publicacao.asp?COD_PUBLICACAO=1209).
Relação de Originais n. 1804; Relação de Publicados n. 1013.

Cinco séculos depois que Maquiavel escreveu sua obra, o diplomata e cientista político Paulo Roberto de Almeida segue os passos do "segretario diplomatico" da República de Florença para atualizar "O Príncipe". A partir da constatação de que a obra permanece atual, o autor utiliza a mesma estrutura e até títulos da obra do florentino para estudar as estruturas políticas e a ciência de governar nos dias de hoje. Nesta obra singular por sua natureza de original pastiche e, ao mesmo tempo, de independência de pensamento, Paulo Roberto de Almeida dialoga com o genial pensador, segue seus passos naquelas recomendações que continuam aparentemente válidas para a política atual, mas oferece um elenco de inquietações sobre cenários contemporâneos para os velhos problemas de administração dos homens. Maquiavel preocupou-se com a estrutura de um Estado moderno, enquanto Paulo Roberto de Almeida busca defender os direitos dos cidadãos, justamente contra a intrusão e a prepotência dos Estados.

O que nos separa de Maquiavel?
Paulo Roberto de Almeida

Se, por alguma fortuna histórica, Maquiavel retornasse, hoje, ao nosso convívio, com as suas virtudes de pensador prático, quase meio milênio depois de redigida sua obra mais famosa, como reescreveria ele o seu manual “hiperrealista” de governança política? Seriam os estados modernos muito diversos dos principados do final da Idade Média?
Este Maquiavel revisitado, voltado para a política contemporânea, dialoga com o genial pensador florentino, segue seus passos naquelas “recomendações” que continuam aparentemente válidas para a política atual, mas não hesita em oferecer novas respostas para velhos problemas de administração dos homens. Aqui, como em outros aspectos, a constância dos “príncipes” nos desacertos é notável. Ela não parece ter evoluído muito, desde então.
De fato, Maquiavel permanece surpreendentemente atual – com o que concordariam os filósofos e cientistas políticos da atualidade –, mesmo (talvez sobretudo) nos traços malévolos exibidos pelos condottieri contemporâneos e pelos cappi dei uomine. Ainda que envenenamentos encomendados e assassinatos por adagas, tão comuns no Renascimento italiano, não estejam mais na moda – pelo menos fora do âmbito dos serviços secretos –, e que eles tenham sido substituídos por outros métodos para se desembaraçar de concorrentes e de adversários políticos, as técnicas para se apossar do poder e para mantê-lo exibem uma notável continuidade com aquelas descritas pelo experiente diplomata da repubblica fiorentina do Quattrocento.
O que pode estar ultrapassado, no seu “manual” de 1513, é meramente acessório, pois a essência da arte de comandar os homens revela-se plenamente adequada aos dias que correm, confirmando assim as finas virtudes de psicólogo político – avant la lettre – do perspicaz pensador do Cinquecento.
Este Príncipe Moderno representa, antes de tudo, uma singela homenagem ao diplomata italiano que “inventou” a ciência política, ainda que ele o tenha feito nas difíceis circunstâncias do ostracismo, na sua condição de funcionário de Estado “cassado” pelos novos donos do poder em Florença. Obra de um momento político – talvez não muito diverso daqueles tempos vividos pelo segretario de cancelleria –, este novo Príncipe, que se pretende tão universal em seu escopo e motivações quanto seu modelo de cinco séculos atrás, oferece novos argumentos em torno dos velhos problemas da administração estatal. A bem refletir sobre a política contemporânea, pouco nos separa de Maquiavel, se não é algum desenvolvimento institucional e uma maior rapidez nas comunicações. Quanto aos homens, tanto os condottieri quanto o popolo, eles não parecem ter mudado muito...

Paulo Roberto de Almeida é cientista social e diplomata, com obras publicadas sobre temas de história diplomática, de relações internacionais e de política externa do Brasil, desfrutando atualmente de um “sabático” dedicado à redação de novos livros.