A grande divisão e as ameaças visíveis
Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.
Nota sobre uma nova fratura no sistema internacional.
Primeiro uma transcrição, retirada de uma das redes sociais:
“Viagem ao Passado (@viagempassado)
O Dia em que o Mundo Mudou:
O Nascimento do Eixo: Há 83 anos, os líderes da Alemanha nazista, da Itália fascista e do Império do Japão assinaram em Berlim o Pacto Tripartite, que formalizou a aliança conhecida como Eixo. Em 27 de setembro de 1940, eles decidiram apoiar e cooperar uns com os outros em seus esforços para estabelecer e manter uma nova ordem mundial, baseada na dominação de suas respectivas esferas de influência. O acordo também previa defesa mútua caso algum dos países fosse atacado por uma nação que não estivesse envolvida na Segunda Guerra Mundial. O objetivo do pacto era intimidar os Estados Unidos e outros países neutros, e desafiar a hegemonia das potências aliadas.
O pacto tripartite foi o resultado de uma série de acordos anteriores entre os países do Eixo, como o Pacto Anti-Comintern de 1936, que visava conter a expansão do comunismo liderado pela União Soviética, e o Pacto de Aço de 1939, que fortaleceu a cooperação militar entre a Alemanha e a Itália. O pacto também recebeu a adesão de outros países aliados ou subordinados ao Eixo, como Hungria, Romênia, Bulgária, Eslováquia, Iugoslávia e Croácia. O pacto tripartite teve um grande impacto na história e na geopolítica mundial, sendo considerado um dos principais fatores que desencadearam a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, após o ataque japonês a Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941. O pacto também definiu os dois blocos antagônicos que se enfrentaram no maior conflito bélico da história, que resultou na morte de milhões de pessoas e na derrota e ocupação dos países do Eixo.”
Agora o meu comentário (PRA):
O mundo se dividiu radicalmente nos anos 1930, e tivemos uma tragédia ainda maior do que a da Grande Guerra. O Pacto Tripartite (Eixo), era formado por três potências militaristas, fascistas, expansionistas, belicistas. O atual "Eixo do Mal" é mais ou menos isso, embora em graus diversos: Rússia, China, Coreia do Norte, Irã, sem um acordo formal entre essas potências, às quais podem ser agregadas alguns simpatizantes a mais: Venezuela, Cuba, Síria, Nicarágua, certas ditaduras do chamado Sul Global que colaboram com as duas grandes autocracias, que lideram essa coalizão anti-G7, anti-OCDE, anti-Ocidente.
O Brasil tradicional, o dos governos oligárquicos do passado, o dos governos centristas ou mesmo os governos populistas mais recentes, sempre procurou manter-se à margem dos grandes conflitos interimperiais. Tentamos nos manter alheios, ou neutros, em face da Grande Guerra e também do segundo maior conflito europeu, mas acabamos sendo envolvidos, a despeito de nossa vontade, nesses conflitos, por ataques diretos à nossa soberania, a nossos interesses, às nossas vidas. Depois, sempre mantivemos, ou construímos, a autonomia e a independência na política externa.
Isso durou até a chegada dos companheiros ao poder, em 2003. A partir daí, a política externa e a diplomacia brasileira passaram a ser influenciadas e conduzidas com base na visão do mundo da esquerda petista, notoriamente comprometida com projetos identificados com o que ainda havia de socialismo e de ditaduras supostamente de esquerda no mundo, ou pelo menos não engajadas na esfera ocidental liderada pelos Estados Unidos e diversos países europeus de cunho democrático. Mas mesmo ditaduras em nada esquerdistas, contrárias a outros valores que a esquerda petista eventualmente defendia – direitos das minorias, das mulheres, etc. –, também passaram a desfrutar do apoio dos governos petistas, bastando que fossem antiamericanos o suficiente para justificar a tomada de posição.
O BRIC, depois BRICS e agora BRICS+, foi o momento decisivo na construção dessa coalização antiocidental que passou a marcar a diplomacia brasileira desde meados dos anos 2000, e que se manteve com ainda mais vigor a partir dos anos 2010 e atualmente. A visão antiamericana e antiocidental – mesmo em aliança com governos abertamente de direita ou reacionários, como a Rússia de Putin e o Irã dos aiatolás – passou a influenciar e mesmo a determinar a postura da política externa lulopetista, e a submeter, por passividade própria, a diplomacia profissional do Itamaraty.
Mas, os desafios atuais são bem maiores do que a simples discordância quanto a modelos de desenvolvimento, políticas econômicas e seus reflexos sociais. Estamos falando, agora, do próprio destino da civilização, dada a postura belicista dos atuais contendores. A nova divisão que se estabeleceu agora tem a ver com a hegemonia ou a preeminência em escala mundial, portanto civilizatória. A tragédia, numa érea nuclear como a atual (inclusive de detentores não declarados), seria incomensuravelmente maior do que jamais existiu na história da humanidade. Ditadores não hesitam ante o perigo! Começou na Crimeia, estendeu-se à Ucrânia, alcançou Hong Kong e projeta-se sobre Taiwan e a península coreana.
O Brasil de Lula parece já ter escolhido o seu campo, e é isto que nos preocupa atualmente. Os companheiros poupam, são coniventes e se aliam aos desafiadores e contestadores da ordem ocidental, a que nos trouxe um pouco de liberdade e de prosperidade. Eles acreditam que a China seja próspera e poderosa pelo PCC, pelo socialismo, não por ter abraçado a economia de mercado e a globalização. São anacrônicos em tudo e por tudo, e não parece haver esperança de que se convertem à economia de mercado e à democracia “burguesa”, ambas desprezadas por eles. Existe ainda muita ambiguidade nos comportamentos dos chefes petistas, que por características do Brasil capitalista ainda influencia as políticas gerais do Brasil, inclusive pela predominância de velhas e novas oligarquias políticas e pelo poderio dos capitalistas, que os financiam.
Os diplomatas permanecem silenciosos e submissos, infelizmente.
As ameaças vão crescer!
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4640, 24 abril 2024, 3 p.
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