Mulheres diplomatas vestiram roupas lilás na cerimônia de transmissão de cargo em Brasília
Folha de S. Paulo, 4.jan.2023
Renato Machado
BRASÍLIA - A diplomata Maria Laura da Rocha assumiu na tarde desta quarta-feira (4) o posto de secretária-geral do Ministério das Relações Exteriores. Ela se torna, assim, a primeira mulher na história a ocupar o cargo —o segundo mais importante da hierarquia da diplomacia brasileira.
A cerimônia de transmissão de cargo foi realizada no Palácio do Itamaraty, em Brasília. Em seu discurso, a auxiliar do chanceler Mauro Vieira prometeu trabalhar para aumentar a diversidade na pasta.
"Como primeira mulher a ser nomeada secretária-geral, não medirei esforços para evidenciar o que a casa ganha em múltiplas dimensões valorizando as suas funcionárias mulheres e a diversidade dos seus quadros. O objetivo da igualdade de gênero deve pairar sobre todas as ações do ministério", afirmou.
"Vamos cuidar para que o Itamaraty seja um ator engajado, em parceria com outros órgãos e com a sociedade civil, para ampliar o número de mulheres, negras e negros, pessoas menos favorecidas e candidatos de todas as regiões do país recrutados para as nossas carreiras."
A cerimônia de transmissão de cargo também foi marcada por um movimento de diplomatas mulheres, que vestiram roupas lilás para celebrar o fato de Maria Laura ser a primeira secretária-geral do sexo feminino. A cor é associada ao movimento sufragista e ao feminismo.
Durante os trabalhos do gabinete de transição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), chegou-se a cogitar a possibilidade de uma mulher ser nomeada ministra das Relações Exteriores, o que seria inédito. No final, porém, Lula optou por Vieira, que já havia sido chanceler no governo de Dilma Rousseff (PT) —o que frustrou parcela da diplomacia.
Em entrevista à Folha após ser escolhida para o cargo, Maria Laura defendeu as demandas de diversidade na área. "Queremos continuar esse caminho, ter muitas profissionais no topo da carreira, mais mulheres em posições de comando. Vai chegar um momento em que teremos uma ministra das Relações Exteriores. É inevitável."
Na cerimônia desta quarta, discursou na mesma linha do novo chanceler, ao mencionar o projeto de reconstrução da diplomacia brasileira e a reaproximação com países e blocos multilaterais, citando a necessidade de "reconstruir pontes".
Também disse que o setor fará o país voltar à posição de "grande nação em desenvolvimento e que detém a maior floresta tropical do mundo", prometendo que o Brasil contribuirá para cumprir as metas do Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas.
A embaixadora afirmou, por fim, que vai dar especial atenção para a reconstrução de uma unidade do Itamaraty para atender e dar proteção e assistência a brasileiros que vivem no exterior. Falando aos servidores, disse que vai estar à frente de uma secretaria-geral "amorosa", aberta a ouvir desafios do trabalho do serviço externo.
Maria Laura da Rocha é diplomata de carreira, tendo ingressado nos anos 1970 no Instituto Rio Branco. Seu último cargo no exterior foi de embaixadora do Brasil em Bucareste, na Romênia. Ela também chefiou as missões brasileiras junto à FAO e à Unesco —órgãos das Nações Unidas para alimentação e agricultura e para educação, ciência e cultura, respectivamente.
Nos primeiros governos de Lula, foi chefe de gabinete do então ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim —ainda hoje principal conselheiro do petista para a área internacional e padrinho da indicação de Vieira.
Durante a cerimônia desta quarta, o novo chanceler teceu diversos elogios a Maria Laura, destacando sua experiência e dizendo que ela tem "refinada habilidade política". Ressaltou também a luta das mulheres e das minorias para exercer a carreira diplomática e as propostas do atual governo para corrigir injustiças.
O chanceler ainda ressaltou o fato que a chegada de Maria Laura à secretaria-geral se dá mais de um século após o ingresso de Maria José de Castro Rebello, primeira diplomata e funcionária pública concursada do Brasil.
"A diversidade não pode ser entendida apenas de forma instrumental. Por um lado, é inegável que um corpo de funcionários diverso e inclusivo aumenta a excelência do trabalho diplomático [...] Por outro, resta óbvio que a maior presença de colegas negras e negros, mulheres, indígenas, pessoas LGBTQIA+, com deficiência e oriundas de distintas regiões do Brasil, constitui o alicerce maciço sobre o qual se assenta a própria democracia", afirmou.
Vieira disse ainda que "práticas autoritárias que macularam a história do país" impactaram a evolução na carreira de mulheres. Citou a data de 1938, quando mulheres foram impedidas de ingressar no serviço exterior, e criticou a perseguição a diplomatas homossexuais.
"É igualmente justo homenagear a memória dos colegas que foram expurgados da carreira por sua orientação sexual e por razões ideológicas, em diferentes momentos da nossa história", afirmou.
O chanceler também disse que sua gestão vai estudar maneiras de reabrir representações encerradas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). "Faz-se necessário assegurar lotação adequada de postos C e D e de postos consulares, e estudar maneiras e meios de reabrir embaixadas que foram fechadas na África e no Caribe."
Estaremos dispostos a solucionar desafios globais, diz embaixadora
Maria Laura tomou posse como secretária-geral das Relações Exteriores, cargo número 2 do Itamaraty
JESSICA CARDOSO
PODER 360, 04.jan.2023
A diplomata Maria Laura da Rocha, 67 anos, tomou posse nesta 4ª feira (4.jan.2023) como a nova secretária-geral do Ministério das Relações Exteriores. A função auxilia diretamente o ministro do Itamaraty e é responsável pela gerência das estruturas internas do órgão.
Essa é a 1ª vez que uma mulher ocupa o 2º cargo mais importante da pasta. Em homenagem a esse feito, as diplomatas presentes no evento foram vestidas de lilás, cor adotada pelo movimento sufragista, em 1908, na mobilização pelo direito ao voto.
Na cerimônia realizada no Itamaraty, Rocha disse que a política externa do Brasil terá o objetivo de mostrar um país “pronto” e “disposto” a dar sua contribuição para superar os desafios globais.
“A diplomacia brasileira voltará a refletir a posição do Brasil como grande país em desenvolvimento detentor da maior floresta tropical do mundo, buscando contribuir para as metas do Acordo de Paris sobre Mudança do Clima como parte de uma estratégia de desenvolvimento que garanta renda, empregos de qualidade e melhores condições de vida”, afirmou.
Rocha disse ainda que as questões de Orçamento e de recursos humanos terão prioridades no diálogo com os outros órgãos do governo. O Itamaraty também pretende adotar uma gestão mais moderna, com mais transparência e planejamento estratégico.
“Temos de seguir investindo em condições de trabalho adequadas, em treinamento e aperfeiçoamento profissional, em saúde e em ambientes livres de qualquer tipo de assédio e preconceito”, disse.
Em entrevista ao Poder360, a secretária-geral disse que o prazo para as mudanças será o mais rápido possível.
“Se espera do Brasil sempre respostas muito rápidas e para isso nós temos que modernizar nossa rede porque nós somos presentes no mundo inteiro. Nós coordenamos o trabalho no mundo inteiro, então temos que aproveitar melhor e para isso temos que repensar juntos um plano feito por todos os setores, colocando a necessidade de cada área”, afirmou ao jornal digital.
QUEM É MARIA LAURA DA ROCHA
Nascida no Rio de Janeiro em 1955, a diplomata atuou como chefe de Gabinete do ministro das Relações Exteriores de 2008 a 2011. Antes de ser anunciada como secretária-geral, foi embaixadora do Brasil na Romênia.
Rocha também foi embaixadora na Hungria de 2017 a 2019. Também atuou em missões em Berlim, Roma, Moscou e Paris. Entre 2010 e 2014, foi chefe da Delegação Permanente do Brasil junto à Unesco. Depois, foi representante do Brasil na FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura).