Antissemitismo: entenda a diferença
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;
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quinta-feira, 4 de janeiro de 2024
Antissemitismo, antissionismo: entenda a diferença - Benjamin Moser (O Estado de S. Paulo)
quinta-feira, 28 de dezembro de 2023
Argentina de Milei “avança para a liberdade” por meios ditatoriais - O Estado de S. Paulo
Não deixa de ser uma suprema ironia de que, para “criar” a liberdade dos argentinos, o governo de Milei seja obrigado a usar dos meios repressivos do Estado contra os opositores da “ditadura” que veio para “avançar a liberdade” (PRA)
Pacote de Milei decreta emergência até 2025, muda eleições, endurece segurança e desregula economia
Texto com 664 artigos foi entregue ao Congresso, acaba com as eleições primárias na Argentina e muda forma de eleger deputados
segunda-feira, 11 de dezembro de 2023
Com Lula, Brasil gasta como um milionário, apesar de ter renda de classe média - José Fucs (OESP)
Com Lula, Brasil gasta como um milionário, apesar de ter renda de classe média
Presidente volta a ignorar que caixa do Tesouro é um só e insiste em fórmula heterodoxa para contabilizar despesas do governo e maquiar rombo colossal nas contas públicas
Coluna José Fucs
O Estado de S. Paulo, 11/12/2023
Depois de uma “pausa tática”, destinada a acalmar temporariamente a turba indignada com suas declarações contra o equilíbrio fiscal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a defender a ladainha que opõe “gasto” e “investimento” do governo.
Para Lula, não apenas as despesas com obras de infraestrutura deveriam ser enquadradas como “investimento”, mas também as realizadas com educação, saúde e até com benefícios sociais. Mais que isso, ele defende a ideia de que tudo que for considerado “investimento” deve ficar fora do resultado primário das contas públicas, que reflete o saldo das receitas e despesas governamentais em cada exercício, sem contar os juros da dívida pública, como se isso resolvesse o problema da limitação dos recursos orçamentários.
“Quando você vai fazer o Orçamento, sempre aparece alguém para dizer que está gastando demais”, pontificou Lula, em evento realizado no Rio de Janeiro na semana passada, repetindo o velho discurso, depois de dar alguns dias de folga aos brasileiros em relação ao assunto. “O Brasil sempre tratou investimento em educação como gasto. Cortar na educação é mexer na qualidade. Quando se corta em saúde, é menos médico”, acrescentou.
Como se não soubesse que o caixa do Tesouro é um só, Lula parece propagar essa narrativa pedestre, que só convence os incautos, como estratégia para justificar a gastança do governo e o rombo colossal que está provocando nas contas públicas, sem que ele seja responsabilizado pela situação , como prevê a legislação em vigor.
Na verdade, a maneira de contabilizar as despesas formalmente não faz muita diferença. Também não muda muito o resultado final se o governo recorrer à “contabilidade criativa” para maquiar o déficit fiscal e mostrar uma fotografia distorcida da realidade. De um jeito ou de outro, independentemente de o dinheiro ser usado para custeio ou para investimento, a parcela que exceder a arrecadação vai turbinar a dívida pública. Mais dia, menos dia, é lá que a farra vai acabar, qualquer que seja o artifício contábil adotado para “dourar” os gastos.
Além disso, para financiar a gastança, o Tesouro terá de emitir títulos públicos ou simplesmente imprimir dinheiro, drenando poupança da sociedade que deveria ser destinada à iniciativa privada. Ao injetar na economia recursos que estão que estão além de suas possibilidades, o governo também contribui de forma decisiva para aumentar a inflação e, por tabela, manter os juros na estratosfera, com efeitos perversos para os cidadãos e para as empresas, como já aconteceu em outras administrações do PT e como está acontecendo agora.
Só em 2023, a previsão oficial é de que o rombo fiscal chegue a R$ 177 bilhões, o equivalente a 1,7% do PIB (Produto Interno Bruto). Somando os gastos com juros da dívida pública, o déficit no ano deve chegar a 7,9% do PIB, um resultado inferior apenas ao registrado em 2020, no auge da pandemia, e em 2015, quando o processo de impeachment de Dilma, ancorado nas chamadas “pedaladas fiscais”, já estava em andamento.
No curto prazo, isso pode até alavancar o crescimento do País, como disse a deputada Gleisi Hoffmann, presidente do PT, em encontro eleitoral realizado pela legenda no fim de semana, e dar maior sensação de bem estar à população. Mas, no médio e no longo prazos, produz resultados catastróficos, como aconteceu com Dilma. Lula, porém, não se mostra muito preocupado com o saldo deixado pela política do “gasto é vida”, que marcou a gestão de sua pupila e levou o País à maior recessão da história em 2015 e 2016, com uma queda de quase 8% no PIB, e está “dobrando a aposta”.
Não é preciso ser um financista com PhD em Chicago para entender que o gasto sem lastro é insustentável
Todas as nações que seguiram por esse caminho se deram mal. Foi assim com a Grécia, na década passada, cujo governo gastou como se não houvesse amanhã, achando que poderia oferecer à população um nível de vida escandinavo sem ter condições para tanto, e foi assim também com a Argentina, que agora terá de pagar o preço de um ajuste penoso em suas contas, aqui no nosso quintal, para sair do coma e voltar a respirar sem aparelhos.
Não é preciso ser um financista com PhD na Universidade de Chicago para entender que essa gastança sem lastro é insustentável. Qualquer brasileiro sabe que, se fizer a mesma coisa que Lula está fazendo com as contas públicas do País, vai quebrar rapidinho. Por um tempo, é possível até ficar pendurado no cheque especial, pagando juros estratosféricos e vendo a dívida crescer em progressão geométrica. Agora, se a gente gastar mais do que ganha o tempo todo, querendo levar uma vida de ostentação que não tem como bancar, vai chegar uma hora em que a realidade vai se impor. A gente vai se tornar inadimplente, entrar no SPC (Serviço de Proteção ao Crédito), sofrer processos judiciais, perder bens e ficar sem crédito na praça.
Qualquer um que zele pelo seu nome sabe que não dá para viver como um milionário, sem medo de ser feliz, tendo uma renda de classe média. Não dá para comprar um SUV da BMW ou da Mercedes, se o orçamento só tem folga para a compra de um carro menos vistoso e mais acessível. Não dá também para colocar nossos filhos numa escola bilíngue em tempo integral ou buscar hospitais de excelência para a família, se a gente só tem condições de matriculá-los numa escola pública e de ser atendido pelo SUS (Sistema Único de Saúde) ou por um hospital privado mais modesto. Tampouco dá para viajar em primeira classe ou executiva e se hospedar em hotéis cinco estrelas, em vez de se apertar na econômica e ficar em pousadas mais populares, se o luxo não couber no nosso bolso.
Lula, o PT e seus aliados não gostam de comparar a gestão das contas públicas com a gestão das finanças pessoais. Sempre que tal comparação vem à tona, eles costumam argumentar que as duas coisas não são comparáveis, porque o governo tem a prerrogativa de colocar a guitarra (máquina de imprimir dinheiro) para funcionar. É inevitável, no entanto, fazer um paralelo entre a administração das finanças pessoais e o que está acontecendo no Brasil de Lula e do PT.
Como mostra a história, não há atalhos para a prosperidade. Não adianta querer socializar a miséria. Nem achar que o Estado é um saco sem fundo. Os recursos são limitados e ainda não inventaram uma forma de multiplicá-los num passe de mágica. Só o trabalho duro, ano após ano, é capaz de produzir riqueza e garantir a melhoria geral das condições de vida da população, se houver comedimento nos gastos.
Gastar de forma irresponsável, acreditando que é possível superar as restrições do Orçamento mudando o enquadramento das despesas, para dar a ilusão de que as contas não estão no vermelho, com quer Lula, só vai agravar o problema. A fatura, como sempre, vai ficar para todos nós.
terça-feira, 5 de dezembro de 2023
Baixa adesão em plebiscito deixa Maduro em desconforto - O Estado de S. Paulo
Baixa adesão em plebiscito deixa Maduro em desconforto: ‘Ele perdeu base de apoio’, diz analista Controvérsias sobre participação na votação indica que apoio ao ditador pode ser baixo apesar de artimanhas para demonstrar força popular
A ameaça venezuelana - Editorial, O Estado de S. Paulo
A ameaça venezuelana
Editorial, O Estado de S. Paulo (05/12/2023)
Lula deveria usar sua proximidade com Nicolás Maduro para convencê-lo a não agredir a Guiana
Regimes ditatoriais são ávidos em explorar paixões nacionalistas como meio de sobreviver, em especial quando desafiados pelos desastres que engendraram. Não é diferente na Venezuela de Nicolás Maduro. Ao iniciar a construção de uma segunda base militar na fronteira leste e conduzir, no último domingo, a farsa de um plebiscito sobre a anexação de 70% do território da Guiana, o autocrata bolivariano deslanchou a primeira ameaça bélica na América do Sul desde 1991. Do episódio, salta à vista a inação do Brasil. Em vez de advertir claramente o vizinho sobre os riscos de uma aventura regional desestabilizadora, o presidente Lula da Silva limitou-se a dizer que a América Latina “não precisa de confusão”.
Não se trata de “confusão”, e sim de ameaça explícita de agressão à Guiana por parte da Venezuela, que inventou uma consulta popular obviamente fajuta para revestir de legitimidade sua reivindicação territorial. Como já fez no caso do ataque injustificado da Rússia contra a Ucrânia, Lula da Silva tratou a ameaçadora Venezuela e a ameaçada Guiana como se fossem igualmente responsáveis pela “confusão”. Segundo o presidente brasileiro, é preciso que “o bom senso prevaleça do lado da Venezuela e da Guiana”. Ora, só há falta de bom senso de um lado, o da Venezuela do “companheiro” Nicolás Maduro.
Não há dúvidas sobre as más intenções do ditador venezuelano, que aceitou a realização de uma eleição presidencial aberta e monitorada em 2024 em troca da suspensão temporária de sanções pelos Estados Unidos. Nada indica que cumprirá esse acordo, celebrado em Barbados em outubro passado, dadas as travas de seu regime às candidaturas da oposição.
Nessa lógica, insuflar o nacionalismo, ao resgatar uma causa apoiada também por alguns de seus detratores, parece uma jogada característica de quem precisa recuperar a popularidade em meio à crise generalizada no país.
A Venezuela reivindica há dois séculos a soberania sobre Essequibo, uma faixa de 160 quilômetros quadrados no oeste da Guiana. Desdenha de arbitragens e acordos anteriores e, agora, de recentes orientações da Corte Internacional de Justiça. Não se pode abstrair o fato de a controvérsia ter sido pinçada por Maduro quando a Guiana se vê catapultada economicamente pela exploração petrolífera na região em disputa – e desguarnecida de força de defesa. Tampouco é possível ignorar o fato de o Brasil estar, literalmente, no meio do vespeiro. Porta de fuga de venezuelanos desesperançados, Roraima faz fronteira com ambos os países.
A circunstância geográfica, por si só, exige do Brasil uma posição neutra, equilibrada e ativa na busca de uma solução diplomática. Lula da Silva deveria usar sua condição de “companheiro” de Maduro para convencê-lo a desarmar os ânimos. A cada dia de imobilismo e de miopia diante dos arroubos de Maduro, porém, a Guiana se verá empurrada a buscar proteção militar nos EUA. A escalada é preocupante e requer do Estado brasileiro o dever estratégico nacional e regional de levar a Venezuela a manter a paz, o maior capital geopolítico da América do Sul.
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Grato a Augusto de Franco pela transcrição.
sexta-feira, 1 de dezembro de 2023
COP-28: o que esperar do Brasil na Cúpula do Clima? - Paula Ferreira O Estado de S. Paulo
COP-28: o que esperar do Brasil na Cúpula do Clima?
Paula Ferreira
O Estado de S. Paulo, 1/12/2023
Queda do desmate na Amazônia será argumento para obter dinheiro de nações ricas e liderar grupo de países florestais, mas hesitação sobre exploração petrolífera atrai desconfiança O Brasil chega à Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP-28) em Dubai com o objetivo de ganhar protagonismo na agenda ambiental, em um ano simbólico na piora do aquecimento global.
Segundo a ONU, já é possível dizer que 2023 foi o ano mais quente já registrado - pelo menos até agora. O planeta assistiu nos últimos meses a uma série de eventos climáticos extremos - como incêndios na Europa e no Havaí, ciclones no Sul e seca recorde no Amazonas -, agravados pelo El Niño. O governo federal defenderá metas mais ambiciosas de redução de emissões de gases estufa e irá atrás de dinheiro para proteção florestal.
As últimas conferências climáticas acumularam tentativas frustradas de ampliar a ajuda financeira das nações desenvolvidas a países pobres, mas o anúncio de um acordo seguido de doações para um fundo de desastres ambientais, anunciado nessa quinta-feira, 30, renovou esperanças para este ano. Além disso, a delegação brasileira levará números positivos no combate ao desmatamento da Amazônia e um plano com foco na economia verde. Isso somado ao esforço de mostrar o compromisso sustentável do nosso agronegócio, um dos principais motores do nosso PIB. Por outro lado, a gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terá de driblar questionamentos sobre os planos de explorar petróleo na Margem Equatorial da Foz do Amazonas e a crescente pressão sobre o Cerrado, onde o governo não tem conseguido frear o desmate.
Missão 1,5º C
O Acordo de Paris, de 2015, prevê manter a alta da temperatura média global abaixo de 2ºC (preferencialmente até 1,5ºC) ante os níveis pré-industriais. Para isso, os países signatários assumiram metas de reduzir emissões de gases de efeito estufa. Nesta COP, será apresentado o Balanço Global do Acordo para mostrar o que foi feito e preparar o cenário para a COP-30, que será realizada em 2025 em Belém, quando os governos deverão apresentar novas metas. O Brasil vai defender metas mais ousados, de modo a não superar o teto de 1,5ºC. “O Acordo de Paris não está dando conta da tarefa” disse ao Estadão a secretária nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, Ana Toni. “O Brasil chega de cabeça em pé. Se vamos liderar pelo exemplo, temos mais moral para cobrar dos outros.”
Fundo de proteção florestal
Uma das principais apostas da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, é propor um novo modelo de financiamento global para quem preservar suas florestas. A proposta é que os países florestais sejam pagos por hectare de bioma preservado e pode beneficiar 80 nações com florestas, como Brasil, Colômbia, Indonésia e Congo. A ideia é que seja diferente do Fundo Amazônia e seja gerido por uma instituição financeira multilateral. Os países ricos têm resistido a ampliar mecanismos de repasses de verbas a nações pobres, tema que emperrou as negociações nos últimos encontros. Na abertura desta cúpula, porém, houve uma sinalização positiva. Um grupo de nações ricas anunciou nesta quarta, 30, a destinação de mais de US$ 400 milhões (quase R$ 2 bilhões) para colocar em operação o fundo climático de perdas e danos, que vai financiar medidas de adaptação dos países mais pobres ao aquecimento global.
O consenso logo na largada é “inédito na história das COPs”, segundo o negociador-chefe do Itamaraty, o embaixador André Corrêa do Lago. Desmate cai na Amazônia, mas fogo preocupa A taxa de desmatamento da Amazônia teve queda de 22% em um ano, após um período de escalada da devastação da floresta na gestão Jair Bolsonaro (PL). Para especialistas, a retomada do plano de combate aos crimes ambientais adotado na 1.ª gestão Lula e o aumento da fiscalização ajudaram nesse resultado. Daqui para frente, porém, o desafio é bem mais complexo. Será preciso enfrentar uma rede de crimes ambientais em que já foram mapeadas 22 facções criminosas, entre elas o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho. Além disso, a estiagem histórica seguida por um número recorde de incêndios no Amazonas expõe falhas no planejamento do governo na resposta aos eventos climáticos extremos. A própria gestão Lula admitiu que o número de brigadistas era insuficiente para dar conta do problema, agravado pelo El Niño, cujos efeitos graves eram alertados pelos cientistas desde o começo do ano.
Não é só floresta
Mas não é só a Amazônia que demanda atenção. O avanço da destruição no Cerrado, por exemplo, ameaça o equilíbrio hidrológico do País e a sustentabilidade do agronegócio, o principal motor da economia na última década. “Não dá para deixar só a Amazônia cumprir meta em nome do Brasil”, diz Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, voltada para a ação climática. O Cerrado é essencial para o equilíbrio hidrológico e para a agropecuária, que tem na região alguns dos seus principais negócios, como gado e soja. Na Amazônia, quase toda a destruição é ilegal e grande parte se concentra em áreas federais, como reservas indígenas e unidades de conservação.
Já no Cerrado, há significativa perda em propriedade privadas e com aval de autoridades locais, o que torna a estratégia antidesmate mais complexa. O avanço dos desequilíbrios ambientais também evidencia a fragilidade de outros biomas. O Pantanal, por exemplo, ainda se recupera do número recorde de queimadas em 2020 e viu, em novembro, uma onda de incêndios que voltou a destruir refúgios de onças-pintadas. Após apresentar planos de combate ao desmatamento para a Amazônia e o Cerrado, o governo promete documentos similares para a Mata Atlântica, o Pantanal e os Pampas até o 1º semestre do ano que vem.
Exploração de petróleo
A oscilação de Lula sobre os planos de explorar petróleo na Margem Equatorial do Amazonas põe em risco suas pretensões de se firmar como uma liderança climática. O projeto divide o governo internamente. A área ambiental resiste em conceder licenças para que a Petrobras pesquise petróleo na região. Já a pasta de Minas e Energia defende fazer o estudo com o propósito de extrair o recurso. Em falas recentes, o presidente minimiza a controvérsia. “É uma exploração a 575 quilômetros à margem do (Rio) Amazonas. Não é uma coisa que está vizinha do Amazonas”, afirmou o petista, em setembro. A Margem Equatorial não está na floresta, mas se estende por mais de 2,2 quilômetros de litoral do Amapá ao Rio Grande do Norte. Naquela região, a Guiana também espera lucrar com a exploração de petróleo.
Na Cúpula de Belém, em junho, o governo recursou a proposta do presidente colombiano, Gustavo Petro, de incluir no documento assinado pelas nações amazônicas o compromisso de não abrir novas frentes de exploração de combustíveis fósseis na região. “É uma posição importante que o Brasil terá de encarar, porque ninguém é líder global da agenda, ou se coloca como guardião do 1,5ºC falando só de desmatamento. É preciso posição firme para o mundo inteiro e dar exemplo em casa” , afirma o secretário executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini.
Plano de transição ecológica
Capitaneado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o Plano de Transição Ecológica, que pretende impulsionar o Brasil na disputa por espaços na economia verde. Haverá seis eixos: finanças sustentáveis, economia circular, adensamento tecnológico, bioeconomia, transição energética e adaptação à mudança do clima. Entre outros pontos, a proposta de Haddad é criar linhas de crédito voltada para o desenvolvimento de alternativas sustentáveis e a criação de um mercado regulado de carbono.
O plano será apresentado nesta sexta-feira, 1º, durante a Conferência do Clima. O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação também vai lançar cinco editais do programa Mais Inovação Brasil, em um total de R$ 20,85 bilhões, com foco nas áreas do plano de Haddad.
https://www.estadao.com.br/sustentabilidade/cop-28-o-que-esperar-do-brasil-na-cupula-do-clima/
terça-feira, 28 de novembro de 2023
Venezuela-Guiana: GRAVE CRISE REGIONAL - Rubens Barbosa (O Estado de S. Paulo)
Venezuela-Guiana
GRAVE CRISE REGIONAL
Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 28/11/2023
No próximo domingo, será realizado referendum, convocado pelo governo da Venezuela sobre a incorporação de 74% do território da Guiana. Com previsível resultado favorável para criar a província do Esequibo, a decisão estimulou uma crise externa para mostrar a força do governo, abalada com o apoio maciço da população `a previa de oposição para a escolha do candidato contra Maduro nas eleições presidenciais de 2024. Maduro, que está sob pressão internacional para participar de eleições livres, reiterou seu interesse no diálogo e no respeito do direito histórico do povo venezuelano, enquanto o governo de Georgtown reafirmou que a área contestada pertence a Guiana por herança e séculos de luta e que Caracas quer rejeitar a jurisdição da Corte Internacional de Justiça (CIJ) e antecipar um julgamento futuro, minando a autoridade da CIJ.
Ao contrário das fronteiras entre as possessões espanholas e portuguesas, definidas nos Tratados de Madri (1750) e Santo Ildefonso (1777), os limites entre espanhóis e holandeses no Norte da América do Sul permaneceram indefinidos, situação que herdaram Venezuela e Grã-Bretanha. Durante o século XIX e XX continuou a disputa com gestões junto a Londres e Washington, negociações e juízos arbitrais. Mais recentemente, a partir de 2015, a ONU passou a tratar dessa questão e em 2018 a Guiana pediu para a CIJ declarar a validade do Acordo Arbitral de 1899, cujo laudo favoreceu a Guiana, definindo uma linha que incluiu território brasileiro, objeto de decisão do Rei da Itália, contestado pelo Brasil. Por isso, a Venezuela decidiu rejeitar a competência da CIJ. Em 2020, a CIJ declarou-se competente para tratar da questão. A decisão da Corte ainda pendente, ganha importância pela convocação do referido referendum.
A antiga controvérsia entre a Venezuela e a Guiana é hoje, a maior ameaça a estabilidade regional. A ameaça `a integridade territorial da Guiana introduz um elemento de incerteza nos países anglófonos do Caribe, na Colômbia, em razão da controvérsia entre os dois países para a definição de limites na região do Golfo da Venezuela, e com os EUA, em atrito com Caracas nos últimos 40 anos e com quem Maduro acaba de negociar um acordo para a suspensão das sanções econômicas, com a promessa de transparência das eleições presidências de 2024. A questão pode desestabilizar região sensível para a segurança brasileira em termos de atividades ilegais, como narcotráfico, tráfico de armas e imigração. Para a Guiana é uma questão existencial, pois significaria a perda de cerca de 2/3 de seu território e de área importante de zona marítima adjacente, onde vivem cerca de 300 mil habitantes, do total de um país que tem 800 mil habitantes. É a região mais rica em minérios, inclusive ouro, recursos florestais, agricultura, pesca e potencialmente muito promissora quanto a petróleo e gás. O presidente da Guiana, Irfaan Ali, em encontro como o presidente Lula, em Brasília, no início do mês, solicitou ao Brasil que faça gestões junto a Maduro para impedir a invasão.
É do interesse de todos os países da região, sobretudo do Brasil, que a controvérsia continue a ser discutida no âmbito político e jurídico. O Brasil tem fronteira com os dois países, que historicamente são consideradas legitimamente definidas e demarcadas. O governo Lula normalizou as relações com a Venezuela, com a designação de embaixadora para Caracas, e mantém igualmente relação próxima com a Guiana. Com ambos os países será importante continuar a tratar de temas de interesse comuns, como imigração, repressão a delitos transnacionais, meio ambiente, integração física e energética. Ao Brasil não interessa, por razões históricas e diplomáticas, que se abra uma nova etapa de revisionismo fronteiriço na América do Sul. A segurança jurídica derivada pela aplicação dos tratados e decisões arbitrais é parte da consolidação de um ambiente de paz e entendimento na região, `as voltas com problemas econômicos e social.
No governo Lula, a América do Sul é uma das prioridades da política externa. Por diferentes razões, o Brasil pode e deve exercer uma influência moderadora e construtiva junto aos dois países para que encaminhem soluções que não perturbem a ordem regional. Por meio de sua diplomacia, o Brasil está atuando para uma solução pacífica na disputa pela área de Esequibo. Defendendo uma solução negociada para a controvérsia, o Itamaraty está reiterando o compromisso de todos com a consolidação de uma Zona de Paz e Cooperação entre os Estados americanos. O assunto, neste mês, foi tratado na reunião de Ministros do Exterior e da Defesa da América do Sul, em gestões da Chancelaria junto aos dois governos, e aos demais países da região, em especial a Colômbia, e na visita do Assessor Internacional de Lula a Caracas.
Na prática, dificilmente a Venezuela poderá incorporar pela força parte do território vizinho da Guiana. Os EUA enviaram missão a Georgetown na semana passada. Uma improvável invasão da Guiana teria implicações geopolíticas graves. Os EUA se envolveriam e poderiam instalar uma base militar na Amazônia, em apoio `as empresas americanas que exploram petróleo offshore na Guiana.
Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE) e membro da Academia Paulista de Letras
terça-feira, 14 de novembro de 2023
Os EUA e a questão palestina - Rubens Barbosa O Estado de S. Paulo
Os EUA e a questão palestina
Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 14/11/2023
Desde a decisão da ONU em 1947, pela criação dos estados de Israel e da Palestina até a crise atual, uma retrospectiva objetiva da política externa americana em relação às crises no Oriente Médio mostra que, ao ignorar as violações do direito internacional - ocupação do território palestino, assentamentos ilegais na Cisjordânia, isolamento da Faixa de Gaza, tentativa de anexar o que resta da Palestina e outras considerações geopolíticas - Washington não contribuiu nem para o encaminhamento de decisões para garantir a segurança de Israel, nem para a busca da paz pela desocupação do território palestino e a criação do segundo Estado definido na partilha. Agora, pela primeira vez, de forma pública e privada os EUA estão insistindo fortemente numa solução política. Os entendimentos em 1978 (Camp Davies) e 1983 (Oslo) estavam na direção correta, mas a política dos dois Estados não contou com o apoio decisivo de Washington.
Embora isolado no “inabalável” apoio político, econômico e militar a Israel, os EUA aparentemente estão chegando ao limite de tolerância em relação à ação militar contra o Hamas, em função do dano colateral contra a população civil. Na linha enunciada pelo presidente Biden, o Assessor de Segurança Nacional do EUA, Jack Sullivan, admitiu candidamente gestões privadas de Washington junto ao Primeiro-Ministro Netanyahu em cinco questões cruciais: cautela na invasão terrestre, proteção da população civil, negociação, via Catar, para liberação dos reféns em mãos do Hamas, assentamentos ilegais de colonos israelitas na Cisjordânia e a criação do Estado Palestino. Sullivan deixou implícito na entrevista que o Primeiro-Ministro israelense não estava dando atenção às gestões dos EUA. Confirmando isso, Netanyahu em entrevista pública, disse que não iria autorizar o cessar fogo, apesar de toda a pressão humanitária. No final da semana passada, o secretario de Estado Antony Blinken voltou pela terceira vez a Israel para convencer o governo de Netanyahu a minimizar o risco da população civil e a concordar com uma pausa humanitária para aliviar a pressão da opinião publica contra a escalada militar de Israel. Visivelmente constrangido, nada pode anunciar e teve de ouvir das autoridades israelenses que só haveria uma pausa humanitária se o Hamas liberasse previamente todos os reféns. Israel anunciou que terá responsabilidade sobre a segurança em Gaza no pós-guerra, enquanto os EUA dizem que os palestinos deverão retomar o controle sobre a região.
A evolução da crise em Gaza, com a possível escalda das operações militares ampliando o conflito para toda a região não pode ser descartada. As manifestações de força dos EUA, de caráter dissuasório, para impedir ataque a Israel por outros grupos radicais de influência do Irã e de outros países, funcionaram. Os pronunciamentos do líder do Hezbollah e dos presidentes dos países do Oriente Médio, reunidos na Arabia Saudita, foram o reconhecimento explícito disso, ao evitar subir o tom das ameaças contra Israel. A ninguém (EUA, Irã, China, Rússia), nesse momento, interessa que o conflito saia de controle
O fator que hoje está mais presente nas considerações de todos os países, e até certo ponto mesmo em Israel, é a crescente reação da opinião pública em todos os países árabes e em alguns países ocidentais, dado à importância da participação de imigrantes de origem muçulmana nas populações locais (Inglaterra e França). O antissemitismo e a islamofobia estão aumentando. Nos EUA, as demonstrações de apoio à questão palestina se sucedem em universidades e lugares públicos e os jovens filiados ao Partido Democrata se afastam de Biden e protestam contra a política dos EUA para a região exigindo a criação do Estado Palestino. A questão do Oriente Médio será um elemento com força na campanha eleitoral de 2024 e a administração Biden começa a dar sinais de que terá de mudar de política se quiser contar com os votos dos jovens e da crescente comunidade muçulmana nos EUA.
Em termos regionais, a situação dos EUA evoluiu da gradual perda de importância política no Oriente Médio, ocorrida nos últimos anos, para o total envolvimento político e militar na região. Isolado no apoio a Israel e desenvolvendo uma política para evitar novos ataques ao país, no final da operação militar, os EUA estarão em uma posição de força para liderar uma fórmula política que encontre uma solução para a desocupação da Faixa de Gaza e o recuo dos assentamentos ilegais na Cisjordânia, fortalecendo ainda a Autoridade Palestina, parte legitima para participar dessa negociação.
O processo negociador não será breve, mas poderá ser facilitado pela mudança do governo em Tel Aviv com a substituição do PM Netanyahu por uma coligação de centro-direita e não de extrema direita como é hoje. A pressão da opinião pública global e interna nos EUA, no contexto eleitoral que se aproxima, deverá fortalecer o apoio, desta vez, decisivo, para a criação do Estado Palestino, mesmo com a oposição de grupos radicais em Israel. Não haverá alternativa política para Washington. Essa é a única forma de garantir a segurança de Israel e a paz na região. Além da força eleitoral de Biden em 2024.
Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comercio Exterior (IRICE) e membro da Academia Paulista de Letras
segunda-feira, 23 de outubro de 2023
Medo do argentino de perder subsídios garante a Massa segundo turno contra Milei - Lourival Sant'Anna (O Estado de S. Paulo)
Medo do argentino de perder subsídios garante a Massa segundo turno contra Milei
Pequeno dicionário de conceitos invertidos - Denis Lerrer Rosenfield, O Estado de S. Paulo
Hamas
Denis Lerrer Rosenfield,sexta-feira, 15 de setembro de 2023
O abraço dos párias - Editorial, O Estado de S. Paulo
O abraço dos párias
Editorial, O Estado de S. Paulo (15/09/2023)
O apelo de Putin ao lunático Kim mostra que suas cartas estão acabando, mas pressagia riscos para a Ucrânia, para as democracias, a estabilidade na Ásia e para a segurança global
Depois da primeira invasão da Ucrânia, em 2014, a Rússia foi expulsa do G-8. Após a segunda invasão, Vladimir Putin faltou às duas cúpulas do G-20 e foi “desconvidado” da última cúpula do Brics pela África do Sul, que se veria obrigada a cumprir uma ordem de prisão expedida pelo Tribunal Penal Internacional. Com efeito, sua única visita internacional (sem contar os antigos satélites soviéticos que hoje integram o Tratado de Tasquente, a Otan russa) foi ao Irã. Agora, Putin estendeu o tapete vermelho para Kim Jong-un, o neto do tirano fantoche imposto por Stalin à Coreia do Norte, o Estado mais fechado e totalitário do mundo – uma versão em miniatura, mas com esteroides, do que a Rússia está se transformando sob Putin.
O conclave na base espacial de Vostochny foi celebrado com pompa e circunstância pelas mídias dos dois regimes, e Kim prometeu “apoio pleno e incondicional” à Rússia em sua “luta sagrada contra o Ocidente”. Mas não houve comunicados oficiais. É certo, no entanto, um acordo para o fornecimento de armas à Rússia.
Isso representa um risco iminente para a Ucrânia. Após o fracasso fragoroso de seu Plano A, uma blitzkrieg contra a Ucrânia, Putin aposta numa guerra de atrito, na expectativa de que o tempo exaurirá as forças ucranianas e a solidariedade ocidental. Mas Kiev tem realizado avanços, ainda que modestos, em sua contraofensiva. O Kremlin está com dificuldades de repor sua munição, e os recrutamentos compulsórios têm gerado desgosto na população. A Coreia do Norte tem amplos estoques e fábricas de bombas e foguetes, a maioria baseada em tecnologias soviéticas compatíveis com o arsenal russo. O acordo pode envolver ainda mísseis balísticos de curto alcance, blindados, drones e até mesmo tropas.
Em troca, a Rússia pode oferecer óleo cru e grãos a um país famélico e falido. O principal interesse de Kim, contudo, está na transferência de tecnologia para modernizar seu arsenal. Isso intensificaria as tensões na Ásia. Vizinhos apreensivos com um Estado errático e agressivo poderiam responder escalando sua corrida por arsenais.
A China, que exerce um poder tutelar sobre os dois países, não tem interesse nessa instabilidade e pode interferir para limitar esse escambo sinistro. Mas só em parte. Pequim não vê nenhum problema em uma guerra prolongada na Europa e certamente se compraz com a tal “luta sagrada” contra o “imperialismo” ocidental.
O pacto pode ainda intensificar a degradação do controle global de armas nucleares, já no seu ponto mais periclitante desde a guerra fria. Nem à Rússia nem à China interessa robustecer as capacidades nucleares de Kim. Mas, a depender da barganha, Moscou pode violar seus compromissos com as sanções da ONU à Coreia do Norte e cooperar com o desenvolvimento não só de satélites de espionagem, como de mísseis e submarinos nucleares.
O conselheiro de segurança nacional dos EUA, Jake Sullivan, advertiu que os países “pagarão um preço”. Mas anos de sanções unilaterais e mesmo multilaterais tiveram impacto limitado sobre a Coreia do Norte, e a Rússia tem engendrado meios de contornar essas barreiras para financiar sua guerra. No G-20, as potências ocidentais se viram obrigadas a aliviar as pressões pela condenação da Rússia para garantir uma declaração conjunta e impedir o malogro da presidência rotativa da Índia, com quem contam para reequilibrar as relações de poder na Ásia. O presidente americano, Joe Biden, legitimamente preocupado com uma escalada, tem hesitado em enviar mísseis de longo alcance para a Ucrânia, apesar do apoio bipartidário do Congresso. A hesitação pode se transformar em franca recusa se Donald Trump for eleito no ano que vem, algo com que Putin conta.
Nada de bom pode sair desse abraço sombrio dos párias. Ele pressagia ameaças para a Ucrânia, para a estabilidade na Ásia, para o eixo democrático e para a segurança global. Se há um aspecto positivo, é o fato de que ele revela que as cartas de Putin estão se esgotando. Mas mesmo esse consolo é ambivalente. Déspotas desesperados são mais, não menos, perigosos.