O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

Mostrando postagens com marcador Revista Epoca. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Revista Epoca. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Noticias de um outro mundo: documentando a mafia em acao - Guilherme Fiuza, Pedro Moura (Epoca)

O Brasil é realmente um país alucinante: assiste uma máfia completa comandando o país dos mais altos escalões, e não reage. Contempla, todos os dias, denúncias nos jornais desses mesmos assaltantes roubando centenas de milhões, e não reage.
O que mais falta para o país implodir, ou explodir?
Nada!
Mas nada acontecerá, para mais uma confirmação de que se trata de um país invertebrado...
Paulo Roberto de Almeida 


Lava Jato toca a campainha do Palácio
Guilherme Fiuza
Revista Época, 18/05/2015

O doleiro do petrolão afirmou, em delação premiada, que o Palácio do Planalto sabia do esquema. Citou pelo menos três ex-ministros de Dilma cujos nomes ouviu várias vezes nos momentos decisivos das operações criminosas. Alberto Youssef disse também aceitar acareações com qualquer um. O esquema bilionário que funcionou mais de década exatamente sob os governos do PT, operado por diretores da Petrobras nomeados ou protegidos pelo grupo político governante, chegou à sua hora da verdade. Ou o Brasil acredita que o doleiro Youssef botou a República debaixo do braço e fez o governo inteiro refém, ou o comando da quadrilha terá de aparecer.
Youssef afirmou, em seu depoimento à CPI da Petrobras em Curitiba, que se sentia ""mais seguro" em suas operações criminosas por saber que tinha a proteção do Palácio do Planalto. Marcos Valério não chegou a dizer literalmente a mesma coisa, mas o julgamento do mensalão mostrou que ele também era assegurado pelo Palácio - tanto que o então ministro-chefe da Casa Civil acabou condenado e preso. Nos dois megaescândalos, dois tesoureiros do PT presos, acusados de participar de desvios de dinheiro de estatais para o partido. E o Brasil, chupando o dedo, não liga lé com cré e se recusa a entender que esse é um padrão de governo.
Aliás, "a única forma de governar o Brasil" — como Lula teria afirmado a José Mujica, ex-presidente do Uruguai. Os dois ex-presidentes naturalmente negaram que se tratasse do reconhecimento do escândalo, mas o livro que traz essa passagem é absolutamente claro ao contextualizá-la como referência ao mensalão. Um dos autores do livro, Andrés Danza, declarou não ter dúvidas de que assim a fala de Lula fora entendida por Mujica — com quem, aliás, Danza tem excelente relação. Possivelmente o ex-presidente uruguaio, chapa de Lula, achou que expondo a confissão de ""culpa" do colega brasileiro em relação ao escândalo iria humanizá-lo. É um tipo de humanismo que passarinho não bebe.
A tolerância do Brasil com os métodos escancarados do PT beira o masoquismo. A pessoa em quem Dilma Rousseff mais investiu para ser seu braço direito no governo chama-se Erenice Guerra, investigada em dois escândalos de tráfico de influência dentro do Palácio — este que Youssef diz que o fazia sentir-se seguro, o mesmo de onde foi engendrado o mensalão. É uma vertiginosa sucessão de coincidências. Ou então o Brasil gosta de apanhar.
Gosta porque não se mexe. Está esperando a Justiça capturar a quadrilha. E vai esperar sentado. A domesticação da corte máxima dessa Justiça apresenta neste exato momento mais um capítulo circense - talvez o de maior audiência, pelo que tem de bizarro. O país assiste à indicação de mais um soldadinho petista para o Supremo Tribunal Federal - um simpatizante do MST, para ter uma ideia do nível de aparelhamento a que está chegando a Justiça brasileira, esta que a platéia está esperando pegar os chefes do bando. O novo indicado por Dilma para o STF tem até site feito pela mesma pessoa que faz o do PT, provando que a independência não livra ninguém dos sortilégios da sincronicidade.
O Congresso Nacional teria a chance de devolver essa carta marcada ao Planalto, reprovando a indicação de Luiz Edson Fachin ao Supremo. Mas o Congresso é... o Congresso. E assim o país vai assistindo candidamente ao adestramento das suas instituições pelos companheiros progressistas, que conseguiram subjugar até as contas públicas — travestindo o balanço governamental através da contabilidade criativa e das já famosas pedaladas fiscais (tão famosas quanto impunes). Claro que a lavagem cerebral companheira já chegou forte a escolas de todo o país — sendo que até colégios militares andam sendo coagidos a ensinar o conto de fadas petista, coalhado de ideologias exaltando as pobres vítimas do capitalismo que mandam no Brasil (pelo visto, para sempre).
O Congresso Nacional está em cima do muro, o governo está atrás do muro e o Supremo está atrás do governo. Só o povo, com ou sem panelas, pode afrontar essa barricada no coração do Estado brasileiro e libertá-lo — exigindo que a Lava Jato siga o dinheiro até o fim. E levando a investigação até dentro desse Palácio que protege doleiros.

==========

A mãe de todas as delações
Pedro Marcondes de Moura
Época
Ricardo Pessôa é o primeiro dono de empreiteira a confessar crimes na Lava Jato. A colaboração dele jogará gasolina política no petrolão

Cercado por delegados federais e procuradores, zeladores do patrimônio público, o empreiteiro Ricardo Pessôa chorou. Não conteve a emoção ao ouvir elogios à capacidade e à qualidade de suas empresas, UTC e Constran. O empresário estava numa reunião na sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília, na quarta-feira da semana passada. A observação veio de um procurador, em tom de reprimenda, como quem diz "precisava mesmo ter participado disso?"
Nas investigações da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, Pessôa aparece com papel de destaque no organograma do petrolão, o esquema de cobrança de propina de construtoras e desvio da Petrobras. É apontado como coordenador do "clube das empreiteiras". Coordenava, pelo lado das construtoras, a definição de qual companhia ou consórcio do cartel venceria cada uma das licitações da Petrobras. Pagava propina também a diretores da estatal, operadores do esquema e políticos. Por isso, estava naquela sala acompanhado de cinco advogados, ao menos dois delegados federais e oito procuradores. Entre eles, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Assinava um acordo de delação premiada. No mesmo dia, começou a contar o que sabe, em troca de redução de pena e um provável direito de permanecer em liberdade. Foram cerca de cinco horas na primeira sessão de revelações. Comprometeu-se também a pagar uma multa de cerca de R$ 50 milhões. O acordo ainda precisa ser homologado pelo ministro Teori Zavascki, relator do petrolão no Supremo Tribunal Federal.
A delação de Pessôa jogará gasolina política no petrolão. Desde que a Operação Lava Jato chegou às principais empreiteiras do país, ele é visto como um delator com potencial explosivo. Suas revelações preocupam o Palácio do Planalto e as cúpulas do Congresso Nacional, do PT e do PMDB. Pessôa não é apenas alguém que corrompeu autoridades. Conviveu com elas. Tinha trânsito fácil nos principais gabinetes de Brasília. Recebia e era recebido, com afagos, por políticos de diferentes escalões interessados em recursos para campanhas e até em suas análises sobre o setor de obras públicas. A posição de líder no cartel também faz com que conheça com detalhes práticas irregulares de suas concorrentes. Antes de Lula, a UTC de Pessôa não era nada. Com Lula, virou um colosso.
Ficou claro, na quarta-feira e durante as negociações com os procuradores, o potencial da delação de Pessôa. O empreiteiro ofereceu informações que, caso comprovadas, mostrarão que o petrolão chegou também a outras estatais federais e ainda mais perto do Palácio do Planalto. Mas o empreiteiro promete mais do que confirmar parte das denúncias já investigadas.
De acordo com fontes que participam da organização da delação de Pessôa, o empresário afirmou que a UTC e outras empresas investigadas na Lava Jato atuaram em cartel nas obras da usina nuclear de Angra 3, da estatal Eletronuclear. Em contrapartida, desembolsaram propina a integrantes da bancada do PMDB do Senado. Disse também que contribuiu para o caixa dois da campanha à reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006. Uma declaração que, se comprovada, estabelecerá relação direta do esquema com Lula e mostrará que o PT insistiu no uso de dinheiro ilegal em campanhas, mesmo depois de descoberto o mensalão. Pessôa afirmou ter doado recursos para a última campanha da presidente Dilma Rousseff, em 2014, de modo oficial, por temer eventuais retaliações em contratos. No período, a Operação Lava Jato já estava deflagrada. Disse também ter pagado cerca de R$ 2,4 milhões em dívidas de campanha do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), em 2012. Os pagamentos ocorreram, na versão de Pessôa, a pedido do ex-tesoureiro do partido João Vaccari. O PT e Vaccari negam qualquer irregularidade.
Desde o ano passado, Pessôa negociava a delação premiada. Esteve por vezes próximo de um acordo com os procuradores do Paraná. Mas as conversas empacavam. Ele temia as consequências pessoais e empresariais de confessar a culpa. Segundo integrantes das negociações, parecia acreditar que não ficaria preso. Negava-se a compreender que a situação se desenhava para passar vários anos encarcerado, como ocorreu com a ex-presidente do Banco Rural Kátia Rabello, no mensalão. Acabou ultrapassado, na fila da delação, pelo diretor presidente da empreiteira Camargo Corrêa, Dalton Avancini, e pelo vice-presidente, Eduardo Leite. Foi quando mudou de estratégia. As tratativas com a Procuradoria-Geral da República, em Brasília, começaram há dois meses, antes mesmo de ele ser solto, por decisão do Supremo. Pessôa se comprometeu a fazer a delação, mesmo que fosse solto. Cumpriu a palavra. Sentindo-se abandonado por Lula, de quem se diz amigo, e pela Odebrecht, a quem diz ter ajudado no cartel, Pessôa, movido por vingança e cálculo, se convenceu de que a colaboração era sua melhor alternativa. Foram menos de dez reuniões até a assinatura do acordo na quarta-feira.
A delação de Ricardo Pessôa pode levar outros empreiteiros e integrantes do petrolão para a fila de delação. Eles sabem que, com os novos depoimentos, as acusações devem se tornar mais contundentes. Além disso, no mercado da delação, os benefícios são proporcionais à quantidade de informações novas. A cada acordo celebrado, o capital dos demais acusados se reduz. Até mesmo a doleira Nelma Kodama, já sentenciada a 18 anos de prisão, disse na semana passada que gostaria de colaborar com a Justiça. Nelma deixou isso claro durante uma sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito da Petrobras, na terça-feira, em Curitiba. Em diversos momentos, ela divertiu os deputados. Em um dos momentos teatrais de seu depoimento, demonstrou onde guardava € 200 mil quando foi presa deixando o Brasil. De pé, explicou que o bolinho de dinheiro nem era tão volumoso e estava no bolso de trás da calça jeans, e não na calcinha, como dito na ocasião da apreensão. Arrancou risos dos parlamentares novamente ao cantar "Amada amante", de Roberto Carlos, para dizer que não teve só um caso com o doleiro Alberto Youssef. Viveu, segundo ela, ""maritalmente com ele do ano de 2000 a 2009". Só parou a canção ao ser repreendida pelo presidente da CPI, deputado Hugo Motta (PMDB-PB): "Senhora Nelma, nós não estamos em um teatro". Já Luiz Argôlo, ex-deputado federal preso na Operação Lava Jato, prestou depoimento segurando um terço. Em atitude de pregador, declarou aos ex-colegas: Os humilhados, um dia, serão exaltados. Isso é bíblico". Na quinta-feira, Argolo e os também ex-parlamentares presos André Vargas e Pedro Corrêa foram denunciados pelo Ministério Público Federal, junto com outras dez pessoas. Começa a 11ª fase da Operação Lava Jato. Não será a última.

sábado, 15 de março de 2014

Venezuela-Brasil: uma relacao complicada (para dizer o minimo) - Leandro Loyola (Epoca)

Tolerância com o atraso venezuelano
Desastre no comércio bilateral e motivo de constrangimento no cenário internacional. Assim é a parceria do Brasil com a Venezuela
LEANDRO LOYOLA

Revista Época, 07/03/2014

O governo brasileiro tem um histórico de tolerância em relação ao atraso da Venezuela. Quando vinha ao Brasil, Hugo Chávez nunca avisava a que horas chegaria, desrespeitando uma tradição da boa diplomacia: um país sempre avisa sobre o horário em que o avião com seu chefe de Estado passará pelo espaço aéreo do outro. Os venezuelanos, ao contrário, nunca determinavam um período exato – apenas um longo intervalo de horas. Seu
sucessor,Nicolás Maduro, o professor Girafales da Venezuela, não mimetiza apenas os longos discursos que Chávez adorava. Ele também reserva longos horários quando vem ao Brasil, de modo que nunca se sabe a hora exata que chegará. O Brasil continua sem saber quanto esperará a Venezuela. Mas tolera seu atraso.
E o tolera num constrangedor silêncio. É um mutismo que revela a dificuldade – ou a deliberada resistência – do governo Dilma em pôr o Brasil na liderança geopolítica e econômica da América Latina, contribuindo para o avanço democrático nos países vizinhos.
Nada seria mais natural. Nas últimas semanas, enquanto o pau cantava nas ruas de Caracas, o Palácio do Planalto a tudo observou em silêncio, como se temesse melindrar os colegas chavistas. Estivesse o governo Maduro à direita de suas preferências ideológicas, teriam Dilma e o Itamaraty observado o mesmo obsequioso cuidado? Até a União Europeia pediu equilíbrio a Maduro e a seus opositores. Ninguém espera ou exige que o Brasil acolha posições golpistas contra Maduro, um presidente eleito pelo voto popular, embora num país que se distancia rapidamente das boas regras da democracia. Mas ficar em silêncio significa tolerar os abusos e a violência praticados pelas forças paramilitares do chavismo e, em menor grau, pela oposição. Não há razão pragmática para adotá-lo. Há apenas razão ideológica.
Do Brasil, não veio um murmúrio de sensatez. Do Mercosul, sob a Presidência temporária da própria Venezuela, veio um grito insensato, em nota que se assemelha às declarações palanqueiras de Maduro e seus apoiadores. “Os Estados do Mercosul”, diz o texto, “reiteram seu firme compromisso com a plena vigência das instituições democráticas e rechaçam as ações criminosas dos grupos violentos que querem disseminar a intolerância e o ódio na República Bolivariana da Venezuela como instrumento da luta política.” O Brasil, integrante do Mercosul, subscreve a nota. O que o Brasil ganha com isso? É difícil dizer. 
Em compensação, o Itamaraty divulgou uma nota sobre a violência e as mortes nos protestos em Kiev. Ucrânia e Venezuela vivem realidades diferentes, mas em ambos os casos os princípios da diplomacia brasileira deveriam ser os mesmos. Estão na Constituição, entre outros: “Prevalência dos direitos humanos” e “solução pacífica dos conflitos”. 
Para assessores próximos de Dilma, ela não falou, nem disse ao Itamaraty que falasse, porque não valeria a pena – não haveria como mudar a Venezuela, esse país eternamente condenado à instabilidade institucional. Parece uma postura pragmática. Talvez seja uma posição cínica, ou confortavelmente derrotista. “O Planalto tem desavenças com o governo Maduro, mas abdicou de jogar duro com ele. Como o assunto é tema de política interna no Brasil – simpatizantes do PT consideram o chavismo um experimento emancipador, e a oposição vê um regime autoritário –, o governo Dilma sente que qualquer crítica ao vizinho seria fazer o jogo dos opositores”, afirma o cientista político Matias Spektor, doutor em relações internacionais e professor da Fundação Getulio Vargas. “O resultado é que Brasília acoberta Caracas mesmo sem querer fazê-lo, e a presidente tem um espaço de manobra reduzido.”
O Brasil sempre demonstrou benevolência com a Venezuela. Em 2005, o então presidenteLuiz Inácio Lula da Silva combinou com Chávez a construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, a ser tocada por Petrobras e PDVSA. Deu errado. Os venezuelanos deram calote na Petrobras. (Agora exclusivamente brasileira, a Abreu e Lima ainda está em construção, e seu preço passou de R$ 3 bilhões para R$ 19 bilhões.) O Brasil não faltou à Venezuela em momentos constrangedores. Lula não criticou Chávez por nacionalizar empresas estrangeiras, em 2006, nem por tratorar o Congresso para mudar a Constituição e ganhar o direito de disputar a reeleição eternamente, como se fora um ditador africano. Em 2012, o governo Dilma aproveitou um golpe político no Paraguai para suspender o país e forçar a entrada da Venezuela no Mercosul. Foram favores imensos.
Apesar da boa relação, Lula não deixava de discordar de Chávez. “Lula era simpático a Chávez, mas nunca deixou de se fazer ouvir com clareza”, diz Spektor. A relação de Dilma com Maduro não é assim. “Ao Brasil, hoje falta interlocução com Caracas.” 
A preocupação real do governo Dilma é com os reflexos econômicos da crise. O governo brasileiro incentivou empresas a investir na Venezuela. No ano passado, o Brasil exportou US$ 4,9 bilhões para lá – e importou apenas US$ 1,1 bilhão. A Venezuela seria um grande mercado para o Brasil, pois, como não produz quase nada além de petróleo, importa 96% de tudo o que consome. Nos últimos meses, as empresas brasileiras levam uma verdadeira canseira para receber. As indústrias calçadista e têxtil desistiram de exportar. No caso dos têxteis, o volume de exportações, de US$ 90 milhões em 2011, caiu a praticamente zero neste ano. “Demorávamos até dois anos para receber”, afirma Alfredo Bonduki, presidente do Sinditêxtil de São Paulo. É uma aberração. Em negócios com países normais, os exportadores recebem adiantado ou a transação é feita com cartas de crédito emitidas por bancos. Isso não é possível, porque a Venezuela é um país quebrado. O governo controla o câmbio a conta-gotas, para não esgotar suas escassas reservas. As empresas venezuelanas compram das brasileiras, depositam seus bolívares (a moeda local) para a conversão, mas o governo venezuelano não libera os dólares para o pagamento às empresas brasileiras. Esse impasse pode levar meses.
O governo brasileiro teme que as empresas nacionais vendam ainda menos para a Venezuela por causa da crise. É uma péssima situação, especialmente porque se repete com a Argentina, o terceiro maior comprador do Brasil. Assim como a Venezuela, a Argentina tem escassas reservas cambiais. Com dois parceiros do Mercosul em crise, o Brasil sentirá um impacto em sua balança comercial, num ano em que as perspectivas econômicas não são das melhores. Ao demonstrar tolerância com a Venezuela, o Palácio do Planalto terá de torcer para que seu silêncio não fique constrangedor, caso os protestos perdurem ou se agravem. Talvez precise ver mais alguns gestos bolivarianos estranhos à democracia, conversar muito para que pagamentos atrasados sejam liberados e fingir não ligar para a falta de cerimônia em visitas. Mas, como se sabe desde Chávez, ao Brasil não falta tolerância com o atraso da Venezuela.

sábado, 7 de julho de 2012

Diplomacia da Conveniencia - Revista Epoca


A diplomacia da conveniência
A posição brasileira diante do impeachment do presidente paraguaio traz mais contaminação ideológica do que defesa dos nossos interesses
JULIANO MACHADO, COM VINICIUS GORCZESKI E LEANDRO LOYOLA, ASSUNÇÃO
Revista Época, 07/07/2012

Os paraguaios gostam de fazer piadas com seus vizinhos de Cone Sul. Dizem ser “mais fácil entender um brasileiro em português que um argentino em espanhol”. A brincadeira expõe a histórica rivalidade entre Paraguai e Argentina e também é uma prova da relação de boa vontade com os brasileiros, apesar da mágoa histórica deixada pela Guerra do Paraguai, no século XIX. Na semana passada, pelo menos na elite do país, pouco restou da boa vontade. Ela foi abandonada assim que o governo de Dilma Rousseff protestou contra a deposição do presidente Fernando Lugo. O português do Brasil deixou de ser compreendido.
Essa sensação está disseminada, sobretudo, em meio àqueles que produzem e ajudam a construir a economia paraguaia, entre eles os agricultores brasileiros chamados de brasiguaios. Eles não queriam mais o esquerdista Lugo no poder e ficaram irritados com a decisão de Brasília de ameaçar o Paraguai com sanções por causa da posse do novo presidente, o liberal Federico Franco. Que tal atitude viesse da Argentina, da Bolívia e do Equador, cujos governos se alinham com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, já era esperado. A adesão do Brasil não caiu bem. O país também avalizou a resolução tomada, na semana passada, na reunião do Mercosul: o Paraguai foi suspenso do bloco econômico até as próximas eleições, previstas para 2013. Na mesma reunião, definiu-se a aprovação da Venezuela como membro pleno em 31 de julho deste ano – posição que contraria frontalmente os interesses paraguaios.
O argumento do respeito à soberania de cada país era usado pelo Itamaraty para não tomar parte no debate em torno da reforma agrária do Paraguai, uma queda de braço entre sem-terra e agricultores que se agravou durante o governo Lugo. Desde o ano passado, o embaixador brasileiro em Assunção, Eduardo dos Santos, era cobrado por brasiguaios devido às constantes invasões de suas propriedades. “A resposta era que se tratava de um problema interno do país, que o governo brasileiro não poderia interferir”, afirma o paraguaio José Costas, advogado e porta-voz de Tranquilo Favero, um catarinense que cruzou a fronteira nos anos 1970.
As elites paraguaias esperavam protestos de Chávez e seus aliados. A adesão do Brasil não caiu bem 
Favero fez fortuna e se tornou o maior proprietário de terra do país, com pelo menos 18.000 hectares só na região leste do Paraguai. Suas terras são constantemente ocupadas por camponeses sem terra. Costas diz o que pensa a maioria dos paraguaios contrários a Lugo: “Agora que temos um presidente que não responde a um bloco socialista no continente, Dilma e o PT tratam de interferir em nossa vida política. Se não se importaram com a gente antes, que continuem da mesma maneira”.
O princípio da neutralidade brasileira, exercido nas relações com regimes autoritários, como Irã e Guiné-Equatorial, fora questionado em outra deposição de um governante de esquerda latino-americano. Em 2009, o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, voltou escondido ao país e refugiou-se na Embaixada do Brasil. Lá ficou por quatro longos meses, até se exilar na República Dominicana. Era o auge da seletiva “diplomacia presidencial” de Luiz Inácio Lula da Silva, que favorecia os aliados Chávez, Rafael Correa (Equador) e Evo Morales (Bolívia). A ordem democrática fora rompida em Honduras, fato que merecia condenação. Mas a acolhida brasileira a Zelaya e a prorrogação do confronto diplomático entre o Brasil e o novo governo hondurenho, após a realização de eleições, foram fruto da ideologia que contamina as ações externas de Brasília. Esse pensamento impediu, até hoje, que o Brasil fizesse qualquer crítica ao autoritarismo do eterno presidente Chávez. Pior ainda quando essa ideologia fere os próprios interesses do Brasil. O boliviano Evo apropriou-se de refinarias brasileiras em 2006, ação que recebeu do governo Lula apenas protestos comedidos e a mão estendida ao diálogo.
Numa nota acertada entre Dilma e o chanceler Antonio Patriota, o Itamaraty evitou falar em “golpe” contra Fernando Lugo como fizeram Argentina e Venezuela. Chamou de “rito sumário” a decisão do Congresso paraguaio, pois Lugo teve apenas duas horas para se defender das acusações que motivaram o pedido de impeachment (o próprio Federico Franco reconheceu que o processo foi “um pouco rápido”). O que irritou mesmo os paraguaios foi a suspensão do país das reuniões do Mercosul e da União das Nações Sul-Americanas (Unasul). Argentina, Venezuela e Equador retiraram seus embaixadores de Assunção. O Brasil convocou Eduardo dos Santos para consulta, uma reprimenda mais leve, e não adotará sanções econômicas, enquanto Chávez interrompeu o envio de petróleo ao Paraguai. Segundo um assessor de Franco, ainda assim o Brasil deveria “calibrar” melhor suas posições diplomáticas na América do Sul devido a seu tamanho, sob o risco de sufocar os parceiros menores.
O diplomata Sérgio Amaral, ex-porta-voz do governo de Fernando Henrique Cardoso, concorda com a avaliação de que a democracia foi desrespeitada no Paraguai. O problema, diz ele, é o uso de diferentes critérios por Brasília com diferentes nações. “Se você rejeita o simulacro do impeachment, você tem de rejeitar também o simulacro de democracia, que é o caso da Venezuela. Os dois casos têm um ponto em comum”, afirma. “O que vale mais: a forma e a aparência ou o conteúdo? Nós teremos eleições na Venezuela neste ano, e temos boas razões para acreditar que as aparências democráticas podem ser respeitadas, mas o conteúdo não.”
Mantida sua posição atual, o governo brasileiro poderá deixar Franco na geladeira até o fim de seu mandato, em agosto de 2013, e só retomar o pleno diálogo com um novo presidente. Dado que os paraguaios não queriam mais Lugo – sua saída seguiu os ritos legais e a reação foi mais externa que interna –, é provável que o próximo presidente tenha feições liberais. Se assim for, demonstrar boa vontade com um governante cercado de regimes de orientação política contrária será um bom sinal de maturidade brasileira.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Capitalismo de Estado no Brasil - revista Epoca

Um levantamento inédito de ÉPOCA identifica 675 empresas na órbita do governo federal e revela a extensão da interferência estatal na economia
Revista Época, 13/06/2011

José Fucs e Marcos Coronato, com Keila Cândido, Matheus Paggi, Camila Camilo, Danilo Thomaz e Juliana Elias

A queda do Muro de Berlim parecia ter encerrado o debate sobre o tamanho do Estado na economia. Com a vitória de um sistema baseado na livre-iniciativa – o capitalismo – sobre outro baseado no planejamento estatal – o socialismo –, a conclusão era cristalina: o governo deveria limitar ao mínimo a regulação sobre as atividades privadas e cuidar (bem) dos serviços básicos, como saúde, educação, justiça e segurança. Deveria ser apenas um bandeirinha, no máximo o juiz do jogo econômico – nunca técnico, zagueiro ou artilheiro. Em setembro de 2008, porém, com a eclosão da crise global, os governos de quase todo o mundo tiveram de injetar trilhões de dólares para reanimar suas economias. Nos Estados Unidos e em outros países, o Estado assumiu o controle de bancos, seguradoras e até mesmo de montadoras de automóveis à beira da falência. Foi a deixa para a ressurreição dos críticos do modelo liberal, que predominara por quase três décadas e garantira ao planeta uma era de crescimento sem igual na história. Vozes antes relegadas a um papel secundário no debate voltaram à cena com ares de protagonistas. Uma delas, o economista americano Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia em 2001, afirmou recentemente a ÉPOCA: “Não é o tamanho do Estado que importa, é o que o governo faz”.

Vá lá. Mas o que, exatamente, faz o governo num país de economia complexa como o Brasil? Trata-se, como o próprio Stiglitz há de reconhecer, de uma questão importantíssima – mas de resposta dificílima. O governo brasileiro regula a atividade econômica? Regula. O Estado é dono de empresas? Também. É sócio de empresas que não controla totalmente? Certamente. E ainda é dono de bancos mastodônticos e de companhias gigantescas, que detêm participações em uma fauna de empresas de todas as espécies. Para não falar no controle que exerce sobre os fundos de pensão das estatais, os maiores investidores do mercado. De diferentes formas, o governo interfere na gestão de algumas das maiores empresas privadas nacionais, em setores tão distantes quanto metalurgia, criação de animais para abate ou telefonia. A teia de interesses estatais nos negócios é tão complexa, tem tantas facetas e envolve tantos conflitos de interesse que o próprio governo não consegue avaliá-la de modo preciso. Nem o Ministério do Planejamento, a que está ligado o Departamento de Coordenação e Controle das Empresas Estatais, nem a Secretaria do Tesouro Nacional, que controla o caixa federal, sabem quantas empresas no país têm participação estatal. E não há, em nenhuma repartição de Brasília, um diagnóstico completo da atuação e da influência do governo sobre nossa economia.

Nos últimos três meses, uma equipe de jornalistas de ÉPOCA dedicou-se a desfazer o nevoeiro que encobre essa questão. Com o apoio da empresa de informações financeiras Economática, mergulhamos em relatórios ministeriais, balanços e planilhas de dados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), das estatais, da Bolsa de Valores e das empresas privadas sob influência do governo. Restringimos nosso trabalho às participações do governo federal – um critério conservador para estimar o tamanho do Estado, por omitir as estatais em poder de Estados e municípios. Mesmo assim, o levantamento inédito, cujos resultados são apresentados a partir da página 71 e estão disponíveis de modo interativo em epoca.com.br e em nossa edição para iPad, revela um quadro preocupante. No futebol da economia brasileira, o governo não é apenas juiz, bandeirinha, técnico, zagueiro e artilheiro ao mesmo tempo. Ele também corta o gramado do estádio, costura as redes e – se quiser – pode até mexer no tamanho das traves.

“O governo é um dinossauro insaciável. Nunca tivemos um capitalismo de Estado tão evidente”, diz um economista

De acordo com o levantamento, existem hoje no país pelo menos 675 empresas de todos os setores com algum tipo de participação ou influência do governo federal. São participações diretas ou indiretas do Tesouro, dos bancos e das empresas estatais ou dos fundos de pensão (entidades híbridas, inegavelmente na órbita do governo). Dessas, o governo controla 276, se somarmos todos os tipos de participação. Levando em conta apenas as 628 empresas não financeiras, o faturamento soma R$ 1,06 trilhão, algo como 30% do nosso Produto Interno Bruto (PIB) ou 2,5 vezes as vendas dos 50 maiores grupos privados nacionais (leia o gráfico abaixo) . Nas 247 empresas não financeiras controladas pelo governo, as vendas somam R$ 468,5 bilhões, ou 13% do PIB. E o valor de mercado das 99 empresas cujas ações são negociadas na BM&FBovespa totaliza R$ 1,7 trilhão, ou 71% do valor de mercado das empresas na Bolsa. A interferência do Estado na economia via estatais, BNDES e fundos de pensão é tão intensa que, durante a pesquisa, ÉPOCA teve de atualizar os dados de muitas companhias que receberam recentemente dinheiro do governo, como o frigorífico JBS ou a Cipher, especializada em sistema de segurança de informação. “O governo brasileiro é um dinossauro com apetite insaciável. Nunca tivemos um capitalismo de Estado tão evidente”, diz o economista Rodrigo Constantino, sócio da Graphus Capital, uma empresa de gestão de recursos do Rio de Janeiro.

No Brasil, a visão do Estado-empresário nunca teve dificuldades para angariar fãs. “A partir do governo Lula, houve uma mudança no entendimento do papel que o Estado deve ter no capitalismo brasileiro”, afirma o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-ministro das Comunicações, ex-presidente do BNDES e um dos responsáveis pelas privatizações no governo Fernando Henrique Cardoso. “Eles renegaram a privatização, começaram a gastar demais e a interferir na gestão de empresas privadas. Começou a aparecer essa face do PT, de que o governo deve ser o agente mais importante de uma economia como a nossa.” Mas o próprio PSDB, preocupado em se livrar do estigma de privatista, estuda apresentar uma emenda constitucional para impedir que Petrobras, Banco do Brasil (BB) e Caixa Econômica sejam privatizados. “Os brasileiros amam o Estado, querem mais Estado”, diz o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central e ex-economista-chefe do Santander. “A ideia de que o governo resolverá todos os problemas está entranhada na cultura nacional.”

Em seus oito anos de governo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou sete novas estatais: o Banco Popular do Brasil (BPB), que nem existe mais, a Hemobrás (para fabricação de hemoderivados), a Empresa Brasileira de Comunicações (EBC), a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), a Pré-Sal Petróleo, a Ceitec (para fabricar chips e microcondutores) e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, designada pela impronunciável sigla EBSERH, cujo objetivo seria prestar serviços gratuitos e apoiar o ensino e a pesquisa nos hospitais universitários federais (esta última não vingou, pois a medida provisória que a criava caducou). Além de criar as novas empresas, Lula investiu quase R$ 100 bilhões nas estatais já existentes e concedeu a elas empréstimos do Tesouro de quase R$ 200 bilhões, principalmente ao BNDES. Houve ainda o renascimento de estatais como a Telebrás, a holding de telefonia cujas subsidiárias foram privatizadas em 1998, e os investimentos bilionários feitos por BNDES, estatais e fundos de pensão na compra de participações em grandes grupos privados. O governo estimulou fusões generalizadas entre empresas privadas, como a Oi, da área de telefonia, resultado da união da Brasil Telecom com a Telemar. Nos primeiros seis meses do governo da presidente Dilma Rousseff, o avanço do Estado sobre o mundo dos negócios continua em ritmo acelerado. Alguns exemplos:

• Num leilão realizado no final de maio, o Banco do Brasil (BB) ganhou o direito de explorar o Banco Postal, a rede de serviços bancários dos Correios, a partir de 2012. Com um lance de R$ 2,3 bilhões, o BB superou a oferta do Bradesco, que operava o Banco Postal desde 2002;

• No final de maio, o BNDES anunciou a conversão de uma dívida de R$ 3,5 bilhões do JBS, o maior frigorífico de carne bovina do mundo, em ações da empresa e ampliou sua fatia no capital de 17% para 31%;

• Quase ao mesmo tempo, o governo patrocinou a troca de comando da Vale, a segunda maior mineradora global, por discordar de sua política de investimento. Embora afastado da Vale desde a privatização, em 1997, o governo usou sua força nos fundos de pensão que detêm o controle da empresa, para impor uma diretoria simpática a seus planos;

• Em abril, o Congresso Nacional aprovou um projeto do governo que criou mais uma estatal, a Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade (Etav), para gerenciar o projeto do trem-bala entre Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro. Ele terá financiamento de R$ 20 bilhões a juros camaradas do BNDES (20% acima do gasto previsto para o Bolsa Família em 2011);

Embora a decisão de privatizar os aeroportos, anunciada em maio, seja um sinal importante, ela não significa que Dilma tenha subitamente aderido à causa da privatização, palavra demonizada por ela mesma durante a campanha eleitoral. A medida reflete apenas o reconhecimento tardio de que o governo não tem dinheiro para modernizar os aeroportos e prepará-los para a Copa do Mundo de 2014 e para a Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro. Só que o país precisa investir pesado em infraestrutura nos próximos anos – e não apenas para a Copa e a Olimpíada. Os gargalos de nossa economia oneram toda a produção e reduzem a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional. Além dos aeroportos, é preciso modernizar e ampliar portos, estradas, ferrovias, a geração e distribuição de energia e os sistemas de água e esgoto. De acordo com cálculos do BNDES, as obras exigirão R$ 1 trilhão até 2014. E o governo não tem os recursos necessários para bancá-las. “Apesar de sermos um país que optou por ter um Estado grande, temos um Estado que investe muito pouco”, diz o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, hoje sócio da Gávea Investimentos. Também falta poupança interna para financiar todos os investimentos necessários. Sem o capital estrangeiro, portanto, é impossível alcançar a meta.

A decisão de fazer concessão de aeroportos não significa que Dilma tenha aderido à causa da privatização

De acordo com o banqueiro Henrique Meirelles, que comandou o Banco Central no governo Lula, se houvesse um ambiente de negócios mais atraente no país, o capital estrangeiro, sedento por boas oportunidades de investimento, viria em proporções cavalares. Há aí um espaço gigantesco a trabalhar. O Brasil é hoje o país emergente com a maior carga tributária do mundo, na faixa de 36% do PIB. Nossa legislação trabalhista obriga as empresas a pagar um salário adicional ao governo, além do que já paga ao trabalhador – é um fardo pesado. “O Brasil é um dos países em que é mais difícil empreender”, diz o empresário Jorge Gerdau, que aceitou recentemente comandar a Câmara de Gestão e Planejamento do governo Dilma. “Isso tem origem direta na ineficiência do Estado, prejudica a geração de emprego e renda e faz o Brasil perder oportunidades.” Na gestão de empresas, o Estado costuma ser bem menos eficiente do que a iniciativa privada. “Em geral, quanto mais coisas o governo tenta controlar, menos eficiente ele é”, diz o economista italiano Luigi Zingales, da Universidade de Chicago. Não é à toa que, segundo o levantamento mais recente do Fórum Econômico Mundial, o setor privado brasileiro está em 39º lugar no ranking de competitividade global, entre 139 países, enquanto o setor público ocupa apenas a 130ª posição.

Considerando tudo isso, é pouco provável que o governo consiga desatar o nó dos investimento, para permitir que o país cresça a taxas elevadas sem alimentar a inflação. Como é a iniciativa privada que financia a sede do Estado por recursos, de um jeito ou de outro, a conta da gastança chega. Depois dos trilhões gastos para erguer o mundo da crise, em diversos países – inclusive no Brasil – a dívida pública se multiplicou, e os governos começaram a cortar despesas para equilibrar o orçamento. No Primeiro Mundo, políticos conservadores estão ganhando as eleições com um discurso concentrado na austeridade fiscal e na contenção dos arroubos expansionistas do Estado. Nos EUA, os republicanos ganharam a maioria do Congresso nas eleições de 2010. Também no ano passado, o conservador David Cameron tomou o lugar do trabalhista Gordon Brown como primeiro-ministro na Inglaterra. Na Espanha, o fenômeno se repetiu em maio. A população mais esclarecida sabe que, no final, o custo sobra para ela, por meio do aumento de impostos, da inflação e das taxas de juro.

No Brasil, a estrutura de gastos públicos não dá muita margem de manobra. Do total de despesas, dois terços são consumidos apenas com a folha de pagamentos do funcionalismo federal e dos benefícios aos aposentados e pensionistas da Previdência Social. No início do ano, o Ministério da Fazenda até anunciou cortes tímidos, de R$ 50 bilhões, no gasto público. Mas esse número fica aquém das necessidades para equilibrar as contas. O essencial é deixar de lado o discurso ideológico e analisar friamente os benefícios de vender ativos – tradução: privatizar – no atual cenário. “É inevitável fazer a privatização”, diz o economista Roberto Macedo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. “O governo precisa sair da armadilha criada pelo Lula em 2006”, afirma Mendonça de Barros. “A Copa e a Olimpíada estão aí, e não dá para brincar. O PT é um partido pragmático e se dará conta de que é uma boa hora para quebrar o tabu das privatizações.”

CONTINUIDADE?
Até agora, Dilma seguiu a visão estatista adotada por Lula. A dúvida é se a falta de recursos para investimentos a fará reavaliar a privatizaçãoA última vez que o país implementou um programa consistente de desestatização foi nos anos 1990, na esteira das privatizações e da desregulamentação promovidas pela Inglaterra de Margaret Thatcher e pelos Estados Unidos de Ronald Reagan. O Estado obeso, herança da era Vargas e dos governos militares, passou por uma dieta notável nas gestões de Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. O governo se desfez de mineradoras, siderurgias, petroquímicas, telefônicas e empresas aéreas. Acabou com o monopólio da Petrobras. Com a privatização, empresas como Vale, CSN e Usiminas voltaram a florescer. Na telefonia, os resultados foram espetaculares. Políticos de centro-esquerda, como Bill Clinton nos EUA, Tony Blair na Inglaterra e o próprio FHC, se viram forçados a abrir mão do viés estatizante de seus partidos para manter-se no poder. O próprio Lula teve, na campanha de 2002, de abandonar antigas bandeiras intervencionistas do PT e comprometer-se a não rever as privatizações, respeitando os contratos assinados.

Depois da crise de 2008, apesar da retomada do crescimento, a ideia de que o Estado pode – ou deve – fazer tudo voltou a ganhar força. “Os países mais bem-sucedidos, como Japão, China, Coreia do Sul e Índia, abriram suas economias de forma gradual e adotaram políticas comerciais e industriais para promover e diversificar suas economias”, diz o economista Dani Rodrik, da Universidade Harvard, EUA, outro defensor do estatismo. “Acaba havendo uma compensação entre a elevação do custo, provocada pelas restrições ao comércio e ao fluxo de capitais, e os benefícios de uma economia mais forte, em que se estimulam setores que, de outro modo, não se desenvolveriam.”

Aqui, as autoridades têm se aproveitado da maré favorável a esse tipo de ideia para ampliar os braços do governo na economia brasileira, seja aumentando a participação em empresas, seja oferecendo crédito subsidiado pelo BNDES. “O BNDES se transformou numa gigantesca máquina de transferência da riqueza dos pagadores de impostos para os aliados do governo. A troca de favores é o meio para o sucesso e o melhor atributo é ser amigo do rei”, diz Rodrigo Constantino. A pretexto de combater a crise, o governo federal parece ter embarcado novamente na ideologia de um estatismo inconsequente.

É provável que, se ele procurasse se concentrar nos três pilares da ação estatal – educação, saúde e segurança –, em vez de alimentar o mito do Estado-empresário, o país funcionaria melhor. Haveria menos corrupção, menos tráfico de influência e menos apadrinhamento. A redução da ação do governo na economia não significa que os mercados devam ser deixados à vontade. O governo pode – e deve – cuidar de sua fiscalização e regulação estabelecendo normas que garantam a qualidade da produção e a boa prestação de serviços à população. Mas o juiz não pode querer chutar a bola no gol.

sábado, 28 de agosto de 2010

Diplomacia de Lula: comecam os balancos

ÉPOCA Debate: O papel de nossa diplomacia
Juliano Machado, com Leonel Rocha, Alberto Bombig e Carlos Giffoni
Revista Época, Sábado, 28 de agosto de 2010

Viagens internacionais não eram algo corriqueiro na rotina de um presidente da República décadas atrás. Quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso somou, entre 1995 e 2002, 347 dias fora do Brasil, isso parecia um exagero para muitos. Pois o presidente Luiz Inácio Lula da Silva superou o recorde de FHC em abril do ano passado, faltando 20 meses para terminar seu segundo mandato, e ninguém estranhou. No mesmo mês, durante a reunião do G20 em Londres, Lula foi chamado de “o cara” pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama.

As viagens de FHC e Lula são um sinal do crescente papel de destaque que o Brasil tem adquirido no cenário diplomático internacional. Com a liderança regional consolidada na América Latina, nossa diplomacia passou a reivindicar uma voz mais ativa entre antigas potências. Tal ascensão do Brasil trouxe algumas conquistas, como o comando bem-sucedido das operações das Nações Unidas no Haiti. Mas também gerou frutos negativos – entre os principais, o desastrado abrigo dado pela embaixada brasileira em Honduras ao presidente deposto, Manuel Zelaya, e o apoio às pretensões nucleares do Irã, em desafio à proposta de sanções, feita pelos Estados Unidos e pela Europa. A pouco mais de um mês das eleições, os dois principais candidatos, Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB), devem ter em mente tais questões. O Brasil deve manter a linha de “ativismo diplomático”? Será preciso marcar presença no Oriente Médio ou é melhor concentrar esforços nos conflitos em países que estão ao lado, como Venezuela ou Colômbia? Nossa diplomacia está agindo de acordo com nossa força e nosso peso internacional?

Essas são algumas das principais questões em pauta na quarta edição de ÉPOCA Debate, uma série de eventos que discutem os temas mais importantes na agenda do próximo presidente. O debate ocorrerá nesta terça-feira, na sede da Editora Globo (que publica ÉPOCA), em São Paulo. Estarão presentes Samuel Pinheiro Guimarães, ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e ex-secretário-geral do Itamaraty; Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil nos EUA e no Reino Unido; e Amaury de Souza, cientista político e autor do livro A agenda internacional do Brasil: a política externa brasileira de FHC a Lula.

Lula deixará em suspenso para seu sucessor a maioria das questões espinhosas em que o Itamaraty se envolveu recentemente. Durante a campanha, Serra criticou com dureza a pretensão brasileira de dialogar com o Irã. E fez repetidos ataques à condescendência do Brasil com o regime do presidente venezuelano, Hugo Chávez, e com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), a guerrilha marxista que vive do tráfico de drogas. O vice de Serra, Indio da Costa (DEM), chegou a fazer uma associação direta entre o PT e o narcotráfico e acusou o partido de manter ligações com as Farc.

Serra ainda chamou de “frouxo” o presidente da Bolívia, Evo Morales, e afirmou que ele não combate com vigor o tráfico da cocaína que sai de lá para o Brasil. Para Amaury de Souza, os ataques tiveram lógica como estratégia eleitoral. “Serra tentou traduzir um problema externo, o narcotráfico boliviano e colombiano, para uma realidade doméstica, de aumento do vício e da criminalidade”, afirma Amaury. “Sua tentativa foi transformar a política externa em um tema de mais fácil compreensão para o eleitor comum.”

O comando da campanha de Serra diz que “suspenderá o apoio que o Brasil tem dado à Venezuela”. Em que pese a proximidade histórica entre o PT e várias correntes da esquerda latino-americana, a candidatura de Dilma afirma que sempre buscará condenar o narcotráfico e o terrorismo da guerrilha colombiana (leia abaixo a posição dos dois candidatos sobre os principais temas da política externa).

Se eleita, Dilma não deve mudar muito as diretrizes deixadas por Lula na diplomacia, mesmo com os atritos ainda não resolvidos. Um indício de continuidade foi a escolha do coordenador de seu plano de governo: Marco Aurélio Garcia, assessor internacional do presidente Lula. De férias do Palácio do Planalto para cuidar do programa de Dilma, ele é cotado para ocupar um ministério num possível governo. Se fosse convocado para o Itamaraty, segundo alguns diplomatas, Marco Aurélio não precisaria mais de “intermediários” para fazer política externa.

Marco Aurélio diz que Dilma não pretende abortar a tentativa do Brasil de negociar com o Irã nem a desajeitada oferta de mediar o conflito entre palestinos e israelenses. Ele projeta como eixo da política externa de Dilma o fortalecimento das relações com a América Latina. A promessa é fechar acordos binacionais e tocar obras para uma maior integração, principalmente nas áreas de transporte e energia. Está prevista uma estrada que ligará o Chile ao Rio Grande do Sul. Outra proposta é criar, com a Bolívia, uma empresa binacional para gerar e distribuir energia elétrica, nos mesmos moldes de Itaipu, a hidrelétrica administrada em parceria com o Paraguai. “É um verdadeiro PAC sul-americano”, diz Marco Aurélio, numa alusão ao programa nacional de obras seguidamente propagandeado por Lula e Dilma.

No discurso, tudo bem. Mas a promessa de relação mais próxima será cobrada rapidamente pelos líderes vizinhos, que vinham se sentindo desprestigiados em detrimento de outras incursões diplomáticas de Lula. Ainda há outros pontos de política externa sobre os quais tanto Dilma quanto Serra pouco se debruçaram. O ex-embaixador Barbosa afirma que o próximo presidente tem de dar mais atenção ao comércio exterior. “Não vi nenhuma proposta para centralizar as políticas de governo para o setor exportador”, diz. Presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, ele sugere que a Câmara de Comércio Exterior, órgão atualmente vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, responda diretamente à Presidência. A campanha de Dilma fala em reforçar os negócios com os países africanos. É uma tendência já observada no mandato de Lula, a ponto de o chanceler Celso Amorim ter justificado com a frase “negócios são negócios” o encontro do presidente com Teodoro Mbasogo, acusado de violar direitos humanos em Guiné Equatorial, país rico em petróleo. Marco Aurélio diz que Dilma não “desprezará” parceiros como EUA e União Europeia.


A “diplomacia presidencial” de Lula, apoiada no carisma, fez da política externa uma controvérsia pública

Nenhum candidato tem, hoje, o carisma de Lula para tocar uma “diplomacia presidencial”. É provável que o futuro presidente tenha de assimilar o funcionamento da política externa nos meandros do Itamaraty. Dilma teria mais facilidade. A ascensão de Lula levou antigos diplomatas a se afastar do ministério. É o caso de Roberto Abdenur, ex-embaixador em Washington, ou Marcos Azambuja, ex-secretário-geral do Itamaraty. O chanceler Celso Amorim e o ex-secretário-geral Samuel Pinheiro (que deixou o cargo no ano passado, por ter completado 70 anos, limite para aposentadoria) sempre foram simpáticos ao envolvimento do Brasil em assuntos outrora distantes para nossa diplomacia, ainda que isso afronte parceiros como os EUA.

Tal concepção foi construída sem que houvesse um foco de resistência claro dentro do ministério, seja porque os diplomatas se adaptaram à nova realidade ou porque preferiram não arriscar sua carreira com desgastes internos. Mas isso não quer dizer que não haja discordância interna quanto às recentes posições do Itamaraty. Boa parte dos diplomatas lotados em Brasília viu como um erro o apoio dado ao presidente deposto Manuel Zelaya em Honduras. No caso do Irã, as opiniões se dividiram entre os que prezaram a busca pelo diálogo e os que entenderam a movimentação brasileira apenas como um ato de megalomania. O nível de satisfação do corpo diplomático varia muito de acordo com os interesses pessoais: quem lidava com os países africanos antes de Lula certamente se sentiu valorizado, assim como quem era responsável, nos anos de FHC, pela negociação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) – abandonada pelo PT – perdeu espaço na gestão atual.

A condução da diplomacia por Lula, embora bastante contestada, teve o mérito de colocar a política externa num nível de discussão que não se conhecia no Brasil. “Aquele isolamento do Itamaraty não existe mais. O debate ganhou mais corpo na opinião pública”, diz Amaury. Transformar esse interesse crescente em ganhos concretos para o Brasil será o maior desafio de quem assumir o Planalto a partir de janeiro.

sábado, 21 de agosto de 2010

Debate sobre a Politica Externa - Revista Epoca

O papel da política externa
Da Redação
Revista Época, Sábado, 21 de agosto de 2010

O Brasil entrou na década de 2000 com uma indiscutível liderança dentro da América do Sul. Em 2002, veio a candidatura à Presidência de Luiz Inácio Lula da Silva, cujo programa de governo falava em reforçar os laços diplomáticos com nossos vizinhos, mas também se referia à política externa como “indispensável para garantir a presença soberana do Brasil no mundo”. Com Lula eleito, a diplomacia ganhou novos contornos.

O presidente passou a usar seu carisma para tentar ampliar a voz do Brasil em organismos multilaterais. Beneficiado pelo bom momento econômico do país, Lula conseguiu atrair a atenção de líderes mundiais. Em abril do ano passado, durante a reunião do G20 em Londres, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, se dirigiu a ele com a frase “Este é o cara!”, que acabou se tornando um símbolo do prestígio internacional obtido pelo Brasil nos últimos anos.
Pool Kirsty Wigglesworth
PRESTIGIADO
O presidente Lula sentado ao lado da rainha britânica, Elizabeth II, e à frente do presidente americano, Barack Obama, durante a reunião do G2), em 2009. O Brasil tenta se consolidar entre os grandes da diplomacia mundial

O “ativismo diplomático” do governo Lula também recebeu críticas da comunidade internacional. Os EUA discordaram do abrigo dado pela embaixada brasileira em Honduras ao presidente deposto Manuel Zelaya, o que teria alongado a crise institucional naquele país. Os americanos e outras potências ocidentais, como França e Reino Unido, também ficaram contrariados com a ideia de Lula de se apresentar como mediador do conflito árabe-israelense e, mais recentemente, com a resistência de nossa diplomacia em relação a sanções contra o programa nuclear do Irã. Diante disso, como o próximo presidente deve equilibrar o protagonismo crescente do Brasil e a convivência com antigas potências diplomáticas? Que parâmetros a política externa brasileira deve seguir nos próximos quatro anos? Essas perguntas estarão em pauta no quarto ÉPOCA Debate 2010, que aborda os temas mais importantes na agenda dos candidatos à Presidência da República. A discussão, aberta à participação de leitores, será no dia 31 de agosto, às 16h30, no auditório da Editora Globo, em São Paulo. Os convidados para este ÉPOCA Debate – Política Externa são Samuel Pinheiro Guimarães, ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência e ex-secretário-geral do Itamaraty; Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Londres e Washington; e Amaury de Souza, cientista político e autor do livro A agenda internacional do Brasil: a política externa brasileira de FHC a Lula.

Os três primeiros debates foram sobre Justiça e segurança pública, educação e saúde. O quinto e último será sobre o papel do Estado. Todos serão gravados e estarão disponíveis em epoca.com.br. As inscrições podem ser feitas pelo telefone (11) 3767-7325 begin_of_the_skype_highlighting (11) 3767-7325 end_of_the_skype_highlighting ou por meio de um formulário em epoca.com.br/inscricao.

ÉPOCA DEBATE
* Política Externa
* Participação
* - Samuel Pinheiro Guimarães
* Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência
* - Rubens Barbosa
* Ex-embaixador do Brasil em Londres e Washington
* - Amaury de Souza
* Cientista político e autor do livro A agência internacional do Brasil

* Data: 31 de agosto (terça-feira)
* Horário: 16h30
* Local Editora Globo
* Endereço Av. Jaguaré, 1485, 7ºandar, São Paulo, SP
* Inscrições: tel. (11)3767-7325 begin_of_the_skype_highlighting (11)3767-7325 end_of_the_skype_highlighting ou pelo site epoca.com.br/inscricao

* (As inscrições serão feitas até o limite de vagas do auditório que tem capacidade para 92 pessoas.)