Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
How unreal can things get? As the sense of shared reality is eroded, more with each passing day, one wonders. Writing on the relationship between truth and politics in this magazine, fifty-one years ago, Hannah Arendt noted just how vulnerable factual truth is, using the example of “the role during the Russian Revolution of a man by the name of Trotsky, who appears in none of the Soviet Russian history books.” Thirty years after Arendt published her article, a British collector and historian of Russia, David King, published a study in the form of a photo album—a study of the disappearance of the physical record of Trotsky and a number of other Russians who fell out of favor, and out of history, during the Stalin era.
The book is called “The Commissar Vanishes.” The title is, incongruously, literal. Its specific reference is to a photograph, from 1919, of a second-anniversary celebration of the October Revolution. In the picture, Vladimir Lenin stands at the top of a set of stairs, surrounded by many unidentified men and children and a few recognizable men, including Leon Trotsky, stationed just in front of Lenin. By the time the photograph was published, in 1967, Trotsky had disappeared: he had been airbrushed out, along with several other commissars.
Sometimes it is impossible to tell just who is missing from a photograph—only that someone is. One photograph in King’s collection shows a propaganda train—a train that crisscrossed the country spreading the message of the revolution. “When we look closely at the window on the right of the photograph,” King writes, “a ghostly apparition—the result of the retoucher’s inept hand—is all that remains of the person who had been looking out of the carriage.” We don’t know who is missing or why—only that someone has been elided. We are lucky even to know that there is something we don’t know.
There is so much more that we don’t know about Stalinist terror—we are no closer today to knowing how many people were killed than we were one, two, or five decades ago. Earlier this month, news came that the F.S.B., the successor agency to the K.G.B., is destroying secret-police records from the terror era; that means that we are unlikely ever to form a significantly more complete picture than the one we have now.
Many of the photographs in King’s collection showcase falsification by commission rather than omission. There is the iconic photograph of Stalin and the masses, in which the image of Stalin is blatantly pasted in, and the masses, less noticeably, are composed of several repeating fragments of crowd. There are the movie stills of the 1905 Russian uprising and the pictures of the storming of the Winter Palace, in 1917—in fact, the images depict historical reënactments that were used as though they were documentary photographs. And there are the enduring myths that underlie the images. Much of the absence of documentary evidence of the Soviet regime—the destruction of personal archives and printed books alike—was a result of citizens’ fear that their neighbors or acquaintances might report them to the authorities. We have since learned that the role of such denunciations during the terror was relatively minor: people were arrested to fill specific quotas; the arrests were essentially random and not, as many have long assumed, the result of reports. But the myth persists, and so does its product—the visuals that have been destroyed can rarely be restored.
Compared to the intentional, crude, and pervasive altering of the Soviet record, the lying currently prevalent in American politics is amateur hour, if not exactly child’s play. President Donald Trump’s routine alterations of the historical narrative, which seem to stem in equal measure from ignorance and ill intent, are ridiculed by the media even as the media reproduces them. Photographs often serve as the corrective to his distortions—as, for example, with his insistence that he had the biggest Inauguration crowd in history. Still, there can be no doubt that Trump is waging an all-out war on the media, the historical record, and the truth in general. In her 1967 essay, Arendt issued a warning:
“The chances of factual truth surviving the onslaught of power are very slim indeed; it is always in danger of being maneuvered out of the world not only for a time but, potentially, forever. Facts and events are infinitely more fragile things than axioms, discoveries, theories—even the most wildly speculative ones—produced by the human mind; they occur in the field of the ever-changing affairs of men, in whose flux there is nothing more permanent than the admittedly relative permanence of the human mind’s structure. Once they are lost, no rational effort will ever bring them back.”
Recebo, de um leitor de um dos meus textos, citado nele, uma mensagem que reproduzo a seguir:
" On Thursday, June 19, 2008, at 03:03PM, "Pedro Maciel - Maciel Neto Advogados" wrote:
Caro Professor Paulo Roberto, Recebi de um aluno uma cópia do sue artigo "A RESISTÍVEL DECADÊNCIA DO MARXISMO..." publicado na Revista Espaço Acadêmico - No. 106 - Março de 2010, p. 131/138. Fiquei honrado de servir de nota de rodapé (p. 133). Gostei do artigo, ele é honesto sob ponto de vista que defende. Lamento não ter sido claro quando escrevi que"...o capitalismo, sua lógica, seus principais operadores e seus estafetas foram abalados com a possibilidade de novos sistemas... com a participação da classe trabalhadora,"eu me referi nesse ponto do artigo à contra-revolução (ou guerra civil) financiada pela França, Japão e Inglaterra, fato que manteve a Russia em guerra de 1.917/1.921. Abraços, Pedro Maciel Pedro Benedito Maciel Neto MACIEL NETO ADVOGADOS E CONSULTORES "
Bem, constato, em primeiro lugar, que o meu interlocutor, a despeito de ser um curioso marxista que combina seu pertencimento ao PCdoB -- um partido teoricamente maoista -- com a sua admiração por Trotsky -- um marxista aderente tardio ao bolchevismo, e que era execrado por stalinistas e maoistas -- é um advogado numa sociedade capitalista, o que pode representar alguns problemas de consciência. Constato, em segundo lugar, que ele corrige a frase que eu citei num ponto fundamental, pois seu argumento atual modifica completamente o sentido da frase que tinha sido colocada em seu artigo original -- citado em meu texto, que já informo onde encontrar --, que pretendia fazer o capitalismo tremer de medo em face da gloriosa revolução proletária e campesina (sic) ocorrida na Rússia em 1917 (outubro, frise-se bem, não fevereiro, como seria o mais correto, pois em outubro ocorreu um putsch, não uma revolução), quando ele pretende agora falar da guerra civil de 1917-1921, quando bolcheviques e anti-bolcheviques (apoiados pela Grã-Bretanha, França e Japão) se enfrentaram numa terrível guerra civil, durante a qual Trotsky empregou ao mais alto grau as armas do terror, justamente.
O que se segue é um debate essencialmente histórico (ou seja, uma mensagem resposta, da minha parte, enviada diretamente ao e-mail do maoista-trotsquista-advogado) em torno deste meu artigo:
Paulo Roberto de Almeida: "A resistível decadência do marxismo teórico e do socialismo prático: um balanço objetivo e algumas considerações subjetivas" Revista Espaço Acadêmico (vol. 9, nº 106, Março de 2010, p. 131-138) neste link.
Bem, sem mais delongas, reproduzo a seguir o que respondi ao advogado de Trotsky:
Pedro, Agradeço pelo seu esclarecimento quanto ao contexto de 1917-21, agora de modo mais claro, mas eu teria então um comentário adicional. Não creio que a intervenção protagonizada por algumas potências ocidentais (basicamente GB e França) e o Japão, no contexto da revolução russa de 1917, possa ser enquadrada no conceito de"capitalismo", que como você deve saber, não tem um centro coordenador ou um Estado-Maior centralizador de operações (ainda que muitos partilhem dessa visão conspiratória da História).
Essas intervenções, em grande parte indiretas (ou seja, em apoio aos exércitos "brancos" dos aristocratas ou contra-revolucionários, ou se quisermos ser mais honestos com a verdade, dos anti-bolcheviques) se deram no contexto da guerra contra a Alemanha, com a qual a Russia bolchevique negociou um armistício (em detrimento das alianças feitas pela Russia czarista com essas potências, que estavam mais ou menos sendo honradas pelo governo saido de Fevereiro, entre outros por Kerensky). Como voce deve saber, como trostquista que é, o negociador desse desastroso armísticio (que determinou grandes perdas territoriais) foi Leon Trotsky, entao comissario do povo para assuntos exteriores, com a complacência mais ou menos inconsciente de Lenin (que tinha sua dívida a pagar com a Alemanha do Kaiser, em função do trem blindado). Em outras palavras, foram consideracoes de natureza estratégica e de ordem tatica no terreno (pois o armisticio liberava as forcas alemas para atacar em massa na frente ocidental) que levaram as potencias a intervir, e nao, prioritariamente, essas consideracoes de ordem economica ou social que você coloca. No meio de uma guerra, e com as economias capitalistas ocidentais largamente dominadas pela intervencao estatal, a preocupacao quanto ao sistema economica estava em baixa escala de prioridades entre os dirigentes ocidentais que determinaram as intervencoes, ainda que entre eles figurassem anticomunistas de carteirinha, como o proprio Winston Churchill, que tinha sido Lorde do Almirantado. Ou seja, o capitalismo ocidental nao apenas nao foi abalado, como sequer se preocupou com o putsch bolchevique, se é que o capitalismo tenha tido um "cérebro", como se deduz de sua argumentação. Alias, a possibilidade de que o capitalismo possa ter sido abalado com o surgimento de um novo sistema de ambito mundial me parece, como diria Mark Twain, francamente exagerada... Creio que certos marxistas (eu também me incluo na categoria, mas não sou religioso como grande parte dos cultores da crença) deveriam parar de atribuir ao capitalismo essas caracteristicas imanentes que fazem dele uma entidade organizadora do mundo, o que constitui, precisamente, uma das grandes mistificações sociológicas do marxismo vulgar. Quanto ao resto, um pouco de conhecimento de história, também ajudaria bastante na arguemntação em torno da Revolução Russa. A caracterização fantástica desse golpe bolchevique como uma revolução operária e campesina, como você escreve, é o primeiro mito que caberia desmantelar para um debate consequente em torno da revolução russa. Você parece comprar inteiramente a versão trotsquista e soviética desse processo, e se exime de consultar historiadores "burgueses" (mas sérios) que escreveram sobre o mesmo fenômeno, o que faz com que a maior parte da literatura dita marxista em torno desse fenômeno gira em circulos em torno dos mitos construídos pelos próprios defensores ideológicos e políticos dessa visão do mundo. Uma história honesta e completa seria bem mais matizada quanto aos golpes, contra-golpes e processos reais que se desenvolveram na Russia. Vocês fazem exatamente como o Vaticano: constroem uma história e se atem a certos dogmas, como se isso pudesse ser um substituto da pesquisa histórica real. Em todo caso, grato pelo diálogo ---------------------- Paulo Roberto de Almeida (Brasilia, 19.03.2010)