O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

Mostrando postagens com marcador crítica à diplomacia brasileira. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador crítica à diplomacia brasileira. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 25 de julho de 2014

De anoes e de gigantes, e de subs dos subs dos subs (bota sub nisso) - Israel-Palestina, encore...


O assessor para Assuntos Internacionais da presidente Dilma Rousseff disse que o Brasil"não busca a 'relevância' que a chancelaria israelense tem ganhado nos últimos anos". Em artigo para o "Opera Mundi", Marco Aurélio Garcia rebateu a declaração do porta-voz da chancelaria israelense, Yigal Palmor, de que o Brasil seria "irrelevante politicamente". Para Marco Aurélio, o Brasil busca "menos ainda a 'relevância' militar que está sendo exibida vis-à-vis populações indefesas".

Na quarta (23), o Itamaraty divulgou uma nota condenando Israel pelo número elevado de mortes de civis no conflito na faixa de Gaza, sem fazer menção ao Hamas, o que provocou a declaração de Palmor e uma nota de condenação do Ministério das Relações Exteriores de Israel.

"Como temos posições claras sobre a situação do Oriente Médio -reconhecimento do direito de Israel e Palestina a viverem em paz e segurança- temos sido igualmente claros na condenação de toda ação terrorista, parta ela de grupos fundamentalistas ou de organizações estatais", diz Marco Aurélio.

O assessor diz também que os palestinos vivem em situação de "virtual apartheid" e que o conflito entre Hamas e Israel é de "alcance global" porque "ameaça a paz mundial".

Marco Aurélio Garcia disse ser "preocupante que os acontecimentos atuais na Palestina sirvam de estímulo para intoleráveis manifestações antissemitas, como têm ocorrido em algumas partes, felizmente não aqui no Brasil".

Ele relembra ainda o Holocausto e diz que "antissemitismo não pode ser um álibi que justifique o massacre atual na Faixa de Gaza".

Comentário de Israel foi de 'sub do sub do sub do sub', diz assessor de Dilma

FLÁVIA FOREQUE

Folha de S. Paulo, 24/07/2014


O assessor da Presidência da República para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, minimizou as declarações de porta-voz de Israel, que qualificou o Brasil como "um anão diplomático" e lembrou o desempenho da seleção na Copa do Mundo.

Em entrevista ao Jornal Nacional, Yigal Palmor afirmou que "desproporcional" é perder de 7 a 1, em referência ao jogo entre Brasil e Alemanha. A mesma palavra havia sido utilizada em nota do Itamaraty sobre o uso da força por Israel contra palestinos.

Questionado nesta sexta-feira (25) sobre as declarações do porta-voz, Marco Aurélio Garcia afirmou a jornalistas que não iria comentar. "Ele é um sub do sub do sub do sub", disse. Perguntado se as declarações foram deselegantes, respondeu: "Não sou especialista em elegância".

Ainda ontem, o chanceler Luiz Alberto Figueiredo buscou acalmar os ânimos. "Nós jamais contestamos o direito de Israel de se defender, o que contestamos é a desproporcionalidade", afirmou.

O impasse teve início após o Itamaraty divulgar nota apontando como "inaceitável a escalada de violência entre Israel e Palestina". Não há menção a ataques palestinos, ao contrário de manifestações anteriores.

quinta-feira, 27 de março de 2014

Politica externa do Brasil, 2 (do Brasil?) - Francisco Seixas da Costa

O que antecipei em comentário ao post anterior, sobre a confusão entre Brasil e diplomacia partidária, vale também para este artigo do embaixador Seixas da Costa, meu amigo e colega blogueiro.
Mas, antecipo igualmente que tendo muito mais a concordar com o sentido geral dos seus argumentos, que partilho, em geral -- com exceção da distinção acima apontada -- do que com o artigo anterior, de uma acadêmica brasileira.
Este artigo de um autor experiente tem uma lógica intrínseca (ainda que ele seja comedido em suas observações) que falta ao artigo anterior, que "comprou" muita "fumaça" do governo brasileiro, sem verificar onde estava a separação entre a publicidade e a realidade...
Repito, para ficar claro: não se trata da diplomacia do Brasil, mas de um grupo político. No resto, pode-se concordar com o embaixador em muitas coisas.
Paulo Roberto de Almeida

Francisco Seixas da Costa
26/03/2014

O "Público" insere hoje um artigo de Adriana Erthal Abdenur sobre a política externa brasileira, que julgo deveria merecer alguma reflexão. Nesse texto, é sublinhado que o Brasil se afasta cada vez mais de uma agenda "ocidental", de que o caso mais recente é a sua rejeição das sanções à Rússia, por virtude da intervenção na Crimeia. Essa posição, na perspetiva da articulista, culminaria uma deriva "sulista" que, cada vez mais, marca a agenda do Itamaraty.

Há muitos anos que reflito sobre isto e digo aos meus amigos brasileiros que eles estão a cumular dois obstáculos à sua mais do que justa reivindicação para acederem a um lugar de membro permanente do Conselho de Segurança da ONU.

O primeiro obstáculo vem dos países do Norte. O alargamento do CSNU a novos países do Sul (consideremos "do Sul" a China e a Rússia) só poderá ter lugar se e quando tal inclusão se fizer de molde a não desequilibrar o atual sentido tendencial de voto no seio do Conselho. Para ser mais claro: só entrará para o CSNU um país do Sul que, no limite, dê garantias sólidas de que manterá uma orientação pelo menos neutral face à conjugação "ocidental" de interesses representada pelos EUA, Reino Unido e França. É injusto? É, mas é assim. Ora, a "excessiva" coreografia da diplomacia brasileira, que já deu sinais "negativos" quanto à questão nuclear no Irão e agora se indicia crítica na sensível questão ucraniana, funciona em claro desfavor das ambições do Brasil.

Mas o Brasil tem também "amigos de Peniche" nos restantes membros do Conselho. Rússia e China estão muito pouco interessados em deixar de ser os únicos a "representar" o Sul neste âmbito, com tudo o que significa de influência junto do "grupo dos 77" - para simplificar, os antigos "países não alinhados". Moscovo pode ter ficado grata com o gesto de Brasília, mas isso nem sequer lhe garante a boa vontade de Pequim. Talvez antes pelo contrário.

Não obstante o esforço voluntarista feito na elevação da sua voz diplomática um pouco por todo o mundo, o trabalho notável na Organização Mundial de Comércio e outras agências multilaterais, a sua constante atenção às operações de paz da ONU, o seu cuidado com as diversas agendas regionais (América do Sul, mas também Médio Oriente e outras), creio que o Brasil tem hoje à sua frente alguns obstáculos sérios nesse seu objetivo de ganhar a consagração institucional suprema à escala global. 

Um amigo diplomata brasileiro, muito crítico da atual linha política, dizia-me, já há anos, que o Brasil mantinha uma "diplomacia adolescente" - pela sua excessiva ambição, pela sua frequente precipitação, pela ânsia de pretender "ir a todas". Ele era capaz de ter alguma razão, embora eu considere que a "juventude" não é nada que se não cure com o tempo.


E, já agora, uma nota de sentido egoísta: Portugal tem tudo a ganhar e nada a perder com uma "subida" do Brasil na escala global das nações. Um dia posso explicar isto com mais pormenor, mas parece-me uma evidência.

sábado, 15 de março de 2014

Diplomacia brasileira: o grande retrocesso - Matias Spektor (Epoca)

Matias Spektor: "É um tapa na cara do Brasil"

Para o analista, a escalada autoritária do chavismo na Venezuela ameaça o projeto de integração na América do Sul. E o governo brasileiro silencia perigosamente

LEANDRO LOYOLA
Revista Época, 14/03/2014 21h05

Desde o ano passado, Matias Spektor trocou a vida de professor de relações internacionais da Fundação Getulio Vargas, no Rio de Janeiro, pela labuta de escritor numa casinha em Hampstead, Londres. Spektor aproveitou a cátedra Rio Branco, que ocupa no King’s College, para se afastar da rotina e terminar 18 dias:  quando Lula e FHC se uniram para conquistar o apoio de George W. Bush, seu terceiro livro, previsto para julho. Nele, Matias conta como Lula e FHCtrabalharam juntos em 2002 para debelar uma das mais graves crises internacionais que o Brasil enfrentou. “Os republicanos achavam que Lula criaria um Eixo do Mal na América Latina”, diz. “Conto como Fernando Henrique e Lula fizeram uma operação exitosa – Bush não só abriu as portas da Casa Branca, como aproximou o PT dos Estados Unidos.” Para fazer o livro, Spektor pesquisou documentos secretos e entrevistou os dois ex-presidentes brasileiros, além da ex-secretária de Estado Condoleeza Rice. Na semana passada, ele deixou a história de lado para falar com ÉPOCA sobre a política externa brasileira.
ÉPOCA – É um pouco difícil lembrar que Lula e Fernando Henrique trabalharam juntos em 2002.
Matias Spektor –
 Isso é uma das coisas que a gente precisa recuperar da história. É um período em que havia uma crise real de política externa, de imagem externa do Brasil, que precisava ser resolvida. A maneira de resolvê-la foi pegar as duas forças políticas do Brasil e uni-las – e, quando eles trabalham juntos, ninguém segura. Parte do problema de nossa política externa hoje é que a polarização (PT-PSDB) é tão intensa que o Brasil não tem capacidade de barganha – como no caso da Venezuela.
ÉPOCA – Por que o senhor afirma que o Brasil não tem capacidade de barganha na crise na Venezuela?
Spektor –
 Num ano em que o grande drama nacional é a eleição de outubro, a Venezuela virou tema de política eleitoral no Brasil. Nos últimos dias houve artigos do Fernando Henrique e do (senadorAécio (Neves, pré-candidato ao PSDB à Presidência) criticando frontalmente a política da (presidenteDilma (Rousseff) para a Venezuela. Da mesma maneira, o PT pretende enviar o (presidente do partidoRui Falcão a Caracas. Isso significa que o tema está partidarizado. O impacto disso sobre a política externa é engessar o Palácio do Planalto. Dilma está numa sinuca de bico. Se quiser dar uma dura em (NicolásMaduro (presidente da Venezuela), isso será visto dentro do embate político partidário como um recuo do governo. É uma situação péssima, porque a lógica de nossa política regional sempre deve ser ter o maior número de opções à mesa. Lula escapou disso. Fernando Henrique também escapou. Quando houve a tentativa de golpe contra Chávez em 2002, Fernando Henrique saiu em defesa de Chávez e mandou petroleiros para quebrar a greve da PDVSA contra ele.
ÉPOCA – Como o governo Dilma ficou nessa situação?
Spektor –
 Desde o início se colocou com uma das partes do conflito, e fez vista grossa para os abusos que o chavismo vem cometendo. O Brasil perdeu espaço de manobra. Você só tem espaço de manobra se é visto por todas as partes em disputa como interlocutor legítimo. Dilma mandou Marco Aurélio (Garcia, assessor da Presidência) a Caracas e Rui Falcão vai a Caracas. Na semana passada, o Itamaraty recebeu a visita de Elías Jaua, o chanceler venezuelano. Em nenhuma dessas instâncias uma autoridade brasileira se encontrou com uma liderança de oposição venezuelana. Compare com o Lula: antes de assumir, ele mandou Marco Aurélio a Caracas. Ele encontrou primeiro Chávez, depois a oposição. Era para aumentar o leque de opções de Lula.
ÉPOCA – Até agora, o Brasil se calou sobre a Venezuela. Apenas assinou um comunicado do Mercosul, redigido pela própria Venezuela. Foi um erro?
Spektor –
 Sem dúvida. Penso em três motivos. O primeiro é que o chavismo está testando seus limites – e tem ficado cada vez mais autocrático e autoritário. Uma escalada autoritária em nossa vizinhança é um tapa na cara do projeto brasileiro de integração regional. O segundo motivo: ou o chavismo faz reformas no modelo de gestão da economia, ou a economia vai para o brejo – e, se a economia for para o brejo, os interesses econômicos brasileiros sofrerão e botarão pressão no Planalto. O terceiro motivo – e desse quase ninguém fala no Brasil, mas para mim é dos mais importantes: a cada dia o chavismo parece menos uma alternativa de esquerda democrática. Os ganhos que o chavismo trouxe para os venezuelanos mais pobres estão ameaçados pela desordem da economia e desse modelo político cada vez mais autoritário. A gente tem visto repressão até em bairros pobres na Venezuela, (com) milícias mandadas pelo próprio presidente. Apesar de ser a chefe de Estado mais poderosa da América do Sul, Dilma se nega a emitir uma mensagem ao chavismo sobre aquilo que é tolerável. Pelo contrário: a diplomacia brasileira tem dado apoio a um governo que já perdeu os próprios limites. Não dizer nada é uma irresponsabilidade. Não existe uma percepção clara de que o desfecho da crise venezuelana definirá o futuro do projeto brasileiro de integração. Essa é a maior crise internacional que o Brasil enfrenta nos últimos anos.
ÉPOCA – Por que o Brasil trabalhou contra o envio de uma missão da OEA à Venezuela?
Spektor –
 Existe uma percepção de que a OEA (Organização dos Estados Americanos) é um organismo dominado pelos Estados Unidos e também a percepção de que os Estados Unidos têm interesse na derrubada do governo democraticamente eleito de Maduro. É possível pensar no argumento contrário. Foi o que Lula fez na última grave crise do chavismo, em 2003. Em abril de 2002, houve uma tentativa de golpe contra Chávez com apoio americano, e a maneira que Lula achou de ajudar a tirar o país da crise foi trazer os Estados Unidos para a mesa.
ÉPOCA – Como está a relação do Brasil com os Estados Unidos hoje?
Spektor –
 A relação viveu um pico muito positivo nos governos Lula e Bush. De lá para cá, degringolou para nunca mais decolar, apesar de tentativas sinceras. Tanto Dilma quanto Obama tentaram desde o início fazer a relação dar certo. Isso não foi possível. O escândalo de espionagem (as acusações contra a agência americana NSA de espinonar a presidente Dilma Rousseff) eliminou as condições para que houvesse uma restauração do relacionamento. Não há nenhuma condição política de isso acontecer antes das eleições de outubro. O desafio, no entanto, me parece claro: a relação com Washington é importante porque afeta em cheio a capacidade de o governo brasileiro fazer política pública em casa. Lula entendia isso perfeitamente, Fernando Henrique entendia isso perfeitamente. A gente precisará restaurar esse relacionamento, principalmente num sistema econômico internacional que ficou mais duro e difícil para o Brasil. Nossa assimetria de poder com os Estados Unidos é enorme – eles são muito mais poderosos que nós. Quem perde ao não falar somos nós. Precisamos encontrar uma fórmula de convivência.
ÉPOCA – Os governos Lula e Dilma expandiram a presença brasileira na África e investiram quase US$ 1 bilhão na construção do Porto de Mariel, emCuba. O Brasil terá vantagens nisso?
Spektor –
 O Brasil se beneficiou enormemente do investimento na África. Agora, essa abertura foi feita sem sustentabilidade. Temos embaixadas vazias, que só existem no papel, nossa política de cooperação para o desenvolvimento é desastrada. Em relação ao Porto de Mariel, é claro que interessa ao Brasil estar em Mariel! O Porto de Mariel em pouco tempo virará um polo importantíssimo das Américas. Facilita a entrada no maior mercado do mundo, o americano e, do ponto de vista político, ajuda Cuba a fazer uma transição entre o regime castrista e o que virá depois, driblando o embargo americano.
ÉPOCA – Há dez anos o Brasil lidera uma força militar das Nações Unidas no Haiti, é reconhecido como uma potência econômica, mas tem pouca presença na política internacional. O Brasil demonstra interesse em ser um grande jogador na geopolítica?
Spektor –
 Para um país com pretensões a uma cadeira permanente (no Conselho de Segurança da ONU), o Brasil é um país muito pouco ativo. Isso é reflexo de algo importantíssimo na política externa brasileira: a aversão ao risco. Uma marca registrada de Lula e Celso Amorim era a disposição em assumir riscos. Isso é muito raro na história do Brasil. Lula teve uma posição doméstica de muita força para fazer política externa. Dilma não tem um ambiente internacional favorável para isso. A ideia do Brasil como potência emergente saiu do comentário internacional. Estamos voltando ao nosso hábitat natural, a política externa avessa ao risco.

quinta-feira, 13 de março de 2014

Venezuela, Brasil e Unasul - Coisas Internacionais


Coisas Internacionais, 13 Mar 2014 07:06 AM PDT

Os observadores da Política Externa Brasileira costumam apontar para realidade que para alguns é incomoda de que o Itaramaty perdeu espaço na formulação de política externa para questões sul-americanas, que estariam sob atenção direta do Palácio do Planalto, mais precisamente sob coordenação de Marco Aurélio Garcia. E isso se faz sentir no modo como o Brasil atua nesse continente.
A Venezuela cresceu em importância econômica para o Brasil desde o governo Lula, investimentos brasileiros fluíram para o país de Bolívar, mas o modo errático de administração econômica dos bolivarianos exige dos exportadores brasileiros doses cavalares de paciência e de navegar os tortuosos caminhos palacianos para conseguirem liberar seus pagamentos. Não é difícil imaginar que um procedimento pouco ortodoxo como esse esteja aberto a arbitrariedades e as famosas “vendas de soluções”. Mas, quem faz negócios com a Venezuela e for diligente já estava sabendo que interagiria num sistema altamente personalista.
A crise é grave e contabiliza mortos e cenas dantescas de milicianos abrindo fogo contra estudantes universitários, mas ao que parece para o Assessor Especial da Presidência, Marco Aurélio esses acontecimentos são apenas “valorização midíatica”.
Em reportagem da BBC Brasil uma teoria adicional sobre o silêncio brasileiro, que seria fruto de pragmatismo comercial, ou seja, evitaríamos comentários ostensivos quanto a situação da Venezuela e assim garantiríamos que exportadores e, principalmente, empreiteiras recebessem seus pagamentos, que são vultosos.
Já escrevi aqui sobre essa crise alertando que ela escancara a ilusão que é a noção de liderança brasileira, que os acadêmicos de RI tanto gostam. Resgato agora um trecho:
Ora, se o governo brasileiro quer mesmo ter papel de liderança no continente não pode se omitir, não pode deixar de condenar a violência dos manifestantes e dos agentes do governo, deveria fazer gestões para que o opositor preso responda processo em liberdade, o que acalmaria um pouco as ruas e pediria comedimento por parte do regime na resposta as manifestações e mais articularia uma missão da UNASUL ou MERCOSUL até a Venezuela para avaliar melhor a situação e para ajudar na negociação do fim da crise. Ações práticas demonstram liderança.
Inevitável é o questionamento de quanto da ação vacilante do governo deriva da simpatia ideológica e o quanto deriva de um quadro de análise política sobre a mensagem que isso passaria aos manifestantes nacionais, que prometem infernizar o governo durante a Copa do Mundo FIFA Brasil 2014.
Pode um líder ser tão vacilante? Cabeças devem estar fervendo no belo palácio dos arcos atormentadas por essas questões, como diria o Barão do Rio Branco, Política Externa é projetar uma certa imagem de Brasil e nesse caso é uma parcial a favor de regimes de mesma matiz ideológica e vacilante quanto a própria capacidade de intermediar crises regionais. É esse um quadro acurado?
Adiciono uma pergunta as que fiz acima. Um verdadeiro líder regional se abstém de influir positivamente para a solução pacífica de uma crise que ceifa vidas humanas e com potencial de tornar ainda mais forte a marca Brasil na região por medo de ser alvo de calote ou de represálias?
A UNASUL parece que finalmente se convenceu da necessidade de alguma ação de mediação, e votou pela criação de um Conselho de Chanceleres para acompanhar a questão que para ser efetivo deve oferecer Bons Ofícios para que os lados alcancem algum tipo de solução que cesse a violência. Embora, a nota divulgada, com o diplomatiquês de sempre não seja auspiciosa nesse sentido.

domingo, 2 de março de 2014

Stanislaw Ponte Preta, again, and again - revista Veja

Dilma toca o samba da diplomacia doida
Em Bruxelas, a presidente demonstra o que os europeus podem esperar do Brasil em relação a um acordo comercial: frases sem nexo e um mundo fantasioso
Duda Teixeira

Dilma Rousseff discursa na VII Cúpula entre Brasil e União Europeia, em Bruxelas: pobre do tradutor simultâneo 

Cinco frases sem sentido do discurso de Dilma:
"A Zona Franca de Manaus, ela está numa região. Ela é o centro dela porque ela é a capital da Amazônia."
"Ela (Zona Franca) evita o desmatamento, que é altamente lucrativo — derrubar árvores plantadas pela natureza é altamente lucrativo."
"Os homens não são virtuosos, ou seja, nós não podemos exigir da humanidade a virtude, porque ela não é virtuosa, mas alguns homens e mulheres são, e por isso é que as instituições têm que ser virtuosas."
"Queria destacar a importância da ligação entre o Brasil e a Europa por cabos de fibra óptica submarinos. A ligação com a Europa significa uma diversificação das conexões que o Brasil tem com o resto do mundo."
"Nós consideramos como estratégica essa relação, até por isso fizemos essa parceria estratégica."

"Este é o samba do crioulo doido." Assim começa a música de Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta (1923-1968), sobre um certo compositor que obedecia ao regulamento e só fazia canções sobre a história do Brasil. Quando escolheram um tema complicado, a “atual conjuntura”, o compositor endoidou. Tiradentes falou com Anchieta, aliou-se a dom Pedro e da união deles foi proclamada a escravidão. Na diversão do Carnaval, a ausência da lógica garante a alegria dos foliões que querem distância de qualquer assunto chato. Em reuniões diplomáticas internacionais, porém, é um desastre quando um governante toma esse tipo de liberdade com o idioma, com a história, a geografia e a lógica. Em seu discurso na segun­da-feira 24, na VII Cúpula Brasil-Europa, em Bruxelas, a presidente Dilma Rousseff protagonizou um desses momentos constrangedores para ela e, como representante do Brasil, para todos os brasileiros. Dilma se disse satisfeita por estar presente na VI Cúpula. O fato de a presidente errar a edição do evento do qual estava participando foi o menor dos deslizes do dia. Depois disso, nossa chefe de Estado deu muito trabalho ao tradutor simultâneo e ao responsável pelas transcrições dos discursos da presidente no blog do Planalto.
A viagem a Bruxelas tinha o objetivo de fazer avançar as negociações para a assinatura de um acordo de li­vre-comércio. Para o Brasil, o assunto é do máximo interesse. As exportações brasileiras para o bloco poderiam aumentar em 12% com o tratado. Preso às amarras ideológicas do Mercosul bolivariano, contudo, o Brasil não conseguiu costurar até agora um único acordo comercial com um parceiro de peso. Quem manda no Mercosul são Venezuela e Argentina. Afogados nos próprios e monumentais erros de gestão ruinosa, esses dois países tragam os demais para seu buraco negro isolacionista e xenófobo. O Brasil não tem força para se impor e vai a reboque. Enquanto isso, as nações viáveis da região se uniram em torno da Aliança do Pacífico, a área de liv­re-comércio formada por Chile, Colômbia, México e Peru. São eles os novos tigres da economia s­ul-a­mericana. O Brasil, mais uma vez, perdeu a chance de liderar a região no rumo certo. “Isso põe em risco o futuro das exportações da indústria brasileira, que também enfrenta dificuldades tributárias, cambiais e logísticas”, diz o economista Roberto Giannetti da Fonseca, da Kaduna Consult.


(Para ler a continuação dessa reportagem compre a edição desta semana de VEJA no IBA, no tablet, no iPhone ou nas bancas)

sábado, 1 de março de 2014

Venezuela e atitude do Brasil - Luiz Felipe Lampreia

Será que é o caso de demonstrar alguma surpresa ante a atitude do governo brasileiro em relação à violência repressiva do governo companheiro da Venezuela?
Alguém estava esperando outra coisa dos companheiros?
Poucas vezes na vida senti vergonha do meu país: durante a ditadura militar, por exemplo, quando se cometiam abusos contra os direitos humanos, ou quando havia censura à imprensa, sempre idiota e odiosa. Ou já na democracia, quando se cometiam bárbaros assassinatos contra pessoas, adultas ou não, culpadas ou não, aliás ainda hoje. Basta ver o que ocorre nas penitenciárias: não é somente vergonha o que sentimos, mas engulhos, nojo, horror e compaixão pelos presos em condições desumanas (salvo os quadrilheiros políticos do Mensalão, obviamente, bandidos talvez até piores, mas tratados com deferências e regalias).
No campo da política externa, quando o Brasil, mais pelo lado dos militares do que dos diplomatas, apoiou golpes de Estado em outros países. Agora pode-se dizer que temos mais um motivo para sentir vergonha do nosso país. Não pelo lado dos diplomatas, que estou certo contemplam com horror o que se passa no país vizinho (mas que, disciplinados, ou submissos não dizem absolutamente nada). Mas pelo lado dos companheiros, que pelo visto não têm vergonha de apoiar ditaduras assassinas. Vergonha, de fato, pelo Brasil.
Um dia acaba, mas o registro precisa ficar. Eu faço a minha parte: registro...
Paulo Roberto de Almeida 

O que diz o Brasil?

Regimes opressivos e violentos, que desservem às aspirações do povo, acabam um dia colhendo o que semearam: a revolta. É o caso da Ucrânia, onde o que era uma disputa administrável tornou-se confronto sangrento. Mais próxima de nós, está a tragédia da Venezuela.
Sob a presidência de Nicolás Maduro, a quem falta o enorme carisma de Hugo Chávez, o país está descendo às profundezas do desgoverno e da brutalidade. Quando as prateleiras dos supermercados estão vazias, a moeda nacional derrete, a inflação está em alta vertiginosa — é natural que haja manifestações de protesto. Qualquer regime democrático as aceita, sob regras publicamente definidas de local, hora e não violência. O regime de Maduro, ao contrário, alegou que se tratava de uma conspiração fascista financiada pelos EUA e começou a baixar o porrete. As forças policiais usaram fartamente cassetetes e gás lacrimogêneo, a Sebin (a Gestapo venezuelana) usou armas de fogo contra a multidão. Os relatos de tortura, espancamentos e ameaças de morte são numerosos. A imprensa tem sido reprimida na cobertura dos choques e, segundo relatos confiáveis, muitos jornalistas têm sido presos ou agredidos na tentativa de encobrir a repressão. A violência de atirar contra os manifestantes é também levada a cabo pelos esquadrões chamados colectivos, em tudo semelhantes às tropas de choque nazistas da SS ou os squadristi de Mussolini, inclusive por terem sido lançados pelo governo de Maduro.
Silêncio em relação à Venezuela é um erro
Prognosticar se o governo de Maduro vai cair não é o escopo deste artigo. O tema principal aqui é a posição do governo brasileiro sobre o massacre que está em curso na Venezuela. Em primeiro lugar, coloca-se a questão de saber se o governo da Venezuela viola seus compromissos jurídicos internacionais. Vale lembrar que, nas normas jurídicas continentais, consta o Compromisso Democrático da OEA, assinado por todos os países membros, que coloca com clareza o que é uma democracia, bem como o Protocolo de Ushuaia do Mercosul (tive a honra de assiná-lo como chanceler brasileiro em 1998), que contém a cláusula democrática e prevê inclusive a suspensão do país que a viole.
Por que o governo brasileiro se omite nessas condições? Por que, por muito menos e de forma altamente discutível e prejudicial aos interesses nacionais, castigou o Paraguai em nome da referida cláusula democrática? E agora, em face das atitudes antidemocráticas do governo venezuelano, nada diz.
O respeitado jornal “La Nación”, de Buenos Aires, publicou matéria no dia 21 de fevereiro em que afirma: “Silêncio cúmplice. Erro estratégico. Postura inadmissível de um suposto líder regional com aspirações globais. Ante a crise que se vive na Venezuela, são cada vez mais numerosas as vozes que condenam a falta de ação do Brasil no conflito que sangra seu vizinho e mais recente sócio no Mercosul.”
Creio, com a maior convicção, que o silêncio do Brasil face à repressão violenta sobre a oposição que está sendo praticada pelo governo Maduro é um erro que afeta a credibilidade de nosso país em sua tradicional defesa dos direitos humanos e dos valores democráticos. É uma mancha para o atual governo, que espero seja apagada por uma postura mais definida .
Fonte: O Globo 28/2/2014

SOBRE LUIZ FELIPE LAMPREIA


Luiz Felipe Lampreia

Sociólogo e Diplomata, Lampreia foi Embaixador do Brasil em capitais estratégicas da Europa, atuando ainda como Secretário Geral do Itamaraty e Ministro das Relações Exteriores entre 1995 e 2001. É responsável por um blog sobre Política Internacional no site de O Globo.

Eclipse global do Brasil - Marcos Troyjo (FSP)

MARCOS TROYJO
Folha de S. Paulo, 28/02/2014

O imenso potencial do país é conhecido; a ideia de eclipse sugere ocultação só temporária dos astros

Países, assim como estilos, entram e saem de moda.
No início dos anos 90, México e Tailândia estavam com tudo. A "crise tequila" de 94 e "maquiladoras" ofuscadas pela hipercompetitividade chinesa minaram o entusiasmo pelo primeiro. Em 97, o derretimento do baht tailandês precipitou o colapso financeiro do Sudeste Asiático e aparou garras do promissor "tigre".
Muito do balde de água fria que a conjuntura joga neste ou naquele país deve-se à formação de expectativas do mercado financeiro, por vezes superficial e imediatista. Será então que o atual desalento com que o Brasil é visto no mundo deve-se a seu desempenho como destino de investimentos de portfólio?
Sobram motivos para entender que a perda de brilho extrapola apostas financeiras. O "eclipse" envolve percalços abrangentes nos três campos das relações internacionais: o econômico-comercial, o político-militar e o dos "valores".
Durante a cúpula do G20 há cinco anos, Obama chamava Lula de "o cara". O Brasil era "o país". Parecia em rota para ultrapassar a França como quinta maior economia em 2015. Hoje, após três anos de crescimento medíocre, estamos às portas da recessão técnica. Taxas de poupança e investimento inferiores a 20% do PIB, ocaso do Mercosul e inexistência de acordos comerciais com polos mais dinâmicos projetam baixa expansão.
Também nosso "soft power" irradia-se com menos força. Programas como o Bolsa Família, cuja aplicabilidade se cogitou na África e noutras regiões em desenvolvimento, têm viabilidade questionada na ausência de crescimento vigoroso.
Na política internacional, mesmo que a reforma do Conselho de Segurança da ONU andasse, qual a contribuição efetiva do Brasil à segurança internacional se, no próprio território, 50 mil homicídios/ano superam a destruição de vida nos conflitos de Afeganistão, Iraque e Sudão?
Na América Latina, a liderança brasileira fragmentou-se com inconsistência moral. Empregamos "padrões duplos" – marca do cinismo de potências que sempre criticamos – nas crises presidenciais de Honduras e Paraguai. Nossa tradição de equilíbrio parece incongruente com endosso automático aos regimes de Cuba e Venezuela.
Grande capital diplomático foi despendido para elegermos dirigentes de instituições como OMC e FAO, cujas funções são arbitrais e de coordenação, não a alavancagem direta dos interesses brasileiros.
Acrescente-se o atabalhoamento de Dilma na diplomacia presidencial – a que, quando chamada, vexa compatriotas – e se completa o quadro de retração brasileira em diversas frentes globais.
Esse eclipse não resulta tão somente de ceticismo macroeconômico ou inépcia internacional da presidente. Reformas estruturantes, essenciais ao bom lugar do Brasil no mundo, terão de incluir também a política externa.
O imenso potencial brasileiro é conhecido e admirado – e a ideia de eclipse sugere ocultação só temporária dos astros. Trabalhemos para que isso, e não um obscurecimento mais profundo, seja o que aguarda o Brasil no concerto internacional. 

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Documento do PSDB: plataforma de politica externa

Abaixo, transcrito do documento do PSDB para as eleições de 2014, a última parte, dedicada à política externa.
O documento completo pode ser descarregado neste link: http://conversacombrasileiros.com.br/wp-content/themes/ConversaComBrasileirosV2/assets/pdf/Cartilha-PSDB-Bras%C3%ADlia.pdf
Apenas transcrevo )p. 25-26); examinarei depois.
Paulo Roberto de Almeida

PARA MUDAR DE VERDADE O BRASIL 

CONFIANÇA CIDADANIA PROSPERIDADE
O PSDB oferece à sua consideração as bases de uma nova agenda para o país.
(...)
12. Política externa: reintegrar o Brasil ao mundo

O viés ideológico imposto à nossa política externa nos últimos anos está isolando o Brasil do mundo. Demos as costas para importantes nações democráticas e abraçamos regimes de clara inclinação totalitária, em flagrante contraste com as melhores tradições da nossa diplomacia. 

Em relação ao comércio exterior, decisões políticas equivocadas fizeram com que, nos últimos dez anos, o Brasil não negociasse acordos com as principais economias e os principais blocos, de forma a dinamizar nossas relações de comércio. A integração regional está se desfazendo e o Brasil continua a reboque dos acontecimentos. Deixamos de abrir mercados para os produtos brasileiros e de ampliar a modernização da estrutura produtiva interna, pela falta de acesso à inovação e à tecnologia de ponta.

A partidarização da política externa tem consequências severas na política de comércio exterior: acentua o isolamento, em vez de ampliar a integração; produz atritos, em lugar de cooperação produtiva; empobrece nossa pauta de comércio, em vez de dinamizar trocas e oportunidades. Vivemos num dos países mais fechados ao comércio exterior no mundo: somos a sétima maior economia do mundo, mas apenas o 25° maior exportador. 

Também por isso, o Brasil precisa voltar a integrar-se num mundo em que, cada vez mais, as relações são interdependentes. Nossas empresas produzem com qualidade, mas com cada vez menos competitividade, dados os altos custos internos. É preciso criar condições para ajudá-las a se integrar nas cadeias produtivas globais, por meio de profunda melhoria, racionalização e simplificação do ambiente econômico interno. 

Com visão de futuro, nosso compromisso é conquistar um lugar privilegiado para o Brasil no mundo. 
É necessário abandonar a política externa de alinhamento ideológico adotada nos últimos anos, resgatando a tradição de competência e a atuação independente da diplomacia brasileira. 

O Itamaraty deve servir ao Brasil e defender o interesse nacional, acima de todo e qualquer interesse partidário. Nossa diplomacia deve, também, recuperar no exterior os compromissos que defendemos internamente, como o repúdio às tiranias, o direito à paz, a solidariedade internacional em defesa da democracia, o respeito aos direitos humanos e ao meio ambiente. 

Especificamente em relação ao Mercosul, o bloco precisa voltar a ser o que era na sua concepção, no início dos anos 1990: uma área voltada à liberalização do comércio e à abertura de mercados. O Brasil deve assumir a efetiva liderança regional e propor as mudanças que se fazem necessárias para o crescimento do nosso comércio internacional. 

A negociação de um acordo abrangente e equilibrado entre Mercosul e União Europeia deve ser concluída, mesmo que, para tanto, o Brasil avance mais rapidamente que outros membros do bloco para deles não ficar refém.