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sexta-feira, 8 de julho de 2011

Operarios (sindicalizados) pedem desemprego e desindustrializacao!!!

Parece contraditório não é mesmo?
Mas é assim.
Leio no jornal do dia a seguinte manchete de primeira página:

"Metalúrgicos fazem greve contra desindustrialização"

Bem, não são todos os metalúrgicos, só os sindicalizados, e mais especialmente a aristocracia operária liderada pela máfia sindical, que são os que cruzaaram os braços, nas montadoras de automóveis do ABC paulista, pois estão preocupados:

"...com o aumento da presença de veículos e de outros produtos industrializados importados no mercado brasileiro e reivindicam o fortalecimento da indústria nacional". (Valor Econômico, 8-10 de julho de 2011, p. A1)

Trata-se de uma das muitas greves comandadas pela máfia sindical contra os interesses da população brasileira e a favor da burguesia, como diriam alguns, ou pelo menos a favor da aristocracia da indústria estrangeira instalada no Brasil, pois se supõe que essas montadoras vão conseguir o apoio ingênuo (ou idiota) dos trabalhadores para barrar concorrência estrangeira e assim poder continuar a cobrar mais caro dos consumidores nacionais.
Se der certo, quem sai perdendo são os brasileiros, em geral, e quem sai ganhando, temporariamente, são os donos das fábricas e os trabalhadores do setor, mas ilusoriamente e com prazo determinado.
Em última instância, quem sai perdendo é o país e a economia nacional, que se insula da concorrência estrangeira e que fica defasada e sem poder competir no exterior.

Que os problemas da indústria brasileira (ou estrangeira instalada no Brasil) não são derivados da concorrência estrangeira, isso eu deduzo de outra matéria no mesmo jornal, que diz o seguinte:

"A valorização exagerada do câmbio tornou mais dramáticos os problemas estruturais que atrapalham a vida do setor privado, como a carga tributária elevada, a infraestrutura precária e o alto custo dos insumos importantes, como a energia elétrica. Para complicar, falta mão de obra qualificada e os salários tem crescido acima da produtividade, num momento de forte aquecimento do mercado de trabalho." (Sergio Lamucci, "A indústria perde competitividade", Valor Econômico, 8-10 de julho de 2011, p. A2)

Ora, NENHUM, repito NENHUM, desses problemas, nem o câmbio, se deve minimamente, à concorrência estrangeira. TODOS eles foram feitos no Brasil, made in Brazil, e devem ser resolvidos aqui dentro.

Então, os metalúrgicos estão fazendo greve contra quem?
Deveriam fazer contra os responsáveis dessa situação.

Adivinhem que é o responsável maior?
Acho que nem preciso dizer...
Paulo Roberto de Almeida

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Addendum em 9/07/2011:

Metalúrgicos fazem manifestação contra desnacionalização da indústria
Wagner Gomes
O Globo, 9/07/2011

Cerca de seis mil metalúrgicos, segundo estimativa da PM, ou 30 mil pelas contas dos organizadores, fizeram uma manifestação na manhã de ontem na Via Anchieta, na divisa entre São Paulo e São Bernardo do Campo, no ABC, contra o que chamam de desnacionalização da indústria brasileira. Eles reclamaram do aumento das importações e da geração de menos empregos para a produção no mercado doméstico.

Os trabalhadores paralisaram totalmente a linha de montagem da Ford para participar da manifestação. Na Mercedes-benz, o turno da manhã foi suspenso e 3.500 dos 13 mil trabalhadores da empresa cruzaram os braços. Nenhuma das duas montadoras informou os prejuízos e quantos veículos deixaram de ser produzidos. Já a Volkswagen informou que a manifestação ocorreu bem longe da fábrica e que os funcionários cumpriram normalmente o dia de trabalho.

Funcionários das empresas de autopeças da capital também participaram da manifestação. Os trabalhadores saíram em passeata pela rodovia, mas não chegaram a bloquear totalmente o trânsito.

Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), a participação de veículos importados no mercado nacional passou de 5% em 2005 para 23% este ano. Nos últimos seis anos, o número de carros importados cresceu 115%, enquanto a produção nacional teve alta de 45%. Segundo a Anfavea, em 2010, as empresas instaladas no Brasil importaram 660 mil veículos. Este ano, serão importados 850 mil unidades.

— O Brasil vai importar este ano quase 900 mil veículos. É praticamente a produção total da Volkswagen em 2010. Mais de cem mil postos de trabalho poderiam ser gerados se os veículos importados fossem produzidos aqui — disse Sérgio Nobre, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

Miguel Torres, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, disse que “mais um pouco e os trabalhadores brasileiros vão apenas apertar parafusos”.

Os sindicalistas defendem mudanças na política industrial, com regras como a da China, que só aceita a instalação de empresas estrangeiras em parceria com sócios locais.

terça-feira, 21 de junho de 2011

O mito da desindustrializacao (1) - Luiz Carlos Mendonça de Barros

A questão da desindustrialização
Luiz Carlos Mendonça de Barros
FSP, 21/06/2011

Um dos itens mais importantes na agenda dos debates sobre a economia tem sido a questão da chamada desindustrialização. Termo cunhado para caracterizar uma redução importante na participação da indústria no PIB, ela tem sido apresentada como um dos mais graves problemas a serem enfrentados nos próximos anos.

Na minha leitura existe uma série de erros de diagnóstico - principalmente em relação à China - que estão sendo cometidos pelos que defendem medidas radicais para reduzir a competição das importações de produtos industriais. Pretendo a seguir fazer algumas reflexões que possam ajudar nesse debate.

Eu dividiria as causas que estão por trás da perda de valor agregado na indústria brasileira em dois grupos principais. O primeiro compreende algumas mudanças por que passa uma economia de mercado como a brasileira quando ela amadurece. São forças que não devem ser combatidas, pois os benefícios que trazem para a sociedade são direitos dos cidadãos. É o caso da perda de parte da produção industrial local pelo aumento das importações por conta de um processo natural da abertura comercial de um país.

Mas quais os benefícios que um aumento das importações pode trazer a uma sociedade como a brasileira, se ele reduz o número de empregos na indústria, questionam muitos? O maior deles é que as importações, ao aumentarem a oferta de determinados bens nos mercados internos, reforçam a competição e permitem que os consumidores tenham acesso a produtos com os mesmos preços e qualidade dos existentes em outros países.

Temos um exemplo recente e emblemático dos benefícios da abertura das importações. Ele aconteceu com os preços do aço no mercado interno. Nossas siderúrgicas sempre trabalharam com um ágio de cerca de 30% em relação aos preços internacionais. Isso apesar de sermos um produtor importante de minério de ferro e que tem, nos custos de transporte marítimo, um item expressivo na formação de seus custos. Pois nos últimos anos, com as importações representando finalmente uma parte relevante da oferta de aço no mercado interno, esse ágio praticamente desapareceu. Os reflexos dessa convergência de preços internos e internacionais já podem ser identificados, por exemplo, na formação dos preços dos automóveis produzidos no Brasil.

Outra força positiva na economia criada por importações maiores é a utilização de componentes produzidos de maneira mais eficiente e barata em outros países. Ao se fazer essa integração, estamos aumentando o poder competitivo dos produtos finais - de maior valor agregado - que saem das linhas de produção de nossas indústrias. Esse é mais um exemplo de como a redução da produção em algumas áreas permite que se aumente em outras com valor agregado maior, principalmente no setor de bens de capital. Ou, dito em outras palavras, um exemplo em que a perda de emprego em algumas empresas seja compensada pelo aumento em outras, sem que o consumidor seja prejudicado.

Outra força natural que está por trás da perda da participação da indústria no PIB brasileiro está associada ao aumento da renda média do brasileiro nos últimos anos. Esse é um fenômeno que ocorre também em outras sociedades em que a economia de mercado prevalece. A participação da indústria em economias como a chinesa - que tem uma renda média igual a um terço da brasileira - é uma, em sociedades como a americana - com renda três vezes maior do que a nossa - é outra, bem menor. Na próxima década, quando se espera que a renda média do brasileiro dobre em termos reais, é natural que a indústria continue a perder importância relativa para o setor de serviços. Tentar evitar isso, com medidas coercitivas definidas pelo governo, seria agredir o metabolismo de uma economia de mercado em trajetória de expansão e criar desequilíbrios importantes no futuro.

Finalmente, nesse grupo de forças que nascem de uma dinâmica natural de uma economia de mercado, temos a que está associada à importância dos produtos primários na matriz de produção do Brasil de hoje. Vivemos em um mundo em que as matérias primas e alimentos passaram a valer mais do que um grande número de produtos industriais. Essa nova realidade reflete-se nos chamados termos de troca, ou seja, a relação entre os preços daquilo que exportamos e os de nossas importações. Há alguns anos essa relação era próxima de 0,9, ou seja, para cada US$ 100 que exportávamos podíamos importar o equivalente a US$ 90. Hoje essa mesma relação é 1,35.

A posição do Brasil hoje é muito parecida com a dos grandes exportadores de petróleo, com a diferença que a força de nossas exportações vem de um número grande de produtos primários. Mas o efeito macro econômico é o mesmo - uma moeda forte e valorizada - que prejudica nossa indústria. Nesse sentido vamos sofrer as mesmas dificuldades das encontradas pela Noruega, Rússia e países exportadores de petróleo do Oriente Médio.

No segundo grupo de forças que reforçam a tendência de perda de produção industrial estão fatores que podem ser reduzidos ou mesmo eliminados por ações do governo. Voltarei a eles em nosso próximo encontro.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é diretor-estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Um falso debate e as falsas solucoes

O governo debate um falso problema: o de uma suposta desindustrialização do Brasil, quando o que está havendo é uma perda de competitividade de exportações industriais brasileiras, por problemas "made in Brazil", não derivados de fatores externos.
Todos os problemas que infernizam a cabeça dos burocratas do governo -- e que são objeto de reclamações dos industriais brasileiros, contra a "concorrência desleal" do exterior -- são, foram e continuam sendo problemas criados inteiramente por medidas do governo, e poderiam ser resolvidas por medidas do governo, no âmbito puramente interno.
Mas, não: o governo vai acusar algum problema externo qualquer, vai praticar protecionismo, vai subsidiar os industriais chorões, e nós vamos pagar a conta, sem que os problemas sejam de fato resolvidos. Ou seja, vão adotar as "soluções" erradas, para nosso prejuízo, claro.
Paulo Roberto de Almeida

Documento oficial alerta para desindustrialização

Sergio Leo e Marta Watanabe - Brasília e São Paulo
Valor Econômico, 16/11/2010




O país vive um processo de desindustrialização? O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio tomou partido nesse debate em documento no qual afirma que o processo existe, é preocupante e ameaça as contas externas. O trabalho, que circula reservadamente na equipe econômica e foi obtido pelo Valor, sugere que o governo deveria criar uma "diretriz" para elevar o saldo comercial, hoje em torno de 9% das exportações, para um nível mínimo de 14%.
No primeiro semestre, o superávit comercial foi de US$ 7,9 bilhões. Para eliminar a necessidade cobrir as contas externas com investimento do exterior, seria necessário saldo de US$ 19,5 bilhões. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, o governo deveria estimular exportações, numa clara oposição às intenções do Ministério da Fazenda, que tem proposto controle de importações.
O documento sustenta que é evidente a "reprimarização" da pauta de exportações. No primeiro semestre, a participação dos manufaturados foi de 40,5%, abaixo dos 43,4% dos produtos básicos, "composição que retrocede ao patamar de 2008". A indústria de transformação, que chegou a ter superávit de US$ 31,9 bilhões em 2005, registrou déficit de US$ 13,9 bilhões no primeiro semestre deste ano. Setores como têxteis, confecções, móveis e veículos, que eram superávitários, operam com déficit. O setor de veículos passou de superávit anual médio de US$ 9,1 bilhões (2004-2007) para déficit de US$ 3,1 bilhões em 2009.
O déficit da indústria cresce à medida que aumenta a valorização do real em relação ao dólar. José Velloso Dias Cardoso, diretor da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimaq), diz que o aço longo de países europeus, por exemplo, chega ao país com preço 40% inferior ao do produto nacional. A mesma tendência ocorre em outros produtos siderúrgicos, como vergalhões e fio-máquina. O preço do aço nacional chega a ser o dobro do chinês, diz Velloso.
De janeiro a setembro, a importação de produtos siderúrgicos somou US$ 3,95 bilhões, quase o dobro dos US$ 2,06 bilhões do mesmo período do ano passado. A indústria metalúrgica ainda tem superávit, mas o saldo caiu de US$ 3,66 bilhões de janeiro a setembro de 2009 para US$ 689,7 milhões nos três primeiros trimestres deste ano.

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terça-feira, 16 de novembro de 2010

Documento oficial alerta para desindustrialização

DEU NO VALOR ECONÔMICO

O país vive um processo de desindustrialização? O Ministério do Desenvolvimento, Industria e Comércio tomou partido nesse debate em documento no qual afirma que o processo existe, é preocupante e ameaça as contas externas. O trabalho, que circula reservadamente na equipe econômica e foi obtido pelo Valor, sugere que o governo deveria criar uma "diretriz" para elevar o saldo comercial, hoje em torno de 9% das exportações, para um nível mínimo de 14%.

No primeiro semestre, o superávit comercial foi de US$ 7,9 bilhões. Para eliminar a necessidade cobrir as contas externas com investimento do exterior, seria necessário saldo de US$ 19,5 bilhões. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, o governo deveria estimular exportações, numa clara oposição às intenções do Ministério da Fazenda, que tem proposto controle de exportações.

Desindustrialização preocupa o Ministério do Desenvolvimento

O país vive um preocupante processo de "desindustrialização negativa" que pode ameaçar as contas externas, alerta documento reservado do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) obtido pelo Valor. O documento, que circula na equipe econômica, diz ser um "fator de preocupação e sinal de alerta" a influência da balança comercial no aumento do saldo negativo nas contas externas, que torna o Brasil cada vez mais dependente de investimentos especulativos. Ele sugere ao governo criar uma "diretriz" para elevar o saldo comercial, em torno de 9% das exportações.

O governo, segundo o MDIC, deveria fixar um "nível mínimo" considerado aceitável para a relação entre saldo comercial e exportações, e apoiar exportadores para garantir esse resultado. No primeiro semestre, essa relação superávit/exportações ficou em 8,8%, para um saldo de US$ 7,9 bilhões. Para eliminar a necessidade de cobrir as contas externas com investimentos em carteira (ações e títulos) do exterior, seria necessário que o superávit no período tivesse sido de US$ 19,5 bilhões, desempenho considerado "inexequível" pelo próprio ministério.

O documento propõe que, após fixado o "nível mínimo aceitável" para o saldo comercial (segundo sugere, no primeiro semestre deveria ter sido 14,3%), o governo adotaria medidas para elevar as exportações de forma a reduzir pela metade a necessidade de financiamento para as contas externas.

Numa clara oposição às intenções do Ministério da Fazenda, que tem proposto medidas de controle das importações no debate interno do governo, o MDIC argumenta, no texto, que a busca de um saldo comercial mais alto deve ser feita com iniciativas de estímulo às exportações, com "medidas estruturantes" - como redução de tributos sobre exportadores, simplificação de procedimentos burocráticos e políticas de incentivo à desvalorização do real.

Baseados no desempenho das exportações no primeiro semestre, os técnicos do ministério previam que as exportações teriam de ter crescido US$ 5 bilhões acima do resultado obtido entre janeiro e junho, ou 35% além do desempenho do mesmo período em 2009. No segundo semestre, o surpreendente desempenho das exportações elevou a previsão de exportações, de US$ 180 bilhões para US$ 195 bilhões, o que reduziria o esforço para obter o superávit maior - o número exato teria de ser recalculado pela equipe econômica.

O documento, concluído em julho, mesmo mês em que, coincidentemente, o Banco Central interrompeu a escalada de alta nas taxas de juros, toma partido no debate se há ou não desindustrialização no país argumentando que é evidente a "reprimarização" da pauta de exportações (predomínio de bens primários, como minério de ferro, soja e grãos). A desindustrialização não se caracteriza pela queda na produção física da indústria, que pode até aumentar, argumenta o estudo. "A característica fundamental do processo de desindustrialização é a perda relativa de dinamismo da indústria na geração de renda e emprego na economia", define o texto.

Para o ministério, a "reprimarização" ameaça o país desde 2007 e ficou evidente no primeiro semestre, quando a participação dos produtos manufaturados (máquinas, veículos, eletrodomésticos) no total das exportações foi de 40,5%, abaixo dos 43,4% da participação de produtos básicos - "composição que retrocede ao patamar de 2008", diz o documento.

Enquanto o Brasil exporta cada vez mais commodities (ferro, soja) do que importa, o comércio de produtos manufaturados segue tendência inversa, e passou, de um superávit em favor do país de US$ 4 bilhões em 1992, para um déficit de US$ 9,8 bilhões em 2007 - valor que subiu para US$ 30,5 bilhões só no primeiro semestre de 2010. O ministério prevê um "déficit histórico", até o fim do ano. A indústria de transformação, que chegou a um superávit recorde de US$ 31,9 bilhões em 2005, passou a ter mais importações que exportações a partir de 2008 e registrou um déficit de US$ 13,9 bilhões no primeiro semestre de 2010.

Setores de "baixa-média" tecnologia como os de têxteis, confecções e móveis, que mantiveram superávits comerciais até o começo da década, já têm déficits ou, como no caso de móveis e indústrias diversas, deverão ter saldo negativo até o fim do ano, prevê o MDIC. No caso de couro e calçados, as vendas de couro têm compensado o déficit no subsetor de calçados.

Outro exemplo da "deterioração" é o segmento de veículos automotores e equipamentos de transporte, considerado de média-alta e alta intensidade tecnológica e que passou de um superávit anual de, em média, US$ 9,1 bilhões entre 2004 e 2007 a um déficit de US$ 3,1 bilhões em 2009, que deve se elevar neste ano. O déficit no primeiro semestre já é maior que o alcançado em todo o ano 2000 por setores de intensidade alta e média-alta, que já eram deficitários, como o de máquinas de informática, elétricas e de comunicação, equipamentos médico-hospitalares, automáticos e de precisão e químicos e artigos de borracha.

Há uma "tendência estrutural de geração de déficits em importantes segmentos da tecnologia de transformação", nota o documento, que classifica essa tendência de "um sinal de alerta para uma possível vulnerabilidade da atividade econômica nacional e para as contas externas do país". Nos últimos três anos, as exportações aumentam a um ritmo inferior ao do crescimento do país e, na falta de medidas compensatórias, o câmbio influencia diretamente a perda de competitividade das vendas da indústria ao exterior, mostra o estudo. Já as importações aumentam acima do ritmo de crescimento da economia, ameaçando o saldo comercial, e os investimentos diretos já não são suficientes para cobrir as necessidade de financiamento do déficit nas contas externas totais.

É um cenário preocupante, "posto que reflete uma dependência de capitais de curto prazo, sujeitos a volatilidade e nervosismos dos agentes financeiros internacionais", alerta o ministério.

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Addendum em 17.11.2010: Este editorial do Estadão, um dia depois que eu fiz meus comentários iniciais, traduz a mesma realidade: o Brasil não é competitivo por fatores puramente internos. Quando é que as lideranças políticas vão reconhecer essa simples realidade? (PRA)

A desindustrialização não se explica só pelo câmbio 

Editorial - O Estado de S.Paulo, 17.11.2010

Finalmente, pelo menos o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDCE) está reconhecendo que existe um processo de desindustrialização no País, que pede uma ação mais afirmativa do governo para conter um processo que só se poderá ampliar sob o efeito da acumulação.
O MDCE constata o que chama de "reprimarização" (predominância de commodities nas exportações) enquanto se registra um déficit nas de produtos industriais. A indústria de transformação, que tinha superávit externo de US$ 31,9 bilhões em 2005, já em 2007 apresentou déficit de US$ 9,8 bilhões, e de US$ 30,5 bilhões no primeiro semestre deste ano.
Podia ser que o déficit se limitasse a setores "trabalho-intensivos", como os produtos têxteis e os móveis, dada a concorrência da China, mas chegou também aos automóveis, cujo superávit médio de US$ 9,1 bilhões, entre 2004 e 2007, passou para um déficit de US$ 3,1 bilhões, no ano passado, que deve ser muito maior neste ano.
A melhoria do poder aquisitivo da população pode ter permitido a compra de bens de maior tecnologia. Mas isso não explica o aumento da importação de produtos siderúrgicos de 70,1% nos nove primeiros meses deste ano, ante o mesmo período de 2009, embora as importações de material elétrico, eletrônico e de comunicações tenham crescido 51,8%. No segundo caso, pode-se falar de efeito renda, mas no primeiro caso isso não pesa. Temos as matérias-primas necessárias no Brasil e instalações siderúrgicas modernas. Não será apenas o efeito câmbio?
Na realidade, não se entende que produtos pesados possam ser importados da Europa por preços menores do que o nacional, levando em conta o custo do transporte e até a tendência de reduzir os preços diante da queda da demanda, observada nos países da União Europeia. A razão é que temos no Brasil um custo de produção maior, em razão da carga tributária, da legislação trabalhista e dos juros, sem falar da menor produtividade. Não podemos esperar que a valorização do real desapareça tão logo (parte dela é vinculada ao sucesso econômico) e seria um grave erro concentrar esforços apenas na correção do câmbio. As mudanças mais urgentes são de outra ordem.
É preciso, antes de tudo, reduzir a carga tributária, o que por sua vez tornará possível uma redução da taxa de juros, que tem sua origem no déficit público. E é preciso haver uma legislação que favoreça as exportações, além de uma política de estímulo à inovação para não dependermos tanto de tecnologia externa.