A persistirem os sintomas do lulo-petismo, procure um
médico...
Paulo Roberto de Almeida
A sociedade brasileira está
emergindo de um longo pesadelo: o lulo-petismo. Essa variante tupiniquim de um
persistente mal latino-americano, a crença ingênua nas virtudes sociais supostamente
benéficas do populismo demagógico e do salvacionismo redentor – ambos irracionais,
mas possuindo poderosos efeitos eleitorais –, tinha sido quase elevado à
categoria de doutrina política, quando não de projeto nacional, por um desses
gramscianos de academia conquistados à causa dos companheiros. Entretanto, ele
revelou-se, ao fim e ao cabo, uma enfermidade passageira no cenário político,
uma espécie de doença da pele, que coça bastante durante certo tempo, mas que
acaba sendo eficazmente combatida desde que aplicada a pomada correta: a consciência
cidadã.
O lulo-petismo foi a nossa
doença de pele, que persistiu enquanto as reais desigualdades da sociedade
brasileira estiveram falsamente identificadas a supostas “falhas de mercado”,
ou a maldades do “neoliberalismo”, duas “deformações do capitalismo” que
poderiam ser superadas com “distribuição de renda” e políticas sociais
“inclusivas”. Foi assim que mergulhamos na década e meia de medidas ativas em prol
da desconcentração de renda e da correção das tais “falhas de mercado”, pelas
mãos (e pés) de um Estado comprometido com a “justiça social”. Os verdadeiros
efeitos – que eu chamo de crimes econômicos – só se tornaram explícitos depois da
aplicação dos exercícios de engenharia econômica da tropa no poder, a tal de
“nova matriz econômica”, com o seu séquito de consequências devastadoras sobre a
economia.
Os historiadores econômicos
podem até chamar estes anos negros do lulo-petismo de “A Grande Recessão”, que
se reflete no recuo geral de todos os indicadores econômicos e sociais –
estagnação ou crescimento negativo, alta da inflação, do desemprego, déficits
ampliados, dívida acrescida, perda da competitividade externa e interna, forte desvalorização
cambial, desinvestimentos –, mas o fato é que o declínio econômico está apenas
começando. Teremos pela frente anos de penoso reajuste para, finalmente, voltar
a uma situação parecida com a que estávamos, digamos, na segunda metade dos
anos 1990, ou no início dos anos 1980. Esses são os efeitos catastróficos dos
anos persistentemente equivocados do lulo-petismo econômico. Estaríamos mesmo no
início de uma grande recessão?
Não descarto o prolongamento
de uma fase realmente dura na área econômica, uma experiência poucas vezes registrada
nos anais da vida nacional, que conheceu taxas de crescimento relativamente
satisfatórias, a despeito dos anos de crise e de aceleração inflacionária, das
trocas de moedas e dos “voos de galinha”, depois de tentativas mal conduzidas
de estabilização. Que ocorra agora uma Grande Recessão, essa é uma marca
histórica que ficará para sempre identificada com a esquizofrenia econômica do
lulo-petismo, um resultado exemplar do ponto de vista daqueles que pretendiam
corrigir as tais falhas de mercado por meio de unguentos e poções mágicas que
só revelam a extraordinária ingenuidade econômica (ou seria estupidez?) dos
seus aprendizes de feiticeiros, esses que eu chamo de “keynesianos de
botequim”.
O que ocorreu, na verdade,
desde os primeiros anos, ditos gloriosos, do lulo-petismo, foi uma Grande
Destruição, em todos os setores, um desmantelamento geral das instituições, da organização
política e da ética pública. Ela começou cedo, pelo aparelhamento das agências
públicas, dos ministérios (com a possível exceção do Itamaraty), dos demais órgãos
de Estado, pelos “servidores” do partido neobolchevique, não exatamente os gramscianos
de academia (eles não são muito confiáveis), mas os militantes de chinelo de
dedo; estes são os membros obedientes e disciplinados do partido leninista, que
repetem de forma canina os ditames do comitê central – vale dizer, do chefe da
tropa e da pequena clique de super-apparatchiks – e que pagam o dízimo mensal costumeiro,
assim como uma boa parcela (30%?) dos subsídios associados aos cargos ganhos na
máquina do Estado.
A Grande Destruição seguiu
pelo ativismo exacerbado das “políticas públicas”, estendendo-se em todas as
direções e dimensões da vida nacional, criando uma clientela de beneficiários
planejados – o curral eleitoral do Bolsa Família – e uma outra de ricos beneficiários
mais planejados ainda. Quem são, finamente, os financiadores do partido hegemônico?
Eles são industriais e banqueiros, pagadores compulsórios de “doações legais ao
partido”, com parte das rendas asseguradas pela mesma máquina do Estado: empréstimos
generosos por parte do BNDES, proteção tarifária, linhas de crédito consignado,
juros da dívida pública e várias outras prebendas setoriais.
Tudo isso se refletiu no
crescimento dos gastos do Estado além e acima do crescimento do PIB e da
produtividade, excedendo a capacidade contributiva do setor produtivo da
economia – daí o esforço sempre crescente de extração fiscal por parte desse
órgão fascista por excelência que é a Receita Federal –, tudo em detrimento dos
investimentos produtivos. Não há dúvida quanto a isso: a Grande Recessão, que
está recém começando, foi precedida pela grande devastação efetuada pelo
lulo-petismo econômico. E não se enganem: o pior ainda está por vir.
É por isso que eu chamo o
período lulo-petista de “A Grande Destruição”, um mal de pele que se incrustou
em todos os poros da sociedade brasileira. Esta se deu conta, finalmente, das
fontes do mal, e se prepara para expulsar pelas vias legais os sabotadores da
economia e os fraudadores da moralidade. As causas do mal de pele já foram
identificadas; as prescrições estão a caminho, e esperamos que rapidamente.
Mas, a persistirem os
sintomas do mal, recorra-se aos cuidados de um médico. Os bons médicos, nas
democracias, costumam receitar a cura constitucional: na hipótese de mal
crônico, a prescrição é sempre a via eleitoral. Em caso de ataques agudos, ou
de câncer ameaçando metástase – como um procurador já alertou –, a solução tem
de ser mais drástica, para se extirpar o mal em toda a sua extensão. Nesses
casos, o Congresso e os tribunais superiores são chamados a operar o paciente. Depois,
no pós-operatório, economistas sensatos costumam ser bons enfermeiros, desde
que eles não tenham sido contaminados pelo keynesianismo de botequim que sempre
caracterizou os economistas aloprados do lulo-petismo. Adiante, minha gente:
mais um pouco e acabamos com a coceira...
Paulo Roberto de Almeida
[Filadélfia, 1 de agosto de 2015, 3 p.]