Para complementar a informação sobre a minha tese, cujo tema era a interação do Brasil com a OCDE, eis o meu Memorial de Defesa, depois que a banca recusou a tese com argumentos pelo menos especiosos, inadequados, para não dizer mentirosos.
A tese está disponível neste link do meu blog
Diplomatizzando (2/06/2015; link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2015/06/brasil-e-ocde-uma-interacao-necessaria.html) e neste de Academia.edu:
(2/06/2015;
link: https://www.academia.edu/5659888/530_Brasil_e_OCDE_uma_interacao_necessaria_-_tese_CAE_1996_).
Até agora (4/06/2015), Academia.edu me avisa isto:
You got 80 views from Brazil, Slovakia, Switzerland, the United Kingdom, Japan, the United States, Colombia, and Ethiopia on "530) Brasil e OCDE: uma interacao necessaria - tese CAE (1996)".
Primeiro a ficha do texto:
540. “Memorial do candidato sobre o processo
de avaliação da Tese”, Brasília, 9 novembro 1996, 14 p. Texto preparado para
subsidiar argumento em favor da revisão da decisão da Banca que decuidiu
recusar a tese de CAE. Entregue em 11.11.96 ao Diretor do IRBr.
Agora o texto da própria, já transcrito na plataforma acima e formato pdf:
XXXII CAE
Brasil e OCDE: uma
interação necessária
Paulo Roberto de Almeida
MEMORIAL
DO CANDIDATO SOBRE O PROCESSO DE AVALIAÇÃO DA TESE
O
candidato apresenta, a seguir, alguns comentários pertinentes aos argumentos
apresentados no relatório da Banca examinadora, tal como transcritos na Carta
IRBr/647, de 6 de novembro de 1996, do Diretor do Instituto Rio Branco, que
transmitiu-lhe decisão da Banca no
sentido de reprovar sua tese.
2. O
aspecto principal deste Memorial
relativo à sessão de defesa da tese e ao próprio julgamento do trabalho escrito
e sua avaliação em Banca, está relacionado com a questão de não terem sido efetivamente observados os
critérios estabelecidos nos artigos
15, 17 e 18 do Regulamento do Curso de Altos Estudos – quais sejam, os de relevância
funcional e utilidade do trabalho para a diplomacia brasileira, de
aproveitamento e desenvolvimento do tema, de originalidade, de metodologia
adequada, de correção, precisão conceitual e pertinência das conclusões, de
precisão fatual, histórica e estatística, de qualidade da linguagem, de
relevância, riqueza e assimilação das fontes consultadas ou de apresentação – bem
como, no que se refere à exposição e defesa da dissertação, aqueles
definidos no Artigo 20 de tal Regulamento, relativo à atualização,
desenvolvimento e justificação dos dados e argumentos apresentados na tese, à
fluência, correção e propriedade da argumentação, à segurança e convicção na
defesa dos pontos argüidos, ou ainda demonstração de conhecimento de matérias
correlatas ao tema e familiaridade com as idéias mais importantes sobre as
relações internacionais, correntes na bibliografia atual.
Apreciação
geral da Banca:
“A
Banca examinou a tese [do Cons. PRA] e considerou que ela padecia de algumas
graves imperfeições, tanto no que se refere ao tema central sob objeto de
exame, isto é, o relacionamento do Brasil com a OCDE, como, e principalmente,
no que se refere às extensas e freqüentes digressões sobre temas de importância
relativa pequena para o objeto do tema ou até mesmo só remotamente relacionados
com a questão sob exame.”
3. O
argumento deixa margem a dúvidas
legítimas, em seus próprios termos: se a tese apresentava “graves
imperfeições”, como se decidiu por sua defesa em Banca? As insuficiências do
texto escrito poderiam desaparecer durante a fase oral e as imperfeições
estariam então sanadas? O candidato não foi esclarecido sobre essas questões.
4. O
candidato não tomou conhecimento, explicitamente, nem durante a fase de
argüição, nem no seu seguimento, de quais
seriam essas “graves imperfeições” na análise do relacionamento do Brasil
com a OCDE. Esse relacionamento constituía, efetivamente o objeto central de
análise, mas do qual pouco se tratou durante a fase de argüição. Transcrevo, a
propósito, o elemento central do projeto de dissertação, que foi devidamente
aprovado, de conformidade com Carta IRBr/111, de 16 de fevereiro de 1996:
O
capítulo mais importante abordará o relacionamento do Brasil com a organização,
bem como os condicionantes e implicações de um eventual processo de adesão à
OCDE, que configura uma nova modalidade de inserção externa do País.
5. Tal
objetivo foi efetivamente cumprido no texto escrito, como uma consulta à tese
poderá revelar, mas em nenhum momento o
tema central e seus complementos
indispensáveis — “requisitos e exigências de um processo formal de adesão”
e discussão das “condições e o impacto (vantagens e desvantagens) de um
eventual processo de adesão” — foram
objeto de inquirição formal ou colocados no centro dos debates. O candidato
coloca em apoio deste argumento suas notas tomadas durante a argüição,
relativamente completas quanto à seqüência dos temas tratados.
6. O
candidato considera que sua tese não
pode ser acusada de não ter tratado do tema central do trabalho, quando a
questão ocupa, precisamente, as partes mais importantes do trabalho escrito. Em
contrapartida, o candidato não pode tampouco determinar por si só o curso dos
debates durante a defesa, obrigado que está em, nos estreitos limites de tempo
que lhe são impartidos, ater-se prioritariamente às questões dos argüidores sob
pena de ser acusado de desviar-se do foco das perguntas.
Avaliação específica:
“... principalmente no
que se refere às extensas e freqüentes digressões sobre temas de importância
relativa pequena para o objeto do tema ou até mesmo só remotamente relacionados
com a questão sob exame.”
7. Não
houve suficiente explicitação quanto à totalidade das “digressões”, mas elas
parecem se referir sobretudo ao capítulo 2, que tratou da “construção da
interdependência: uma perspectiva de meio século”. Ora, tais “digressões”
tratam das origens da OECE/OCDE e da inserção dos países em desenvolvimento na
economia global, temas previstos no projeto
apresentado, aprovado previamente pela Banca, tal como se transcreve a
seguir:
Um
primeiro capítulo substantivo, de natureza histórica, tratará do reordenamento
da ordem econômica no pós-guerra, com a constituição e evolução da OECE/OCDE,
promotoras ativas da interdependência econômica, bem como da posição dos países
em desenvolvimento na economia global.
8. O
esquema que foi anexado ao pedido de matrícula indicava explicitamente quais os
temas o candidato pretendia tratar nesse capítulo:
2.1.
Do Plano Marshall à OCDE
2.2.
Os países em desenvolvimento na economia global
2.3.
Do desenvolvimentismo à aceitação da interdependência
9. Se
tais questões devem ser consideradas como “digressões”, elas deveriam ter sido
afastadas in limine, no momento da
aceitação do projeto. Era propósito do candidato, porém, e nisso não houve
contestação por parte da Banca, dar um tratamento histórico-evolutivo à
institucionalização da OCDE enquanto foro emblemático da interdependência
econômica no último meio século, assim como à própria inserção dos países em
desenvolvimento na economia global.
10. Cabe
referir, por outro lado, à carta de aceitação (IRBr/111, de 16/02/96) na qual
se indica, claramente, que “nos termos do Edital de 28 de novembro [de 1995], o
tema não poderá ser substituído ou alterado, sendo admitidas, contudo,
modificações no título e no esquema estrutural, desde que comunicadas
oportunamente ao Instituto Rio Branco”.
11. O
candidato não pretendia, como não o fez, modificar seu esquema estrutural, e a tese tratou exatamente do objeto indicado
no projeto depositado no IRBr, na ordem exata e na mesma terminologia ali
delimitadas, sem qualquer acréscimo ou supressão de temas. O elemento da
“digressão” aparece portanto como mal explicado, na medida em que o candidato cumpriu precisamente com os objetivos propostos no projeto aprovado.
Crítica principal:
“Assim, a tese deixa de
tratar de algumas questões importantes relativas à natureza da OCDE e seu
funcionamento, o papel do Conselho, a estrutura de poder na Organização, o
funcionamento dos Comitês e Grupos de Trabalho que seriam essenciais para a
definição da postura diplomática brasileira em relação à Organização.”
12. A
tese não deixa de tratar desses
problemas, ainda que não tenha pretendido fazer das questões apontadas o
centro da discussão, como indicado aliás
no projeto original. Permito-me referir novamente ao projeto depositado, e aceito integralmente pelo IRBr,
transmitido como tal à Banca, que resolve essa questão em modo definitivo.
13. No
ponto 5 (Tratamento do tema), o candidato indicava expressamente:
5.3.
Aspectos que o candidato pretende omitir:
Não
será possível efetuar, em vista da enorme diversificação e complexidade do
trabalho técnico desenvolvido pela OCDE, uma análise detalhada das políticas
setoriais que figuram na agenda dos diversos comitês e grupos de trabalho da
organização ou o “follow-up” das muitas recomendações aprovadas pelo Conselho e
sua implementação pelos países membros.
14. Eu
outros termos, o candidato não se propôs, em nenhum momento, e a Banca não
solicitou em tempo hábil que fosse corrigida a perspectiva no sentido de se
abordar, prioritariamente, o funcionamento interno da OCDE. Tal pretensão tinha
sido expressamente excluída do projeto
aprovado do candidato, cujo objetivo principal era “examinar o
relacionamento do Brasil com aquela entidade no período recente (política de
aproximação) e discutir as condições e o impacto (vantagens e desvantagens) de
um eventual processo de adesão”.
15. Sem
embargo, ainda que o candidato não tenha abordado, in extenso, tais temas no
corpo da tese, as questões da natureza da OCDE e seu funcionamento figuram em
diversas passagens do capítulo sobre a “anatomia” da OCDE, assim como são
objeto de diversos anexos informativos. Refiro-me em particular aos seguintes:
1.
OCDE: Estrutura, órgãos subsidiários e agências especializadas
2.
Estrutura operacional de trabalho da OCDE
3.
O Secretariado da OCDE e como ele se vê a si mesmo
4.
Composição e participação nas atividades da OCDE
num
total de sete anexos sobre todos os órgãos da OCDE, suas publicações e uma
coleção de indicadores econômicos e sociais comparativos.
16. Para esclarecer o foco principal de
análise, o candidato transcreve partes significativas de sua tese:
O
capítulo mais importante trata da dinâmica do relacionamento entre o Brasil e a
OCDE: em primeiro lugar um itinerário histórico sobre a política de aproximação
— com destaque para a missão pioneira de 1991 —, seguido de uma descrição
bastante minuciosa sobre a participação do Brasil nas atividades do “diálogo
informal” — depois convertido em política do diálogo —, para se examinar, como
num exercício de vestibular, as bases de uma mudança de status, ou seja, uma
simulação em torno das condições e exigências de um eventual processo
negociatório em vista de uma adesão. Finalmente, a última seção busca avaliar o
impacto desse relacionamento — com ou sem adesão — nas relações econômicas
internacionais do Brasil e em sua política externa. Trata-se, em estilo
classicamente diplomático, de um exercício de policy-formulation, ou seja, uma discussão dos elementos relevantes que devem ser
avaliados na tomada de decisão em vista de uma definição mesma sobre o caráter,
o ritmo e o sentido dessa política de aproximação. (p. 5)
O
presente trabalho pretende, precisamente, formular as bases de uma política do
Brasil em relação à OCDE, mas ele vai um pouco além, no sentido em que esse
relacionamento não pode ser dissociado dos demais aspectos da política externa
brasileira, nem desvincular-se do conjunto de ações governamentais que visam,
na fase atual de restruturação do Estado brasileiro e das próprias bases de
funcionamento da economia nacional, reinserir o Brasil no sistema
internacional. Ele é basicamente
dissertativo — muito embora, por compreensíveis razões de espaço, não pode
abordar, com riqueza de detalhes, todos os aspectos interessando ao Brasil
relativos a uma organização extremamente complexa como a OCDE —, mas
apresenta, também, elementos “especulativos”, tendentes a oferecer opções de
política externa num momento de grandes definições internas e internacionais no
que se refere ao ordenamento mundial. (p.
10)
17. O
candidato chama igualmente a atenção para a Nota 6 ao capítulo 3, precisamente
dedicado à anatomia da OCDE, e que continha a seguinte indicação:
Para
não sobrecarregar o texto com desenvolvimentos burocráticos por vezes
enfadonhos, consignei em alguns apêndices do Anexo informações mais detalhadas
sobre a estrutura e os órgãos da OCDE, bem como sobre o funcionamento dos mais
importantes.
18. Quer
parecer ao candidato, portanto, que a afirmação de que “a tese deixa de tratar
de algumas questões importantes” não
pode ser derivada nem de seus propósitos iniciais, declarados em projeto aceito
e explicitados reiteradas vezes no texto escrito, nem de advertência preliminar
da Banca. O propósito do candiato era,
precisamente, o de tratar do relacionamento Brasil-OCDE, o que parece ter sido
abordado à saciedade, sendo apenas de se lamentar que tal questão relevante não
tenha sido tratada no curso da defesa. O candidato não pode, em
conseqüência, aceitar uma acusação de lacuna ou de insuficiência em relação
àqueles pontos, uma vez que não fizeram parte de seus projetos iniciais a
abordagem central dessas questões.
Crítica acessória:
“Inversamente, a tese
aborda de forma superficial e com afirmações sem fundamento consistente
questões de toda ordem desde a teoria cepalina, o ingresso no Conselho de
Segurança, a política social brasileira, o conflito Norte-Sul, e muitos outros
que pouco ou nada têm a ver com o tema do trabalho.”
19. A
acusação aqui, apesar de secundária ao objeto mesmo da tese, é
suficientemente grave para merecer
um tratamento apropriado e detalhado nos parágrafos seguintes.
“...de forma superficial e sem fundamento
(...) a teoria cepalina...”
20. Não
tratei, especificamente, da teoria cepalina, mas referi-me ao debate em curso
na América Latina nos anos 40, 50 e 60, nos pontos relativos à inserção
econômica internacional do continente, que apresentavam consistência para o
objeto da tese. A problemática cepalina é pertinente para o tratamento dessa
questão, mas é evidente que seu tratamento não poderia ser feito de maneira
detalhada.
21. Sem
relevar a contradição que existe entre,
por um lado, censurar o candidato por fazer “digressões sobre temas de
importância relativa pequena para o objeto do tema” e, por outro, censurá-lo
novamente de tratar essas questões “de forma superficial”, caberia indagar
se tal censura se sustenta em face das inúmeras referências que faço, várias
delas com transcrições de trechos: dois artigos de Raúl Prebisch retirados da Revista Brasileira de Economia (1949 e
1951), diversos artigos ou notas da revista Conjuntura
Econômica (1947, 1949, 1954, 1955, 1958), Memorando do FMI de 1960 sobre os
pagamentos na ALALC (e correlacionado com essa mesma questão na União Européia
de Pagamentos), artigo de Garrido Torres na Revista
Brasileira de Política Internacional (1958); o candidato está no direito de
se perguntar onde está exatamente a superficialidade?
22. No
que se refere à bibliografia de história econômica, acusada de superficialidade
com base em citação de Maurice Niveau — na verdade, suporte unicamente de uma
tabela de dados sobre a ajuda financeira americana à Europa ocidental — ou
devido à falta de um ou dois autores da preferência de um dos examinadores,
cabem observações sobre, por um lado, o caráter mais funcional do que acadêmico
do exercício de CAE e, por outro, sobre a ausência completa de contato prévio —
não previsto nos procedimentos do Curso — entre o candidato e seu examinador
acadêmico, de molde a poder eventualmente sanar qualquer deficiência nesse
terreno. Permito-me registrar, nesse particular, referências atualizadas a
Asselain, Van der Wee, Cameron e Bairoch, entre outros, todos nomes consagrados
na historiografia econômica.
“... ingresso no Conselho
de Segurança... ”
23. O candidato tratou uma única vez do tema (pp. 192-193), no
capítulo final, dedicado precisamente à “nova inserção internacional do
Brasil”, para referir-se à incorporação
eventual do País em foros relevantes. Entretanto, tal se deu no contexto de
um subcapítulo que se chamava, significativamente, “Uma balança do poder
mundial: do G-7 a um G-10?” O candidato não vê inconsistência entre posições
defendidas na tese e as da própria diplomacia brasileira. Para ser mais
preciso, a menção ao CSNU refere-se ao fato de que:
... as dimensões brutas
(ou seja, mercados), a filosofia política, as orientações econômicas e o papel
regional do País o tornam um interlocutor incontornável em todo e qualquer
esquema de ordenamento internacional: financeiro, comercial, de segurança
estratégica, etc. Nesse particular, o Brasil não precisaria fazer campanha
militante para sua inclusão no Conselho de Segurança das Nações Unidas: a menos
de uma renúncia voluntária a assumir responsabilidades globais — e os encargos
financeiros, políticos, militares e morais que seguem junto —, o Brasil já pode
ser considerado “membro eleito” daquela instância, em qualquer esquema que se
faça de reforma do sistema das Nações Unidas.
24. Nào parece ao candidato que este seja um tratamento
“superficial e com afirmações sem fundamento consistente”; a questão é de atualidade, muito embora a tese focalize a
problemática da inserção especificamente
econômica do Brasil, pela via eventual de um G-7 ampliado, como indica
aliás o próprio título da seção.
“... a
política social brasileira... ”
25. A menção parece
pertinente ao candidato, quando recolocada em seu contexto próprio. Qual é
esse contexto? Trata-se do capítulo “IV. Brasil-OCDE: a dinâmica do
relacionamento”, subcapítulo “4.Impacto nas relações econômicas e na política
externa”, seção relativa aos “Efeitos
sobre o Estado e o funcionamento do aparelho social”. O Brasil apresenta,
nas palavras de seu Presidente, um grave problema social, que constitui talvez
o mais relevante problema da nacionalidade neste final de século.
26. A tese indica claramente que:
“... não há um ‘padrão OCDE’ de justiça
social e de repartição da renda, pois que políticas redistributivas dependem de
um amplo leque de variáveis, não diretamente subsumíveis num universo de
respostas ‘técnicas’ a problemas fundamentalmente políticos.
(...) ...as desigualdades sociais
referidas no caso brasileiro... resultam, de fato, da ausência de uma política
social digna desse nome. Aqui, sim, a
OCDE pode fornecer modelos integrados de intervenção social por parte do Estado
que não se resumem a uma simples cópia figurada do conceito de Welfare State. A organização fornece, isso sim, um amplo leque de experiências nacionais em matéria de medidas ativas por
parte do Estado, a partir das quais se pode modelar políticas setoriais com
simulações já testadas sobre os diversos efeitos macroeconômicos dessas medidas
intervencionistas. Com efeito, um
dos mais importantes programas de estudo e de elaboração de modelos na OCDE refere-se
à gestão pública e aos diversos aspectos da administração estatal nos
países membros. (p. 179)
27. A OCDE possui, como referido no Anexo 3, um Directorate for Education, Employment, Labour and Social Affairs, que “analisa a
eficácia dos programas de saúde e bem estar social...” e uma das principais
iniciativas adotadas pelo candidato como chefe da DPFD, encarregado como tal do
seguimento dos temas relativos à OCDE na SERE, foi a decisão de se solicitar o
ingresso do Brasil, como observador, no Comitê de Administração Pública,
processo atualmente em curso de exame pela organização.
“ ... conflito Norte-Sul
... ”
28. O
tema não parece irrelevante ao candidato no contexto dos grandes debates dos
anos 60-80. A diplomacia brasileira nunca deixou de referir-se às relações
Norte-Sul nos foros internacionais. Sem que o candidato precise sublinhar a centralidade desse conceito em todos os
discursos oficiais brasileiros dessa época, pode-se remeter tão somente ao
recentemente publicado A Palavra do
Brasil nas Nações Unidas: 1946-1995: uma contagem das referências sob essa
rubrica no último meio século constataria certamente uma abundante colheita em
torno dessa dicotomia, aliás até hoje presente nos textos oficiais.
“...e muitos outros que pouco ou
nada têm a ver com o tema do trabalho.”
29. O candidato desconhece exatamente quais seriam essas outras
questões, mas, de conformidade com o projeto aprovado pela Banca, poderia
indicar uma série de outros conceitos ou
problemas abordados na tese, que não foram tratados durante a argüição:
a)
pressupostos e implicações (inclusive os custos econômicos e políticos,
internos e externos) de uma aproximação do Brasil à OCDE;
b)
condições e exigências de um eventual processo negociatório de adesão;
c) sua
compatibilidade com os demais princípios sobre os quais se assenta a política
externa brasileira;
d)
impactos no cenário político e econômico, interno e externo, de uma tal
política;
e) a
política de aproximação corresponde, no médio ou no longo prazo, ao interesse
nacional brasileiro?
30. Esses problemas, que parecem pertinentes e centrais ao objeto mesmo da dissertação — pois que
não só referidos na Introdução, mas retomados nos capítulos finais substantivos
e sublinhados com destaque no Extrato — constituíam os temas em torno dos quais
o candidato havia preparado sua defesa de tese. Eles não foram, entretanto, abordados no curso do debate. O
candidato coloca à disposição suas notas de argüição oral, suficientemente
detalhadas a esse respeito, podendo-se fazer apelo, se for o caso, à memória
dos demais colegas de CAE, como aliás, à própria Banca.
31. O candidato deseja fazer uma referência particular ao Artigo 18 do Regulamento do Curso, que
indica que a tese deve ser não apenas um registro de antecedentes e evolução de
situações, mas também deve ser analítica,
interpretativa, prospectiva quanto a tendências e opinativa quanto a futuras
ações brasileiras na matéria.
32. A tese escrita preencheu, na opinião do candidato, todos esses
critérios, mas não se procedeu, efetivamente, no curso da argüição oral, a uma
discussão de sua adequação a essas exigências do Curso de Altos Estudos. Uma
transcrição relevante pode resumir um dos pontos mais relevantes (e até
polêmicos), extensivamente abordado em diversas passagens da tese, mas que
permaneceu à margem de qualquer discussão na fase oral:
Nesse ponto do debate, precisamos retomar
os argumentos sobre a interação entre a OCDE e o Brasil. O que a “agenda OCDE”,
basicamente, promete a um País como o Brasil? Fundamentalmente, a continuidade
do processo de abertura comercial e de liberalização econômica, como forma de
usufruir plenamente das oportunidades abertas pelo sistema econômico
internacional na adaptação — certamente dura, mas necessária — ao novo cenário
competitivo global. Não são os países membros da organização ou a própria OCDE,
enquanto foro dito “ortodoxo-liberal”, que exigiriam do Brasil essas medidas de
liberalização e a continuidade das reformas econômicas de um modo geral como
condição de acesso a mercados numa suposta relação de reciprocidade dirigida. O
argumento utilizado é o de que a liberalização, mesmo unilateral, quando
combinada a medidas adequadas de ordem fiscal e monetária, é do próprio
interesse do Brasil como forma de fazê-lo aceder a patamares mais altos de
integração econômica mundial.
O relacionamento com a OCDE não poderia,
aliás, desenvolver-se na ausência de políticas voltadas para o crescimento e o
emprego, ademais da estabilidade financeira, como determina a própria carta
constitutiva da organização. As bases dessas políticas são o multilateralismo,
a eliminação de barreiras ao intercâmbio global e a liberalização dos
movimentos de capital. Uma visão sensata das realidades econômicas atuais
levaria, aliás, à implementação voluntária da maior parte das medidas
normalmente preconizadas nos códigos de liberalização da OCDE. (pp. 173-174)
Questões secundárias e deficiência central
“A combinação do tratamento de temas
ancilares ou alheios ao objeto de estudo, a forma superficial e simplista em
que tal tratamento é feito, prejudicam seriamente a tese, que perde foco e
deixa de tratar questões relevantes.”
33. Tal tipo de afirmação parece ao candidato inconsistente com a própria lógica dos argumentos desenvolvidos no
relatório da Banca e incorreta quanto ao ponto principal.
34. Se há tratamento de “temas ancilares ou alheios ao objeto do
estudo”, como esperar que tal tratamento devesse ser outra coisa que
“superficial e simplista”, segundo os termos do relatório. Temas alheios ao
objeto deveriam, supostamente, receber um tratamento não superficial e não
simplista, ou seja profundo e complexo? Não se estaria acrescentando às
supostas “digressões” detectadas em outras partes da tese? Como conciliar as
duas visões? Como, sobretudo, encontrar um meio termo em vista de uma possível,
hipotética, futura argüição?
“...a tese perde foco e deixa de
tratar questões relevantes”
35. De todas as afirmações negativas contidas no relatório, esta é, seguramente, a mais forte e, se não é suficientemente explícita quanto ao “foco” pretendido e sobre
quais seriam essas outras “questões relevantes” supostamente não tratadas na
tese, ela é certamente a mais
depreciativa de um trabalho cuidadosamente elaborado por quem vem seguindo
o tema desde alguns anos, sobretudo de forma intensa na Secretaria de Estado no
curso dos últimos meses.
36. A tese trata, para ficarmos apenas no objeto que era o seu,
dos “requisitos do contrato global”, das “bases
de uma mudança de status” para o Brasil, isto é, das condições a serem
preenchidas pelo Brasil para uma aproximação ainda mais consistente à OCDE, de
seu “impacto nas relações econômicas e
na política externa” e, finalmente, da “OCDE e a nova inserção
internacional do Brasil”. Os capítulos, que correspondem exatamente a esses
títulos, tratam efetivamente de todos esses pontos.
37. Como, nessas condições, afirmar que a tese perde foco e deixa
de tratar de questões relevantes? O candidato deseja reiterar que as questões relativas ao “foco principal”
não foram abordadas, seja nas argüições dos examinadores, seja no debate
que se seguiu. Não houve, a propósito, propriamente debate, mas uma série de
criticas à tese, e tentativas de resposta, ainda que pouco relevantes ao tema
central da tese, como esclarecido abaixo.
38. Cabe notar, a esse respeito, que o ordenamento particular da
argüição — com blocos sequenciais sucessivos de perguntas e comentários, sem
verdadeira conclusão ou argumento final, de uma ou outra parte, e nenhuma
antecipação de aceitação ou rejeição — não permitiu esclarecer se a Banca se
considerava satisfeita com as respostas do candidato, ou se o veredito final
quanto ao não acolhimento da dissertação já estava talvez inapelavelmente
tomado.
Fase de apresentação:
“Durante a argüição
oral, algumas das dificuldades acima apontadas poderiam ter sido sanadas, ou,
pelo menos minoradas. A Banca considerou, no entanto, que a argüição oral
agravou os problemas detectados na leitura da tese, uma vez que o candidato
procurou desqualificar as críticas feitas e ignorar as imperfeições apontadas.
Seus comentários dirigiram-se não para a defesa dos pontos de vista expressos
na tese, mas sim para a apresentação de posições diferentes, procurando, quando
questionado, negar algumas de suas afirmações centrais no trabalho escrito.”
39. As afirmações são, sem dúvida nenhuma, graves, mas o candidato
deseja restabelecer o equilíbrio de posições. De forma algo paradoxal, as notas
do candidato indicam, a respeito da argüição oral, dois comentários de
examinadores favoráveis à parte da exposição em Banca, que teria sido “mais
clara” do que a própria tese. Caberia, contudo, indicar, antes de mais nada,
que a tentativa de responder a pontos
levantados pelos examinadores, ainda que secundários ao objeto da tese, não
pode de nenhuma maneira representar uma “desqualificação das críticas”: ela é absolutamente central ao conceito mesmo
de qualquer defesa de tese.
40. Não parece razoável esperar de algum candidato engajado em
exercícios desse tipo que ele tenha como objetivo principal penitenciar-se de
supostos erros cometidos, persignar-se automaticamente a argumentos contrários
apresentados. Nenhuma defesa de tese implica inexistência de contraditório,
atitude aquiescente, resignação contemplativa em face da suposta superioridade
do discurso argüidor ou assimilação imediata de comentários feitos. Qualquer
candidato busca defender seus pontos de vista, numa elementar regra do debate
democrático e de puro exercício de argumentação socrática.
41. Assim, o candidato anotou ter concordado com alguns pontos
levantados pela Banca e discordado claramente de outros — como por exemplo a
afirmação de que os processos de adesão à OCDE seriam guiados por critérios
econômicos, quando eles se devem mais a considerações políticas, no que fui
seguido por outro membro da Banca. Foi anotado igualmente, embora pouco
relevante no contexto da tese, a contestação da pertinência de argumentos
apresentados por economista francês prêmio Nobel — não referido na tese — a
propósito do problema do desemprego, tema aliás secundário no próprio contexto
do trabalho. O candidato lembra-se também de ter contestado a suposta falta de
distinção entre a OCDE, enquanto organização intergovernamental, e seu
Secretariado, argumento que está bem presente em diversas passagens da tese
(especialmente pp. 55-60 e 62-66).
42. O candidato não discordou fundamentalmente, por outro lado, da
afirmação segundo a qual a OCDE é “uma criação essencialmente norte-americana”,
algo aliás bastante explícito no capítulo “histórico”, previamente
caracterizado como eivado de “digressões”. O candidato também anuiu em que a
expressão “templo da racionalidade econômica” devesse figurar entre aspas, para
demarcar o necessário distanciamento crítico em relação a uma definição pelo
menos ambígua. Deve ser registrado, porém, que a expressão aparece a primeira
vez seguida de um explícito ponto de
interrogação, conectado a dois pontos e a reserva explícita em relação à
capacidade normativa da OCDE: “modesto poder de coerção”. Esse subcapítulo é,
aliás, seguido de outro que busca caracterizar o jogo de poder naquela
organização: “Desafios ao consenso liberal: protecionismo e unilateralismo”.
43. Entretanto, colocar uma caracterização não central ao objeto
da tese — a do suposto “templo” — como fulcro de uma pretensa desqualificação
do trabalho de análise das relações Brasil-OCDE conduzido pelo candidato
significaria, em qualquer hipótese, tomar o secundário pelo principal, ater-se
à forma para descartar o conteúdo do debate, desfocar a discussão relevante em
benefício de uma polêmica não apenas irrelevante mas impertinente à questão
principal abordada na tese do candidato. Ela não foi, segundo as notas
disponíveis, discutida seriamente durante toda a defesa. É precisamente com
base nesses registros que o candidato aborda agora o argumento final, que
buscou desqualificar sua tese:
Exercício
da Defesa:
“Seus comentários
dirigiram-se não para a defesa dos pontos de vista expressos na tese, mas sim
para a apresentação de posições diferentes, procurando, quando questionado,
negar algumas de suas afirmações centrais no trabalho escrito.”
44. Seria extremamente difícil ao candidato fazer a defesa dos
pontos de vista expressos na tese, nos estritos limites de tempo impartidos e
sem deixar de responder às questões colocadas pelos argüidores, pela simples
razão que os pontos de vista
verdadeiramente relevantes não foram jamais abordados. O debate ateve-se a questões secundárias ao objeto mesmo da
tese, como se relata a seguir.
45. O candidato retira de seu caderno de notas (disponível para
consultas) as questões levantadas para debate: “digressões que pouco têm a ver
com o tema” (questão já tratada em parágrafos anteriores e considerada de
conformidade com o projeto); “digressões opinativas, ideológicas, pouco
consistentes sobre temas não relacionados com a política externa brasileira”
(não foi explicitado que digressões foram essas, mas se, de fato, os pontos
centrais da tese poderiam se prestar a esse tipo de comentário, sua
consistência intrínseca não foi em todo caso examinada no curso dos debates);
“afirmações temerárias, não baseadas em argumentos desenvolvidos no trabalho”
(tampouco explicitado, mas também suscetível de debate, se orientado para o
foco principal da tese); crítica ao terceiro-mundismo, um “fantasma que não
existiu” (inserido no contexto dos debates dos anos 60-80, sendo que a
referência atual se prendia a uma proposta “provocadora” de “Good-bye G-77”,
questão que não foi contudo abordada); se a OCDE é o “templo da racionalidade
econômica”, então seria melhor ao Brasil não entrar nesse templo, já que a
razão é o que existe de mais “autoritário” (em reação à definição do candidato
de que a OCDE seria o “ideal-typus
institucional e operacional da racionalidade econômica stricto sensu”); considerar que os “últimos 50 ou 60 anos de política
econômica externa foram um equívoco” (o candidato não se lembra de ter feito
tal condenação generalizada, por escrito ou oralmente); “saudosismo
passadista”, ao pretender que o Brasil de princípios do século era mais aberto
aos influxos externos do que o contemporâneo (há notório equívoco quanto ao
sentido da afirmação, que se referia ao coeficiente de abertura externa da
economia, de toda forma não pertinente ao ponto central); “visão extremamente
simplista do passado” (argumento não desenvolvido pelo argüidor); não teria
focalizado o conceito de “interesse” (mas, ele está implícito e explícito em
várias passagens nas quais eu me refiro à “interação necessária” entre a OCDE e
o Brasil como correspondendo ao interesse nacional, mas isso não foi objeto de
discussão); existem expressões alemãs não traduzidas (é verdade: exatamente
três, todas de fácil compreensão no contexto em que foram colocadas: ideal-typus, Weltanschauung, Entzauberung);
teria faltado à tese uma “reflexão sobre o que é a política externa hoje no
campo econômico” (mas toda a tese é exatamente um grande debate sobre essa
questão, apenas que referida à questão da inserção econômica internacional do
Brasil e o papel da OCDE nesse contexto); como o CAE representa o “exercício de
uma certa liberdade”, eu deveria ter usado essa liberdade para também “criticar
a OCDE” (o exercício pretendido era mais exatamente o de exercer essa liberdade
para propor uma aproximação mais intensa, mas não a adesão, à OCDE, mas isso
não foi tratado no debate); “exercício de iconoclastia”, segundo a própria
expressão do candidato (presente apenas na exposição oral, mas compatível
precisamente com o espírito de “liberdade” que deve presidir toda tese de CAE,
que não precisa ater-se, segundo o entendimento do candidato e de conformidade
com a própria confidencialidade do exercício, a uma espécie de conformismo
diplomático, contrário aliás ao caráter opinativo e propositivo sugerido no
Regulamento); a apresentação oral constituiu um “roteiro melhor do que o
próprio trabalho, pois os matizes ficaram mais claros” (o candidato agradece a
referência, mas o Extrato, difícil de ser lido em 20 minutos, representa um
roteiro ainda melhor da tese, pois que resume argumentos alinhados em dezenas
de páginas substantivas sobre os “pontos de vista” e as “afirmações centrais”
da tese, que não foram abordados no debate mas que poderiam tê-lo sido, não
fosse a cronometragem estrita e a súbita interrupção final, como referido a
seguir).
46. O candidato deseja contestar o argumento de que teria
procurado, na defesa oral, “negar
algumas de suas afirmações centrais no trabalho escrito”. Isto não foi feito, em absoluto, pela
simples razão que não houve oportunidade de assim proceder, pois, como
registrado acima, nenhuma das afirmações centrais figurou no centro do debate.
Não se discutiu, assim, se o Brasil deveria ou não pedir adesão à OCDE (em
nenhum momento isso foi perguntado ao candidato), quais seriam os requisitos
implícitos e explícitos de uma tal decisão, quais suas conseqüências para a
economia e a política, interna e externa, como isso se refletiria em nossa
posição internacional e no diálogo com o G-7, por exemplo, ou como conciliar
uma tal postura com nossa condição de país em desenvolvimento e com certos
alinhamentos internacionais, como seria a “auto-assimilação” proposta do que
foi chamado de “padrão OCDE de racionalidade econômica”, como interpretar o
relacionamento com a OCDE visto mais como meio do que como finalidade,
como se traduz, na prática, o trade-off
entre autonomia econômica e interdependência, como o Itamaraty deveria se
preparar para o tratamento dessa ampla gama de temas, enfim, essas e várias
outras questões sem dúvida pertinentes ao objeto da tese, mas relegadas ao
esquecimento.
47. O candidato constata com uma certa dose de decepção que uma
questão relevante para a política externa brasileira, a “interação necessária” com a OCDE, não tenha sido discutida em seus
fundamentos mesmos, tal como propostos no projeto original e reafirmados no
texto escrito. O assim chamado “rugido acadêmico” do candidato não se teria
convertido num “miado diplomático”, segundo a espirituosa expressão de um dos
membros da Banca, se oportunidade tivesse sido dada para um verdadeiro debate em torno dos temas
centrais que moldaram a concepção, elaboração e apresentação da tese.
48. De forma surpreendente mesmo, o debate não chegou a ocorrer:
ele foi simplesmente sepultado pela afirmação peremptória do “caráter esquizofrênico” que estaria
presente na tese, certamente uma das definições mais originais com que já se
deparou o candidato numa longa vida razoavelmente dedicada às lides acadêmicas.
Terminou assim, abruptamente, aos cinco minutos da argüição final do
último examinador, com o levantamento da Banca, um exemplo de defesa de tese a
todos os títulos melancólica e que certamente não honra as melhores tradições
da Casa ou aquelas, ainda relativamente recentes, do Curso de Altos Estudos.
49. O candidato deseja sobretudo registrar um fato importante: à diferença de todos os demais candidatos deste
XXXII CAE (que poderão confirmar tal assertiva), não lhe foi dada a possibilidade de contra-argumentar nessa fase de
argüição final, em vista da já referida interrupção do exercício no seu
curso final. Não se pode evidentemente descartar a rejeição de qualquer tese
pela Banca. O que, sim, pode ser questionado é que procedimentos não
formalizados e não explicitados de defesa sejam utilizados para a
desqualificação de um candidato, sem que
ao menos o objeto central de sua tese tenha sido examinado exaustivamente,
contestado e o próprio tema desqualificado em virtude de inconsistência notória
com os critérios retidos no Regulamento do CAE.
50. O candidato desejaria, por outro lado, indagar se, de conformidade com o determinado no Artigo 14 do Regulamento (“o IRBr
enviará um exemplar de cada uma [das teses] ao Chefe de Missão no exterior cuja
competência mais se relacione ao tema da tese, com o objetivo de permitir-lhe
encaminhar comentários, a título de subsídios, para o relator”), a Embaixada em Paris teve a oportunidade
de pronunciar-se sobre a tese do candidato e se as opiniões eventualmente
expressas são concordantes com o julgamento da Banca de “graves imperfeições” e
a constatação de que ela “perde foco e deixa de tratar questões relevantes”.
Comentários
finais:
51. O candidato gostaria agora de chamar a atenção para um fato
que lhe havia passado desapercebido durante e imediatamente após a argüição e
que lhe foi observado pelos demais colegas de CAE. Trata-se do tom acerbo, para
não dizer agressivo ou inamistoso da maior parte, se não da totalidade, dos
argumentos levantados em relação à tese. Contrastando com os elogios
protocolares ou sinceros que foram feitos em caráter preliminar a quase todas
as demais teses apresentadas, independentemente das críticas mais ou menos
severas que depois eram dirigidas aos trabalhos dos candidatos, em nenhum momento a tese do candidato foi
objeto de apreciações favoráveis ou de alguma avaliação positiva — à
exceção de um único reconhecimento pelo “grande esforço” denotado na pesquisa e
“conhecimento em primeira mão das negociações”, mas no mais o trabalho seria
“desigual”.
52. Aparentemente, a tese
consistiria, do começo ao fim, de um equívoco fundamental. Tantos defeitos,
supostos ou reais, foram detectados pelos colegas de CAE que, surpreendidos
pelo caráter inusitado dos ataques, chegaram a referir-se ao “massacre em
regra” que teria sido aplicado ao candidato. De forma concordante com essa
impressão, o relatório da Banca não
identifica nenhum ponto positivo na tese,
reafirmando a cada frase seus defeitos, falhas e imperfeições: “graves
imperfeições”, “freqüentes digressões”, “deixa de tratar de questões
importantes”, “forma superficial e simplista”, o candidato “procurou
desqualificar as críticas feitas e ignorar as imperfeições apontadas” ou “negar
algumas de suas afirmações centrais no trabalho escrito”.
53. O candidato se surpreendeu, a esse respeito, com a unanimidade
nos ataques e com a ausência concomitante de qualquer apreciação positiva, ou
neutra, que se supõe não tenha sido deliberada, resultando antes de uma
avaliação efetiva de que a tese
realmente não apresentava nenhum mérito intrínseco ou valor para o conhecimento
da problemática enfocada. Mas, nesse caso, volta-se à questão inicial: como se procedeu à convocação para a defesa
se a tese era indefensável? Tanta unanimidade na condenação não deixa
efetivamente de surpreender, na medida em que, em nenhum momento, os argumentos centrais da tese foram descartados por
inconsistentes, impertinentes ou irrelevantes.
54. Mais exatamente, eles não foram sequer evocados e em nenhum
momento se lhes aplicou os critérios retidos no próprio Regulamento do CAE, a
despeito do tema ter sido considerado relevante e o foro OCDE como muito
importante para o Brasil.. Face à ausência, portanto, de uma avaliação da tese
em função daqueles dispositivos do Regulamento, o próprio candidato desejaria
preencher a lacuna, sob a forma de roteiro preparado para a defesa oral e
obviamente não utilizado em razão do aspecto periférico dos debates. Mais
exatamente, o candidato requer o direito
de ser examinado pela Banca com base exatamente nos critérios constantes dos
artigos pertinentes do Regulamento.
55. O candidato deseja registrar, por fim, o tom descortês, com
laivos evidentes de ironia, com que um dos examinadores recebeu, antes de
qualquer comentário substantivo sobre a tese, as palavras iniciais, em
epígrafe, de homenagem ao trabalho contínuo dos diplomatas (24 horas.../sete dias por semana,
negociando, representando, defendendo o Brasil no mundo/365 dias pro ano,
concebendo, promovendo, idealizando um futuro para o Brasil no mundo/sempre...):
declarando não compreender o porquê desse singelo tributo, disse esse
examinador “surtout pas trop de zèle”, arrancando sorrisos complacentes dos
presentes. O candidato considera pelo menos estranho, para não dizer
indelicado, que um membro da Banca se julgue no direito de fazer troças
gratuítas a propósito de algumas estrofes que, por não serem pertinentes ao
objeto da tese, não representam menos o espírito com que foi concebido e
desenvolvido a dissertação de CAE. Tal atitude de zombaria explícita não parece
condizer com o tom geralmente cerimonioso do exercício, ademais de representar
um certo desrespeito para com um colega da carreira, ainda que hierarquicamente
inferior.
Brasília, 11 de novembro
de 1996
Paulo Roberto de Almeida
[Brasília, 540: 9.11.96]
Paulo Roberto de Almeida
Divisão de Política
Financeira e de
Desenvolvimento - MRE
Tels.: 211-6935/45 Fax:
322-8245
Brasília,
11 de novembro de 1996.
Ao Senhor Diretor do Instituto Rio Branco
Ministro Xxxxx XXXX XXXX
Acuso recebimento, do expediente IRBr/647, de 6.11.96, pelo qual Vossa
Senhoria informa que a Banca Examinadora do Trigésimo Segundo Curso de Altos
Estudos (XXXII CAE) “decidiu reprovar a tese apresentada sobre o tema ‘O Brasil
e a OCDE: uma interação necessária’”. A Banca sugere que eu deva ter a
“oportunidade de reescrever o trabalho (...) centrando-o claramente no tema sob
exame, que o candidato bem conhece, e reapresentá-lo em futura oportunidade”
O Relatório da Banca aponta “graves imperfeições” em relação ao tema
central da tese, afirmando ainda que ela “perde foco ou deixa de tratar de
questões relevantes”. Não me foram apontadas, contudo, quais seriam essas
“graves imperfeições”, mesmo porque os temas centrais ¾
a saber, relacionamento Brasil-OCDE, requisitos de acesso, impacto
econômico e conseqüências para a política externa brasileira ¾ não
foram abordados no curso dos debates. Desejaria conhecer com maior detalhe
essas “graves imperfeições, e como elas poderiam ser eventualmente sanadas. Não
consigo atinar, por outro lado, como, em vista de tão graves problemas, a tese
tenha sido aceita para defesa. Permito-me observar que, não apenas o projeto
original foi aceito integralmente pela Banca, incluindo as partes que foram
depois caracterizadas como “digressões”, mas que a própria tese, cujo resultado
final conformou-se inteiramente aos objetivos propostos pelo candidato, foi
aprovada para defesa em Banca.
Minha dúvida legítima, nesse sentido, é a de solicitar à Banca que me
indique, com base nos critérios e princípios contidos nos artigos 15, 17, 18 e
20 do Regulamento do Curso de Altos Estudos, que regulam a preparação,
apresentação e defesa da tese, como e em que condições minha tese teria deixado
de atender aos referidos dispositivos.
Gostaria de deixar registro, igualmente, que à diferença de todos os
demais candidatos ao XXXII CAE, não me foi dada oportunidade de fazer defesa
final da tese, como relato no parágrafo 49 do anexo Memorial sobre o processo
de avaliação da tese. Tal exercício se terminou abruptamente, por iniciativa do
Presidente da Banca, sem que, finalmente, os pontos centrais da tese tenham
sido examinados com base nos
critérios constantes dos artigos pertinentes do Regulamento.
O Regulamento do CAE não limita o direito à presente petição de
reavaliação, que de resto encontra-se amparado em garantias constitucionais
(Artigo 5º, alineas XXXIII e XXXIV), assim como em princípios consagrados do
direito público e administrativo brasileiro, relativamente ao direito de
representação. Como é do conhecimento de Vossa Senhoria, não há, no direito
administrativo brasileiro, decisão única e irrecorrível, existindo nas mais
diversas instâncias faculdade de reconsideração ou de reclamação. Permito-me
fazer referência aos artigos 104 a 116 da Lei n° 8.112, de 11.12.90, que dispõe
sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União.
O que me motiva a apresentar tal demanda de reconsideração é minha
convicção de que, no processo de avaliação e julgamento da tese, não foi
efetivamente dada ao candidato a chance de defender seus pontos de vista em
relação aos pontos centrais da tese, que permaneceram à margem dos debates
ocorridos durante a fase de argüição. Não encontro, por outro lado, no
relatório da Banca elementos esclarecedores suscetíveis de confirmar que, efetivamente,
minha tese deixou de cumprir com os requisitos enunciados nos artigos já
referidos do Regulamento.
Muito agradeceria levar estes elementos de informação ao conhecimento
dos membros da Banca: Embaixadores Fulano, Presidente, Sicrano,
Vice-presidente, Beltrano, examinador diplomático, e Professor XXXXx XXXXX XXXX,
examinador universitário. Rogo igualmente a Vossa Senhoria dar conhecimento do
presente expediente e seus anexos ao Senhor Secretário Geral das Relações
Exteriores.
Reporto-me, finalmente, à parte final do referido expediente, na qual
Vossa Senhoria autoriza o candidato a “reapresentar tese sobre o mesmo tema,
desde que procedendo às alterações recomendadas”. Entendo que tal direito não
se encontra, de nenhuma forma, prejudicado pelo presente pedido de
reconsideração.
Respeitosamente,
Paulo Roberto de Almeida
Anexos:
1. Memorial
sobre o processo de avaliação da tese (11.11.96)
2.
Requerimento de inscrição no XXXII CAE, com esquema da tese (26.01.96)
3. Roteiro da
apresentação oral (29.10.96)
541. “Recurso em legítima defesa”, Brasília,
11 novembro 1996, 2 p. Carta ao Diretor do IRBR, com pedido de reconsideração
da decisão da Banca que decidiu recusar a tese de CAE. Entregue em 11.11.96 ao
Diretor do IRBr. Resposta comunicada em 10.12.96, por ofício 758 do Diretor do
Instituto Rio Branco, confirmando a decisão negativa da Banca.
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