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domingo, 6 de abril de 2014

Eleicoes 2014: economia brasileira, passada, presente e futura - Samuel Pessoa (OESP)

Não se trata, obviamente, de uma matéria sobre as eleições, mas a situação econômica, em especial, a energia, terá grande influência nas eleições.
Paulo Roberto de Almeida

Deu errado o ensaio desenvolvimentista’
Para o economista Samuel Pessoa, atual modelo econômico é um desastre que precisa ser revisto
06 de abril de 2014 | 2h 05
ALEXA SALOMÃO, RICARDO GRINBAUM - O Estado de S.Paulo


Samuel Pessoa, um físico que leciona economia, estreitou as relações com o PSDB na campanha presidencial deste ano. O senador Aécio Neves, candidato dado como certo para a legenda, anunciou que ele é um de seus assessores. Pessoa faz duras críticas à atual política econômica: "eu chamo de ensaio nacional desenvolvimentista - foi uma tragédia para o País e tem de ser revertido", diz. Na sua avaliação, a reversão deve ser seguida reformas que possam dar eficiência ao Estado sem que seu tamanho seja reduzido: "A sociedade quer educação, sistema de aposentadoria, programas sociais - é impossível reduzir o Estado", disse na entrevista que segue. 
Como o senhor esta vendo o atual momento da economia?
Samuel Pessoa: Vou falar o que repito em todo lugar porque acho importante. Quando se olha a formulação de política econômica no Brasil, eu acho que há duas agendas muito diferentes. A partir do final do segundo mantado do governo Lula, passamos a ter duas agendas. Uma é muito anterior ao governo Lula. É uma agenda que está com a gente desde a democratização - uma agenda estrutural. Há outra agenda, que veio de 2009 para cá. Ela está associada a saída do ministro Antonio Palocci e a ida do ministro Guido Mantega (no Ministério da Fazenda). Isso aconteceu em 2006. O ministro Mantega teve muito senso de oportunidade e habilidade política para implantar a agenda dele aos poucos, conforme os fatos fossem permitindo. Em 2009, depois da crise, foi o grande momento em que ele pode trazer para a formulação da política econômica uma nova agenda. A primeira agenda estrutural eu chamo de contrato social da redemocratização. A segunda agenda - da equipe econômica do Mantega e da presidente Dilma e do final do governo Lula - eu chamo de ensaio nacional desenvolvimentista. Eu separo muito bem essas duas agendas. Acho que essa segunda é petista puro sangue. Acho que o Palocci, dentro daquele grupo político, talvez seja a excepcionalidade e parece que esse grupo político do PT tem um visão muito favorável ao nacional desenvolvimentismo e a esse conjunto de políticas econômicas - se bem que, posso estar exagerando, porque houve um período do governo Lula em que havia muita continuidade e que esse tema da agenda nacional desenvolvimentista não tinha proeminência. A outra agenda, a estrutural, é uma opção que a sociedade brasileira fez na Constituição, lá em 88. Está materializada no texto constitucional e essa opção vem sendo referendada e repactuada a cada eleição desde então. Ela expressa o desejo da nossa sociedade de construir um Estado de bem estar social muito abrangente, nos moldes dos países da Europa continental. Esse desenho esta no nosso texto constitucional. Neste aspecto, não há nenhuma diferenciação entre nenhum grupo política em atuação no Brasil. Em particular, eu acho que isso não distingue tucanos de petistas. O que inclui? Política de valorização do salário mínimo. Abono salarial, que é um programa lá do governo Sarney (José Sarney, ex-presidente da república). A aposentadoria rural. A Lei orgânica da assistência social. Renda mensal vitalícia. O programa bolsa família. A universalização da saúde. Mais recentemente, algumas iniciativas muito interessantes, como ProUni, Fies (programas de financiamento para o ensino superior) e todo um esforço de educação técnica. É um desejo da nossa sociedade avançar na questão da equidade. Com mais ou menos eficácia - tem programas que fazem sentido e outros que não fazem - isso é uma discussão. Mas esse é o pacote que o eleitor quer. O que cada governo faz é muito em função do que está na agenda desse pacto. A segunda agenda, não. Ela tem uma diferença grande. É uma agenda para colocar o Estado - o setor público - interferindo no desenvolvimento econômico. É o Estado decidindo a alocação de capital. É o Estado fazendo microgerenciamento das políticas de impostos e das tarifas de importação para incentivar alguns setores escolhidos segundo certos critérios. É o Estado fazendo microgerenciamento da política de intermediação financeira. Além disso, tenta adotar teorias heterodoxas sobre o processo inflacionário que acabam interferindo na liberdade do Banco Central e tendo um impacto sobre a inflação. É uma agenda grande. Começou no governo Lula, antes de 2009. Mexe nos graus de independência das agências reguladoras. Coloca uma parte grande da regulação de volta para os ministérios e, além de colocar de volta para os ministérios, passa a ter muita discricionariedade na regulação de diversos setores da economia. Ou seja: ao invés de usar um sistema de regras e procedimentos, pesos e contra pesos, passamos a ter a mão pesada do Estado. A gente vê isso no setor de petróleo, no setor de energia elétrica. Até na reformulação do marco ferroviário, com a ideia de separação vertical - que eu acho que não vai funcionar. Foi uma má ideia. Tem uma lista longa. Esse pacote não é da sociedade. É um pacote de um grupo de pessoas que está no centro da formulação da política econômica e que avalia que essas medidas são necessárias para acelerar o crescimento econômico. A minha avaliação é que esse ensaio nacional desenvolvimentista deu errado. Deu tudo errado. Foi uma tragédia para o País. Foi adotado por motivos ideológicos e acho que ele tem de ser revertido.
 
O senhor fala que a agenda da sociedade pede uma social democracia. Mas agenda depende da situação fiscal, que hoje está na ordem do dia. Como o PSDB poderia conciliar a questão fiscal, hoje com limitações, com essa agenda da população?
Samuel Pessoa: Minha resposta a tua pergunta é: não sei. Mas quero esclarecer que não falo aqui pelo PSDB. Sou colunista da Folha. Escrevo aos domingos. Todo mundo sabe quais são as minhas ideias. Eu tenho um vinculo grande com o partido há muitos anos. Fui assessor do senador Tasso Jereissati durante sete anos. Foi uma experiência maravilhosa. Trabalhar com Tarso foi a atividade profissional mais interessante que eu tive. Foi um privilégio pertencer ao gabinete dele. Adicionalmente, acho que o presidente Fernando Henrique Cardoso foi o melhor presidente que a gente teve. Avaliar o País que ele pegou e o País que ele legou mostra isso. Eu gosto muito do Lula. O primeiro mandato do Lula foi espetacular. Mas frente aos desafios que a sociedade brasileira enfrentava em 94, acho que o legado de FHC é impressionante. Também acredito que a história já está dando a ele o devido crédito. Ele vai ser um desses homens festejados ainda em vida e espero que ele viva muito. Meus vínculos com o PSDB são imensos. Tenho conversado com o senador Aécio. Acho que ele é um candidato espetacular. Há um tempo, li uma entrevista do Paulo Bernardo que, inclusive, me deixou muito surpreso. Paulo Bernardo se referiu ao Aécio como se ele fosse um garoto de Copacabana. Isso é algo inacreditável quando você olha o currículo do Aécio. O Aécio cumpriu o caminho legislativo brasileiro inteiro. Foi líder na Câmara e no Senado. Foi governador oito anos. É difícil imaginar uma pessoa com tanta bagagem na política brasileira hoje. E ele é jovem, o que é surpreendente. É um jovem com a experiência de uma velho. É um candidato espetacular. Mas eu não estou discutindo com o candidato detalhes de política econômica.
Mas qual é a tua opinião?
Samuel Pessoa: Como eu falei, essa é uma agenda da sociedade. O que nós economistas podemos mostrar os custos e os benefícios das diversas opções. A gente pode redefinir os termos do contrato social. O que chamo de contrato social é uma série de programas, de seguros sociais e critérios, como valor do benefício. Este é o contrato que ela assinou com ela mesma e com o Congresso Nacional. Esse contrato tem implicações para a igualdade, para o crescimento econômico. Nós que atuamos de alguma forma nessa área - eu sou professor de economia, não sou economista, mas formado em física - podemos mostrar alguns caminhos possíveis. Mostrar custos e benefícios. Mas a decisão do que fazer nem é do candidato _ é da sociedade. A sociedade precisa ser informado. O presidente ou a presidente coordena, a partir do poder que tem de definir a agenda, já que no nosso presidencialismo de coalização o presidente muito pode. Mas o processo de tomada de decisão de como o contrato social vai evoluir é um processo que deve ocorrer no Congresso. Eu já falei muita bobagem na minha vida. É difícil encontrar uma pessoa que atue na minha área que não tenha falado uma bobagem. Mas entre todas, a que mais me causa arrependimento ocorreu num episódio em 2003 ou 2004 quando fui chamado para uma audiência pública no Senado para falar de salário mínimo. Eu falei contra o aumento do salário mínimo e sobre as questões fiscais. Me arrependo muito. Não acho que fui um bom auxiliar nesse caso. O Congresso me chamou para que eu o auxiliasse a pensar no problema e acho que minha intervenção foi péssima. Me dá dor de cabeça quando lembro. A minha mensagem foi careta - e estava tudo certo na mensagem careta. Primário tem que pagar dívida, juros tem que cair, tem que fazer primário. Mas quando se fala em política de valorização do salário mínimo é preciso lembrar que existem milhões de pessoas que vivem de salário mínimo. Tratar o aumento do salário mínimo como algo não importante, não dar atenção ao impacto sobre a vida de todas as famílias que dependem do salário mínimo, é uma enorme falta de sensibilidade política. Eu aprendi que o profissional de economia não tem muito a dizer sobre política de valorização de salário mínimo. Pode falar sobre custos, sobre benefícios, mas a decisão é certamente política. Quando eu falei das duas agendas, me referia a isso. Tem uma agenda que não só é políticas, por ser da sociedade, mas porque ela envolve questões distributivas profundas. A gente não sabe avaliar direito. Quem avalia isso é o político. A gente pode auxiliar fazendo conta, mostrando custo. A outra agenda, é mais técnica. O livro que eu estudei diz que tudo isso que foi feito está errado. Não é uma questão de menos distribuição de renda ou sobre visões diferentes do liberalismo. São visões diferentes sobre o funcionamento da economia e sobre o que é certo e o que é errado. Eu estudei em um livro e as pessoas que formulam a política econômica hoje estudaram outro livro. Evidentemente, a economia não é uma ciência dura. Elas podem estar certas e eu errado - tudo deu errado por outros motivos. Ou eu posso estar certo e elas, não - a coisa deu errado pelos motivos que eu acho. Essa é uma discussão infinita. É difícil ter uma conclusão, até pela natureza da disciplina de economia. Sobre essa questão do contrato social, tenho a mesma ideia desde 2006. Eu, Mansueto Almeia e Fábio Giambiagi falamos sobre isso em uma notinha no apêndice de um relatório de conjuntura econômica trimestral que havia no Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e nunca mais mudei de ideia: o contrato social hoje requer que o gasto social cresça mais que o PIB. Esse é um dado.
Mas como resolver?
Samuel Pessoa: A solução não está na economia. A solução é política - e os políticos terão que resolver. O que a economia diz é: ou repactuamos, para que o gasto cresça mais lentamente, ou aumentamos a carga tributária, o que é legítimo, ou não fazemos nada e se soluciona com inflação - o que eu acho que a sociedade não quer. Mas nós que atuamos na área econômica temos apenas um papel, uma função: informar direito. Vamos pegar as manifestações do ano passado. A sociedade mostrou ter uma leitura diferente da minha e acho que essa leitura é muito equivocada. As sociedade acredita que dá para resolver todos os problemas do Estado combatendo a corrupção e suas ineficiências. Isso não é verdade. Combater a corrupção e as ineficiências do Estado é muito importante e precisa ser feito. É mais importante ainda quando se lembra que houve o ensaio nacional desenvolvimentista e destruição na governança de diversos setores da nossa economia - no setor de petróleo, no de energia, nas agências reguladoras. Construíram-se muitas ineficiências ao longo de anos de governo petista. Sendo bem específico: a gente gasta com o INSS algo como 7,5% do PIB. Tem uma tabela do Mansueto que todo ano a gente atualiza. Essa conta aumentou 3 pontos porcentuais do PIB nos últimos 20 anos. Essa conta não é cara porque tem um monte de falecidos ganhando indevidamente o benefício. Ou porque um monte de gente fraudou e está ganhando indevidamente o benefício. Ou porque um monte de gente que tem direito ao benefício conseguiu fraudar e recebe um benefício maior do que a regra permite. Isso deve existi em toda parte. Deve existir no Estados Unidos. É bem possível que seja um pouco pior no Brasil. Mas isso não representa o grosso. Medidas de gestão para resolver esses problemas não resolvem a questão estrutural - o fato de o contrato social requerer que o gasto público cresça a uma velocidade maior que o crescimento do PIB. Esse problema é estrutural. Essa questão vai ser tratada na esfera política, envolvendo executivo e legislativo. Os técnicos têm pouco a dizer a esse respeito.
Mas qual é a sua opinião - como compatibilizar a agenda social com a necessidade de financiamento público?
Samuel Pessoa: O processo eleitoral é que vai dizer o que fazer. A forma como a sociedade se pronunciar, a forma como o debate entre candidato e sociedade ocorrer é que vai dizer. Se eu disser o que quero, não vou falar como economista, vou falar como cidadão. Aliás, gente, eu não sou economista. Eu sou professor de economia e sou físico -- e apenas formado em física. Ser físico é para poucos. Não é o meu caso, infelizmente. Então, posso falar pelo cidadão Samuel, que é rico - todos nós aqui fazemos parte do 1% da sociedade mais rica. Até hoje, eu me penitencio pela aquela ida ao Senado, travestido de técnico. No fundo eu representava o cidadão. Isso me entristece até hoje. Eu confundi as duas personas. Por isso, acredito que agora não é momento para eu falar. Algum candidato contrario ao Aécio pode pegar alguma coisa que eu falar e apresentar em um programa para dizer: está vendo? O Aécio quer fazer isso. Um dos assessores dele disse que ele deve fazer isso.
Publicaram hoje uma entrevista do Aécio em que ele toca sobre vários pontos da economia. Dois deles chamam a atenção: ele acha que é preciso manter a política do salário mínimo e que o gasto não deve cresce acima do crescimento do PIB. Ele disse isso. Qual a tua opinião?
Samuel Pessoa: A política do salário mínimo e os atuais critérios de elegibilidade do INSS gera um dinâmica da previdência em que o crescimento é maior que o PIB. Tem sido assim nos últimos anos. Deve ter alguma ineficiência. É possível melhorar os mecanismos de controle. Mas não é isso que vai resolver. Para manter isso intacto, será preciso mexer em outras rubricas para que o gasto como um todo não cresça. Isso pode ser feito. Mas é preciso ver com o senador o que ele tem na cabeça. Eu acho que a aproximação do debate eleitoral, essas questões vão ser tratadas.
Olhando para a outra agenda, a nacional desenvolvimentista que o sr. criticou muito, o que é preciso mudar?
Samuel Pessoa: É preciso reduzir os créditos do Tesouro para bancos públicos. Foi um excesso. Foram os anos 70 voltando. O Geisel voltando. Parece um trem fantasma. É preciso consertar os preços. Novamente, isso também é um trem fantasma. Nos anos 70, na hiperinflação da redemocratização, por várias vezes, tentamos controlar preços segurando tarifa pública. Fizemos isso desde os anos 50. Nunca deu certo. O preço precisa ser real. Mas dizem: ahhhh, mas tem o problema da pobreza. Sim, mas o problema de pobreza a gente cuida com os mecanismos corretos - com um bolsa família, que é um instrumento poderoso, espetacular, que precisa ser valorizado e reforçado o tempo todo. Para mim, o presidente Lula marcou um enorme gol quando unificou os programas sociais, aumentou e potencializou os benefícios. Teve um impacto muito importante. As pessoas precisam ter uma garantia mínima de vida, sim, mas você faz isso com política de salário mínimo, com bolsa família, que dão uma renda para as pessoas. Mas os preços, da gasolina, da energia, precisam ser corretos. Isso precisa ser desfeito. Não gosto da política de desoneração. Acho que o senador tem uma opinião diferente da minha nesse aspecto. Eu sou um fiscalista. Acho muito ruim ter um superávit primário mais baixo quando as condições de endividamento do Estado não permitem. Acho muito ruim o risco-país, desde outubro, ter aberto 100 pontos em relação a México, Chile, Peru. Acho muito ruim a gente começar a fazer conta: será que essa dívida vai começar a crescer feito bola de neve? E eu acho que isso foi gerado por uma política desastrada de desoneração tributária. Tirando a desoneração sobre salário e sobre cesta básica, que têm benefícios óbvios e já deveriam ter sido adotadas há muito tempo, sou contrário as desonerações tópicas para esse ou aquele setor. A gente precisa reforçar a posição fiscal. O princípio de uma macroeconomia em ordem é um setor pública em ordem. A gente entrou numa crise muito profunda em 2008 e 2009 e houve muita competência por parte da equipe do ministro Mantega para enfrentar aquele episódio e tirar o País da crise. Um dos instrumentos adotados foi a política de desoneração. Eu acho que até exageram nos instrumentos contracíclicos em 2009. Não precisava de tudo que foi feito. Mas reproduzir a prática em 2011, 2012 foi um erro gigantesco. A economia brasileira já estava vivenciando uma realidade totalmente diferente. Por causa dessa política desastrada de desonerações ficamos com os ônus sem ter os bônus. O Tesouro Nacional ficou com os ônus, mas o País não teve os bônus da política. Também aumentaram imposto de importação, mas isso caiu. Foi uma boa medida cair. A gente agora via ter de enfrentar a inflação com uma posição fiscal sólida e um Banco Central independente. Uma boa medida é tentar passar no Congresso a independência formal do Banco Central.
Além da independência informal, que existia no governo de Fernando Henrique, o senhor acha necessária a independência formal?
Samuel Pessoa: Nunca fui um entusiasta da autonomia formal, porque é dessas coisas meio chatas: você só pode ter quando não precisa muito dela. É assim: se a sociedade não está convencida que é melhor fazer tudo que for necessário para combater a inflação, não é botando na veia que não vai ter inflação e que ela não vai existir. Vimos o exemplo da Argentina - botou na veia a conversibilidade, medida super dura, para não ter inflação. A sociedade não tinha resolvido o conflito distributivo e a inflação quando veio, veio pior. Amarras muito duras quando o amadurecimento da sociedade não é compatível com essas amarras pode ser contraproducente. Eu acho que a sociedade está demonstrando que está bem evoluída. Não está aceitando inflação. Nãos está reclamando que o Banco Central está subindo o juro. Acho que, talvez, a sociedade esteja madura para que tenhamos o instituto da independência formal do Banco Central.
Excluindo essa agenda que o sr. considera desastrosa, o que deve ser colocado no lugar para elevar o crescimento?
Samuel Pessoa: O tema crescimento também tem dois aspectos. Há um aspecto político. Crescer dói. Não é fácil. A China cresce 7% ao ano. Vai lá ver se está todo mundo feliz com aquele crescimento. A taxa de poupança de uma família chinesa é de 50% da renda. Poupando 50% da renda dá para crescer muito. Pergunta: a sociedade brasileira que poupar isso para crescer mais rápido? Ou tem outra escolha? Quer crescer mais lentamente? Esse são temas para os quais o profissional de economia não tem nada a dizer. Não é bom. Não é ruim. É uma escolha da sociedade. Isso bate no contrato social da redemocratização. Eu tenho dito, tenho escrito várias vezes - a sociedade brasileiro escolheu crescer pouco. Quer cresce de maneira mais sólida. A agenda da sociedade brasileira hoje não é crescimento. É equidade. O Brasil tem crescido e tem melhorado, mas no nosso ritmo, atendendo às nossas demandas. Por outro lado, o ensaio nacional desenvolvimentista piorou a situação, porque ele tira a eficiência da economia. Uma parte do nosso baixo crescimento é um padrão de escolha da sociedade. Mas outra parte do baixo crescimento, mais recente, no meu entender, vem da eficiência econômica e dos erros de política econômica que foram cometidos seguidamente a partir de 2009. Se for revertido, o Brasil cresce mais. Vou até dar a minha conta porque esse é um debate que temos feito. O Brasil está crescendo hoje 2 pontos porcentuais a menos do que crescia antes. O mundo cresce 0,6 a menos. A América Latina cresce 0,7 a menos. Nós estamos crescendo 2 a menos. Alguma coisa que aconteceu e fez com que a nossa desaceleração fosse muito maior do que a desaceleração do resto do mundo. É verdade que as economias estão interligadas e que o ciclo mundial é sincronizado, principalmente agora que o mundo é globalizado. O ciclo do Brasil é igual ao ciclo do mundo. Mas a gente abaixou mais. Por que? Bom, 0,6 ponto porcentual de queda foi provocada pelo mundo. E o resto? Você tem o esgotamento do fator trabalho, que deve explicar cerca de meio ponto porcentual de queda. Mas tem cerca de um ponto porcentual de perda - talvez um pouco menos - que no meu entender vem da ineficiência econômica e de uma certa desorganização que existe na economia. São as consequências na mudança do regime econômico que o ministro Mantega chamou de a nova matriz econômica. Isso está tirando um ponto porcentual do crescimento. Talvez a minha conta esteja exagerada e não seja tudo isso - seja 0,7 ou 0,8. Revertendo essa política, voltando ao regime anterior e avançando a partir de onde a gente estava antes, isso muda. O FHC não é o fim dos tempos. Ele fez o que era possível naquela janela de oportunidade nos oito anos que teve. Ele deixou muita coisa a ser feita. Nos primeiros anos do governo Lula, o País avançou muito, principalmente na área de crédito. Mas temos agora que desfazer as coisas erradas e continuar naquela toada.
O para frente nessa toada inclui o que?
Samuel Pessoa: Para atender as ruas, uma parte do trabalho é melhorar a eficiência do Estado. Essa é uma agenda que está parada. Falei isso inúmeras vezes. Desde o primeiro mandato de FHC, quando se fez muita coisa. Bresser Pereira passou pelo Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. Depois a Claudia Costin deu continuidade. Mas até pela complexidade dos temas tratados no segundo mandato de FHC, essa agenda ficou um pouco parada. O governo petista não conseguiu tocar essa agenda. A questão da reforma administrativa inclui dar ao Estado instrumentos de gestão para fazer com que as pessoas que passaram no concurso público, mas que sejam funcionários ruins, possam ser demitidas Hoje o cara só é mau funcionário público se roubar. Se ele tiver um desempenho ruim que penalize a comunidade, ele fica. Essa é uma questão fundamental para atender as demandas das ruas. Foi uma pena o longo ciclo petista não trazer nenhum reflexão nessa direção. Gastaram muito tempo destruindo coisas que funcionavam bem. Um exemplo:  o marcado regulatório do petróleo. Gastou-se energia do setor público que poderia ser endereçada para outros temas. No âmbito estadual, o Aécio, dentro do que é possível fazer com legislação estadual, fez muita coisa em Minas Gerais. Essa é uma agenda importantíssima para que se possa melhorar os serviços de saúde, educação e segurança. A gente não vai melhorar saúde, educação e segurança colocando mais dinheiro. Talvez até precise gastar um pouco mais com saúde, mas a questão, de forma geral, não é mais dinheiro. É preciso usar melhor o dinheiro - mas para usar melhor o dinheiro é preciso olhar o Estado por dentro. Tem também a eterna agenda da reforma tributária. A presidente Dilma reconheceu e os economistas que trabalham com ela estão cientes e se esforçaram para levar adiante. No entanto, acredito que perdemos uma chance preciosa. O ensaio nacional desenvolvimentista destruiu a situação fiscal. Só para vocês terem uma ideia. O primário recorrente neste ano, desconsiderando receitas extraordinárias, provavelmente vai ser 0,8 % do PIB. O primário em 2002 era 3%. Um pouco mais que isso. O ano de 2002 terminou com déficit de transações correntes acho que um pouquinho abaixo de 2 pontos porcentuais. Este ano vai fechar em 4 ou 3,9. O fiscal, além da perda da transparência e outros efeitos ruins, piorou muito. A gente perdeu a oportunidade de usar o espaço fiscal que tínhamos lá atrás para fazer um reforma tributária, negociando com os estados. Foi trágico. Quiseram reinventar o Geisel, ao invés de usar esse espaço fiscal para fazer a reforma tributária, que é muito importante. Agora, essa reforma tributária só vai sair se o executivo quiser muito e se ele tiver espaço fiscal, para poder  liderar o processo.  
Quando o senhor fala que elevar a eficiência do Estado, considera a possibilidade de reduzir o seu tamanho retomando as privatizações?  
Samuel Pessoa: Quando a gente fala de tamanho do Estado também temos duas agendas - totalmente diferentes. Acho impossível diminuir o Estado Brasileiro. A sociedade não quer diminuir o Estado - e a sua escolha é legítima. A sociedade quer saúde pública, universal, integral. Quer educação pública. Quer um sistema abrangente de aposentadoria. Quer um sistema abrangente de seguros público - abono salarial, seguro desemprego - e programas sociais. Como a sociedade quer tudo isso, é impossível reduzir o Estado. Nesta dimensão, o Estado só vai mudar, se a sociedade mudar. Como eu acho que ela não vai mudar, o Estado não vai diminuir. Isso não está em discussão. Eu como cidadão posso gostar mais de um Estado grande ou pequeno. Posso preferir a Suécia aos Estados Unidos. A sociedade brasileira já tomou a sua decisão - prefere a Suécia. Essa escolha não está em xeque. Não é isso que se discute nessa eleição. O que se discute é modelo de intervenção na economia. Eu acho que é preciso mudar a intervenção direta na regulação da economia. Isso é um desastre.
Para o Brasil ser Suécia, precisa de qual modelo de crescimento?
Samuel Pessoa: Uma vez eu pensei nisso. Acho que o modelo nosso modelo é meio nosso. Há o modelo anglo saxão, que é pouco welfare e tem pouca intervenção direta do Estado na economia. Há o modelo europeu que é muito welfare e tem uma regulação mais dura do Estado. Há o modelo oriental, muito pouco welfare, mas com muita regulação. O nosso é único. Muito welfare e com uma regulação menor na economia. Acho que isso é possível e tem condições de gerar crescimento econômico. Talvez seja um modelo parecido com países como a Austrália.
Como você compararia a transição de 2002 com a de 2014.
Samuel Pessoa: São bem parecidas, mas com uma diferença: em 2002 a gente estava melhorando. Havia um monte de problemas na época, mas estávamos muito melhor que em 1994. Se eu comparar agora com 2010, pioramos. Vamos comparar os números de 2002 e 2014. Eu olhei hoje. A inflação em 2002 fechou em 12,5%. Muito alta. A inflação neste ano vai fechar em 6,5%. Fica parecendo que piorou, mas não é bem isso quando você abre a inflação. Serviços em 2002: 5,5%. Serviços hoje: 8,5%. Serviços é o componente mais duro da inflação. Sob o critério inflação de serviços, 2002 é melhor. Impressionante. Não tinha nenhum atraso tarifário em 2002. Agora, há um enorme atraso tarifário. Apesar de a inflação em 2002 ser mais alta, a sua composição era muito melhor. Superávit primário de 2002: 3% do PIB. Neste ano: 0,8%. Déficit de transação correntes em 2002: 1,7% do PIB. Neste ano, provavelmente 4%. Aparentemente, hoje a conta está mais alta. Se levarmos em conta a inflação represada e a dificuldade para reduzi-la, porque as expectativas estão muito contaminadas, podemos dizer que o desafio em relação a inflação em primeiro de janeiro de 2015 será maior que o desafio em janeiro de 2003. Em 2003 a inflação era alta, mas o câmbio estava super desvalorizado. Coisa que agora não há. O câmbio desvalorizado apontava uma inflação cadente.
Então 2015 será um ano difícil?
Samuel Pessoa: Sim. Todo mundo sabe que será um ano difícil. O povo já sabe.
O eleitor percebe todos esses problemas?
Samuel Pessoa: Demora. A situação de renda continua boa. A PME (Pesquisa Mensal de Emprego) da semana passada mostrou que, na comparação ano a ano, a renda ainda está crescendo 3%. É menos que antes, mas ainda é acima da produtividade do trabalho. O PIB cresce 2% e a renda cresce 3%. O desemprego ainda está baixo. Mas acho que há um desconforto. Eu li no jornal hoje que novos cálculo da consultoria de Mário Veiga apontam que a probabilidade de racionamento de energia mais profundo é de 46%. Se abril não for chuvoso, esse negócio piora. Não parece que abril vai ser mais chuvoso. Esse é um assunto delicado. A dificuldade do FHC para eleger o Serra esteve relacionada ao racionamento. O racionamento abortou a possibilidade de crescimento. Se não tivesse tido racionamento, talvez a economia estivesse bombando, houvesse recuperação da renda e isso seria suficiente para eleger o Serra. A questão energética vai pesar.
O senhor espera uma disputa eleitoral acirrada?
Samuel Pessoa: Essa é uma pergunta para consultor político. Eu acho que vai ter segundo turno. Apesar de tanto Aécio quanto Eduardo Campos não serem políticos conhecidos nacionalmente, são políticos profissionais. Aécio está há mais de 30 anos na política. Por causa dessa experiência, a Dilma vai ter dificuldades no debate no segundo turno. 

Brasil: destruindo a competencia militar

Triste quadro, que aparentemente não será revertido facilmente.
Mas a pergunta importante é esta aqui: existe alguma razão racional para que um mero técnico legislativo ganhe TRÊS VEZES mais do que um oficial especializado das FFAA?
Eu só vejo uma: o comportamento predatório, mandarinesco (no mau sentido da palavra) ou nababesco, de nossas elites políticas, que aliás não merecem esse substantivo. 
Paulo Roberto de Almeida 

Defesa

Forças Armadas perdem seus cérebros

Baixos salários e atraso tecnológico fazem com que 653 oficiais da elite militar do país pendurem as fardas

Lucas Souza
Veja.com, 6/04/2014
O ex-capitão Victor Dalton
O ex-capitão Victor Dalton (Cristiano Mariz/VEJA)
Aos quinze anos, o baiano Victor Dalton já tinha o desejo de seguir a carreira militar. Deixou a casa dos pais em Porto Seguro (BA) e viajou sozinho a Campinas (SP) para ingressar na Escola Preparatória de Cadetes do Exército, em 1999. Após uma passagem na Academia Militar das Agulhas Negras, foi aprovado no vestibular de engenharia da computação do Instituto Militar de Engenharia (IME), um dos mais difíceis do país. “Recebi uma promoção para o posto de capitão quando me formei. Sempre gostei do meu trabalho. Mas, depois que me casei, os gastos aumentaram e eu tive de dar um jeito na situação”, conta. Victor tinha onze anos de Exército, e pouco mais de um ano de casado, quando decidiu batalhar por outro emprego. Quando passou no concurso para ser analista legislativo na Câmara dos Deputados, seu salário triplicou, de pouco mais de 5.000 para 16.000 reais. 
A história do ex-capitão ilustra a fuga de cérebros que atinge as Forças Armadas brasileiras. Nos últimos três anos, outros 652 oficiais pediram baixa das três Forças. A debandada aumentou 63% de 2011 a 2013. Esse grupo inclui a elite militar do país, formada em centros de excelência, como o IME e o ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica). O número de engenheiros que deixaram a farda, por exemplo, cresceu 153% e chegou a 92 no ano passado. Só no primeiro mês deste ano, outros onze já abandonaram a carreira militar em busca de salários maiores na iniciativa privada e de uma ascensão profissional mais rápida. No total, restam pouco mais de 1.700 engenheiros entre os mais de 500.000 militares brasileiros.
Essa “deserção” tem impacto direto em grandes projetos no país com participação dos militares, seja porque nenhuma empreiteira se interessou ou porque as empresas contratadas não conseguiram cumprir o contrato. Obras como a construção da BR-163 (que liga o Pará ao Rio Grande do Sul) e a recuperação da BR-319 (do Amazonas a Rondônia), tocadas por batalhões de engenharia do Exército, foram paralisadas por problemas operacionais. A primeira apresentou “deficiência” no projeto de execução, enquanto a segunda teve falhas no estudo do impacto ambiental, de acordo com o Tribunal de Contas da União. 
Jefferson Coppola/VEJA

O ex-coronel da FAB Nehemias Lacerda
Uma das promessas da campanha presidencial de Dilma Rousseff em 2010, a transposição do Rio São Francisco tornou-se um verdadeiro vexame para a gestão petista e para os militares brasileiros. Até o projeto básico de um trecho sob responsabilidade do Exército, o da Bacia do Nordeste Setentrional, foi considerado deficiente pelo TCU. Para a realização de um projeto hidroviário no rio, o governo teve de contratar, em 2012, o Exército americano.
Outro fator de preocupação é a defesa cibernética brasileira. Embora um centro militar de estudos no setor tenha sido criado em 2012, o país permanece frágil perante os ataques. Apenas no ano passado, os sites da Polícia Federal, Senado, IBGE, Ministério dos Esportes, Cultura e Cidades foram atacados e deixados momentaneamente fora do ar. O próprio ministro da Defesa, Celso Amorim, chegou a ressaltar a dificuldade de manter profissionais dentro das Forças. “Precisamos ter formação de pessoal e garantir que eles continuem trabalhando para nós. Frequentemente se ouve sobre alguém que era muito bom e foi trabalhar em uma multinacional”, afirmou em novembro.
A questão salarial é, de fato, um dos motivos que levam a essa fuga. Em 2000, um capitão da Marinha ganhava o equivalente a dezoito salários mínimos. Hoje, o poder de compra caiu pela metade. Enquanto isso, a revolução tecnológica e o fenômeno das start-ups também atraem os profissionais mais qualificados para a iniciativa privada. “Conforme eu crescia na hierarquia militar, passei a receber atribuições administrativas. Mas a minha vocação era trabalhar como pesquisador”, conta o ex-coronel da FAB Nehemias Lacerda. Formado em engenharia pelo ITA, depois de trinta anos na Aeronáutica ele decidiu abrir sua própria empresa. Na carteira de clientes em busca de soluções de engenharia estão Embraer, Vale, Votorantim e multinacionais como General Motors, Ford e Philips.
A competição entre a carreira militar e a iniciativa privada é uma guerra desigual, com enorme vantagem para o campo adversário das Forças Armadas. Neste ano, o Ministério da Defesa foi o que sofreu o maior corte entre as pastas. O orçamento caiu de 4,5 bilhões em 2013 para 3,5 bilhões de reais neste ano. A perspectiva de grandes inovações vindas dos militares é tão distante quanto as suas principais realizações – como a primeira transmissão de telégrafo no país, em 1851, na Escola Militar do Rio de Janeiro.

Jacques Le Goff: um grande historiador da Idade Media (e nao apenas...) - Gilles Lapouge

O tapeceiro do passado
Na História de Jacques Le Goff, os contornos dos tempos perdidos ganham sutileza, cor, verdade
06 de abril de 2014 |
Gilles Lapouge - O Estado de S. Paulo

Jacques Le Goff morreu em Paris aos 90 anos. Era o maior historiador francês e um dos últimos representantes da escola dos Annales, que desde os anos 1930 vem subvertendo na França e no mundo a leitura do passado dos homens. A primeira geração dos Annales foi a de Marc Bloch e Lucien Febvre; foi seguida por aquela do grande Fernand Braudel, que em1936 lecionou na recém-fundada Universidade de São Paulo; depois da guerra, sucedeu-lhe a terceira geração, com Georges Duby, Leroy-Ladurie e, principalmente, Jacques Le Goff.
Esses grandes intelectuais dotaram a pesquisa histórica de um novo suporte lógico. Em vez de se debruçarem apenas sobre as batalhas, as coroações ou as tragédias, dedicaram igual interesse à vida cotidiana, ao que chamavam de non-événementiel (não factual): a metamorfose das mentalidades, a transformação dos hábitos, as lentas evoluções da maneira de amar, de alimentar-se, de morrer; as descobertas das paisagens, os jogos da paixão, as relações dos homens com o próprio corpo, as festas, as flexões das palavras e da linguagem.
Eles urdiram uma nova tapeçaria do passado. As imagens dos tempos perdidos ganharam em sutileza, verdade e cor. Além dos períodos convulsionados da história tradicional, estudaram os períodos pesados, lentos, quase viscosos que moldam o caráter das sociedades de maneira bem mais profunda que as guerras e o cerimonial da política.
Nessa ressurreição do passado, Jacques Le Goff ocupa uma posição eminente. Não apenas presta atenção a cores jamais percebidas como faz surgir do abismo da morte, do fundo do tempo, todo um continente, uma Idade Média desconhecida que a nossos olhos maravilhados se revela como os emergentes destroços de um navio magnífico, carcomido por moluscos e ferrugem e ainda resplandecente dos matizes das profundezas.
Ele busca e apreende essa Idade Média na consciência dos homens. Estuda seus sonhos e terrores, palavras e quimeras, corpos e alimentação. Ouve o gargalhar das bruxas, o sussurrar das monjas em oração no branco manto das igrejas e mosteiros que na Idade Média cobriam a cristandade.
A história de Le Goff nos seduz de outras maneiras. Seus escritos revelam o prazer, a fruição que ele experimenta ao devorar velhos manuscritos, antigos vestígios semiapagados, sacudindo a poeira que cobria, até sufocá-las, antigas representações que tínhamos daqueles tempos. "O pó se levanta ao poderoso vento do mar aberto", diz ele.
Em suas retortas de alquimista, Le Goff descobre paisagens jamais suspeitadas. A Idade Média não é mais a "noite negra" que separava, na história tradicional, o fim do Império Romano da Renascença. Uma nova Idade Média se descortina, feita de sombras, evidentemente, mas também de uma luz sublime. Essa Idade Média inédita é a verdadeira matriz de nossa modernidade.
"É na Idade Média’, afirma Le Goff, "que se constitui o elemento fundamental de nosso cristianismo. É nela que vemos a formação do Estado e da ideia de soberania. E também o surgimento da língua francesa, o desenvolvimento urbano e a fundação da cidade moderna. É sempre na Idade Média que vemos crescer as universidades, fenômeno novo e europeu. Porque a Europa também nasce na Idade Média."
Quais de seus livros podemos citar? O mais célebre é A Invenção do Purgatório, que se situa no século 12. Le Goff não só acompanha as etapas do surgimento como explica o motivo pelo qual, nessa época, os homens repudiam a terrível divisão entre bem-aventurados e amaldiçoados, inferno e paraíso, e acham mais compassivo acrescentar a um maniqueísmo atroz os estágios intermediários do purgatório para se ter em conta a infinita variedade do Mal e do Bem.
Jacques Le Goff tinha outra virtude. Homem da palavra, apresentava sua bela Idade Média no rádio. Seus programas fascinaram a França. Ele "representava" a história no rádio como a representava em seus cursos. Quando trabalhava numa grande biografia do rei São Luís, fascinou seus alunos descrevendo como o corpo (sagrado) do rei, que morreu de peste durante a oitava Cruzada, foi fervido pelos companheiros para que seus ossos pudessem ser levados de volta à França.
Era um apreciador dos bons vinhos e da boa cozinha, um brilhante interlocutor. Compartilhar um jantar com esse grande amante da vida era uma festa. Lembro-me de um deles. Ao ser servido um queijo de cabra na sobremesa, Le Goff começou a comparar a crosta do queijo, de cor cinzenta, bronze, azulada e ferrugem, recoberta de pequenas borbulhas, ao grão da pintura dos quadros de Giotto e Fra Angelico. Dali, divagou como num sonho e nos transportamos, como por um passe de mágica, da crosta do queijo de cabra para a cidadezinha de San Gimignano, depois para Florença e a dinastia dos Médicis, terminando com não sei que papa dos albores da Renascença. Tudo isso, todo esse teatro, estava como que escondido no humilde queijo de cabra. Le Goff terminou a representação dando uma dentada decisiva no queijo que, de repente, tornara-se algo sublime aos nossos olhos.
É emocionante e eloquente ver, neste momento em que o grande explorador e viajante do tempo já não está entre nós, o jornal Le Monde pedir ao grande escritor italiano Umberto Eco, autor de O Nome da Rosa, seu testemunho sobre esse que foi seu amigo. Como se o historiador rigoroso que foi Le Goff só pudesse ser celebrado por um dos maiores romancistas europeus. 
/ TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA


O golpe e o regime militar: minha visao de 1964, reproduzida nas Colunas Dom Total

O primeiro de uma série de dez, já transcrito aqui, mas nesta forma com ilustração, neste link: http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=4170

03/04/2014  |  domtotal.com

O Brasil na crise de 1964 e a oposição armada ao regime militar

Um retrospecto histórico, por um observador engajado (1).
Sumário geral:

1. Antecedentes e contexto do golpe militar de 1964

2. A reação dos perdedores: resistência política e luta armada

3. A passagem à luta armada: a insensatez em ação

4. A derrota da luta armada e suas consequências: uma história a ser escrita

5. O que foi a luta armada no Brasil: uma interpretação pessoal

6. Quando a luta armada se desenvolveu no Brasil?

7. Onde a luta armada se desenvolveu no Brasil?

8. Como a luta armada se desenvolveu?

9. Por que houve luta armada no Brasil?

10. Uma avaliação pessoal da luta armada e suas consequências atuais

1. Antecedentes e contexto do golpe militar de 1964

O Brasil do início dos anos 1960 enfrentava uma típica crise de instabilidade do sistema político, não muito diferente de dezenas de outras, que surgem, se desenvolvem e desaparecem em quaisquer outros sistemas políticos, especialmente na América Latina. Desde meados dos anos 1950, a classe política, extremamente dividida quanto a soluções consensuais típicas de países em crescimento – inflação, gastos do governo, tributação, reformas estruturais e administrativas, etc. – não conseguia encontrar mecanismos democráticos para encaminhar as pressões do crescimento e das demandas por participação popular. Daí o velho recurso e o apelo dos políticos aos militares, como “pesos decisivos” na balança política, para “corrigir os problemas”.

De fato, os militares tinham uma longa tradição de intervenção nos assuntos políticos, desde o próprio golpe de derrocada da monarquia e de proclamação da República, até as crises político-militares dos governos JK e Jânio Quadros, passando pelas revoltas tenentistas dos anos 1920, pela revolução que derrubou a Velha República, pelo golpe que instaurou a ditadura do Estado Novo, em 1937, e também pelo que determinou sua extinção, em outubro de 1945. Depois, eles foram ativos participantes dos diversos episódios de turbulência da República de 1946, em especial em meados dos anos 1950, até culminar na implantação do parlamentarismo, em 1961, no bojo de nova crise, e na derrubada dessa República, menos de três anos depois.

Desde meados da década anterior, nos estertores do segundo governo Vargas, o Brasil vivia em permanente crise político-militar, agravando-se as turbulências no início dos anos 1960 em função do comportamento bizarro do presidente eleito Jânio Quadros e da momentosa posse do vice-presidente (eleito pela chapa concorrente) João Goulart. A situação, durante os seus três anos de mandato (primeiro em regime parlamentarista, depois no retorno ao presidencialismo), se caracterizava por constantes greves, inflação crescente, quebra de autoridade em diversas instâncias do poder estatal, inclusive no âmbito das Forças Armadas, e intensa radicalização política por parte dos movimentos que pretendiam para o Brasil opção semelhante à dos países comunistas, indo até, em certos meios, à preparação para a guerrilha rural, em moldes cubanos ou chineses.

O movimento civil-militar – não lhe cabe o nome de golpe, nem de revolução – que derrocou o regime da República de 1946 representou apenas o ponto culminante dessa fase de crise aguda, não sendo nem o resultado de uma conspiração organizada pela direita e pelas elites – como pretende a esquerda – nem o acabamento de algum desígnio imperial no contexto da Guerra Fria – como pretendem os paranoicos anti-imperialistas e antiamericanos das mesmas correntes. Ele ocorreu porque grande parte da sociedade, representada majoritariamente pela classe média, demandava uma solução aos descalabros administrativos, à corrosão do poder de compra, ao clima de desordem política, à percepção do aumento da corrupção que caracterizavam o governo Goulart.

Talvez os militares devessem ter aguardado as eleições do ano seguinte, e ter apostado numa solução democrática em face desse quadro turbulento, mas o fato é que o agravamento da situação induziu algumas lideranças civis e militares a atuarem de imediato contra o governo, sem que a necessária coordenação de todas as forças políticas se fizesse num sentido mais consentâneo com a legalidade constitucional. Existem momentos na história de um país nos quais a população decide assumir ela mesma as atribuições de um poder constituinte originário; foi o que parece ter ocorrido em março de 1964, quando a grande maioria da população brasileira secundou e se solidarizou com as Forças Armadas que assumiram o comando involuntário daquele movimento. A história poderia ter sido outra, mas ela é o que é: incontrolável.

A historiografia brasileira ainda se divide quanto à natureza do golpe, suas origens políticas, suas raízes sociais, suas justificativas econômicas ou geopolíticas, sobre o envolvimento dos Estados Unidos no evento, segundo se é contra ou a favor em relação a esse evento decisivo no Brasil moderno. A esquerda, obviamente, interpreta o golpe militar como o avanço das forças reacionárias, alinhadas ao imperialismo, contra a ascensão dos “movimentos populares”, em favor de reformas democráticas; ela nunca mudou de opinião a esse respeito, o que denota certa incapacidade a revisar suas próprias concepções e caminhar em direção de uma interpretação mais objetiva.

Os que apoiaram e comandaram o golpe, o veem como uma reação às forças comunistas que ameaçavam tomar o poder para colocar o país na esfera do movimento comunista internacional, liderado pela URSS. No caso do Brasil, curiosamente, as forças de “direita” ganharam, mas a História foi escrita pela “esquerda”, no sentido em que todo o processo político que levou às crises político-militares dos anos 1954-1964 e ao próprio golpe e seus efeitos mediatos e imediatos foram e são interpretados segundo a ótica dos “perdedores”, que, aliás, ascenderiam ao poder em 2003. De fato, o Brasil constitui um caso único de construção de um discurso histórico – e de vários outros padrões culturais – no qual a linha condutora veio a ser quase inteiramente dominada e controlada pelas forças, basicamente socialistas, que não tiveram o apoio da sociedade, seja nos momentos de crise política aguda, ou como projeto de organização econômica e social suscetível de recolher o apoio eleitoral da grande massa da população.

(Continua...)

Paulo Roberto de Almeidaé doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas (1984). Diplomata de carreira desde 1977, exerceu diversos cargos na Secretaria de Estado das Relações Exteriores e em embaixadas e delegações do Brasil no exterior. Trabalhou entre 2003 e 2007 como Assessor Especial no Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Autor de vários trabalhos sobre relações internacionais e política externa do Brasil. 

Alo pais: acabou o MacLanche Feliz: os companheiros acham que isso perverte as criancinhas...

Do blog de Klauber Pires, Libertatum:


Por Klauber Cristofen Pires
Libertatum: 05 Apr 2014 02:59 PM PDT

Sob as barbas de todos, a governo acaba de baixar uma medida duríssima contra a propaganda comercial e pois, contra a liberdade de expressão. 

Enquanto os empresários vivem correndo atrás de cada ossinho que o governo lhes joga...

Enquanto os pais e mães vivem atrás da tela da tv assistindo a Rede Globo fazer proselitismo gaysista e  "denunciar" o machismo da fraudulenta pesquisa do IPEA...

Enquanto todos os cidadãos vão pensando que a Venezuela fica muito longe daqui...

O governo do PT, por meio da Secretaria dos Direitos Humanos - Conselho Nacional dos direitos da criança e do Adolescente- Conanda, acaba de instalar a censura à propaganda dirigida ao público infantil. 

Conforme a RESOLUÇÃO No - 163, DE 13 DE MARÇO DE 2014, publicada no DOU de sexta-feira, 04 de abril de 2014, daqui por diante fica proibida qualquer propaganda que tenha o público infantil por alvo. 

Com a supracitada resolução, não somente a propaganda é proibida, mas inclusive programas infantis, como aqueles em que crianças ganham brinquedos como prêmios por gincanas. Isto significa o fim de programas como o da Xuxa e do Gugu.

A medida do governo vem bem a calhar para tornar as empresas de comunicação mais dependentes da propaganda estatal, esta sim enganosa e danosa ao público. 

Eu mesmo já tentei alertar a Abap (Associação Brasileira de Agências de Publicidade), que representa as agências brasileiras associadas à indústria de comunicação, especialmente as agências de propaganda. É da Abap a iniciativa pela realização da campanha SOMOS TODOS RESPONSÁVEIS, uma campanha que ao meu ver foi boa em enaltecer o papel da responsabilidade de toda a sociedade sob a égide da liberdade liberdade de expressão e auto-regulamentação publicitária, mas miseravelmente omissa em denunciar a fonte autoritarista por trás do FNDC - Forum Nacional pela Democratização da Comunicação. Deu no que deu.

Abaixo, segue um comunicado do Instituto Alana, do Banco Itaú, uma ONG anti-capitalista e assentada sobre os métodos de ensino marxistas de Paulo Freire, que tem agido intensamente a favor da censura dos meios de comunicação, para os leitores terem uma compreensão da extensão dos seus efeitos:



O texto completo, disponível aqui, diz que “a prática do direcionamento de publicidade e comunicação mercadológica à criança com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço” é abusiva e, portanto, ilegal segundo o Código de Defesa do Consumidor.
A resolução lista os seguintes aspectos que caracterizam a abusividade:
-       linguagem infantil, efeitos especiais e excessos de cores;
-       trilhas sonoras de músicas infantis ou cantadas por vozes de criança;
-       representação de criança;
-       pessoas ou celebridades com apelo ao público infantil;
-       personagens ou apresentadores infantis;
-       desenho animado ou de animação;
-       bonecos ou similares;
-       promoção com distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis ou com apelos ao público infantil;
-       promoção com competições ou jogos com apelo ao público infantil.
Com a resolução, a partir de hoje fica proibido o direcionamento à criança de anúncios impressos, comerciais televisivos, spots de rádio, banners e sites, embalagens, promoções, merchadisings, ações em shows e apresentações e nos pontos de venda.
O texto versa também sobre a abusividade de qualquer publicidade e comunicação mercadológica no interior de creches e escolas de educação infantil e fundamental, inclusive nos uniformes escolares e materiais didáticos.
Para o Conanda, composto por entidades da sociedade civil e ministérios do governo federal, a publicidade infantil fere o que está previsto na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código de Defesa do Consumidor.
O Instituto Alana integra o Conanda, na condição de suplente, e contribuiu junto aos demais conselheiros na elaboração e aprovação desse texto.
“A partir de agora, temos que fiscalizar as empresas para que redirecionem ao público adulto toda a comunicação mercadológica que hoje tem a criança como público-alvo, cumprindo assim o que determina a resolução do Conanda e o Código de Defesa do Consumidor”, afirma Pedro Affonso Hartung, conselheiro do Conanda e advogado do Instituto Alana. “É um momento histórico. Um novo paradigma para a promoção e proteção dos direitos da criança e do adolescente no Brasil”, comemora Pedro.

IZOT e ALEKS: diplomatas brasileiros agentes da KGB (ainda nao identificados...)

Provavelmente nunca o serão, a menos que Putin -- o novo czar de todas as Rússias, e de mais algumas que ainda não foram devidamente reincorporadas ao ex-império soviético -- tenha um súbito ataque de transparência mórbida, que o faça revelar todos os segredos da antiga KGB, o que é totalmente improvável e impossível que ocorra. Mesmo que ele quisesse, desejasse, pretendesse fazer esse gesto tresloucado, seria devidamente "neutralizado" pelos mesmos serviços, como é lógico e esperado que se faça assim.
O mesmo ocorre e ocorreria na maior democracia do mundo: mesmo que o presidente -- digamos um bocó animado pelo gosto imoderado da transparência -- desejasse terminar com todos os programas de monitoramento da CIA, da NSA e de todos os demais serviços que pululam como champignons nesse grande continente democrático -- e não perverso, como querem fazer acreditar os esquerdistas mais bocós ainda -- ele nunca conseguiria: a lógica burocrática e kafkiana dos serviços de inteligência o impediria.
Assim, nunca saberemos quem foram os diplomatas brasileiros que serviram -- voluntariamente ou não -- como agentes soviéticos durante boa parte da Guerra Fria.
Provavelmente existem ainda alguns, não exatamente remanescentes da Guerra Fria, pois já estariam aposentados e mesmo mortos, mas alguns companheiros que ainda acham que vale a pena morrer por Cuba. Não exatamente isso, claro, mas como no caso dos agentes Izot e Aleks, o quadro é sempre o mesmo: seja por convicções ideológicas -- e portanto, por desejo pessoal de servir uma causa perdida -- seja por chantagem -- mulheres, dinheiro, trapaça, antigamente denúncia de homossexualismo (mas isso já não pega mais, embora tenha sido um motivo poderoso nos velhos tempos da moralidade hipócrita) -- ou por qualquer outro motivo, existem sempre indivíduos dispostos a trair o seu país para servir algum outro, nesse tipo de atividade, que parece ser a segunda mais antiga do mundo, assim dizem.
Pois é, os serviços cubanos, a pedido dos soviéticos, e estes mesmos, diretamente, penetraram nossos códigos em Luanda e em Brasília, e assim leram todas as nossas mensagens confidenciais, as mesmas que o NSA lê regularmente graças ao poderio de sua tecnologia (algo que os soviéticos nunca puderam igualar, por isso tendo de se apoiar nas velhas regras da espionagem, de chantagem ou afiliação ideológica), e isso muito tempo antes que os companheiros estivessem no poder.
Como todos sabem, uma das primeiras providências do Richelieu do Planalto, do grão-vizir do cerrado central -- sim, ele mesmo, o Stalin sem Gulag -- ao tomar posse do que ele julgava ser o Politburo do Comitê Central do aparelho do partido neobolchevique travestido em governo -- enfim, era tudo o mesma coisa para ele, mas como seus mestres cubanos ensinaram, ele precisava antes de montar um aparelho secreto, dentro do aparelho clandestino, dentro do aparelho obscuro do partido totalitário --, retomo, sua primeira providência foi tratar de fazer um acordo internacional (me pergunto se passou pelo Congresso) de cooperação (sic três ou quatro vezes) entre a ABIN, nossos pobres arapongas, e a Inteligência Cubana. Sim, nada menos do que isso, no que ele devia atender a uma ordem dos seus ex-chefes cubanos.
Bem, a pedido de alguns, ou de um, transcrevo o que já tinha postado aqui em outros tempos, mas parece que ninguém prestou atenção.
Os arapongas é que me forneceram a dica, e eu fui conferir no livro: está tudo lá.
Me surpreende que os congressistas, que possuem uma comissão especial para supervisionar o trabalho da ABIN, não tenham nunca se posicionado sobre esse acordo entre brasileiros e cubanos companheiros na mesma espionagem comunista, entre eles ao que parece.
Deixo com vocês, as dicas da publicação.
Cada um faça o que quiser...
Paulo Roberto de Almeida
PS.: Para ler sem os problemas desta transcrição, basta ir neste link:
http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/03/1743-soviet-penetration-of-brazil-e-o.html

quarta-feira, 3 de março de 2010 

1743) Soviet penetration of Brazil (é o caso de se dizer...)

Na verdade, se trata do trabalho de inteligência dos serviços de espionagem soviéticos envolvendo o Brasil, tal como pode ser lido neste livro, que revela apenas uma parte, pequena provavelmente, desse mundo obscuro.
Limito-me a transcrever a informação pertinente ao Brasil contida no livro, sem comentários no momento.

ANDREW, CHRISTOPHER & MITROKHIN, VASILI:
The World Was Going Our Way: The KGB and the Battle for the Third World 
New York: Basic Books, 2005.

Brazil: 89, 96, 104-107; 477
Brasilia KGB Residence: 105-106

p. 96: (1976):
“Among the DGI operations in Angola carried out to assist the KGB was a penetration of the Brazilian Embassy to obtain intelligence on its cipher system. A technical specialist from the Sixteenth (SIGINT, intelligence derived from interception and analysis of signals) Directorate flew out from Moscow with equipment which enabled a DGI agent to photograph the wiring of the embassy’s Swiss-made TS-803 cipher machine.”(33)
(Note 33, p. 519: “k-22, 150. The DGI carried out a similar operation , at the request of the KGB, against the Venezuelan Embassy in Havana.”)
[k stands for “k series: handwritten notebooks containing notes on individual KGB files”, p. 595, on Bibliography, 1. Mitrokhin Archive]

p. 105:
“For most of its existence, the military regime which held power from 1964 to 1985 made Brazil a relatively hostile environment for KGB operations. There was little prospect during the 1970s either of acquiring confidential contacts within government, as in Argentina and Peru, or of finding contacts with direct access to the President, as in Mexico. The KGB’s best intelligence on Brazil probably came from its increasing ability to intercept Brazil’s diplomatic traffic. By 1979 the radio-intercept post (codenamed KLEN) in the Brasilia residency was able to intercept 19,000 coded cables sent and received by the Foreign Ministry as well as approximately 2,000 other classified official communications”(67)
(Note 67, p. 520: “k-22, 128. “Since Mitrokhin had no access to the KGB Sixteenth (SIGINT) Directorate, he was unable to note the contents of any decrypts.”)

SIGINT enabled the Center to monitor some of the activities of probably its most important Brazilian agent, codenamed IZOT, who was recruited while serving as Brazilian ambassador in the Soviet bloc.(68)
(Note 68, p. 521: “IZOT is the highest-ranking Brazilian agent identified in the files noted by Mitrokhin. He provided recruitment leads on three fellow diplomats, including the ambassador of a NATO country in Prague. IZOT had himself been talent-spotted for the KGB by another Brazilian ambassador, an agent codenamed ALEKS; k-22, 235-7”)

“As well as providing intelligence and recruitment leads to three other diplomats, IZOT also on occasion included in his reports information (probably disinformation) provided by the KGB. Assessed by the KGB as ‘adhering to na Anti-American line and liberal views concerning the development of a bourgeois society’, IZOT was a paid agent. His remuneration, however, took a variety of forms, including in 1976 a silver service valued by the Centre at 513 rubles. The Centre has increasing doubts about IZOT’s reliability. On one occasion it believed that he was guilty of ‘outright deception’, claiming to have passed on information provided by the KGB to his Foreign Ministry when his decrypted cables showed that he had not done so.” (69)”
(Note 69, p. 521: “k-22, 235-7; k-8, 551.)
(...)

p. 106:
“Despite hard-line opposition, Figueiredo issued an amnesty for most of Brazil’s remaining political exiles, including Prestes and other leading Communists.”(72)
(Note 72, p. 521: "In May 1980 Prestes was succeeded as a leader of the Brazilian Communist Party by Giocondo Dias. In December Dias sent his thanks to Moscow, via the Brasilia residency, for allowing him, like his predecessor, to nominate Party members for free visits to Soviet sanatoria and holiday homes; k-26, 339”)

p. 106:
“In the spring of 1980 a Soviet parliamentary delegation headed by Edward Shevardnadze, then a candidate (non-voting) member of the Politburo, visited Brasilia. Unknown to their hosts, the plane (Special Flight L-62) carried new radio interception equipment to improve the performance of the residency’s SIGINT station, and took the old equipment with it when it left. (...) (74)
(Note 74, p. 521: “k-22, 1, 3”)

[End of transcriptions related to Brazil]

ANDREW, CHRISTOPHER & MITROKHIN, VASILI. The World Was Going Our Way: The KGB and the Battle for the Third World (New York: Basic Books, 2005).

See also, by the same authors: The Sword and the Shield: The Mitrokhin Archive and the Secret History of the KGB


 See 
more at: http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/03/1743-soviet-penetration-of-brazil-e-o.html#sthash.SLDCEfQ9.dpuf