Mini-reflexão sobre o estado catatônico a que chegou o Brasil em 2021
Paulo Roberto de Almeida
(www.pralmeida.org; http://diplomatizzando.blogspot.com)
[Objetivo: debate público; finalidade: organização da sociedade]
Perguntar não ofende: depois que um aprendiz de
feiticeiro criou uma enorme confusão em torno de todos os processos levados a
efeito pela República de Curitiba no âmbito da Lava Jato, quem será o Grande
Feiticeiro que colocará ordem na bagunça?
Um dos processados?
Todos?
É o fim de qualquer esperança de que a corrupção
possa ser algum dia combatida eficazmente no Brasil?
Devemos inscrevê-la com um dos componentes
essenciais, formadoras do espírito nacional, assim como a jabuticaba e o
jeitinho?
Qualquer que sejam as respostas, vou inscrever a
insegurança jurídica como a terceira maior tragédia brasileira, ao lado da, e
em paridade com a baixa produtividade do capital humano (derivada da péssima
qualidade da educação de massa) e a corrupção política, esta sim triunfante e
resplandecente desde as origens da nação.
Vai demorar para consertar tudo isso, se é verdade
que algum dia conseguiremos.
Já estamos dando meia volta volver...
Aliás, fizemos pior do que isso: os retrocessos impostos
por um psicopata no comando do país — como resultado do autoengano coletivo nas
últimas eleições presidenciais e da visão apalermada do mundo e do Brasil que
possuem suas elites econômicas, civis e militares — representam monstruosidades
institucionais e sobretudo MORAIS, que não fomos capazes de antecipar em 2018.
Vamos continuar apostando no imponderável? Vamos
nos submeter à ditadura da polarização que o mesmo psicopata nos impôs desde o
início de sua abjeta campanha política?
Polarização que alimenta um contínuo ambiente de perversões
políticas e morais baseadas na mentira populista, na demagogia econômica, no
atraso cultural e educacional do país?
Há muito tempo que o Brasil vive um lento processo
de anomia política, de descalabro moral, de fragmentação institucional, de
assalto constante aos recursos duramente extraídos da coletividade para serem
entregues à saciedade de lobbies corruptores, aos privilégios corporativos de
mandarins da República e de aristocratas do Judiciário, na indiferença cúmplice
dos mais altos representantes do Grande Capital, estes também interessados na
perpetuação das vantagens que podem auferir de um sistema político e de estruturas
econômicas altamente deformadas e já totalmente disfuncionais.
Suas elites, inclusive as supostamente
intelectuais, se têm mostrado incapazes de estabelecer um mínimo consenso sobre
o que é disfuncional no país, para a partir daí formular um diagnóstico sobre
nossos equívocos mais flagrantes, como base necessária a um processo gradual de
reformas dentro da ordem democrática.
Todos esses problemas, “normais” — pois que
inscritos na agenda do “momento”, que se arrasta há anos, senão há décadas —
foram magnificados pela pandemia, sobretudo a desigualdade de chances em face
da morte, muito mais provável para os mais pobres e fragilizados pela nossa
abissal concentração de renda, e ainda mais potencializados pela gestão
criminosa da crise pandêmica pelo psicopata que ocupa o poder atualmente.
Estamos condenados a fazer mais do mesmo, ou seja,
escolher mais um “salvador da pátria” como a solução-milagre para todos os
nossos males? Somos incapazes de debater racionalmente as soluções para os
problemas mais prementes — salvar vidas — e depois encaminhar as soluções para
os obstáculos estruturais a um processo inclusivo de desenvolvimento econômico
e social? Continuaremos no marasmo?
Recuso-me a crer que sejamos tão incapazes de fazer
o mínimo, que é pensar sobre a Reconstrução da Nação.
O mais imediato, obviamente, é a necessária
coordenação de esforços e medidas para SALVAR VIDAS. Se para isso for
necessário afastar o GENOCIDA que nos desgoverna, que se faça.
Em seguida cabe estabelecer uma plataforma mínima de
defesa da democracia e da governança — atualmente seriamente amaçadas — para
que se dê início a esse processo de Reconstrução da Nação: macroeconomia
estável, microeconomia aberta e competitiva, boa qualidade da governança
(sobretudo no Judiciário), alta qualidade do capital humano (com concentração
de esforços no ciclo fundamental) e total abertura econômica e inserção na
globalização, com liberalização comercial e investimentos estrangeiros diretos.
Não deveria ser difícil a representantes
qualificados dos círculos mais influentes da nação — nas esferas da economia,
da política e da academia — se colocarem de acordo sobre essa plataforma mínima
de consenso em torno das tarefas mais imediatas de ação (o salvamento de vidas)
e dos processos de reformas graduais.
Estou pedindo muito?
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 3867, 13 de março de 2021