O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

segunda-feira, 3 de abril de 2023

Livros de Paulo Roberto de Almeida na Amazon: próprios, editados por mim, colaborações (uma bela salada)

Livros de Paulo Roberto de Almeida na Amazon.com

Estive comprando, um livro ou dois, na Amazon, paguei, já tenho data de recebimento, e aí resolvi colocar o meu nome para ver o que estava sendo oferecido em meu nome nesse grande destruidor de pequenas e grandes livrarias. Tomei um susto: sem ter colocado aspas para restringir a seleção, recebi a informação de que havia mais de 390 livros catalogados em 25 páginas de 16 livros cada uma, tudo misturado: livros próprios, impressos por editoras comerciais, universitárias ou livros em Kindle, livros editados por mim (o que inclui introdução e mais de um capítulo preparado especialmente) e alguns outros livros com os quais colaborei, editados por terceiros, mas ainda não contei quantos nessa última categoria (tenho mais de 170 colaborações em livros diversos). 

Vou aqui separar, em ordem aleatória, os livros próprios (ou seja, dos quais sou autor exclusivo), os livros editados por mim, solitariamente ou em colaboração, e os livros dos quais participei, mas são poucos. O resto é uma profusão de livros dos quais eu nem tinha a menor ideia da razão pela qual estou sendo citado (alguns anônimos, outros nos quais meu nome, onde homônimos aparecem nas páginas editoriais.

Atenção: existem muitos outros livros mais, livremente disponíveis, em minha página em Academia.edu.


1) Livros próprios: 

Construtores da Nação: Projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior

Construtores da Nação: Projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior

por Paulo Roberto de Almeida | 1 set. 2022

Apogeu e demolição da política externa: itinerários da diplomacia brasileira

Apogeu e demolição da política externa: itinerários da diplomacia brasileira

Edição Português | por Paulo Roberto De Almeida | 3 set. 2021

Nunca Antes na Diplomacia. A Política Externa Brasileira em Tempos não Convencionais

Nunca Antes na Diplomacia. A Política Externa Brasileira em Tempos não Convencionais

Edição Português | por Paulo Roberto de Almeida | 16 jul. 2014

O Itamaraty Sequestrado: a destruição da diplomacia pelo bolsolavismo, 2018-2021 (Bolsolavismo diplomático Livro 1)

O Itamaraty Sequestrado: a destruição da diplomacia pelo bolsolavismo, 2018-2021 (Bolsolavismo diplomático Livro 1)

por Paulo Roberto de Almeida | 12 mai. 2021 - eBook Kindle

Miséria Da Diplomacia: A Destruição Da Inteligência No Itamaraty

Miséria Da Diplomacia: A Destruição Da Inteligência No Itamaraty

Edição Português | por Paulo Roberto De Almeida | 6 ago. 2019: Atenção: Este livro está disponível gratuitamente no site da Editora da UFRR.

Contra a corrente: ensaios contrarianistas sobre as relações internacionais do Brasil 2014-2018

Contra a corrente: ensaios contrarianistas sobre as relações internacionais do Brasil 2014-2018

Edição Português | por Paulo Roberto De Almeida | 19 mar. 2019

Formação da Diplomacia Econômica no Brasil

Formação da Diplomacia Econômica no Brasil

Edição Português | por Paulo Roberto de Almeida, 2 vols. | 1 jan. 2017
Atenção: Este livro, oferecido a um preço absurdo na Amazon, está disponível gratuitamente na Biblioteca Digital da Funag: vol. 1, vol. 2.


O homem que pensou o brasil: trajetória intelectual de roberto campos

O homem que pensou o brasil: trajetória intelectual de roberto campos

Edição Português | por Paulo Roberto De Almeida | 1 abr. 2017

Oliveira Lima - Um Historiador das Américas

Oliveira Lima - Um Historiador das Américas

Edição Português | por Paulo Roberto de Almeida e André Heráclio Do Rego | 1 jan. 2017

O Príncipe, revisitado: Maquiavel para os contemporâneos (Pensamento Político Livro 18)

O Príncipe, revisitado: Maquiavel para os contemporâneos (Pensamento Político Livro 18)

por Paulo Roberto Almeida e Pedro Paulo Palazzo de Almeida | 8 set. 2013 - eBook Kindle ; Atenção: Este livro existe igualmente numa edição do Senado (mas talvez já esteja esgotado). 


RELACOES INTERNACIONAIS E POLITICA EXTERNA DO BRAS

RELACOES INTERNACIONAIS E POLITICA EXTERNA DO BRAS

por Paulo Roberto De Almeida | 1 jun. 2018 ; Atenção: Este livro também está disponível disponível atualmente em formato eletrônico no site da Editora LTC.

A grande ilusão do Brics : e o universo paralelo da diplomacia brasileira (Pensamento Político Livro 19)

GlobalizandoEnsaios Sobre a Globalização e a Antiglobalização

GlobalizandoEnsaios Sobre a Globalização e a Antiglobalização

Edição Português | por Paulo Roberto De Almeida | 1 jan. 2011
O Estudo Das Relações Internacionais Do Brasil

O Estudo das Relações Internacionais do Brasil

Edição Português | por Paulo Roberto de Almeida | 13 dez. 2006



LE MERCOSUD: Un Marché commun pour l'Amérique du Sud

LE MERCOSUD: Un Marché commun pour l'Amérique du Sud

Edição Francês | por Paulo Roberto De Almeida | 1 jan. 2001


Histoire du brésil pour comprendre le br: Pour comprendre le Brésil contemporain

Histoire du Brésil: Pour comprendre le Brésil contemporain

Edição Francês | por Paulo Roberto de Almeida



Die brasilianische Diplomatie aus historischer Sicht: Essays über die Auslandsbeziehungen und Außenpolitik Brasiliens

A Grande Mudança

A Grande Mudança

Edição Português | por Paulo Roberto de Almeida | 1 jan. 2003; Atenção: Este livro disponível gratuitamente na minha página em Academia.edu.


2) Livros editados por mim (ou em colaboração): 


Envisioning Brazil: A Guide to Brazilian Studies in the United States

Envisioning Brazil: A Guide to Brazilian Studies in the United States

Edição Inglês | por University Associate Professor of History Marshall C Eakin | 1 nov. 2005

Oswaldo Aranha - Um estadista brasileiro - Volume I

Oswaldo Aranha - Um estadista brasileiro

por Sérgio Eduardo Moreira LimaRogério de Souza Farias, e Paulo Roberto de Almeida. | 1 jan. 2017
Atenção: obra em dois volumes, igualmente disponível gratuitamente na Biblioteca Digital da Funag; vol. 1; vol. 2.


Relações Brasil Estados Unidos: Assimetrias e convergências

Relações Brasil Estados Unidos: Assimetrias e convergências

Edição Português | por Rubens Antônio Barbosa e Paulo Roberto de Almeida | 19 dez. 2012


The Drama of Brazilian Politics: From 1814 to 2015 (English Edition)

The Drama of Brazilian Politics: From 1814 to 2015 (English Edition)

Edição Inglês | por Ted GoertzelPaulo Roberto de Almeida, e outros. | 26 set. 2014 - eBook Kindle





Mercosul, Nafta e Alca

Edição Português | por Yves Chaloult; Paulo Roberto de Almeida1 jan. 1999





Guia dos Arquivos Americanos Sobre o Brasil: Colecoes Documentais Sobre o Brasil nos Estados Unidos

Edição Português | por Paulo Roberto De Almeida | 1 jan. 2010



Mercosul - Textos Basicos

Edição Espanhol | por Paulo Roberto(coordenador) Almeida | 1 jan. 1992


3) Livros dos quais participei/colaborei: 

Brasil: o futuro que queremos

Brasil: o futuro que queremos

Edição Português | por Jaime PinskyAntônio Corrêa de Lacerda, e outros. | 8 mai. 2018

História das relações internacionais contemporâneas: Da sociedade internacional do século XIX à era da globalização

História das relações internacionais contemporâneas: Da sociedade internacional do século XIX à era da globalização

Edição Português | por Paulo Roberto de AlmeidaJosé Flávio Sombra Saraiva, e outros. | 19 dez. 2012

Powers and Principles: International Leadership in a Shrinking World

Powers and Principles: International Leadership in a Shrinking World

Edição Inglês | por Michael SchifferDavid Shorr, e outros. | 1 jun. 2009


O megabloco do Pacífico e o Brasil

O megabloco do Pacífico e o Brasil

por Paulo Roberto de Almeida | 25 mai. 2016 - eBook Kindle

Revista Plural - Democracia

Revista Plural - Democracia

Edição Português | por Fernando Henrique CardosoMaria Stella Martins Bresciani, e outros. | 1 jan. 1978


Existem muitos outros livros mais, livremente disponíveis, em minha página em Academia.edu.

Antonio Paim: de militante comunista na União Soviética a guru do liberalismo brasileiro - Felipe Vidal Benvenuto, Alberto Tomás Paixão Borges (Diálogos Internacionais)

Antonio Paim não era só um guru do liberalismo brasileiro, e muito menos na era Bolsonaro. Era um grande intelectual, pensador tout court, e não só do liberalismo, mas do conhecimento universal. (PRA)

Notas biográficas de Antonio Paim: de militante comunista na União Soviética a guru do liberalismo brasileiro na era Bolsonaro

Volume 10 | Número 97 | Mar. 2023

Imagem de Andrew Martin por Pixabay

Por Felipe Vidal Benvenuto Alberto
Tomás Paixão Borges

RESUMO

Na busca por recriar os caminhos trilhados por uma figura bastante singular do Pensamento Político Brasileiro, este trabalho perpassa aspectos pessoais e inusitados da vida de Antonio Paim, que militou como comunista na União Soviética e terminou sua vida como referência para figuras significativamente distanciadas desses ideais. Em paralelo aos aspectos essencialmente biográficos, é esboçada também uma análise acerca da ideologia política defendida e propagada por Paim, ainda que tenha se mostrado tão caleidoscópica ao longo de sua vida. Como um expoente intelectual brasileiro, a despeito de seu posicionamento político, esse aspecto não poderia ser ignorado.

Palavras-chave: Marxismo; Liberalismo; Pensamento Político Brasileiro; Extrema-Direita.

INTRODUÇÃO E ORIGENS

Antonio Ferreira Paim nasceu na cidade de Jacobina, na Bahia, em 1927, sendo criado pela sua avó juntamente com seus irmãos. Filho de um homem envolvido com o meio musical, em determinado momento Paim chegou a acumular, entre os seus muitos afazeres para uma criança, a prática de trompetista, algo que não passou de uma imposição familiar em sua vida. Apesar de seu marcante afastamento das memórias de infância, motivado principalmente pelo tardio interesse no levantamento de sua biografia, com o protagonista já em idade avançada, ainda é possível encontrar características que posteriormente viriam aflorar nas seus pensamentos e atividades desenvolvidas. O mais evidente destes casos é certamente a sua aberta inspiração no irmão mais velho, Isaias Paim, que viria a se tornar um médico psiquiatra dedicado à organização do conteúdo teórico existente sobre a área na sua época (JUVENTUDE, 2018).

Seguindo o padrão do período, Paim frequentou simultaneamente o ginásio escolar — atualmente chamado de segundo grau — e o Tiro de Guerra, instituição vinculada ao Exército Brasileiro voltada a ser formação de entrada de estudantes secundaristas no serviço militar. Contudo, o caráter desimportante desta formação complementar precisou ser revogado em 1943, quando a integração do Brasil na Segunda Guerra Mundial leva à incorporação de reservistas como o futuro pensador político. Recém-chegado ao Rio de Janeiro e decidido a seguir seus estudos pela área das ciências exatas, Paim é surpreendido pelas novidades e passa por alguns anos de intensas mudanças forçadas pelos seus serviços militares vinculados a Exército e Aeronáutica.

MILITÂNCIA NO PCB E PERÍODO MARXISTA

Na segunda metade da década de 40, a convulsão do pós-guerra colabora fortemente para a ampla disseminação dos ideais comunistas principalmente entre os jovens do país. Assim, segundo palavras do próprio autor, “influenciado pelos amigos” que ingressaram o Partido Comunista Brasileiro (PCB), Paim também o fez, sendo, inclusive, convocado para trabalhar na Tribuna Popular, um diário carioca diretamente ligado a essa vertente ideológica. Segundo seus relatos em entrevistas recentes, chegou a ser preso em 1948 por reagir com tiros a uma tentativa da polícia de fechar seu local de trabalho da época e, depois da prisão, considerou-se um “verdadeiro líder comunista” (BRUNO, 2016), pois passou a organizar e promover manifestações e greves na região Nordeste. Nesse momento, o autor afirma que estava sendo formado para ser um “bolchevique”, que na definição de seus correligionários era alguém “sem alma”, que não poderia ter amigos ou família. Em suas palavras, passou por um processo de desumanização, até que foi convidado a estudar o marxismo em Moscou.

Na Rússia, Paim inicia seus estudos na Universidade de Lomonosov e ali se apaixona por uma tradutora nativa, sofrendo duras críticas dos integrantes do partido — devido à definição do que deveria ser um bolchevique — porém ignorou-as e decidiu por casar-se com a russa (PAIM, [s.d]). Após muito tempo de estudo aprofundado, o autor alega ter encontrado incoerências no pensamento marxista, mas somente quando foi divulgado o Relatório Khrushchev, que acusava Stalin “pelo uso indiscriminado de violência, execuções, processos fraudulentos contra adversários políticos, violando todas as normas de legalidade revolucionária” (DISCURSO, [s.d.], p. 11), que decidiu abandonar o PCB, pois, em suas palavras, o partido foi criado para ser “imagem e semelhança” do que ocorria na Rússia.

Regressando ao Brasil, mais especificamente ao Rio de Janeiro, onde anos atrás havia tentado sem sucesso se estabelecer, o autor deixou suas “aventuras mais revolucionárias” para trás e retornou às atividades acadêmicas convencionais, iniciando o curso de Filosofia, na Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Apesar de haver deixado o Partido Comunista, Paim ainda se considerava marxista, muito por só ter estudado esta corrente durante toda a sua juventude. Na atualidade, o autor afirma que naquele período conhecia a crítica marxista a todos os principais autores filosóficos, porém não estudava suas ideias em si. Por desejar conhecer a filosofia que considera lhe ter sido privada pelo foco marxista, inscreveu-se na cadeira de Kant da Faculdade de Filosofia e começou a estudar com afinco as ideias kantianas, às quais se dedicou por mais de 15 anos.

GUINADA LIBERAL E CRÍTICA AO MARXISMO

Como a situação política do Brasil nos anos 60 não permitiu que Paim realizasse sua tese sobre marxismo à época, é somente muitos anos mais tarde, que ele publica seu livro Marxismo e Descendência (2009). Nele, o autor descreve o marxismo como um sistema filosófico que, com base em uma visão econômica da realidade, discorre sobre o Estado, a sociedade e o pensamento. Na obra, Paim critica as incoerências desse sistema ao desconsiderar os sistemas com líderes democráticos que prosperavam e pender para um sistema político sem pluralidade democrática.

A saída de Paim do movimento marxista se deu pela influência da vertente do culturalismo da filosofia kantiana, através dos filósofos da Escola de Baden. Com base nessa vertente, na primeira parte de sua obra, o autor analisa a doutrina marxista do Estado. Para ele, há uma afinidade entre a doutrina de Marx e o patrimonialismo. Esta, segundo Weber, representa um tipo de dominação carismática e racional, definida por forte concentração de poder nas mãos do soberano, não permitindo a clara separação entre patrimônio público e riqueza privada. Além disso, a população fica à mercê do arbítrio do soberano, que não tem limitações de poder, e da ausência de instituições sólidas de representação, como partidos políticos. Assim, com o patrimonialismo, o Estado é mais forte que a sociedade.

O autor, então, afirma que Marx pende para a violência política para destruir o Estado burguês e substituí-lo por uma ditadura do proletariado, que construiria uma sociedade comunista sem classes. Isso se apoiaria e entraria em consonância com a tradição do patrimonialismo russo, tal como postulado por Lênin e, em seguida, Stálin. Ou seja, para Paim, Marx se identificava com métodos de tomada de poder pela força. No entanto, ele ignorava que métodos parecidos já haviam fracassado. Por exemplo, os de Louis Auguste Blanqui, com o movimento dos operários de Paris, cuja queda deu origem à Segunda República, e a tentativa de Napoleão III de reinstaurar o império, que fracassou com a Guerra Franco-Prussiana e o esmagamento da Comuna de Paris, dando origem à Terceira República (RODRÍGUEZ, [s.d.]).

Assim, Marx ignorava os movimentos que mais deram frutos, principalmente na Europa Ocidental. Eles consistiam na resolução das questões sociais através da incorporação progressiva das massas trabalhadoras nas organizações políticas que as representavam no jogo eleitoral. Foi, para Paim, uma evolução histórica muito diferente daquela postulada com base no patrimonialismo.

Esse processo se iniciou na Inglaterra no final do século XVII, após a Revolução Gloriosa, que resultou no surgimento de um governo monárquico limitado pelo Parlamento e que se consolidaria depois como regime parlamentarista. Foi um freio inicial ao absolutismo, através de um sistema representativo, e que, naquele então, refletia os interesses dos beneficiários da revolução, ou seja, a nobreza rural. Outro fator importante, para o autor, foi a Reforma Protestante. Sendo a religião um berço da moral, cujos valores servem de referência na construção do mundo social do indivíduo, ela desempenha importante papel nos processos históricos. Logo, o surgimento de interpretações rivais criou a necessidade de que grupos com pensamentos diferentes convivessem. Daí em diante novos atores políticos foram sendo incorporados ao processo evolutivo, como a burguesia industrial, a pequena classe média e, por fim, a classe não proprietária.

A possibilidade de participação política através do voto se expandiu e se universalizou com o fim do voto censitário. Essa mudança se espalhou pelo Ocidente da Europa, pautada por um sistema de partidos políticos permanentes e não blocos parlamentares. Esse processo de evolução seria, para Paim, a democratização da ideia liberal, que ocorre pela exigência liberal de que o Estado tenha seu poder sobre o indivíduo limitado e pela busca democrática por decisões tomadas pela maioria. Foi essa visão liberal que criou, nos Estados Unidos, a primeira república presidencialista.

ANÁLISE DO PENSAMENTO POLÍTICO BRASILEIRO E INFLUÊNCIA KANTIANA

Por sua vez, no terreno das histórias das ideias políticas, Antonio Paim teve uma contribuição ímpar para uma nova visão do processo político brasileiro. Em seu livro A Querela do Estatismo, apoiado nas conceituações teóricas weberianas das dimensões básicas da vida social e da legitimação do poder, constrói a ideia de um “Estado Patrimonialista Brasileiro”, caracterizado pela faceta “clientelista e cartorialista” (PAIM, 1994, p. 23) de sua esfera econômica e por fonte tendência modernizadora em determinadas épocas.

Na visão do teórico, a única forma de compreender amplamente o processo de formação deste Estado reside no entendimento que o “Estado é uma realidade per se” (Idem, p. 16). Ao superar uma visão tradicionalista que centra toda a análise na sociedade civil e apenas situa o Estado como sua expressão máxima, rejeita qualquer tipo de análise que atribua as decisões tomadas à nível governamental apenas ao interesse de classes no Brasil. Esta inovadora abordagem recentraliza o papel da tradição cultural na formação da realidade político-estrutural brasileira.

Na perspectiva de Paim, a origem deste Estado reside nas históricas tradições dos sistemas políticos lusitanos, altamente patrimonialista. Apoiado pelos escritos de Raymundo Faoro, aponta que o Estado Português manteve no bojo de suas estruturas políticas práticas culturais que, além de misturar a propriedade estatal com os domínios das antigas realezas, impediu a florescência de um capitalismo industrial. O autor reforça também a importância do período pombalino na formação de uma elite política que via com gosto a hegemonia da modernização do país pelo Estado.

A partir desta tendência lusitana, urgiu uma outra grave questão na estrutura política do Brasil: a falta de uma real representação política. Do modo como se estrutura a República no país, um sistema com real consciência política e poder de transformação por parte da população é substituído por uma democracia ilusória, onde a “eleição, mesmo formalmente livre, lhe recusa a escolha entre as opções que não formulou” (FAORO, 1975, p. 748). Para o filósofo, a única experiência verdadeiramente representativa do sistema político brasileiro ocorreu durante o Segundo Império, graças a prática parlamentarista, de inspiração liberal.

Desta forma, a transformação da atual situação patrimonialista do Estado brasileiro não se esgotaria em reformas dentro do sistema que incentivassem a pluralização política, maior participação política da população e estímulo a eleições verdadeiramente livres. Pelo contrário, se faz necessária uma reconstrução dos moldes em que foi formado, promovendo uma abertura plena ao sistema capitalista e renovando a perspectiva ideológica que ainda suporta o pensamento cartelista dos estadistas. Reforçando essa ideia, Ricardo Vélez Rodríguez, antigo aluno de Paim e então Ministro da Educação, ao analisar a obra de seu mestre aponta que “é imprescindível desenvolver, no interior da cultura brasileira, o interesse pelas ideias liberais, hoje abandonadas pela grande maioria dos políticos e intelectuais” (PAIM, 1997).

No livro O Patrimonialismo Brasileiro em Foco (PAIM et al., 2015), o autor destaca as mazelas que esse modelo vem causando no país, além de mostrar que a população já tem consciência do quanto ele a prejudica, referenciando-se ao repúdio popular ao caso do “mensalão” quando o crime de apropriação indevida de recursos públicos foi devidamente punido.

Como anteriormente comentado, Paim possui uma forte influência daquele para o qual dedicou muitos anos de seus estudos, o filósofo Immanuel Kant. Sua crítica ao modelo político brasileiro muito se assemelha ao artigo 2º da primeira seção da obra A Paz Perpétua, o qual afirma que o Estado não é patrimônio de uma pessoa ou grupo. Como o próprio filósofo prussiano diz, “o Estado adquire, pois, um governante, não é o governante como tal que adquire o Estado” (KANT, 2008, p. 5). Apesar da obra direcionar-se para a aquisição literal de Estados, a situação do patrimonialismo de Weber se apresenta como análoga à criada por Kant, visto que o governante agiria como proprietário do Estado, utilizando dos bens públicos para fins pessoais.

Outra semelhança está na defesa de uma constituição republicana. Apesar do Brasil possuir o título de República Federativa, a análise de Antonio Paim quanto ao patrimonialismo existente no país mostra-o como contrário ao conceito de república estabelecido pelo filósofo. Isso ocorre porque quando o chefe do Estado não é um membro do Estado, mas seu proprietário, os súditos não são mais cidadãos dotados de liberdades individuais plenas. Assim, o Estado fica ainda mais propenso a guerras de acordo com o pensamento kantiano, pois as guerras ocorreriam segundo os interesses pessoais dos governantes e não os prejudicaria diretamente devido às suas regalias aos custos da população; ao contrário de uma situação de república, na qual a população que é cidadã consegue decidir se deve ou não haver guerra, pois ela seria a sua principal financiadora e a principal afetada por seus efeitos.

O autor também produziu outras diversas obras que exploravam às questões relativas ao pensamento político brasileiro. Destacam-se entre elas O Liberalismo Contemporâneo (1995) e o Pensamento Político Brasileiro (1994). Além disso, buscando maior divulgação das ideias do liberalismo no Brasil e a formação de uma elite intelectual liberal, publicou o curso de Introdução Histórica ao Liberalismo (1996).

INFLUÊNCIAS ATUAIS E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Vivendo até 2021 em uma casa de repouso para idosos, na cidade de São Paulo, o pensador ainda é tido como uma das principais referências para o ideário liberal brasileiro, fator acentuado pelo alinhamento ideológico adotado pelo ex-Presidente da República Jair Bolsonaro. Com a opção por nomear uma série de ministros indicados pelos gurus intelectuais da vertente liberal do pensamento político nacional, Antonio Paim voltou ao protagonismo de outrora, apesar de sua idade já avançada à época. A mais evidente influência de suas falas se mostra na nomeação de Ricardo Vélez Rodríguez, seu ex-aluno e posterior companheiro de estudos, para o cargo de Ministro da Educação. Ainda que o colombiano Vélez tenha durado apenas quatro meses no cargo, sua exoneração em nada passou por um distanciamento ideológico com o presidente em exercício, mas sim pelas sucessivas inconstâncias que marcaram o governo de Bolsonaro.

Paim seguiu uma vida pacata em seus últimos anos de vida, nos quais um dos principais hobbies passou a ser o de receber estudantes em sua habitação, a fim de tecer conversas informais e passar parte do seu vasto conhecimento político e filosófico. Obviamente esse público possuía uma prévia simpatia ao que Paim tinha a propagar ideologicamente (JUVENTUDE, 2018). Ainda que mantivesse uma interação regular, principalmente por meios digitais, com outros de seus correligionários da mesma época, como o pretenso filósofo Olavo de Carvalho, ficou evidente a sua predileção pelos bastidores em detrimento dos holofotes. Ao contrário do espalhafatoso Olavo de Carvalho, falecido em 2022 e deixando uma horda de órfãos daquilo que opinava diariamente através de redes sociais, Antonio Paim faleceu no ostracismo em 2021, aos 94 anos, de causa não divulgada (FILÓSOFO, 2021).

REFERÊNCIAS

BRUNO Garschagen entrevista Antonio PaimMises Brasil, 15 jan. 2016. Podcast 201 (60 min.). Disponível em: https://www.mises.org.br/FileUp.aspx?id=413. Acesso em: 10 jan. 2023.

DISCURSO Secreto de Khrushchev no XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética, O. Rio de Janeiro: Ed. Ipanema, [s.d.].

FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder. 2.ª ed., Porto Alegre: Globo/USP, 2v, 1975.

FILÓSOFO Antonio Paim morre aos 94 anos. G1, São Paulo, 1 mai. 2021. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2021/05/01/filosofo-antonio-paim-morre-aos-94-anos.ghtml. Acesso em: 10 jan. 2023.

KANT, Immanuel. A Paz Perpétua, Um Projeto Filosófico. Covilhã: Universidade da Beira Interior, 2008.

JUVENTUDE Comunista de Antonio Paim. Revista Insight Inteligência, ano XXI, nº 81, (abril/maio/junho 2018): 52-62. Disponível em: . Acesso em: 10 jan. 2023.

PAIM, Antonio Ferreira. Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro: Sócios Honorários Brasileiros, [s.d.], Disponível em: https://ihgb.org.br/perfil/userprofile/AFPaim.html. Acesso em: 10 jan. 2023.

_______. Historiador das Ideias. Revista Brasileira de Filosofia, São Paulo, vol. 44, nº 186 (abril/maio/junho 1997): 203-212.

_______. A Querela do Estatismo. Brasília: Senado Federal, 1998.

_______. Marxismo e Descendência. São Paulo, Vide Editorial, 2009.

_______.; BATISTA, Antonio Roberto; KRAMER, Paulo; RODRÍGUEZ, Ricardo Vélez. O Patrimonialismo Brasileiro em Foco. São Paulo: Vide Editorial, 2015.

RODRÍGUEZ, Ricardo Vélez. Antonio Paim: Vida, Obra, Pensamento. Proyecto Ensayo Hispánico. [s.d.]. Disponível em: https://www.ensayistas.org/filosofos/brasil/paim/paim.htm. Acesso em: 10 jan. 2023.

Felipe Vidal Benvenuto Alberto é mestrando no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais (PPGRI) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) como bolsista CAPES. Bacharel em Línguas Estrangeiras Aplicadas pelo CEFET/RJ, com período sanduíche na Faculté des Sciences Juridiques, Politiques et Sociales da Université de Lille. Pesquisador do Núcleo de Estudos Atores e Agendas de Política Externa (NEAAPE) do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP/UERJ). Sócio Estudante da Associação Brasileira de Relações Internacionais (ABRI).

Tomás Paixão Borges é mestrando em Ciência Política no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ (IESP/UERJ). Bacharel em Línguas Estrangeiras Aplicadas às Negociações Internacionais pelo CEFET/RJ, com período sanduíche no Institut d’Études Politiques da Université de Strasbourg (Sciences Po Strasbourg). Pesquisador do Grupo de Estudos e de Pesquisa em Teoria Política e Pensamento Político Brasileiro (BEEMOTE) e do Núcleo de Estudos, Atores e Agendas de Política Externa (NEAAPE) do IESP/UERJ.

Como citar:
ALBERTO, Felipe Vidal Benvenuto; BORGES, Tomás Paixão. Notas biográficas de Antonio Paim: de militante comunista na União Soviética a guru do liberalismo brasileiro no governo Bolsonaro. Diálogos Internacionais, vol. 10, n. 97, Mar. 2023. Disponível em: https://dialogosinternacionais.com.br/?p=2895

A Diálogos Internacionais (ISSN 2596-2353), B1 pelo Qualis 2017-2020, é uma revista online, mensal de Relações Internacionais,

Nosso homem no Brasil: o espião de Putin e a decisão de Lula - Reynaldo Turollo Jr. e Thiago Bronzatto (O Globo)

  1. Já sabemos que Lula não gosta de extraditar criminosos que eventualmente tenham relações com pessoas de sua simpatia. Só ainda não sabemos se suas simpatias estão mais com Joe Biden ou com Vladimir Putin...


    Bitcoins, joia e dinheiro em espécie: russo acusado de espionagem contava com rede de apoio no Brasil, aponta investigação

Acusado de espionagem, russo contava com rede de apoio no Brasil, aponta investigação

Sergey Vladimirovich Cherkasov criou uma história que convenceu até as autoridades em Haia, mas agora está na mira das autoridades brasileiras e dos EUA

Por Reynaldo Turollo Jr. e Thiago Bronzatto — Brasília

O Globo, 3/04/2023


O estudante Victor Müller Ferreira nutria o sonho de conseguir um emprego na Europa. Nascido no Rio de Janeiro, viveu com a tia-avó na Argentina dos 2 aos 21 anos, quando pegou um ônibus de volta ao Brasil. Ao chegar a sua cidade natal, começou a trabalhar em uma agência de turismo e câmbio. Até que decidiu fazer um curso na Irlanda e, algum tempo depois, uma pós-graduação na Universidade Johns Hopkins, em Washington (EUA). Essas experiências abriram as portas de um estágio no Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, para atuar em casos de crimes de guerra.


Ao chegar a Amsterdã para iniciar o trabalho, foi impedido de passar pela imigração. Teve que voltar ao aeroporto de Guarulhos (SP), onde foi preso em 2 de abril de 2022 por uso de documentos falsos. Descobriu-se, então, que a história de Victor Müller Ferreira era uma obra de ficção para acobertar sua verdadeira identidade: Sergey Vladimirovich Cherkasov, apontado como espião russo pelas autoridades brasileiras e internacionais.


Ao ser detido pela Polícia Federal, Cherkasov teve de entregar o celular, pen-drives, HD e chips de memória. Esse material, analisado pelos investigadores, revelou indícios de que o suposto espião da GRU, inteligência militar russa, “possuía uma rede de apoio no Brasil”, que “depositava valores mensais em sua conta de forma fracionada e em espécie, visando à sua não identificação”.

Parte do processo contra Sergey Cherkasov que detalha pagamentos feitos por uma suposta rede de apoio no Brasil — Foto: Reprodução

Parte do processo contra Sergey Cherkasov que detalha pagamentos feitos por uma suposta rede de apoio no Brasil — Foto: Reprodução

Uma prova disso, de acordo com as autoridades, são e-mails trocados entre Cherkasov e uma pessoa que trabalhava no Consulado Geral da Rússia.

“Parece que seu pai está preocupado por não receber notícias suas. Mande notícias para ele. O cônsul russo solicitou isso a mim. Semana que vem devo fazer uma nova transferência”, escreveu o interlocutor para o estudante. Uma semana depois, Cherkasov recebeu € 750 (R$ 2,7 mil) em uma conta bancária na Irlanda, onde conseguiu emitir um passaporte brasileiro utilizando identidade falsa.


Primeira entrada em 2010

Outras transações do suposto espião, que entrou no Brasil pela primeira vez em 2010, também chamaram a atenção dos investigadores. Em depoimento a agentes do FBI, a polícia federal americana, Cherkasov contou que pagou um curso na Irlanda com “lucro auferido com a compra e venda de bitcoins” e que, sem visto de trabalho, usou suas economias para fazer uma pós-graduação nos Estados Unidos — que custou entre US$ 80 mil e US$ 100 mil. Segundo a apuração do caso, enquanto estava no exterior, o russo recebeu depósitos em espécie em uma agência bancária no Rio de Janeiro, comprou automóveis e movimentou “alto valores” em corretoras de criptomoedas.


Essas operações financeiras envolvendo Cherkasov ocorreram tanto no exterior como no Brasil, onde ele comprou por R$ 190 mil um imóvel em Cotia (SP) um mês antes de tentar se mudar para a Holanda. Com os recursos que recebia, o russo conseguiu subornar uma funcionária de um cartório, segundo ele próprio registrou em um relatório encontrado no material apreendido pela PF. Ao presentear uma escrevente com um colar de joias de US$ 400 (R$ 2,2 mil), o suposto infiltrado conseguiu autenticar documentos, anular multas eleitorais e concretizar a compra de um apartamento para ter um endereço fixo. “Acredito que [essa pessoa] possa ser usada para fins de nosso trabalho, relacionado à documentação”, escreveu ele a um interlocutor.


Tão logo foi preso, Cherkasov foi levado à carceragem da PF em São Paulo. Lá, recebeu a visita de um representante do consulado russo. Pouco tempo depois, assumiu perante os tribunais sua verdadeira identidade e foi assessorado por advogados que solicitaram à Justiça que ficasse preso no próprio Consulado Geral da Rússia. A defesa alegou que ele corria risco de vida e que havia uma suspeita de tentativa de envenená-lo. No início deste ano, ele foi transferido para um presídio de segurança máxima em Brasília. Procurados, o Consulado Geral da Rússia em São Paulo e a Embaixada da Rússia não comentaram.


Em junho de 2022, Cherkasov foi condenado pela Justiça brasileira a 15 anos de prisão por uso de documentos falsos em várias ocasiões. No mês seguinte, a embaixada russa protocolou no Itamaraty um pedido de extradição do suposto agente. A solicitação foi dirigida ao então ministro da Justiça, Anderson Torres, que encaminhou o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo os documentos apresentados pelo procurador-geral adjunto da Rússia, Cherkasov não era um espião, mas sim um traficante ligado a um grupo criminoso, liderado por um tadjique, que fornecia heroína de Moscou para Lipetsk.

Essa acusação, porém, só foi oficializada pelas autoridades russas no dia 22 de junho de 2022 em um processo iniciado em 2013 e que já fora encerrado em 2017. A denúncia diz que os crimes praticados por Cherkasov ocorreram entre junho de 2011 e agosto de 2013. Nesse período, no entanto, ele estava no Rio de Janeiro, trabalhando numa agência de turismo e câmbio, segundo o próprio currículo do suposto agente infiltrado. Além disso, Cherkasov disse em depoimento ao FBI que visitou a Rússia na Copa de 2018, ocasião em que poderia ter sido detido. Há também registros de uma viagem em setembro de 2021 para Kaliningrado, sua verdadeira terra natal, para exames médicos.


Diante do impasse da prisão, representantes da Embaixada da Rússia chegaram a procurar o Itamaraty para tratar da extradição de Cherkasov. O Ministério das Relações Exteriores confirmou ao GLOBO que houve um “contato exploratório” por parte da diplomacia do Kremlin, mas a resposta da Chancelaria brasileira, segundo a pasta, foi que nada poderia ser feito pelo governo brasileiro, porque o assunto já estava sob a alçada do STF.

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Após a investida russa no STF e no Itamaraty, Cherkasov ficou esperançoso de que conseguiria voltar ao seu país de origem. Em agosto de 2022, ele escreveu da prisão uma carta à namorada. “Então, estamos otimistas sobre setembro. Dedos cruzados. Mas eu realmente sinto que o fim está próximo. Sonho muito com o nosso Ano Novo — você e eu em São Petersburgo caminhando na neve para o Palácio de Inverno. Tudo ficará bem”, afirmou, assinando a carta como “prisioneiro de guerra”.

Saia-justa diplomática

O otimismo de Cherkasov, porém, mostrou-se frustrado. O ministro Edson Fachin, relator do processo no STF, concordou com o pedido de extradição do russo, mas condicionou o andamento do processo ao término da segundo investigação conduzida pela PF, que apura suspeita de espionagem, corrupção e lavagem de dinheiro. Enquanto o inquérito segue em andamento no Brasil, na semana passada, o FBI acusou o russo de ter cometido ao menos sete crimes, de fraude bancária à atuação como agente infiltrado do governo Putin.


Cherkasov estava nos EUA entre 2017 e 2020, enquanto trabalhava sob direção e controle da Rússia. Como parte dessa missão, Cherkasov usou pseudônimo de Ferreira para se matricular na Universidade Johns Hopkins e coletou informação e inteligência sobre a Organização do Tratado do Atlântico Norte, cidadãos americanos e política externa dos EUA. A informação e inteligência que ele coletou foi para o benefício direto da Rússia e contrária ao interesse dos EUA”, apontou a polícia federal americana.

Essa acusação dos EUA pôs o Brasil numa encruzilhada diplomática. Ao longo de 2022, a prisão de Cherkasov foi tratada pelo governo Bolsonaro e pela PF com discrição máxima para evitar qualquer conflito com a Rússia, considerada uma fornecedora estratégica de fertilizantes para o setor agrícola. Agora, se o processo de extradição for adiante, caberá ao presidente Lula decidir sobre o futuro do suposto espião e se desagradará ao Kremlin ou à Casa Branca.


https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2023/04/acusado-de-espionagem-russo-contava-com-rede-de-apoio-no-brasil-aponta-investigacao.ghtml