O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sexta-feira, 13 de setembro de 2024

Forthcoming book on South America History: From European Contact to Independence; H. Micheal Tarver (Anthology Editor), Carlos E. Márquez Petit (Anthology Editor); with contributions by Paulo R. Almeida

 


South America

From European Contact to Independence 

2 volumes

H. Micheal Tarver (Anthology Editor) ,  Carlos E. Márquez Petit (Anthology Editor)

Due to be published by early 2025

Table of Contents

Alphabetical List of Entries
Preface
Chronology
Maps
Introduction
Thematic Essays
1. Geography of South America I: Human Geography
2. Geography of South America II: Physical Geography
3. Independence (Concept of),
4. Independence Movements: An Overview
5. Mapping South America
6. Print Culture in South America
7. Public Works in South America
8. Pueblo and Pueblos 
Encyclopedia Entries
Glossary
Bibliography
Index
About the Contributors [Paulo R. Almeida]

Description

Discover the people, events, milestones, and landmarks in the history of South America from European contact to their independence.

This two-volume encyclopedia provides entries on many of the key people, places, and events essential to the last 500 years of South American history, from the Cajamarca Encounter of 1532 to the independence of Suriname in 1975. With entries on the indigenous peoples of countries such as Argentina and Uruguay, the major geographic landmarks from the Andes Mountains to the Amazon River, and on cities from Buenos Aires to Quito, this encyclopedia provides students and researchers alike a valuable guide to South American history, geography, and culture.

The volumes comprise entries on various South American colonies and countries; events and places; groups, organizations, and industries; independence movements; individuals; objects and artifacts; and organizations and administrations. Primary source document excerpts, a timeline, and original maps provide readers with a direct connection to the past and inspire historical inquiry.

This comprehensive encyclopedia offers a window to the past, showing how the South America of the present came to be.


Minhas contribuições: 

Encyclopedia of South American History:

contributions Paulo R. Almeida 

Relação e textos das contribuições preparadas para a Encyclopedia of South American History, com publicação prevista para 2024, Blomsbury Publisher; Editor: Professor Micheal Tarver. Contribution to a project of ABC-Clio, “South America: From European Contact to Independence”.  

Relação das contribuições preparadas em 2021 para o projeto coordenado pelo Prof. Micheal Tarver para uma Enciclopédia de história da América do Sul, originalmente a cargo da editora ABC-CLIO, adquirida em 2021 pelo grupo Bloombury. 

3970. “Tordesillas, Treaty of (1494)”, Brasília, 8 Sept 2021, 3 p.; 1.189 words.

3974. “Bandeiras”, Brasília, 12 Sept 2021, 3 p.; 1.074 words.

3976. “Bandeirantes”, Brasília, 12Sept 2021, 3 p., 1235 words. 

3979. “Andrada e Silva, José Bonifácio de”, Brasília, 18 Sept 2021, 3 p.; 1.071 words.

3980. “Brazil, Independence Movement”, Brasília, 19 Sept 2021, 5 p.


A Libia afunda no caos - Ishaan Tharoor (The Washington Post)

 


quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Sobre a Rússia como Estado agressor e sobre a posição do Brasil na guerra de agressão contra a Ucrânia - Paulo Roberto de Almeida

Sobre a Rússia como Estado agressor e sobre a posição do Brasil na guerra de agressão contra a Ucrânia

 

Paulo Roberto de Almeida

Primeiro, comentários que fiz no Facebook sobre a argumentação equivocada – inclusive defendida pelo assessor presidencial de Lula, ex-chanceler Celso Amorim – de que é o Ocidente, a OTAN que não respeitam as "preocupações de segurança da Rússia".  Em seguida, uma relação de alguns trabalhos que fiz sobre a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia.

As esquerdas que apoiam a Rússia na sua guerra de agressão contra a Ucrânia estão sempre alegando – alguns até com base em argumentos de John Mearsheimer – que foi a OTAN que descumpriu um acordo que teria sido feito com a Rússia, pós-implosão da URSS, para "não avançar" sobre as fronteiras russas, ou seja, sobre países ou territórios que até 1991 faziam parte do imenso império soviético (alguns até do império czarista).
A verdade que NUNCA houve um acordo formal OTAN-Rússia, apenas conversações entre os líderes. A Rússia foi inclusive incluída politicamente no G7 e num programa de parceria com a OTAN, durante a presidência Ieltsin.
Putin, revanchista, começou a desmantelar a convivência, desde que tomou o poder como primeiro-ministro ou presidente russo, notadamente pelas intervenções na Georgia e na Moldova, pela anexação ilegal da província da Crimeia, em 2014, e depois pela guerra de agressão em 2022.
Negar o ingresso à OTAN de países que foram dominados pelo Império czarista e depois pela União Soviética (alguns incorporados, como os bálticos) seria desconhecer a vontade soberana de seus povos de decidir em total autonomia pelas suas relações exteriores e alianças internacionais.
Seria algo semelhante ao Paraguai ter um acordo formal de defesa mútua com o Brasil, por temor de que a Argentina tome posse de parte de seu território pelo fato de ter pertencido ao antigo Vice-Reinado do Rio da Prata (como aliás o sul da Bolívia). Seria ignorar que o Brasil do chanceler Rio Branco já teve um tratado preliminar de fronteiras com o Equador e também, em 1904, um tratado de defesa mútua com o mesmo país, inviabilizado mais tarde pelo avanço de Peru e Colômbia sobre suas terras amazônicas.

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Agora a minha lista de trabalhos sobre o tema, de 2022 até agora, segundo o registro que acabo de fazer: 

4730. “Lista de trabalhos sobre a guerra de agressão à Ucrânia, até setembro 2024”, Brasília, 12 setembro 2024, 9 p. Relação atualizada em 12/09/2024 de todos os meus trabalhos pertinentes ao tema. Disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/123824022/4730_Lista_de_trabalhos_sobre_a_guerra_de_agressao_a_Ucrania_ate_setembro_2024); anunciado no blog Diplomatizzando (link: ). 

 


Lista de trabalhos sobre a guerra de agressão à Ucrânia, até setembro 2024

 

 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Relação atualizada em 12/09/2024 de todos os meus trabalhos pertinentes ao tema.

 

 

A Ucrânia – a despeito de ter adquirido um country guide sobre o país eslavo com a intenção de visitá-lo no passado, uma vez ainda como parte da URSS, a segunda vez já como país independente nos anos 1990 – me era um país inteiramente desconhecido até fevereiro de 2022, quando começou a guerra de agressão da Rússia, finalmente realizada depois de semanas anunciada e alertada pelo presidente Joe Biden, desde os últimos meses de 2021, com base em relatórios de inteligência. Quando defendi minha tese de doutorado na ULB, ...

(...)

O que segue abaixo é uma relação puramente cronológica de meus trabalhos sobre o assunto, direta e indiretamente, que ficam assim disponíveis aos interessados.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 12 de setembro de 2024


Lista sintética de trabalhos escritos, entrevistas, palestras e notas sobre o tema Ucrânia: 

 

4087. “Uma nota pessoal sobre mais uma postura vergonhosa de nossa diplomacia”, Brasília, 22 fevereiro 2022, 2 p. Comentários a nota do Itamaraty e a declaração feita no CSNU a propósito da invasão da Ucrânia pela Rússia, com referência à nacionalização dos hidrocarburos na Bolívia em 2006. Postado no blog Diplomatizzando (link:https://diplomatizzando.blogspot.com/2022/02/uma-nota-pessoal-sobre-mais-uma-postura.html).

4098. “Renúncia infame: o abandono do Direito Internacional pelo Brasil”, Brasília, 7 março 2022, 5 p. Breve ensaio para o blog científico International Law Agendas, do ramo brasileiro da International Law Association (ILA; http://ila-brasil.org.br/blog/), para edição especial sobre “A política externa brasileira frente ao desafio da invasão russa na Ucrânia”, a convite de Lucas Carlos Lima, coeditor do blog, com base nas notas e declarações do Itamaraty com respeito aos debates no CSNU e na AGNU. Publicado, na condição de membro do Conselho Superior do ramo brasileiro da International Law Association, no blog eletrônico International Law Agendas (7/03/2022; link: http://ila-brasil.org.br/blog/uma-renuncia-infame/); blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2022/03/uma-renuncia-infame-o-abandono-do.html). Relação de Publicados n. 1442. 

(...)

3100. “Da velha guerra fria geopolítica à nova guerra fria econômica: cenários prospectivos das relações internacionais”, Brasília, 7 abril 2017, 15 p. Aula no Instituto Rio Branco, no dia 7/04/2017. Postado no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2017/04/da-velha-guerra-fria-geopolitica-nova.html).

 




Entrevista de Zelensky: Brasil é visto como pró-Rússia - Samuel Pancher (jornal Metrópoles)

Mundo

Zelensky diz ao Metrópoles que governo do Brasil é “pró-Rússia”

Volodymyr Zelensky voltou a criticar o posicionamento do governo Lula sobre a guerra e disse que o Brasil é “pró-Rússia”

Vídeo: 

https://www.metropoles.com/mundo/zelensky-metropoles-brasil-russia 

 

Kiev – O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, voltou a criticar a postura do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) diante da guerra no Leste Europeu e afirmou que o Brasil é “pró-Rússia”. A declaração aconteceu nesta quarta-feira (11/9), durante entrevista exclusiva ao Metrópoles, no Palácio Mariyinsky, em Kiev.

Zelensky revelou que esperava posicionamento mais enérgico de Lula, e não apenas uma “pacificação política”.

“Infelizmente, eu acredito que eles (governo do Brasil) apoiam a Rússia”, declarou Zelensky ao ser questionado ao falar do posicionamento do Brasil sobre a guerra. “Tive uma boa conversa com o presidente Lula e achei que ele me entendia. Fiquei grato por conhecê-lo, e eu fui muito aberto, absolutamente aberto. Achei que veria em sua experiência uma compreensão do que está acontecendo, e não apenas uma pacificação política.”

De acordo com o líder ucraniano, os esforços brasileiros de tentar encontrar solução pacífica para a guerra são inúteis, pois Vladimir Putin – classificado por ele como um “assassino” – não dá sinais de que pretende dar um fim ao conflito.

A crítica de Zelensky contra Lula se soma a outros episódios de rusgas diplomáticas entre Kiev e Brasília.

Desde o início do governo Lula 3, o Brasil tem mantido postura de neutralidade em relação à guerra.

Além disso, o presidente brasileiro defende que negociações de paz envolvam os dois países em conflito, diferentemente do que tem acontecido nas últimas discussões.

Por sua vez, a Ucrânia enxerga a neutralidade do governo brasileiro como cumplicidade com as ações da Rússia, que invadiu o território ucraniano em 24 de fevereiro de 2022.

No início da semana, o chefe de gabinete de Zelensky cobrou visita de Lula à Ucrânia, para que ele possa ver o que acontece no país com seus próprios olhos. De acordo com Andrii Yermak, essa experiência poderia mudar a perspectiva e o posicionamento do presidente do Brasil em relação ao conflito.


Veja a íntegra da entrevista:

 

 https://www.metropoles.com/mundo/zelensky-metropoles-brasil-russia 


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Exclusivo: embaixador [Rafael de Melo Vidal, do Brasil] rebate Zelensky e nega que Brasil é pró-Rússia

Após críticas de Volodymyr Zelensky, embaixador do Brasil em Kiev negou ser “pró-Rússia” e enfatizou postura neutra histórica brasileira

 atualizado 

Exclusivo: embaixador rebate Zelensky e nega que Brasil é pró-Rússia

Após críticas de Volodymyr Zelensky, embaixador do Brasil em Kiev negou ser “pró-Rússia” e enfatizou postura neutra histórica brasileira

 atualizado 

Brasil não consultou Rússia sobre proposta de paz

As declarações do chefe da missão brasileira em Kiev surgem um dia após Volodymyr Zelensky alfinetar, mais uma vez, o posicionamento do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre a guerra.

Em entrevista exclusiva ao Metrópoles, o líder ucraniano acusou o Brasil de ser “pró-Rússia” e alegou que a proposta de paz apresentada em conjunto por Brasil e China em maio é “destrutiva”. Sem provas, Zelensky alegou que Brasília e Pequim consultaram Moscou sobre a iniciativa, mas Kiev não.

O poço não tem fundo - Marcos Rolim (jornal Extra Classe)

 OPINIÃO

O poço não tem fundo 

Por Marcos Rolim / Extra Classe, 
11 de setembro de 2024 
 
 
 
 

O poço não tem fundoArte: Fabio Edy Alves sobre fotos de Freepik.com

No contexto histórico das interações sociais reguladas pelos algoritmos, os grupos de extrema direita têm desempenho muito superior nas redes sociais, produzindo um discurso simplificador e quase sempre falso, mas especulando com problemas reais e se colocando como reais intérpretes da vontade popular

Tradicionalmente, as eleições municipais no Brasil foram marcadas pelo debate de temas locais, bastante deslocados das disputas político-ideológicas nacionais. Até mesmo os arranjos partidários das disputas locais seguiam lógicas distintas daqueles verificados em eleições majoritárias para os governos estaduais e para a presidência. Aparentemente, as coisas não são mais assim.

O Rio Grande do Sul, por exemplo, sofreu um desastre ambiental sem precedentes em maio, o que promoveu, além de prejuízos econômicos de enormes proporções, muito sofrimento, dor, luto, etc.

Os gestores que responderam mal aos eventos climáticos extremos e, particularmente, aqueles cujas gestões foram, por omissão, escolhas equivocadas ou negacionismo, associadas à gravidade dos efeitos do desastre, tiveram desgaste político-eleitoral apreciável. Entretanto, tudo leva a crer que as falhas observadas nas gestões municipais quanto ao sistema de drenagem e contenção de cheias, por exemplo, assim como os temas destacados de gestão nas cidades, como o transporte coletivo, a educação e a saúde, etc., não serão decisivos para a definição de voto da maioria dos eleitores.

Para essa maioria, o alinhamento ideológico prévio – compreendido como uma adesão mais ou menos racional a um discurso – tende a ser o elemento mais forte. Nesse quadro, o próprio debate se afasta do desafio de formulação de políticas públicas eficientes, sendo substituído por uma realidade fantasmagórica, em que ameaças e insultos são lançados desde as trincheiras onde os adversários se entocam.

A campanha eleitoral de São Paulo trouxe ao cenário político a figura bizarra de Pablo Marçal, um ególatra populista com retórica antissistema e patrimônio declarado de R$ 200 milhões. É difícil situar seu perfil e discurso sem ceder ao espanto, mas ele tem boas chances de vencer as eleições em uma das maiores cidades do mundo, caso sua candidatura não seja cassada por abuso de poder econômico. Seu discurso é marcado pela virulência e pelo messianismo. Ele estaria sozinho contra o sistema, mas vencerá todos os obstáculos, declarando-se como “o servo”. Sobre ele, Bolsonaro declarou que “Marçal não tem caráter”, uma frase que, em si mesma, testemunha a radicalidade do problema.

Assim, quando imaginamos que chegamos ao fundo do poço, descobrimos que o poço não tem fundo e que as coisas nunca são tão ruins a ponto de não poderem piorar.

Será preciso estudar o “fenômeno Marçal” mais detidamente e ter presente que aquilo que ele representa não diz respeito apenas a São Paulo. Muito provavelmente, a emergência deste lúmpen-populismo, desde o “fenômeno Bolsonaro”, surge no vazio político criado desde que perdemos a perspectiva da luta por reformas sustentadas, a partir de uma crítica contundente às desigualdades, à violência e aos limites e distorções do poder público.

Como a esquerda abdicou dessa tarefa, o caminho ficou aberto para que a indignação diante da má qualidade do serviço público, das injustiças sociais, dos privilégios e da corrupção fosse ocupada pela extrema direita. Ainda assim, entretanto, não seria possível que esse discurso de ressentimento e ódio fosse capaz de cativar milhões de mentes sem a formação de “bolhas” ou “câmaras de eco” na internet, por onde transitam as mais incríveis teorias da conspiração e as mentiras customizadas para diferentes grupos e repetidas infinitas vezes.

Diante das ameaças de golpe de Estado, restou à esquerda a defesa da democracia, o regime político que a tradição marxista sempre classificou como uma forma de dominação burguesa. Acossada pela tormenta do avanço de um movimento de massas de perfil fascista, a esquerda foi à sua dispensa à procura do guarda-chuva da democracia, um espaço “tático”, onde, a rigor, nunca se sentiu confortável. Por não ter acertado contas com sua tradição teórica mais forte, os partidos de esquerda seguem se atrapalhando quando se exige deles coerência com a ideia da democracia como valor universal (para usar o conceito proposto no Brasil, em 1979, por Carlos Nelson Coutinho). A cada “pano passado” para o chavismo, para a gerontocracia cubana, para a ditadura chinesa ou para o regime assassino de Putin, a esquerda permite que seu capital democrático se dilua e que sua crítica ao golpismo pareça um simples discurso oportunista.

No contexto histórico das interações sociais reguladas pelos algoritmos, os grupos de extrema direita têm desempenho muito superior nas redes sociais, produzindo um discurso simplificador e quase sempre falso, mas especulando com problemas reais e se colocando como verdadeiros intérpretes da vontade popular. Já a esquerda parece ter cada vez mais dificuldades para se fazer compreender, porque não propõe uma agenda de reformas, porque sua visão de mundo parece ser a mesma da “guerra fria” e porque, em vez de mobilizar as pessoas contra as injustiças, se aferra ao papel de defensora das instituições.

A situação geral do país, em síntese, parece ser muito grave, e a imagem do Titanic rumando para seu destino, enquanto os passageiros dos lugares mais caros dançam ao som de uma orquestra, parece tão atual quanto foi em 2018.

Marcos Rolim é jornalista, doutor em Sociologia. Escreve mensalmente para o jornal Extra Classe.

rolim.com.br 

A grande fratura da política brasileira - Paulo Roberto de Almeida

 A grande fratura da política brasileira 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Nota sobre a divisão do país, iniciada sob o lulopetismo e agravada sob o bolsonarismo.

 

A grande divisão política, ideológica, partidária, no Brasil parece ter se agravado e se consolidado no Brasil nos últimos anos. Ela não começou, contudo, com o desafio da direita – tanto a extrema quanto a liberal – ao predomínio das esquerdas no cenário acadêmico e jornalístico do Brasil desde a explosão de protestos contra o governo Dilma em 2013. Ela começou bem antes, e vinha se afirmando no país desde os anos 1980, com a emergência do PT na política brasileira, se reforçou na redemocratização e praticamente se cristalizou nos anos 1990, época maior dos enfrentamentos entre duas linhas social-democráticas típicas na América Latina: a reformista-capitalista e a socialista-anticapitalista, representadas pelo PSDB e pelo PT respectivamente. 

Essa divisão foi basicamente alimentada pelo sectarismo petista, organizada e dinamizada pelos “gramscianos” do PT, que são diferentes do núcleo sindicalista original do PT, imediatamente “assaltado” pelos “guerrilheiros reciclados” que voltaram do exílio na anistia do 1979 e logo penetraram e dominaram organicamente o PT, como uma das principais forças organizadas e empenhas na montagem do aparelho partidário de tipo “neobolchevique”. Foi essa combinação de representantes do sindicalismo alternativo e dos “gramscianos” das esquerdas derrotadas pelo regime militar que constituiu a força original do PT e que, junto com as bases populares que formaram o seu eleitorado – movimentos sociais, comunidades eclesiais de base, organizações comunitárias vinculadas à “Igreja progressista” (bispos da CNBB, de esquerda) –, estiveram na origem do primeiro e único partido de base ideológica e popular que efetuou sua “média marcha” em direção ao poder, vinte anos depois de sua fundação. Sindicalistas, gramscianos, intelectuais formaram a espinha dorsal do PT, que preservou a linhagem revolucionária estilo cubano, jamais efetuando a transição para a revolução reformista que marcou a transição para a modernidade dos velhos partidos marxistas da esquerda europeia em direção dos movimentos reformistas da II Internacional. O PT permaneceu deformadamente marxista, mimeticamente cubano e supostamente socialista.

Ao lado do populismo demagógico do seu principal líder – supostamente operário, mas na verdade um apparatchik sindicalista -, os intelectuais gramscianos levaram o PT aos seus primeiros triunfos eleitorais, ao mesmo tempo em que o líder se encarregava de construir uma imagem de líder social popular comprometido com as causas clássicas dos partidos socialistas: a luta pela igualdade social, pelos direitos dos trabalhadores, pelo reformismo radical de nítida feição estatizante e alinhado com as causas da revolução cubana na região. Esse foi o cenário no qual emerge e se consolida a fratura política nacional: de um lado o povo puro, classes C e D, inclusive E na parte urbana, de outro as elites, as oligarquias, os ricos em geral, responsáveis presumidos pela miséria e pelas desigualdades sociais.

A divisão “nós e eles”, o “povo” e as “elites” começa aí, num sentido classista típico, que torna praticamente impossível uma grande aliança entre petistas e tucanos para iniciar e empreender um conjunto de reformas modernizantes capazes de mudar o cenário político oligárquico tradicional em direção de uma coalizão de centro-esquerda, com condições de mudar o país, como feito em alguns experimentos da socialdemocracia europeia ou mesmo latina. O PT obstruiu completamente, pelo seu não aggiornamento, a possibilidade dessa união de cunho progressista, continuando a hostilizar as forças moderadas da esquerda tucana. O PSDB teve de se aliar à direita para realizar muitas das reformas constitucionais e outras que teriam de ser feitas, depois que uma Constituição elaborada antes da queda do muro de Berlim congelou no país um modelo estatizante, intervencionista, assistencialista, e que, na verdade, reproduziu velhos mecanismos da oligarquia tradicional numa roupagem de tipo socialista moderna. 

Isso durou durante todos os anos 1990, depois os dois primeiros mandatos do PT, Lula 1 e 2, quando o sectarismo e os equívocos petistas levaram uma boa experiência de redistribuição social ao impasse de uma política econômica desastrosa, pelo excesso de gastos públicos e pelo intervencionismo exagerado na economia. A Grande Destruição Econômica do terceiro mandato petista abriu espaço para uma direita vingativa, ainda dividida em várias vertentes ideológicas, indo dos saudosistas da ditadura e dos fascistas involuntários (na verdade inconscientes) até os liberais moderados, mas que rejeitavam o molde petista na economia. Foi o agravamento, a exacerbação e o extremismo dessas correntes que inauguraram um outro tipo de divisão no país, não mais a “elite” e o “povo”, mas uma esquerda supostamente “comunista” e uma direita liberal e conservadora, sendo que esta nunca teve o seu equivalente de “intelectuais gramscianos” para oferecer-lhe uma doutrina política coerente ou capaz de organizar e conduzir um movimento reformista moderno, capitalista, liberal social avançado.

O extremismo venceu, pois que as direitas desorganizadas juntaram agora as velhas oligarquias, saudosistas da ditadura militar e os liberais muito fracos para dispor de seu próprio movimento ou partido capaz de levá-los ao poder. O petismo sectário criou e alimentou o antipetismo, onde vieram se abrigar todos aqueles que recusam o sectarismo petista, e com isso se consolidou a divisão do Brasil tal como a observamos atualmente. Os militares desempenharam um papel importante nessa ascensão da extrema-direita, pois eles reagiram contra o revanchismo das esquerdas a partir da Comissão Nacional da Verdade, que  de fato só considerou os crimes da repressão do regime militar, deixando completamente de lado os movimentos guerrilheiros, que incitaram a repressão violenta da ditadura, atingindo inclusive o pacífico Partidão, totalmente descomprometido com a luta armada dos anos 1960-1970, núcleo do “guerrilheiros reciclados” que afluíram no PT. 

Esse é o quadro da divisão atual entre duas metades do país, desiguais na composição social, na organização, nas doutrinas e nas motivações políticas estatais. Juntando tudo isso à casta política consolidada nas instâncias de representação e de comando político, temos o pior cenário de convivência política entre contrários, congelando os blocos opositores.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4729, 12 setembro 2024, 3 p.