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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

quinta-feira, 7 de março de 2019

O chanceler vestiu a carapuça. Mas não era para ele e sim para um dos seus patronos...

Estou até enrubescido, como se dizia nos romances de antigamente.
Vários jornais continuam tratando dessa coisa.
Por essa coisa eu quero me referir, obviamente, à minha defenestração do cargo de Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais do Itamaraty, o primeiro cargo que tive, na Secretaria de Estado, desde 1999, se contarmos a partir da minha saída para a embaixada em Washington, em setembro desse ano. 
Ao retornar ao Brasil, em 2003, tive vetado o convite que o então diretor do Instituto Rio Branco me havia formulado, no começo daquele ano, para dirigir o curso de mestrado, para o qual ele me julgava academicamente qualificado, mas para o qual os "donos" da Casa – Secretário-Geral Samuel Pinheiro Guimarães, e Ministro de Estado Celso Amorim, nessa ordem – me julgavam politicamente inadequado. 
Ao contrário do que diz o Itamaraty, eu não escolhi trabalhar no Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República por vontade própria. Eu atendi a um convite do então ministro Luiz Gushiken – um dos membros da troika de assessores do presidente Lula, e que gostava de mim, a despeito de eu já ser um opositor do PT e de suas políticas econômicas esquizofrênicas – justamente porque o Itamaraty me recusou qualquer cargo na Secretaria de Estado.
Trabalhei no NAE-PR enquanto o ministro o chefiou. Quando de seu afastamento, em 2006, retornei ao Itamaraty, apresentando-me para o trabalho. A despeito de oferecimentos que me foram feitos pela própria chefe de Gabinete do ministro Amorim, nenhum dos três cargos se confirmou, e fiquei quatro anos no DEC, Departamento de Escadas e Corredores, fazendo da Biblioteca do Itamaraty o meu escritório de trabalho. Depois andei pela China durante alguns meses, voltei a Brasília, e nada. Passou-se um ano, nada. 
Tirei licença, passei meio ano em Paris, dando aulas no IHEAL-Sorbonne em 2012. 
Voltei a Brasília, e nada. Apenas em 2013, resolvi assumir um cargo secundário num pequeno consulado nos EUA, pois já estava há quase dez anos em Brasília, sem perspectivas de receber qualquer convite para trabalhar na SERE, já que que os companheiros estavam na terceira vitória sucessiva (em face desses incompetentes tucanos).
Voltei a Brasília no final do 2015 e nada. Fiquei mais seis meses no DEC, até que Madame Pasadena foi finalmente afastada da Presidência por alguns dos seus muitos crimes contra o Brasil e os brasileiros (a Lava Jato recém começava a investigar a máfia dos quadrilheiros da maior organização criminosa do Brasil travestida de partido político). 
Foi só em agosto de 2016 que assumi o cargo do qual acabo de ser defenestrado.
Parece que causou o maior rebuliço, a julgar pelas muitas matérias de imprensa publicadas desde a Segunda-Feira de Carnaval (esses caras não podiam ter esperado pelo menos a Quarta-Feira de Cinzas, para não atrapalhar a folia dos jornalistas?).
Abaixo estão alguns dos alertas de notícias que recebo regularmente sobre temas diversos, entre eles esta pessoinha que vos escreve. Vejam e eu volto logo abaixo...

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"Paulo Roberto de Almeida"
Atualização diária  8 de março de 2019
NOTÍCIAS 
BRASÍLIA - O Itamaraty desmente, extraoficialmente, a versão do embaixador Paulo Roberto de Almeidapara sua exoneração do cargo de ...
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Para Itamaraty, Paulo Roberto de Almeida foi afastado de cargo por ter "agredido" pelas redes sociais o chanceler e a política externa do governo ...
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Por isso demitiu o embaixador Paulo Roberto de Almeida, segundo revela a jornalista Eliane Cantanhêde. "Ao publicar no Facebook uma crítica do ...
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Segundo uma entrevista do embaixador recém-exonerado Paulo Roberto deAlmeida para O Estado de S. Paulo, “os embaixadores estão ...
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Para Itamaraty, Paulo Roberto de Almeida foi afastado de cargo por ter “agredido” pelas redes sociais o chanceler e a política externa do governo ...
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O que dizem essas notícias, alimentadas pelo próprio Itamaraty? Que eu "ataquei" o ministro, pessoalmente. Ora vejam!
Primeiro, eles disseram que essas substituições de chefias eram normais e já estavam programadas desde muito tempo.
Concordo, mas por que, então, fazer em caráter ultra-rápido, numa Segunda-Feira de Carnaval logo no começo da manhã?
Não podiam ter feito antes do Carnaval, o que me teria possibilitado espairecer, viajar, sair em algum bloco, bebendo à vontade, fantasiado de diplomata?
Ou por que não fizeram na Quarta-Feira de Cinzas?
Explicaram isso para a FSP na Segunda-Feira, que publicou a "explicação" tal qual.
Isto foi o que a FSP publicou na manhã do dia 4/03: 
"O Itamaraty afirmou que a mudança da diretoria do Ipri, “no contexto da troca da grande maioria das chefias do ministério das Relações Exteriores, já estava decidida e foi comunicada ao atual titular”. (https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/03/diplomata-e-demitido-apos-republicar-textos-sobre-crise-na-venezuela.shtml).
Depois, constatando que essa explicação era por demais fajuta, inventaram essa coisa de que que teria "ofendido o chanceler", segundo versão difundida oficiosamente por aquele garoto que assessora o chanceler a partir da PR, mais conhecido como Robespirralho, ou Sorocabannon. Ele resolveu insistir nessa versão, e acharam que eu estava, portanto, condenado por crime de "lesa-majestade". 

Uma jornalista conhecida, sem verificar exatamente o que eu estava escrevendo em meu blog, e sem consultar-me a respeito, "comprou" essa versão  do Itamaraty e a difundiu pela TV e num artigo de jornal.
Eu não sei porque o chanceler vestiu a carapuça nessa questão, quando obviamente eu não estava referindo-me a ele – pois o considero uma peça menor no jogo do poder – e sim a quem já foi chamado de "chanceler paralelo", e quem foi o seu grande eleitor na escolha dos ministros do novo governo, juntamente com aquele sofista da Virgínia, que não preciso dizer quem é (também conhecido como Rasputin de suburbio). 

Eu falei de "fundamentalista trumpista" e isso se aplicava apenas – por enquanto – a um dos Bolsokids. Eis o que escrevi para clarificar a vinculação da designação ao personagem: 

"O "fundamentalista trumpista" a quem eu me referi é aquele sujeito também amador em política externa, que passeou ridiculamente pelos EUA com um boné da reeleição de Trump em 2020, e que disse, USURPANDO sobre a opinião do povo brasileiro (que ele não consultou), que todos aqui estávamos apoiando a construção de um muro na fronteira com o México. Isso é um adesismo da pior espécie, além, é claro, de representar interferência nos assuntos internos de DOIS países. 
Ao que me consta o chanceler ainda não usou nenhum boné do Trump."

Não sei bem porque o chanceler considerou que o "fundamentalista trumpista" se referia a ele. Só porque ele assinou um artigo dizendo que Trump iria salvar o Ocidente?
Confesso que nunca considerei que aquele artigo – cheio de invocações a Jesus Cristo e outras entidades da Santíssima Trindade – fosse realmente uma peça séria; me pareceu mesmo que ele era o que efetivamente é: uma peça eleitoral, para enganar incautos. 

Entretanto, acho que o que mais agastou o nosso chanceler acidental foi o fato de eu ter "ofendido" o seu patrono espiritual, o tal sofista da Virgínia.
Mas, de acordo com um colega de carreira, não revelado por razões óbvias, experto em filosofia, ele não merece toda essa pompa, e por isso eu o estou despromovendo.
Reproduzo aqui o que me escreveu esse colega ao comentar uma das minhas "filípicas" anteriores (como gostaria de ver escrito o chanceler, tão apreciador da cultura grega, não sei se macedônica também): 

"Algumas das expresssões que o sr. utiliza estão destinadas à consagração, como a referência a nosso "chanceler acidental", "Robespirralho" e aos "bolsokids". Peço licença apenas para discordar da descrição do tal guru da Virgínia como um "sofista". Acho que é exagero compará-lo a nomes como Górgias e Protágoras, os quais, no limite, tiveram como consequência promover a reação de Sócrates (e Platão) contra a mentira, a dissimulação e a delinquência intelectual. 
No máximo, esse tal de olavo (de quem nunca havia ouvido falar, apesar de carioca e de ter uns vinte anos de estudos e de docência em filosofia) só pode ser classificado como um "sub-sofista", pois dali não tem como sair senão ressentimento e baixo calão."

Enfim, a imprensa tem farto material de leitura sobre esse pouco faustoso evento, como diriam os causídicos de antigamente...
Aguardem que vai ter muito mais.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de março de 2019

Uma homenagem particularmente feliz - Carlos Eduardo de Freitas

Recebo, com extrema satisfação, esta mensagem de solidariedade de meu amigo Carlos Eduardo de Freitas. Ele estava cotado para fazer uma palestra no IPRI, a meu convite, mas espero que meu sucessor mantenha o convite.

Meu ilustre e estimado amigo Paulo Roberto,.
Receba meus cumprimentos, e o testemunho de minha admiração e respeito pela coragem de manifestar-se com independência sobre questões envolvendo a política externa do Brasil, e, assim, como diplomata de carreira e servidor público profissional, enfrentar as consequências de sua atitude.
Parabéns Paulo! Iniciativas como a sua têm se tornado raras no Brasil nos últimos tempos. Precisamos reviver exemplos de vida como o do Dr. Sobral Pinto e, mais recentemente, do Dr. Hélio Bicudo.

Afetuoso abraço,
Carlos Eduardo de Freitas
Análise & Pesquisa Econômica
carlos.freitas@corecondf.org.br
 

How much you make? Quanto dinheiro você faz? - Roberto Macedo

Mais ‘poupancicultura’ para o Brasil prosperar

Ampliar a poupança bem investida é o caminho da prosperidade

Roberto Macedo
O Estado de S. Paulo, 7/03/2019

“Poupancicultura” é um neologismo com duplo significado. Um é o da cultura da poupança, integrada a padrões culturais de comportamento, crenças e outros aspectos que distinguem uma pessoa ou grupo social, e se desdobram no plano das suas instituições. No outro, o cultivo da poupança é comparado à agricultura, ao investir bem o dinheiro poupado. À maneira de sementes que, cultivadas com fertilizantes de bons hábitos financeiros, e defensivos contra tentações consumistas e desperdícios, levarão a bons resultados. 
Andando por aí vemos lojas, shoppings, oficinas, fábricas, escolas, hospitais, fazendas e outras edificações a produzir bens e serviços. Quanto maior a sua produção e a produtividade lá dentro – de seres humanos à de máquinas e equipamentos –, maior será a prosperidade de pessoas, famílias, comunidades, cidades, regiões e do País. 
Como tudo isso foi construído? Sucessivas gerações não consumiram tudo o que produziam, poupando parte para ampliar sua capacidade produtiva. Por exemplo, quem só plantasse milho não prosperaria se o consumisse todo, exceto as sementes para a safra seguinte. Para prosperar teria de poupar mais sementes e/ou, via inovações, buscar outras mais produtivas. Inovações envolvem investir tempo poupado, e também recursos de poupança. Ao investir, pode-se também usar financiamentos, mas seu custo seria mais baixo com mais poupança financeira, e lá na frente será necessário poupar para pagá-los. 
Ainda existem pessoas que produzem individualmente algo tangível como o milho. A maioria das demais trabalha em várias atividades, recebe seus rendimentos e o caminho da prosperidade é o mesmo. Primeiro, não consumir tudo o que recebem. Poupada uma parte, precisa ser bem investida, e há alternativas, como o investimento financeiro, mas é preciso que siga para algo produtivo. No Brasil o governo absorve grande parte desse dinheiro, que vem da poupança de famílias, empresas e outras instituições, mas investe muito pouco dessa poupança, fazendo assim uma despoupança que prejudica o crescimento econômico do País. 
Outra possibilidade é adquirir bens, como um imóvel, que mesmo usado como casa própria rende implicitamente o aluguel que economizou. E serviços, como os de educação e saúde, que mantêm e/ou ampliam nossa capacidade produtiva. A educação a valoriza e credencia a uma promoção no trabalho ou a um emprego melhor. Com ela e de olho no mercado, inovações e o empreendedorismo também trazem ganhos de renda. 
O norte-americano Bill Gates, um dos homens mais ricos do mundo, quando aluno de graduação na Universidade Harvard (EUA), passou a desenvolver softwares que levaram ao enorme desenvolvimento dos computadores de mesa, mais tarde dos portáteis e, mais recentemente, aplicáveis aos smartphones. 
O que fazia e faz com o dinheiro que lhe cabe de sua empresa, a Microsoft? Se pensasse em consumi-lo todo ou em grande parte, não teria levado adiante seus projetos, pois ela estava e ainda está sempre precisando de mais recursos parasoftwares inovadores, contratar gente, comprar equipamentos e tudo mais que for necessário para a empresa crescer. Ou seja, ele poupou e poupa muito, investe muito e bem. Do contrário, perderia para a concorrência. 
Lições básicas: 1) quem trabalha como assalariado precisa poupar e bem investir para prosperar; 2) quem tiver um negócio, para fazê-lo crescer, precisará poupar boa parte dos ganhos e bem investi-los; 3) quem herda negócio da família, para mantê-lo, deverá poupar parte dos lucros, e não dilapidar o patrimônio, pois terá de investir para inovar, enfrentar a concorrência e a depreciação do capital fixo do negócio, na forma de suas máquinas, equipamentos e outras instalações; 4) em qualquer caso, a poupança bem investida é indispensável para a prosperidade; 5) governos também precisam poupar e bem investir, ou ao menos não atrapalhar esse processo, como no Brasil. 
Gates é um caso raro de enorme e rápido sucesso empresarial. O mundo das pessoas comuns, tipicamente assalariadas, é o do mercado de trabalho em que estão ou precisam se inserir, que disputarão com outras pessoas, sendo indispensável poupar e investir em novas qualificações, necessidade ampliada pelos avanços das tecnologias de informação e comunicação. Ademais, precisam viver dignamente como seres humanos, tendo onde morar e como cuidar do sustento próprio e da família, da educação e da saúde de seus membros, além de pensar na longevidade e sua(s) aposentadoria(s), e em cuidar de problemas de saúde que virão. E a lista poderia prosseguir, com atividades culturais, de lazer e outros itens. Sem poupar e bem investir, o futuro ficará comprometido e, na velhice, em condições abjetas. 
Estatísticas mostram que no Brasil a poupança total, que inclui a pessoal, familiar, empresarial e governamental, é baixa. Os investimentos, também. No governo, como visto, ela é até negativa. Olhando o mundo, os países que mais crescem estão no Sudeste Asiático e se destacam entre os que mais poupam e bem investem. 
Em contraste com essa imensa importância da poupança bem investida, aqui pouco se fala de difundi-la e ampliá-la e muito na necessidade de mais investimentos. Mas como custeá-los? Entram recursos externos, mas não se pode ficar dependente deles, pois são insuficientes para as necessidades, correm o risco de instabilidades e atendem às conveniências dos investidores, e não necessariamente do País. 
O empresário Antonio Cabrera, ex-ministro da Agricultura, observou que nos EUA se fala muito em fazer dinheiro. Aqui, em ganhar dinheiro. Acrescento: se possível, sem maior esforço. “Poupancicultura” é fazer dinheiro. Assim, cabe um grande esforço para difundi-la e ampliá-la no Brasil. 

* ROBERTO MACEDO É ECONOMISTA (UFMG, USP E HARVARD), PROFESSOR SÊNIOR DA USP, CONSULTOR ECONÔMICO E DE ENSINO SUPERIOR

Retificando Eliane Cantanhede no GloboNews em Pauta e no Estadão


Esclarecimentos vindos do “outro lado” da história

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de março de 2019

Vou transcrever em primeiro lugar o artigo de Eliane Cantanhede no Estadão desta quinta-feira 7 de março, que reproduz, em formato ampliado, seus argumentos no GloboNews em Pauta de 6/03.
Acho que ela só ouviu o Itamaraty e não teve o cuidado, ou o tempo, de me ouvir, ou interpretou mal o que escrevi no meu blog Diplomatizzando.
Na sequência, e desculpando-me pela longa postagem, coloco os meus argumentos, que ela usará se desejar.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de março de 2019


1) Matéria do Estadão

Ataques a Ernesto Araújo motivaram exoneração de embaixador
Para Itamaraty, Paulo Roberto de Almeida foi afastado de cargo por ter “agredido” pelas redes sociais o chanceler e a política externa do governo Bolsonaro
Eliane Cantanhêde, O Estado de S.Paulo
06 de março de 2019 | 23h22

BRASÍLIA - O Itamaraty desmente, extraoficialmente, a versão do embaixador Paulo Roberto de Almeida para sua exoneração do cargo de presidente do Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais (Ipri), em plena segunda-feira de Carnaval. Na versão do ministério, ele “quer aparecer” e foi afastado por ter “agredido” pelas redes sociais o ministro Ernesto Araujo e a política externa do governo.
Ao publicar no Facebook uma crítica do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso à política externa, na véspera da exoneração, Almeida escreveu sobre “os descaminhos da nossa diplomacia, entregue aos eflúvios amadores de ideólogos tresloucados, como certo sofista da Virgínia, e fundamentalistas trumpistas totalmente equivocados”. E concluiu: “Já passou da hora de superar o ridículo...”

No Itamaraty, a conclusão é que a referência a “fundamentalistas trumpistas” foi uma “agressão direta” ao chanceler Araújo, que tem textos publicados enaltecendo o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, como o único capaz de salvar os valores cristãos do Ocidente e, por isso, é costumeiramente acusado por seus críticos justamente de “fundamentalista trompista”. Além disso, a cúpula do ministério considera que ele acusou a política externa do atual governo de “descaminhos” e de ser “ridícula”.
Embaixadores sediados no Itamaraty, em Brasília, consideram que as expressões “ideólogos tresloucados” e “sofista da Virgínia” foram dirigidas frontalmente contra o filósofo Olavo de Carvalho, que mora no Estado norte-americano da Virgínia e é apontado como o principal padrinho da escolha de Ernesto Araujo como chanceler. Eles, porém, disseram que isso não pesou na exoneração, o que pesou foram os “ataques ao chanceler e à hierarquia”. 

Em entrevista ao Estado, publicada ontem, Almeida disse que foi exonerado por, além de ter criticado Olavo de Carvalho, ter publicado em seu blog um artigo de Fernando Henrique Cardoso e uma palestra do embaixador Rubens Ricupero contra a política externa do governo Jair Bolsonaro. O Itamaraty, porém, diz que tanto o artigo quanto a palestra são públicas e, inclusive, divulgadas no resumo diário de notícias sobre o Itamaraty. Logo, não seriam motivo para o afastamento.
Uma das críticas de Paulo Roberto de Almeida, na entrevista, foi que Ernesto Araujo impôs uma “subversão da hierarquia, uma reforma de cima para baixo que deixou muita gente perplexa”. Disse, também, que já estava esperando ser afastado. De fato, ele já tivera uma conversa na sexta-feira com o chefe de gabinete de Ernesto Araujo, ministro de carreira Pedro Wollny, justamente sobre seu próximo cargo. O post no domingo interrompeu a discussão, ele foi comunicado da exoneração na segunda-feira pelo próprio Wollny, por telefone, e ontem foi ao Itamaraty para formalizar a decisão.
Uma curiosidade: Paulo Roberto está escrevendo um livro junto com o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, sobre o ex-embaixador, ministro e senador Roberto Campos, um dos ideólogos da direita brasileira. Longe de ser considerado “de esquerda”, Almeida é um estudioso da vida e obra de Campos.
Na entrevista ao Estado, o embaixador disse que ficou “na geladeira”, ou “encostado na biblioteca”, nos anos dos ex-presidentes Luis Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Segundo o Itamaraty, porém, ele atuou de 2003 a 2007 como assessor especial do Núcleo de Assuntos Estratégicos do Palácio do Planalto.


2) Meu primeiro esclarecimento sobre o artigo de Eliane Cantanhêde no Estadão (7/03/2019) e seu comentário no GloboNews em Pauta (6/03):

1) Ninguém tem nenhuma dúvida sobre quem seja o sofista da Virgínia; reafirmo: é um completo inepto em relações internacionais;
2) O "fundamentalista trumpista" a quem eu me referi é aquele sujeito também amador em política externa, que passeou ridiculamente pelos EUA com um boné da reeleição de Trump em 2020, e que disse, USURPANDO sobre a opinião do povo brasileiro (que ele não consultou), que todos aqui estávamos apoiando a construção de um muro na fronteira com o México. Isso é um adesismo da pior espécie, além, é claro, de representar interferência nos assuntos internos de DOIS países. 
Ao que me consta o chanceler ainda não usou nenhum boné do Trump.


3) Meu segundo esclarecimento sobre o artigo de Eliane Cantanhêde no Estadão (7/03/2019) sobre um livro que ainda não saiu e meus “cargos” anteriores:


Tenho novamente de corrigir a Eliane Cantanhede em mais dois outros parágrafos da matéria no Estadão, ela novamente apenas informada por certos súditos do Itamaraty.
Ela escreveu:
"Uma curiosidade: Paulo Roberto está escrevendo um livro junto com o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, sobre o ex-embaixador, ministro e senador Roberto Campos, um dos ideólogos da direita brasileira. Longe de ser considerado “de esquerda”, Almeida é um estudioso da vida e obra de Campos.
Na entrevista ao Estado, o embaixador disse que ficou “na geladeira”, ou “encostado na biblioteca”, nos anos dos ex-presidentes Luis Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Segundo o Itamaraty, porém, ele atuou de 2003 a 2007 como assessor especial do Núcleo de Assuntos Estratégicos do Palácio do Planalto."

Vamos lá:
1) NÃO estou escrevendo NENHUM livro com o ministro Gilmar Mendes. Cerca de oito meses atrás, sob recomendação do jurista Ives Gandra Martins, o gabinete do Ministro Gilmar Mendes contatou-me para colaborar num livro que ele estaria coordenando sobre os 30 anos da Constituição. Eu disse que, não sendo formado em Direito e considerando-me inepto na matéria, eu poderia no máximo contribuir com uma crítica à economia política da CF-88, pois tal é a minha especialidade, e que poderia ser algo sobre as críticas de Roberto Campos à Constituinte e à Constituição de 1988, pois eu já tinha escrito e coordenado um livro sobre o grande diplomata e economista: O Homem que Pensou o Brasil: trajetória intelectual de Roberto Campos (Appris, 2017). Disseram-me que estava bem, preparei o artigo, mandei e NUNCA mais tive notícias desse livro.
2) Aproveitei o embalo, expandi esse artigo, completei com vários outros argumentos e compus o livro A Constituição Contra o Brasil: ensaios de Roberto Campos sobre a Constituinte e a Constituição de 1988 (SP: LVM, 2018), com 65 artigos de Roberto Campos, gentilmente cedidos por seu filho, e dois longos ensaios meus.
3) Sobre o fato de eu ter "atuado", entre 2003 e 2006 (não 2007), como assessor no NAE: não o fiz por vontade própria, mas apenas a convite do ministro Gushiken, a quem eu conhecia desde os anos 1990, quando ele foi relator de alguns projetos dos quais eu me ocupava no Itamaraty (acordos de investimento) e que gostava de mim, mesmo eu dizendo a ele que a "economia" do PT era esquizofrênica (assim mesmo: ele dava risada e não falava nada).
4) Esse convite veio depois que, vergonhosamente, o Itamaraty - SG Samuel Pinheiro Guimarães e ME Celso Amorim – vetaram um convite que me foi formalmente feito pelo então Diretor do Instituto Rio Branco, João Almino​, para dirigir o Mestrado do Rio Branco, do qual eu já era professor orientador desde o seu início, em 2001. Em 2002 tirei férias da embaixada em Washington e passei uma semana em Brasília orientando 5 ou 6 alunos. O convite veio no início do governo Lula, em 2003, mas três dias depois de eu ter aceito (pois já estava há quase 4 anos em Washington), o Diretor do IRBr teve o constrangimento de anunciar-me que não podia confirmar o convite, pois "o SG tinha outras ideias". Eu sei quais eram essas ideias, pois ele já me achava liberal demais para o pequeno campo de reeducação que ele pretendia fazer no IRBr e na SG.
5) Vim a Brasília em meados de 2003 – a tempo de ouvir o ministro Celso Amorim dizer que os diplomatas "precisavam vestir a camisa do governo", uma declaração vergonhosa sob qualquer aspecto – para discutir sobre o meu futuro. Disseram-me na SG que não tinham nada previsto para mim, que não estavam me removendo para a SERE pois não havia cargos à disposição, e que eu poderia ficar mais tempo em Washington ou negociar um outro posto.
6) Foi nessas circunstâncias que eu aceitei o convite do ministro Gushiken – um dos poderosos membros da troika, mas a quem NUNCA solicitei qualquer favor, sequer promoção – para integrar o Núcleo de Assuntos Estratégicos da PR, com quem trabalhei de 2003 a 2006.
7) Quando ele se afastou do NAE, por motivo de doença – ou efeitos do Mensalão, não sei – eu me despedi do NAE e me apresentei novamente no Itamaraty, acredito que em outubro de 2006. Fui imediatamente bem recebido pela chefe de Gabinete do Ministro Amorim que me ofereceu três postos na SERE para "preenchimento imediato". Aceitei um deles e fiquei esperando. Não aconteceu nada, durante dois meses, e aí compreendi que o Ministro Amorim tampouco me queria na SERE.
8) Em dezembro de 2006, num encontro casual com o Ministro Amorim no Clube das Nações disse-lhe que eu estava voltando à SERE, para trabalhar "sob a sua gestão". Ele me olhou secamente e disse-me: "É, mas a sua entrevista ao Estadão não lhe ajudou em nada." Virou as costas e circulou. Nunca mais falei com ele diretamente, a não ser anos depois, num encontro casual numa saída de restaurante em Brasília, quando me perguntou se eu "continuava escrevendo muito". Foi a vez de eu lhe dizer: "É ministro, é um vício que eu tenho.". E nada mais.
9) A entrevista a que ele se referiu foi uma a Lourival Santana, sobre o BRIC, e eu dizia que se tratava de uma construção intelectual que não fazia muito sentido – a não ser para investidores – pois os quatro países não tinham nada em comum. Eu não sabia que o ministro já articulava com Lavrov (o eterno ministro russo das relações exteriores) a formalização de um BRIC diplomático, mas isso não tem a menor importância: continuo pensando a mesma coisa sobre o BRIC, hoje BRICS.
10) Algum tempo depois, o ministro Amorim me ofereceu um posto de embaixador na Ásia, que eu recusei gentilmente, consciente de que nada mais me seria oferecido, na SERE ou fora dela.
11) E assim passei anos no DEC, Departamento de Escadas e Corredores, fazendo da Biblioteca o meu escritório de trabalho. Tirei licença, fui dar aulas em Paris, voltei, nada...
12) Portanto, é uma falsidade o Itamaraty dizer que eu não tive trabalho na SERE, mas fui trabalhar no NAE: só fiz isso por que me recusaram qualquer cargo na SERE, e isso durou até o impeachment de Madame Pasadena, quando o governo Temer me ofereceu o cargo de diretor do IPRI, do qual acabo de ser defenestrado pelo atual chanceler.
Esta é a história completa, mas se a Eliane Cantanhede desejar posso lhe contar os detalhes de inúmeros diálogos que mantive com servidores do lulopetismo (inclusive com Marco Aurélio Garcia, a quem recebi no meu "autoexílio" na Bélgica, quando do golpe de Pinochet no Chile, em 1973), todos eles empenhados em me manter fora da SERE, já que não podiam demitir-me do serviço público.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de março de 2019

quarta-feira, 6 de março de 2019

Uma homenagem de Joao Amoedo e um pequeno segredo - Paulo Roberto de Almeida

Uma homenagem de João Amoedo e um pequeno segredo

Paulo Roberto de Almeida

Aproveito esta mensagem elogiosa do meu amigo João Dionisio Amoêdo, a quem agradeço a homenagem (texto transcrito in fine), para agora revelar um pequeno segredo, que cumpre contar por inteiro.
Estive com a equipe econômica do atual governo em meados de 2018, meses antes que o chanceler olavista fosse sequer cogitado pela equipe de Bolsonaro. Isso foi no escritório de Paulo Guedes, no RJ, com vários outros colegas que estão agora ocupando altos cargos, aos quais já conhecia desde algum tempo.
Quando entrei na sala, me receberam como se eu já fosse o futuro chanceler, o que descartei de imediato, com palavras quase iguais a estas (cito de memória):
"Não sou candidato a nada, só vim aqui conversar com vocês sobre economia e política externa. Não sou eleitor de Bolsonaro, não vou votar por ele, e sinceramente eu o acho um candidato muito fraco. Já tenho candidato no primeiro e no segundo turno e ele se chama João Dionisio Amoêdo."
Meus interlocutores ficaram um pouco chocados com a rudeza de minhas palavras, mas depois conversamos por aproximadamente duas horas, e eu tive de corrigir certas percepções deles sobre o Mercosul, sobre o Itamaraty e assuntos correlatos.
Nos despedimos em bons termos, e eu continuei a enviar para eles alguns papeis que eu também havia feito especialmente para o João Dionisio Amoêdo, sem no entanto que eles tivessem sido refletidos no programa de Bolsonaro quando este foi elaborado.
Quando finalmente saiu esse programa, eu os cumprimentei pela parte econômica, que achei bem elaborada, mas critiquei duramente a parte, medíocre, horrível, pequena, sofrível, relativa à política externa, que achei indigna de um programa de governo para inserir o Brasil no mundo. Escrevi isso num paper que continha 3 páginas de críticas contundentes à mediocridade dessa parte, e mais 3 com propostas que me pareciam adequadas de política externa. Um dia vou revelar esse documento (mas ele já pode ter circulado por aí).
Depois que enviei esse documento, os membros da equipe econômica de certa forma “romperam” comigo, o que não me causou nenhum problema, pois eu não estava trabalhando, e não pretendia trabalhar para um governo Bolsonaro. Estava apenas colaborando voluntariamente com a equipe econômica.
Nunca mais falei com qualquer um deles, e assim permanece até hoje. Estou sempre aberto a colaborar com todos aqueles que pretendam fazer reformas reais no Brasil, segundo as minhas condições.
De toda forma, quero novamente agradecer ao João Dionisio Amoêdo as palavras abaixo, e confirmar-lhe que continuo partilhando da maior parte (não todas) das propostas do NOVO.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 6 de março de 2019

Homenagem de João Dionísio Amoedo, em postagem sobre uma das entrevistas que concedi na tarde de ontem:
Qualificação técnica, firmeza de princípios e coragem para falar o que pensa, são características do PRA. O governo erra ao afastá-lo. Ele deveria, ao contrário, ser mais ouvido e convidado a assumir responsabilidades ainda maiores.

PS.: Permito-me apenas uma pequena correção: não foi o “governo” que me demitiu, e sim o chanceler Ernesto Araújo, e não, como alegam os itamaratecas a seu serviço, porque eu tenha criticado pessoalmente o chanceler. Não é verdade. Eu critiquei, sim, e duramente, dois esteios desse governo, um que leva o nome Olavo, outro que leva o nome Bolsonaro. Foi isso. Não tenho culpa se o chanceler os admira e não estabeleço qualquer correlação entre uma e outra coisa. Eu os criticaria em qualquer hipótese, mesmo se o chanceler não tivesse com ambos quaisquer relações, de amizade, de admiração ou de distanciamento. PRA