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sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Mario Vargas Llosa sobre o tal de "neoliberalismo"

Já escrevi bastante sobre essa bobagem essencialmente acadêmica -- mas exercitada plenamente por militantes políticos profundamente ignorantes, eu até ousaria dizer completamente idiotas, se não tivesse me comprometido a não mais chamar alguém de idiota (embora alguns mereçam) -- que consiste em acusar alguém ou alguma posição econômica ou política de "neoliberal".
Trata-se, numa expressão benigna, de um reducionismo atroz, no limite uma idiotice completa (perdão, perdão).
Em economia, existem liberais, como existem intervencionistas, ponto. Num caso se pretende a liberdade dos mercados, no outro se pretende a mão visível, e forte, do Estado. São fatos, não são minha opinião.
Em política, existem liberais e existem autoritários, ou mesmo totalitários. Os primeiros defendem um regime amplamente democrático, com total liberdade de expressão e de organização política, com algumas salvaguardas contra aqueles que pretenderiam destruir a democracia (sim, existem, como sabemos). Os segundos gostam de Estados centralizados, partidos únicos (ou quase), liderança da "vanguarda" (autodesignada, cela va de soi) e aquele desejo intenso de "reformar a sociedade", para torná-la mais "justa", mais "igualitária", mais conforme os desejos da "maioria". Enfim, tudo se resume num projeto de "engenharia social": os liberais não admitem essa perspectiva, e acham que os homens devem ser livres, simplesmente. Os autoritários, sim, têm essa vontade obsessiva de reorganizar a sociedade, mesmo contra a vontade dos... liberais, claro.
Bem, chega de papo.
Gostaria apenas de transcrever aqui um texto de Mario Vargas Llosa sobre o neoliberalismo, que fui "roubar" no blog do meu amigo e colega de ideias liberais Orlando Tambosi, que fez o trabalho de tradução (e que fica com todos os copyrights e moral rights pelo esforço). (Neste link.)
Quem quiser ler meus textos sobre neoliberalismo, pode buscar no meu site, na série sobre as "Falácias Acadêmicas".
Paulo Roberto de Almeida

Mario Vargas Llosa sobre o "neoliberalismo"
Creio que o termo “neoliberalismo” não tem conteúdo semântico. É uma fórmula fundamentalmente denigritória, utilizada como etiqueta para caricaturar o liberalismo e fazê-lo responsável por todas as calamidades humanas. Uma das grandes vitórias das ideologias totalitárias, todas derrotadas na prática, é que nos deixaram uma sequela ideológica que se traduz em preconceitos e em certos lugares-comuns ideológicos, profundamente arraigados apesar dos desmentidos da realidade.
A ninguém se chama “neoliberal” para definir um sistema de pensamento, de valores, de convicções políticas. Não, neoliberal é algo automaticamente associado a explorador, defensor de instituições anacrônicas, injustas; neoliberal é quem tem uma visão fundamentalista do mercado, alguém que, em última instância, defende o sistema de exploração, de abuso, de expropriação do trabalho.
Há que se rechaçar a própria noção de neoliberal, já que carece de significação e, mais que uma idéia, é uma espécie de imprecação. Tem gente que é liberal e gente que não o é. Mas eu não conheci jamais um “neoliberal”. Assisto a congressos e seminários sobre o liberalismo e nunca ouvi alguém dizer: “Eu sou um neoliberal”. Cada vez que ouvimos a palavra “neoliberal” temos que nos preocupar, porque por trás dessas palavras há preconceitos profundos e ódio ao que o liberalismo representa. E isto, sim, existe, está aí, em muitos casos é um ódio consciente, em outros é instintivo.
Curiosamente, o liberalismo, que para muitos representa algo conservador, anacrônico, algo que já não expressa a realidade, é capaz de provocar hostilidades, manifestações de extraordinária ferocidade. Creio que essas são sequelas das ideologias totalitárias que ainda contaminam profundamente o discurso político do nosso tempo.
Não há neoliberais, há liberais. E os liberais são um espectro bastante amplo, de matizes muito diferentes e, às vezes, distanciados e contrapostos. Algo que é perfeitamente lógico se se pensa que o liberalismo não é uma ideologia, não tem esse caráter fechado de religião, dogmático, que tem as ideologias. É um corpo de ideias, uma doutrina em que se parte de certas convicções básicas que têm a ver especificamente com a liberdade, a idéia de que a liberdade é o valor mais prezado desde o ponto de vista individual e social, e que a presença e operacionalidade da liberdade, entendida de maneira unívoca como totalidade no campo político, no campo econômico, no campo cultural, no campo individual, é o que mais contribui para afastar a violência, para estabelecer a coexistência social e trazer prosperidade. Essas são ideias muito elementares, que são o denominador comum dos liberais.
A partir daí, o que há são diferenças, enormes diferenças. Mas, basicamente, a partir de algumas convicções democráticas e algumas convicções de que a liberdade, tanto no campo político quanto no campo econômico, conjugados, traz progresso, desenvolvimento, civilização: não a sociedade perfeita; o liberalismo não parte da idéia de uma sociedade perfeita, posto que as sociedades são sempre imperfeitas, mas são aperfeiçoáveis, e que para uma sociedade se aperfeiçoar é necessário fundar a Carta da liberdade, permitir a crítica, a diversidade, dentro de uma coexistência só garantida pela lei.

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