Não por ser meu amigo, mas por ser um grande historiador, recomendo vivamente, ainda antes de conhecer, este livro que acaba de sair no Brasil.
Como posso recomendar um livro sem tê-lo lido ainda?
Simples: prefaciei o primeiro livro de Luiz Claudio, que já conhecia desde a dissertação de Mestrado, e ali mesmo disse que deveria ser publicado, o que finalmente foi feito pela Editora da Universidade do Paraná. Trata-se de uma história das relações do Brasil com as repúblicas do Pacífico, especialmente através da figura especialíssima de Duarte da Ponte Ribeiro, o grande promotor do uti possidetis na definição das fronteiras do Brasil e um diplomata excepcional.
Depois conheci e acompanhei a edição de seu segundo livro, sobre as relações interamericanas no século 19, derivado de sua tese de doutoramento, que foi publicado pela Unesp. Finalmente, já conheço o novo livro parcialmente, por meio de artigos preparados para revistas especializadas.
Agora posso fazer um reparo: também estive associado ao trabalho de elaboração da capa, e fui eu quem forneci a foto do Barão (não fui eu quem fiz, mas eu possuía o clichê), que vem da Catedral de Washington, num vitral que tem outras figuras da América Latina, Bolívar, San Martin, esses "founding fathers" dos países da região, aos quais o Barão se encontra, assim (tardiamente), associado.
Agora, se vocês repararem bem, pela imagem do Barão, quase moçoilo, apesar da calvície já adentrando na cabeça, constataram que "esse barão" não poderia ser "o Barão", status que obteve já de cabelos brancos. Se trata de um barão back to the future. Mais passons sur cette bevue.
O que importa é que o Juca Paranhos, barão ou não, é um dos "santos protetores" na catedral ecumênica de Washington. Grande figura, sem dúvida, ainda que eu seja totalmente contrário a esse culto mítico, quse litúrgico, que existe na diplomacia brasileira. O que não diminui em nada, diga-se de passagem, o valor do Barão como historiador, negociador, diplomata e ministro. Um grande homem e um grande estudioso, o que para mim é o que importa. Como ministro, era um realista e não um ideólogo, e não ficava fazendo bravatas entre os impérios daquela conjuntura. Tinha uma percepção aguda do interesse nacional, que colocava acima dos partidos e das lutas políticas da sua época.
Bem, está feita a recomendação
Paulo Roberto de Almeida
PS: Vou receber o livro proximamente, diretamente das mãos do autor...
O DIA EM QUE ADIARAM O CARNAVAL: POLÍTICA EXTERNA E A CONSTRUÇÃO DO BRASIL
LUÍS CLÁUDIO VILLAFAÑE G. SANTOS
(São Paulo: Editora Unesp, 2010, 278 p.; ISBN-13: 978-85-393-0060-0; ISBN-10: 85-393-0060-5)
SINOPSE:
Tido como o responsável pela consolidação do território brasileiro, o Barão do Rio Branco conquistou em vida a aura de herói nacional. Sua morte, em 1912, levou o governo a declarar luto oficial e a adiar o Carnaval de fevereiro para abril. Esse episódio ímpar, que mistura política externa e festa popular, é o ponto de partida de Luís Cláudio Villafañe G. Santos que, nesta inteligente obra, discorre sobre as complexas relações entre Estado, território e poder político no Brasil.
A transcendência da morte de Rio Branco não escapou a seus contemporâneos. Uma rápida consulta aos jornais da época deixa clara essa percepção. Na edição vespertina daquele mesmo 10 de fevereiro de 1912, o diário A República assinalou: "Nenhum brasileiro atingiu mais alto o culto da veneração popular. O Barão do Rio Branco era verdadeiramente um patrimônio nacional. A nação que o amou em vida há de idolatrar-lhe reverentemente a sua venerada memória". A Gazeta de Notícias (11/02/1912), por sua vez, comentou que "Dizer doBarão do Rio Branco uma rápida impressão de dor, de luto, de lágrimas, quando o país inteiro soluça é bem difícil. E sua obra foi enorme e grandiosa".
Nem os festejos de Momo escapariam do choque trazido pela perda de quem já em vida era considerado um herói nacional. O sábado seguinte ao passamento do Barão, dia 17 de fevereiro, seria carnaval. Seria, porque o carnaval em 1912 acabou adiado para abril. O governo determinou que, em virtude do luto nacional, os festejos fossem transferidos para o período de 6 a 10 de abril. A força do mito criado em torno de José Maria da Silva Paranhos Júnior como construtor na nacionalidade, sua identificação com "uma certa idéia de Brasil", merece reflexão. Trata-se de um caso único, de um diplomata que surge como referência para a construção da nação, um "fundador"da nacionalidade deslocado no tempo. Quando de sua morte, o Brasil já contava com quase noventa anos de vida independente. Já havia sido governado por imperadores, regentes e presidentes. Ainda assim, Rio Branco passou a disputar espaço importante na memória e no imaginário como um dos formadores da nação brasileira.
O fato de Juca Paranhos estar indubitavelmente no panteão dos santos do nosso nacionalismo certamente revelará algo do processo de construção da identidade brasileira, uma discussão que já conta com uma longa e respeitável tradição intelectual. São muitas as perspectivas e premissas que animam esse debate. A nação brasileira foi construída pela literatura, pela historiografia, pelas ciências sociais e pelas grandes explicações multidisciplinares dos "intérpretes do Brasil". Vários são os enfoques e os recortes possíveis. Aqui, trilharemos um caminho ainda pouco explorado: a construção da idéia de Brasil, da nação e da nacionalidade brasileiras a partir da política externa do país.
Apresentação do Autor:
Tomando como ponto de partida a tentativa de adiar o carnaval de 1912 por luto pela morte do Barão do Rio Branco, busco problematizar essa mistificação da política externa brasileira como uma continuidade inescapável das ideias e políticas de Paranhos, mas, principalmente, busco reconstruir o caminho trilhado na consolidação do sentimento de identidade brasileira e de nacionalidade e explorar o papel da ação do Estado nessa “invenção”. Mais especificamente, busco ligar a política externa e a construção da identidade/nacionalidade brasileira.
A utilização da figura do Barão como gancho retórico para isso pareceu-me extremamente adequada, pois nós temos um caso único de um “founding father” da nacionalidade deslocado no tempo. Enfim, espero que possa despertar sua curiosidade para um livro que, quem tiver o tempo e paciência, verá que, ainda por cima, acaba em samba…
A Profa. Doutora Maria Lígia Coelho Prado teve a gentileza de escrever uma belíssima apresentação que conclui, com generosidade, com o seguinte parágrafo:
“Concordando ou discordando das premissas e das teses esposadas – muitas delas controversas – não há dúvidas sobre a competência e sofisticação do autor. Este livro, sem dúvida, se constitui em leitura fundamental para todos aqueles que desejam entender as intrincadas mediações entre relações exteriores, identidade e nacionalismo no Brasil contemporâneo”.
O livro já está disponível na Editora e no site da Livraria Cultura (ver aqui).
Sumário:
Apresentação – Maria Lígia Coelho Prado
O Barão, santo no altar da nacionalidade
Brasil ou Brasis?
Um Império tropical
Somos da América e queremos ser americanos
O Barão e outros santos
A consciência do atraso
Rompendo com o Barão?
Conclusão
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