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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 31 de outubro de 2010

Mafia Participacoes, SRL (sociedade a responsabilidade limitada)...

Limitada apenas aos companheiros, claro.
Alguns exemplos desse novo empreendimento capitalista, embora em escala restrita (e não seguindo exatamente aquela contabilidade que tinha sido inventada por um monge medieval), figuram nas duas matérias abaixo.
Talvez seja o prenúncio de um novo reino: o dos espertos. Vamos ter de conviver com isso por um bom tempo, ao que parece...
Paulo Roberto de Almeida

Telebrás, para comparsas
ETHEVALDO SIQUEIRA
O Estado de S.Paulo, 31 de outubro de 2010

"A Telebrás não está sendo recriada para servir à sociedade brasileira. Sua reativação tem o claro objetivo de atender a comparsas políticos. Exatamente como tem ocorrido na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Isso nos conduzirá, inevitavelmente, à degradação dos serviços, como, aliás, já ocorre no setor postal."

Essas palavras são do comandante Euclides Quandt de Oliveira, ex-ministro das Comunicações, de 1974-79, ao avaliar a recriação da Telebrás.

Quandt foi o primeiro presidente daquela estatal que retirou o País da situação de profundo atraso em suas telecomunicações em que vivia até o começo dos anos 1970.

Lúcido e franco aos 91 anos de idade, Quandt se preocupa com o futuro do País e relembra que cabe ao Estado fixar políticas públicas e mesmo prestar serviços, diretamente ou por intermédio de concessionárias.

"A prestação de serviços públicos é uma responsabilidade do Estado. Cabe-lhe, no entanto, fiscalizar a prestação de serviços com o máximo rigor", afirma Quandt.

Defensor histórico e convicto do modelo estatal, Quandt mudou de opinião no começo dos anos 1990.

Ele explica: "Depois de passar pela Telebrás e pelo Ministério das Comunicações, continuei a defender o modelo estatal, pois acreditava que ele seria capaz de cumprir sua missão de atender aos brasileiros em qualquer ponto do País. Fui, porém, forçado a reconhecer que, a partir de 1985, a escolha de dirigentes no Sistema Telebrás passou a ser feita com o claro propósito de atender a amigos e comparsas políticos, gente que, em sua maioria, não tem a qualificação profissional para o exercício do cargo. A partir daí, passei a ser defensor da privatização".

Loteamento. Por volta de 1990, Quandt já havia perdido sua esperança na possibilidade de a Telebrás atender a todos os brasileiros.

Hoje, o modelo estatal volta a ser desfigurado em vários setores governamentais pelo loteamento político, inclusive com a reativação da Telebrás, como acaba de ser feita.

Conheço Quandt há mais de 30 anos e fui testemunha de seu trabalho excepcional em favor das comunicações brasileiras, ao lado do segundo presidente da Telebrás, o general José Antonio de Alencastro e Silva.

Aquela Telebrás, nascida em 1972, funcionou de forma exemplar até 1985 e nada tinha de parecido com a "nova Telebrás", ressuscitada por Dilma Rousseff e por Erenice Guerra - e entregue, como um feudo, ao petista gaúcho Rogerio Santanna.

Heterodoxia petista. A volta da Telebrás tem sido justificada como estratégia para levar a banda larga a todo o povo brasileiro, "com a melhor qualidade e o menor preço".

Algo comovente, não? Os caminhos para alcançar esse nobre propósito, entretanto, não são nada republicanos. Confira, leitor:

Holding das antigas teles, a Telebrás foi privatizada em 1998, mas não foi extinta, por diversos problemas legais. Por ter sido criada por lei, não poderia ter sido reativada por decreto, com a mudança de suas finalidades. No entanto, esse decreto mudou sua condição de empresa holding transformando-a em uma operadora de serviços. Só uma lei específica, debatida e votada pelo Congresso poderia mudar sua atividade-fim.

Nenhuma concessionária ou outra parte legítima teve coragem de contestar, perante o Supremo Tribunal Federal (STF), essa inconstitucionalidade. Por isso, o País teve que engolir tudo em seco. Será que o Ministério Público não seria essa parte legítima para provocar o STF a se pronunciar sobre a constitucionalidade ou não desse decreto?

Além de recriar a Telebrás, o governo Lula aprovou, num só decreto, o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), que, "a rigor, como plano, não existe", segundo Otávio Marques de Azevedo, diretor da Andrade Gutierrez, acionista da Oi.

O PNBL divulgado com o decreto não passa de uma breve carta de intenções, acompanhado agora por uma lista das primeiras 100 cidades a serem atendidas, 50% delas com população superior a 350 mil habitantes, nas quais já atuam pelo menos três operadoras com oferta de banda larga.

Um plano de banda larga de verdade deveria incluir metas específicas, fontes de financiamento, orçamento confiável, cronograma de investimentos, áreas prioritárias, população a ser atendida, evolução dos serviços e suas características técnicas.

Por sua importância, a questão da banda larga deveria ter sido debatida pelo Congresso Nacional há mais de 5 anos e com a participação de toda a sociedade. Só foi anunciada, entretanto, por um grupo palaciano ávido de poder, no sétimo ano do governo Lula, como um filão eleitoral.

O pior da heterodoxia e da ousadia petista na recriação da Telebrás foi alijar e marginalizar as duas áreas mais qualificadas e legalmente capacitadas a estudar e a propor modificações setoriais: o Ministério das Comunicações, ao qual a Telebrás sempre esteve legalmente vinculada, e a Anatel, que detém o maior número de especialistas em telecomunicações do governo.

Depois de tantas manobras, tudo acabou sendo decidido por Dilma Rousseff e sua sucessora, Erenice Guerra, sem o apoio do Ministério das Comunicações, que elaborou estudo de mais de 200 páginas sobre as linhas do PNBL - totalmente ignorado pela ministra Dilma.

Eis aí um pequeno retrato das comunicações brasileiras na era Lula.

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E por falar em Oi, "Oi internautas"...
Nunca uma saudação foi tão profética:
Da coluna "Holofote", de Felipe Patury, na VEJA desta semana, com três impressionantes flagrantes, como indica o jornalista Reinaldo Azevedo, "evidenciando como funciona a República dos Companheiros. Nos três casos, como vocês verão, o interesse público é apenas a alavanca ou o instrumento de ambições privadas. Esse é o modelo que, segundo as pesquisas, está recebendo hoje o endosso da maioria dos que decidiram votar."
Leiam:

Alô, é do BNDES? Não, é da Oi

O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, convidou poucos profissionais do setor privado para acompanhá-lo na carreira pública. O economista Rafael Oliva foi um deles. Braço direito de Coutinho na sua empresa de consultoria, a LCA, Oliva se tornou assessor da presidência do banco. No cargo, participou das maiores operações feitas pela instituição, entre elas o empréstimo de 4,4 bilhões de reais concedido à Oi. Oliva deixou o BNDES. Agora, é diretor de planeja-mento regulatório da Oi. Oi?

Um tempero pra lá de oleoso

Um dos pedidos que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez à presidenciável petista Dilma Rousseff foi que mantivesse por um ou dois anos o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli. Lula acredita que, propagandeando o pré-sal, Gabrielli construirá sua candidatura à sucessão do governador baiano Jaques Wagner. Até 2012, Wagner convidaria Gabrielli para seu governo - e, então, o presidente da Petrobras começaria a tocar sua campanha ainda mais à vontade

As exigências de Erenice à Anatel
O presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Ronaldo Sardenberg, recebeu em 5 de abril deste ano uma carta confidencial da então secretária executiva da Casa Civil, Erenice Guerra. Em duas páginas, a futura ministra Erenice exigiu mudanças no projeto do Plano Nacional de Banda Larga, anunciado no mês seguinte. Anexado à carta, seguiu um texto de doze páginas com o que Erenice queria ver encampado pela Anatel. O documento era assinado por Artur Coimbra de Oliveira, assessor da Presidência, e Gabriel Laender, da Casa Civil. O texto sugeria duas medidas que beneficiariam a empresa Unicel: novas regras para as licitações de bandas largas em freqüências de 450-470 mega-hertz e facilidades para novas operadoras móveis com rede virtual. O marido de Erenice, José Roberto Camargo Campos, trabalhou para a Unicel. O assessor Gabriel Laender também. Sardenberg fez as alterações cobradas por Erenice.

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Comento: Eu me pergunto por que certos personagens, que não precisariam dobrar a espinha, resolvem ser tão condescentes com o crime, e acabam manchando assim a sua própria biografia de servidores públicos? Não tenho respostas, mas talvez alguns leitores as tenham.

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