Uma lágrima para Chávez;
nenhuma para o socialismo do século 21
Paulo Roberto de Almeida
Alegoria política estilo século 20
Juca Chávez se foi. Uma
pena. Era um bom cantor e compositor. Encantava o público, que podia passar
horas escutando-o deblaterar contra os poderosos, os políticos tradicionais, os
mercados, o capitalismo, a ganancia, a cupidez dos homens, enquanto versejava
sobre um futuro melhor, feito de abundância, de solidariedade, de muito amor e
compreensão. Embaladas nos acordes de um velho violão, as canções soavam simpáticas,
sempre prometendo justiça e bem-estar para todos, mesmo sem esclarecer como
tudo isso seria alcançado, já que trovas políticas precisam ter recados curtos
para serem eficazes. Ele chamava tudo isso de “socialismo do século 21”, um
título curioso, pois suas ideias recendiam mais ao século 19. Enfim, a vida é
feita de contradições.
Era um mestre das palavras
e das rimas. Sabia tocar os corações e mentes das pessoas, sobretudo os mais
humildes, aqueles afastados dos círculos de poder, que só têm uma vaga ideia
sobre como são complexos os mecanismos da dominação política e ainda mais as
engrenagens dos dos circuitos produtivos. Chávez era um carismático, com sua
retórica poderosa, certamente convencido de seu próprio poder sobre as pessoas.
Mas ele não descuidava de fazer sua autopromoção, ressaltando suas qualidades e
escondendo habilmente seus defeitos. Acompanhado de seu violão, era capaz de
reter as pessoas durante horas, frente às telas da televisão, ou ao som do
rádio.
A isso chamamos liderança
natural: Juca Chávez a tinha de sobra. Pena que usou muito mal de todas as suas
habilidades, prometendo muito e, afinal, entregando muito pouco. Suas ideias
econômicas eram bizarras, feitas de uma mistura de estatismo e socialismo
rústico: acabou desmantelando as bases da economia de mercado, e deixando o
país pior do que se encontrava quando assumiu sua posição de líder, o que lhe
converteu numa espécie de caudilho da música popular. Primeiro, passou a achar
que só as suas músicas eram as boas: daí praticamente monopolizou as rádios e
TVs para seu estilo de música, banindo todos os demais. Depois decretou que
todos (ou quase todos) passariam a usar a mesma cor de camisa, que ele dizia
ser a cor do amor. Tanto carinho e dedicação a suas causas nobres encantavam os
já conquistados ao seu charme e pregações, mas deixavam poucas opções de
escolha aos demais, aqueles que simplesmente gostariam de usufruir de suas boas
promessas, sem necessariamente ter de aderir a todas as suas maneiras e
trejeitos.
Juca Chávez, como
trovador, era mesmo contraditório: queria fazer o bem, mas achava que todos
deviam concordar com a sua maneira especial de fazer o bem. Na verdade, ele não
estimulava a criatividade nas ou das pessoas; pretendia simplesmente à
agregação de todos e cada à sua visão peculiar do que fosse o bem, ao seu
projeto pessoal de engenharia social. E a sua engenharia padecia de sérios
erros estruturais.
Juca Chávez se foi. O mundo
da canção latino-americana já não será mais o mesmo, pois Chávez o transformou
irremediavelmente. Deixou seguidores, mas nenhum à sua altura, ou dispondo de
seus recursos pessoais e materiais. Vai fazer falta para muitos, sobretudo porque
era generoso com os humildes, embora impiedoso com quem não partilhava de seu “socialismo
do século 21”. Este nunca chegou a ser formulado explicitamente e, de fato, era
muito confuso para funcionar de verdade. Imagina-se que nunca funcionaria na prática,
já que poetas e trovadores jamais conseguem articular soluções a problemas
concretos: ele só alimentam sonhos.
Uma lágrima para Juca Chávez;
nenhuma para o seu socialismo.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 2 de Janeiro de 2013.
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