O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

Mostrando postagens com marcador Across the Empire. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Across the Empire. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Across the Empire, 2014 (25): Back home, where there is work waiting...


Across the Empire, 2014 (25): Back home, where there is work waiting...

Paulo Roberto de Almeida

A despeito meu anúncio, na postagem 24, de que voltaríamos para casa via nova passagem em Corning, NY, onde se encontra o maior museu do mundo de objetos de vidro, resolvemos, na partida, seguir direto de Toronto a Hartford, e isto por duas razões muito simples: na segunda-feira 22, o tempo começou a se deteriorar rapidamente, e na manhã da segunda tinha começado a ficar frio e nublado, ameaçando possíveis chuvas na jornada, em todo caso o final do verão (e de fato, já entramos no outono, que nestas paragens do norte costuma ser invernal, estrito e lato senso). 

A outra razão foi um simples equívoco de distância, feito quando eu estava montando o esquema de viagem, entre km e milhas, o que pode dar diferenças consideráveis. Eu tinha anotado uma distância total de quase 800 milhas entre Toronto e Hartford, o que recomendaria, sem dúvida, quebrar em duas etapas, pelo menos, daí a sugestão de visitar novamente o museu do vidro de Corning, onde já tínhamos estado no ano passado. Mas, distraído, apressado, ou sonolento, fui vítima da precisão milimétrica (se ouso dizer) do Google maps: como fui estabelecendo o roteiro de viagem e de distâncias respectivas com a ajuda dessa ferramenta a partir dos EUA, todas as distâncias mostradas estavam em milhas. Já ao traçar a etapa final, colocando Toronto, o Google maps usou obviamente o sistema métrico universal, que a Inglaterra adotou creio que quando ingressou na então Comunidade Europeia, no início dos anos 1970; só os EUA ficaram no seu velho sistema de unidades bizarras: milhas, pés, galões, jardas, bushels, barris, etc. O fato é que eu registrei uma distância de 799 milhas de Toronto a Hartford, quando isso era em quilômetros. Em milhas daria apenas 499 milhas, um trajeto facilmente coberto por nômades como nós. Quando descobrimos isso, decidimos deixar Corning para uma outra ocasião, menos cansativa.
A propósito, lembrei-me agora de uma história real, na verdade uma perda imensa, de vários milhões de dólares, e de muitos meses de trabalho desperdiçados, por um erro banal desse tipo. Eu havia acabado de chegar aos EUA, em 1999, e ouvi falar de um satélite lançado em um projeto conjunto de exploração espacial – mais provavelmente de espionagem – entre os EUA e o Reino Unido. Depois de lançado, por um foguete americano, a partir de Cabo Canaveral, o foguete simplesmente desapareceu dos sistemas de monitoramento, quando estava sendo colocado em órbita, em operação efetuada pelas duas agências nacionais. Por um momento se teve uma enorme dúvida do que tinha acontecido, e onde tinha ido parar o tal satélite. Finalmente, depois de alguns dias veio a explicação oficial – e depois nunca mais se falou nisso – e ela era tão prosaica quanto o meu erro: os americanos estavam dirigindo o satélite usando o seu sistema de orbitagem, todo efetuado em milhas, e os britânicos estavam usando o seu, todo ele calculado em quilômetros. Pronto, foi o que bastou para o satélite se perder no espaço, para nunca mais ser localizado. Perderam, envergonhados, vários milhões nessa brincadeira, e ainda assim os americanos ainda não se decidiram pelo sistema métrico, praticamente universal. Este é um problema que persiste desde Thomas Jefferson, que por ter sido embaixador em Paris, preconizou a mudança, nunca realizada. O Brasil também teve a sua revolta de quebra-quilos, quando finalmente se decidiu a passagem para o sistema métrico, adotado desde a independência, mas nunca efetivado até bem mais tarde no segundo império: os comerciantes, obviamente, aproveitaram a oportunidade para roubar alguns tostões dos consumidores, incertos sobre as novas medidas, e daí se passou ao “quebra-quilos”. Bem, conosco não aconteceu nenhuma revolta popular, nem imensas perdas econômicas, ao contrário, economizamos alguns dias de hotel e viagem. 
Enveredamos, portanto, pelo mesmo caminho até as quedas do Niágara, onde comemos no mesmo Hotel Sheraton que já tínhamos estado em maio último, com um restaurante na altura das cataratas e plena visão sobre o conjunto, sem precisar enfrentar o tempo chuvoso, ventoso, “urlante”, lá fora. Depois, na altura de Buffalo, em lugar de seguir para o Sul, tomamos a I-90 em direção a leste, direto a Massachusetts e depois Connecticut, onde chegamos de noite.
Decidimos, portanto, concluir a viagem cinco dias antes do prazo, mas isso também porque eu tenho muito trabalho pelo frente: estou editando um livro sobre a política brasileira com meu amigo Ted Goertzel, e ele decidiu que tínhamos de tirá-lo, se possível, antes das eleições, o que é sempre uma aposta sobre o desconhecido. Em todo caso, passei metade da viagem revisando textos, organizando algumas tabelas, e preparando esta edição que precisa ser em Kindle, do contrário não ficaria pronta. Foi uma razão poderosa para voltar, pois ainda temos de ver capa e outros detalhes técnicos dessa edição. Vai se chamar The Drama of Brazilian Politics, mas ainda estamos acertando o subtítulo. Nada de muito dramatique, ou dramatik, mas uma coleção de estudos sobre a política brasileira no século 20 e 21, com ênfase no período contemporâneo. Meu capítulo é sobre mudanças de regime econômico em função das conjunturas políticas. Depois informo melhor.
Mas lá viemos nós, em desabalada carreira pela I-90, tão desabalada que acabei pegando uma multa no estado de NY, a única de toda a viagem, por estar a 87 milhas por hora, quando o limite era de 65. Justo: ninguém mandou afrontar a lei. Ainda não sei quanto vai custar, mas deve ser salgada...
Chegamos não muito tarde em Hartford, mas ainda trabalhei intensamente no livro, até a madrugada, e acabei dormindo toda a manhã desta terça-feira, para dar por encerrada, apenas agora, este último relato de viagem.
Ainda vou fazer um balanço geral da viagem, provavelmente a última desse tipo de aventura, pelo menos nos EUA. Ainda falta cruzar todo o Canadá, a Rússia, a China e vários outros continentes, mas por enquanto nos damos por satisfeitos. Agora, viagens por lugares mais costumeiros, da costa leste.
No total do trajeto, fizemos exatamente 7.842 milhas, ou 12.547 km, o que dá uma média de aproximadamente 500 kms por dia. Não está mau para quem pretende atravessar um país continente. Na verdade, a média das etapas é bem maior, pois estivemos por dois ou três dias em cada uma das grandes cidades que visitamos. Fizemos um pouco mais do que o planejado, aliás, como sempre acontece, mas isso eu deixo para comentar depois.
 Agora vou terminar de revisar o livro e depois volto para um balanço final.

Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 23 de setembro de 2014

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Across the Empire, 2014 (24): Toronto: cultura e pequenos prazeres...


Across the Empire, 2014 (24): Toronto: cultura e pequenos prazeres...

Paulo Roberto de Almeida

Toronto estava em festa neste fim de semana, inclusive com a praça do Legislativo fechada para as comemorações da batalha de York, contra os americanos. Em todo caso, preferimos passar o dia no que estava programado para esta cidade: a visita ao novo museu das imediações, Aga Khan, como já antecipado.

Não vou resumir aqui a história do homem ou de sua religião, pois todos podem encontrar muita informação sobre tudo isso, e sobre o museu, na internet. Em todo caso, uma recomendação: Carmen Lícia comprou este livro, que detalha a história dos ismaelitas. Custou exatamente 85 dólares canadenses na lojinha do museu e é um livro imponente (mais 11,05 de imposto, ou seja, um total de $ 96,05).
Eu conheci um pouco da história dos ismaelitas por circunstâncias fortuitas: em 1971 ou 1972, eu estudando na Bélgica, aquele ditador de circo chamado Ido Amin Dada – uma espécie de predecessor do Hugo Chávez – para compensar sua absoluta incompetência em matéria econômica – exatamente como o Chávez, aliás – resolveu encontrar um bode expiatório a quem culpar pelos problemas econômicos que ele mesmo criou em Uganda: resolveu então expulsar todos os imigrantes da época inglesa, que em geral eram trabalhadores do subcontinente indiano, entre eles paquistaneses da seita ismaelita. Algumas dezenas, ou centenas, foram parar na Bélgica. Conheci então uma jovem ismaelita, cujo nome nunca esqueci – por uma razão muito simples, ela se chamava Ruhina – e que me relatou a história de sua família e da imigração de seus antepassados para Uganda, inclusive pormenores da seita ismaili, já com menções a Aga Khan, o benfeitor da comunidade. Muito simpática, e nos entendíamos numa mistura de inglês e de francês, o que bastava para aferir o drama imenso daquelas milhares de família que tiveram, do dia para a noite, abandonar tudo, para buscar uma nova vida em outros países. Imagino como deve ter sido a expulsão dos judeus e dos mouros da península ibérica, a de vários outros povos submetidos a ditadores sanguinários – como Hitler, Stalin e os Castros – e fico pensando como a humanidade ainda comporta seres tão primitivos quanto esses brutos. Mas voltemos ao museu Aga Khan
O museu tinha de tudo o que pessoas cultas podem desejar: exposições de alta qualidade, música ao vivo, uma lojinha muito diversificada (onde comprei uma gravata de seda manufaturada com a temática do museu, bastante cara, por sinal) e Carmen Lícia comprou vários livros, além de um par de brincos na mesma temática, aliás que combinam com um colar que compramos no museu de Detroit, também muito bonito), pessoal simpático, instalações muito confortáveis, com garagem subterrânea (totalmente indispensável num país que neva 1 metro de altura, com 40 negativos). Recomendo altamente, como aliás Carmen Lícia, que aparece nesta foto sorridente.
Endereço para os distraídos: 77 Winford Drive, Toronto, ON M3C 1K1. 
Fizemos dezenas de fotos, Carmen Lícia provavelmente mais de duas centenas, de todos os objetos interessantes fotografáveis, com plaquetas informativas bilíngues.
Eu apareço na companhia deste barbudo, que é o Fathali Shah Qajar, um governante iraniano (ou persa) do início do século 19.
Carmen Lícia preferiu ficar entre esse casal de príncipes iranianos do mesmo período.

Os iranianos, ou persas, nunca foram fundamentalistas, em matéria de religião, de arte, de música, de poesia, e até de afinidades etílicas que seriam condenadas em outras partes, pelo menos até chegar o bando de bárbaros guiados pelo Khomeiny.
Depois do museu, fomos ainda ao centro religioso, ao lado, e que aparece nesta foto escura que fiz ao cair da tarde. 

Estavam preparando uma reunião religiosa, mas ainda assim pude sentar na pequena biblioteca do local, para folhear este Atlas que fiquei com vontade de comprar, mas acabei não achando na lojinha do museu, quando voltamos a ele.

Carmen Lícia também viu frustrado seu desejo de comprar um sexto ou sétimo livro, que também folheou na biblioteca, mas que tampouco estava disponível no momento. Este aqui. Fica para encomendas na Amazon ou na Abebooks.

Depois, ainda percorremos a cidade, indo até essa imensa torre que distingue a cidade, no mesmo modelo da que tínhamos visto em Seattle, com o inevitável restaurante circular, etc.

Carmen Lícia me fotografou na fonte-cascata em frente da torre, com perfis metálicos de peixes (suponho que sejam os famosos salmões do Canadá), subindo as corredeiras dos rios para desovar a montante.

Finalmente, ainda circulamos pela cidade, e sem vontade de sair para um restaurante, passamos num comércio de Fine Foods e compramos um húmus e mais alguns apetrechos para um pequeno lanche ao cair da noite. Terminei mais uma garrafa de vinho, esta que vocês veem na foto, ao lado do azeite com trufas brancas, que ainda perfumou o meu húmus com alho grelhado e cebola...
Agora estou degustando uma legítima Miller, uma das cervejas mais famosas da região, enquanto termino de redigir estas notas.
Amanhã, ou dentro de algumas horas, empreendemos o caminho de volta, não sem antes passar novamente por Corning, onde está o maior museu do vidro do mundo.
Depois conto...

Paulo Roberto de Almeida
Toronto, 21 de setembro de 2014

domingo, 21 de setembro de 2014

Across the Empire, 2014 (23): de Detroit a Toronto, só turismo e gastronomia



Across the Empire, 2014 (23): de Detroit a Toronto, só turismo e gastronomia

Paulo Roberto de Almeida

Sábado, 20/09: depois de dois dias em Toronto, uma bela cidade falida, mas dotada de um museu excepcional, voltamos ao menu costumeiro, estradas, no caso só uma, a 401, de Windsor, na fronteira, até Toronto, onde chegamos pouco antes das 18hs, depois de alguma gastronomia pelo caminho.
Como tínhamos saído tarde de Detroit, e ainda desviados do roteiro normal por causa de uma jornada bicicleteira na cidade, que bloqueou várias ruas, acabamos parando logo depois de atravessar a Ambassador Bridge, para almoçar num restaurante italiano de Windsor: Armando’s. Eu, com mais fome do que Carmen Lícia (mas sempre é assim), comecei com uma salada Caprese (tamanho família) e depois desisti do vitelo a parmegiana, para não ficar comida demais, pois todos os pratos eram enormes. Comi apenas uma pizza Margheritta, e ainda assim sem as bordas. Carmen Lícia ficou com seus calamari fritti, que sempre apreciou. Ambos com uma taça de Valpolicella, mas eu sempre acabo tomando metade do dela.
Conclusão: vim meio sonado na estrada para Toronto, o que nunca é recomendável... Mas viajamos bem, com alguns pontos de engarrafamento aqui e ali.
Fomo diretos ao Museu Aga Khan, nosso objetivo principal na cidade, pois ele acabava de ser inaugurado (na quinta, 18/09). Não para visitar, pois já era tarde, mas para comprar os tickets de ingresso, para garantir a visita neste domingo (aliás hoje). Acabei fazendo algumas fotos do museu, entre elas estas duas.


Depois fomos à inglória tarefa de encontrar um hotel na cidade, num fim de semana de festas em Toronto, com todos os hotéis lotados. Depois de passar por dois ou três, encontramos, a preços extorsivos, no Ramada, da Jarvis Street, não muito longe do centro, com a vantagem de ter garagem fechada. Tive de pagar um apartamento de dois quartos, com duas imensas camas tamanho king size, pelo direito de dormir, pois do contrário talvez tivéssemos de sair da cidade. Deixamos os pertences no quarto e saímos novamente pela cidade.
A razão da lotação dos hotéis se prende à festa comemorativa da guerra de 1813, contra os americanos, que por uma vez os canadenses ganharam, garantido a posse de alguns territórios em torno dos grandes lagos (mas alguns principais ficaram com os imperialistas desde criancinhas, como escreveria Moniz Bandeira. Fort York e Toronto estarão em festas neste fim de semana, e isso vai atrapalhar um pouco a circulação do que pretendemos fazer no domingo, que é visitar museus, e flanar pela cidade.
Antes de voltar ao Hotel, compramos queijo de cabra, torradas, duas garrafas de vinho (das pequenas, ou seja, meia garrafa) e mais duas cervejas para mim. Nosso jantar, pois, foi queijo e vinho, e confesso que liquidei todo o queijo (CL ficou com uma parte de Asterix, eu fiquei com a do Obelix) e toda a meia garrafa de Cabernet Sauvignon chileno, deixando o italiano para amanhã (ou hoje, domingo).
Nada mais tendo a declarar, mas tendo dois jornais para ler, o Wall Street, velho jornal que os companheiros definiriam como sendo do capital financeiro monopolista e dos especuladores de Wall Street, e um jornal local, The National Post, ambos com matérias interessantes, sobre Escócia, Estado Islâmico, Ucrânia, aquecimento global, enfim, essas coisas sem importância que só existem para atrapalhar grandes reflexões intelectuais, e perturbar nossa paz cotidiana.
Amanhã temos muita coisa para fazer, aliás até segunda-feira, quando pensamos iniciar o roteiro de volta, mas passando em Corning, NY, onde está o maior museu do vidro do mundo, sem brincadeira. Já tínhamos visitado no ano passado, mas esse vale uma nova visita.

Paulo Roberto de Almeida
Toronto, 21 de setembro de 2014

sábado, 20 de setembro de 2014

Across the Empire, 2014 (22): Detroit, entre a tecnologia e a arte


Across the Empire, 2014 (22): Detroit, entre a tecnologia e a arte

Paulo Roberto de Almeida

Sexta-feira 19/09: com a Escócia salva – mas tem gente que não concorda – o dia foi dedicado às duas realizações mais características e mais caras do ser humano: a tecnologia e a arte (que de certa forma se confundem, pois uma se inspira na outra, para o maior bem da humanidade).
Pela manhã, bem cedo, fui a Dearborn, visitar o Henry Ford Museum, um enorme complexo contendo não apenas as maiores invenções tecnológicas desde a revolução industrial, mas também cenas da vida americana desde a colônia até os dia de hoje. Existe uma certa linearidade cronológica nos diversos blocos de um imenso salão de exposições, dividido em várias alas, mas o mais importante é a coleção impressionante de máquinas e mecanismos de transporte e de produção, de todos os tipos, que Henry Ford acumulou ao longo de sua vida, a começar pela agricultura, atividade à qual ele sempre deu especial atenção. O complexo integra ainda um “Greenfield Village”, com montagens reais da vida camponesa, mas que preferi não visitar, tanto por falta de tempo, como porque se tratava de algo mais didático, dedicado a crianças e jovens. Concentrei-me nas realizações tecnológicas, inclusive no famoso modelo T, o carro que revolucionou o mundo da produção, e não apenas automobilística, criando o que ficou conhecido como a linha de montagem (que na verdade é uma derivação prática da teoria econômica de Adam Smith, sobre s divisão social do trabalho). Entre 1908 e 1928, esse modelo básico, podendo ser montado por qualquer trabalhador sumariamente instruído, mas que era submetido a uma assemblagem precisa, concebida por engenheiros, foi o exemplo da moderna organização do trabalho: ao reduzir o preço de um automóvel em mais de 60% da média do mercado do seu tempo, o Ford T é uma brilhante demonstração de como o capitalismo inteligente pode transformar, por meio de uma tecnologia engenhosa um produto de luxo em mercadoria de consumo de massa.

Existem dezenas de modelos de praticamente todos os tipos de automóveis, inclusive europeus e alguns japoneses, mas predominantemente americanos, como seria de se esperar; senti falta do meu primeiro carro, que usei na Europa, enquanto morava na Bélgica: um Citroen Deux Chevaux – ou seja, dois cavalos de (im)potência – que me levou a vários pontos do continente, mas sempre em velocidade reduzida: quando tentei ultrapassar os 120km/h, o motor fundiu, e demorou certo tempo para juntar dinheiro para trocar o motor... Gostei também de um dos primeiros modelos de ônibus escolares, mais uma demonstração de que o transporte de estudantes sempre foi um componente essencial do processo educacional neste país.

No meio de toda aquela tecnologia, algumas lições de história, inclusive constitucional, libertação dos escravos, direitos da mulher, etc. Os visitantes aprendem que o texto constitucional desenhado em Filadélfia – mas com raízes anteriores – é o mais velho documento desse gênero no mundo; logo após, foram definidos os primeiros atos adicionais, chamados de Bill of Rights, que são especificamente dedicados a salvaguardar os direitos e as liberdades dos cidadãos americanos CONTRA o governo. A base de tudo isso é a autonomia do indivíduo, a liberdade, e a independência da nação, como explicava Thomas Paine (aliás presente num vídeo bastante esclarecedor sobre a revolução contra o reio Jorge), em seu famoso panfleto, Common Sense, mostrado numa primeira edição ali preservada.

Um outro painel explicava exatamente contra quais exações britânicas os americanos se revoltaram, nos famosos episódios que foram aumentando as reclamações dos colonos no sentido de se sentirem “taxados sem representação”.


Passamos, depois, toda a tarde no Detroit Institute of Arts, uma instituição modelo no gênero, e altamente visitável: mas, como a fome apertava, Carmen Lícia eu visitamos primeiro o restaurante do museu: eu comecei pela soupe du jour, um seafood and corn chowder, e depois dividimos um plateau de fromages, como pode ser visto nesta foto que Carmen Lícia fez, que fizemos acompanhar de duas taças de Cabernet Sauvignon e eu uma pequena garrafa de Perrier, terminando por um expresso double.


Depois do estômago, a arte, duplamente, pois que, no meio da visita, em plena sala dedicada aos murais de Diego Rivera, pudemos assistir ao ensaio da banda que tocaria logo mais no começo da noite, do qual fiz um pequeno filme; creio que não conseguirei exibir aqui, pois são muitos MB, mais exatamente 134, e a conexão do hotel é muito ruim; vou tentar colocar no iCloud, para dar apenas o link, e registro uma foto aqui do evento; destaques, para o nome da chinesa, que se chama Grace Kelly (mais alguma coisa chinesa) e para as horríveis bermudas vermelhas do trompetista, aliás, um desses calções de jogadores de basquete. Não sei se ele pretendia se apresentar desse jeito, em todo caso, não esperamos para ver.

Continuamos visitando o museu, com algumas peças conhecidas de livros de arte, e outras dentro do padrão esperado para instituições desse calibre: os inevitáveis impressionistas franceses, alguns grandes nomes da pintura europeia (Brugel, Cranach, Van Gogh), mas também uma coleção altamente significativa de arte americana, asiática, africana, e o que mais sempre tem nos museus peso-pesados.



Compramos alguns objetos na loja do museu – entre eles um novo colar para Carmen Lícis e um CD de jazz para mim – e depois ainda fomos passear pela cidade, para ver mosaicos e pinturas em estações de bonde elevado, que aqui eles chamam de people mover
Amanhã, vamos atravessar esta ponte, apropriadamente chamada Ambassador, em direção a Windsor, por onde entramos no Canadá, em direção a Toronto. Ainda temos algum caminho pela frente, e possivelmente mais dois ou três museus, além de uma bela cidade canadense.

Paulo Roberto de Almeida
Detroit, 19 de setembro de 2014

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Across the Empire, 2014 (21): Detroit, a Paris (falida) do MidWest?


Across the Empire, 2014 (21): Detroit, a Paris (falida) do MidWest?

Paulo Roberto de Almeida

Prosseguindo nosso (longo) caminho de volta, hoje, 18 de setembro, dia do referendo escocês (ouvi pela rádio que o “não estava ganhando por 53%, mas que só na manhã de sexta 19 teríamos os primeiros números oficiais, pois a contagem é manual), Carmen Lícia e eu saímos de Manistique no final da manhã, não sem antes algumas últimas fotos de despedida desse ponto mais extremo na extremidade norte do lago Michigan: um farol e alguns alces muito bem vestidos em frente a restaurantes e hotéis da cidade. Eu, por exemplo, fiz uma foto deste Alce fêmea, ou Madame Alça, em frente do nosso hotel, mas havia outros, alguns bastante engraçados, como um senhor Alce de smoking (tuxedo).

Empreendemos então o largo trajeto em direção ao sul, começando por atravessar a ponte sob a qual se faz a junção do lago Michigan com o lago Huron, e depois descemos pela I-75 até Detroit, na extremidade oriental de Michigan, às portas do Ontário canadense, junto à cidade de Windsor.
Vocês acreditam mesmo que os responsáveis locais pela propaganda da cidade ainda têm a petulância de chamar esta cidade de “Paris do MidWest”? Ou que ela seria a “Meca da gastronomia” da região? Vejam, a propósito, esta foto da capa da revista de turismo local.
Eles deliram, ou acreditam mesmo? Esta cidade está simplesmente falida, e sua dívidas chegam a mais ou menos 18 bilhões de dólares aos seus credores, que são tanto os fornecedores de bens e serviços para a prefeitura, quanto os pensionistas do setor público e de suas agências subordinadas e os muitos provedores dos serviços urbanos e de infraestrutura coletiva. Quando lemos, alguns meses atrás, sobre a bancarrota anunciada da cidade, quando ela foi colocada sob intervenção judicial e entregue a um gestor da massa falida – como tal, encarregado de negociar os débitos, déficits e passivos da cidade – as matérias todas falavam dos edifícios vazios, das casas abandonadas, do lixo acumulado nas ruas e de outras misérias, inclusive com fotos espetaculares; a impressão que se tinha era que isto aqui seria uma Síria do MidWest, ou quase uma cidade fantasma.
Falava-se inclusive na venda em leilão dos quadros mais famosos do Detroit Institute of Arts – como sempre, impressionistas franceses – cuja valor estimado representaria algumas centenas de milhões, um pingo de compensação em face das quase duas dezenas de bilhões de dólares da inadimplência oficial (isto apenas o registro do balanço, mas potencialmente muito mais, como resultado dos negócios fechados). A ex-cidade do automóvel faria figura de destaque nos melhores filmes-catástrofe sobre as distopias da modernidade.
Tanto era assim que, ao viajar a Chicago em maio último, para um congresso da LASA, fizemos questão de voltar por aqui, para verificar o estado “sírio” da cidade, e visitar o museu de arte antes que fechasse. Como sempre, os jornalistas pintam um quadro mais negro do que o verdadeiro, e escolhem as piores fotos para ilustrar o caos urbano. Não vimos nenhuma cena “síria”: muitos prédios com tapume, certo, e algumas casas abandonadas, mas uma cidade normal, inclusive com novas obras públicas e reformas privadas sendo empreendidas, talvez já como resultado na queda nos preços dos imóveis e boas oportunidades de ganhos futuros.
Desta vez viemos para conhecer melhor a cidade, e nos hospedamos por dois dias no Atheneum Suite Hotel, bem no centro da cidade, e ao lado de um cassino grego (por uma vez não é de índio capitalista). O Hotel tem no seu lobby um imenso painel de Lacoonte, imitando grosseiramente uma famosa estátua de Fídias, que vimos em Roma, se bem me lembro, e creio que no museu do Vaticano. Faz parte do kitsch americano. Os gregos, e os African-Americans, dominam no bairro, mas o ambiente está longe de ser distópico.
Programa local? Tem vários, mas o essencial se refere ao já citado Institute of Arts, que pode eventualmente ser usado como colateral na renegociação das dívidas, e o complexo Henry Ford, em Dearborn, algo como 15 milhas a leste, no caminho de Chicago, precisamente. É o que pretendemos fazer nesta sexta-feira.
Depois, é o Canadá, como já anunciado, para visitar o novo museu Aga Khan em Toronto.

         Paulo Roberto de Almeida
Detroit, 18 de setembro de 2014

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Across the Empire, 2014 (20): balanço quantitativo de 20 dias de viagem


Across the Empire, 2014 (20): balanço quantitativo de 20 dias de viagem

Paulo Roberto de Almeida

Sem pretender agora fazer um resumo muito extenso, ou detalhado, pois estou com a fatiga natural do dia e ainda trabalho por fazer no computador, pelo menos uma parte da noite, vou resumir agora as grandes etapas da viagem, deixando em seguida o registro das etapas, com seus respectivos links, para quem desejar ter uma pequena descrição de cada uma delas, acompanhada a cada vez de algumas fotos e ilustrações.
Demos a partida no dia 29 de agosto, uma sexta-feira, mas só no final do expediente de trabalho; ainda assim viajamos até quase o coração da Pensilvânia. Depois foram mais dois dias de aborrecidas estradas no milharal, sem esquecer Des Moines e North Platte, a caminho de Denver, onde ficamos três dias (visitando bem a cidade e Boulder, cidade universitária ao lado). Depois subimos até o caminho do Oregon, e em terras do Buffalo Bill (que está um pouco em todas as partes por ali).
Visitamos Yellowstone, com seus geysers e búfalos, mas não somos fascinados por essas coisas de natureza: gostamos mais de cultura, e de cidades. As etapas seguintes foram na costa do Pacífico: Portland, no Oregon, Tacoma e Seattle, no estado de Washington, e finalmente Vancouver, o ponto mais extremo ao ocidente, a que chegamos, onde também estivemos três ricos dias, com incursões pela cidade e arredores. Depois começamos a voltar, e aí tivemos montanhas e florestas. Great Falls, no Montana, Little Big Horn, no mesmo estado, e Mount Rushmore, no extremo oeste de South Dakota. Finalmente, atravessamos esse estado larguíssimo, e o Minnesota, para vir até Wisconsin, onde estivemos ontem, visitando um pequeno museu do vidro que estava em minha lista de pequenos museus desde mais de um ano. Estamos a cavalo, se ouso dizer, do lago Michigan, e vamos passar para o lado do lago Huron, para depois descer até Detroit, quase no lago Saint Clair. De lá atravessaremos novamente para o Canadá, um país tão simpático que ele poderia se mudar para o Brasil, com armas e bagagens, como se diz, mas preferimos que seja com simpatia e tecnologia, e também diversidade cultural e humana, além das paisagens belíssimas (mas sem neve).
Como o balanço é apenas quantitativo, preciso colocar aqui as quantidades. Pois bem, da costa atlântica até o Pacífico (Vancouver), fizemos 4.160 milhas (ou 6.656km), quando o planejamento inicial era de apenas 3.860 milhas (ou 6.176km). De Vancouver até a presente etapa, em Manistique, no extremo norte do Lago Michigan, acumulamos mais 2.465 milhas (ou 3.994km). Ou seja, no total, fizemos 6.625 milhas, ou 10.600km, quando pelo planejamento inicial (que foi modificado em várias etapas), estaríamos fazendo, aproximadamente até aqui (ou seja, no 20o. dia de viagem) “apenas” 5.128 milhas, ou 8.205km. Isto quer dizer que acumulamos um “surplus” de 1.500 milhas, pelos dias viajados, mas aproximadamente o mesmo volume de milhas percorridas nas distâncias programadas (que deveria ser em torno do Milwaulkee, no Wisconsin, de onde tínhamos cogitado tomar um ferry para atravessar o lago Michigan, mas acabamos desistindo por impossibilidade de horário).
Coloco, finalmente, como ilustração, os dois mapas das principais etapas que já fizemos, e um terceiro que talvez ainda venhamos a cumprir como está traçado, mas nunca poderemos excluir alguma esticada para outras paragens, também, no Canadá ou nos Estados Unidos. Afinal de contas, temos até o dia 28 para voltar para casa, ou seja, mais dez dias de férias...



Fico por aqui, e quem desejar pode ir clicando nas etapas abaixo para se divertir um pouco...

         Paulo Roberto de Almeida
Manistique, 18 de setembro de 2014


=============

Lista das postagens:

0) Crossing the Empire (0): segunda viagem através dos EUA: 12,6 mil km em 30 dias: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/08/crossing-empire-segunda-viagem-atraves.html

1) Across the Empire (1) First day: boring roads, sempre mais do que o planejado...: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/08/across-empire-1-first-day-boring-roads.html

2) Across the Empire (2) Second day: only the road, no more than the road...: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/08/across-empire-2-second-day-only-road-no.html

3) Across the Empire (3): Des Moines, Omaha e o caminho dos pioneiros...: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-3-des-moines-omaha-e-o.html

4) Across the Empire (4): de North Platte, Nebraska, a Denver, Colorado: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-4-de-north-platte.html

5) Across the Empire (5): em Denver, num jardim botânico de vidro (Chihuly): http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-5-em-denver-num-jardim.html).


7) Across the Empire (7): de Denver a Cody, leituras no velho Oeste: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-7-leituras-no-velho-oeste.html

8) Across the Empire (8): tinha um Yellowstone no caminho: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-8-tinha-um-yellowstone-no.html

9) Across the Empire (9): de Twin Falls a Portland, pelo Oregon Trail: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-9-de-twin-falls-portland.html

10) Across the Empire (10): em Portland, buscando cultura: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-10-em-portland-buscando.html

11) Across the Empire (11): de Portland, OR, a Tacoma, WA: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-11-de-portland-or-tacoma.html

12) Across the Empire (12): de novo com Chihuly, desta vez em Seattle: http://diplomatizzando.blogspot.ca/2014/09/across-empire-12-de-novo-com-chihuly.html

13) Across the Empire (13): em Vancouver, fazendo o balanço da metade do caminho: http://diplomatizzando.blogspot.ca/2014/09/across-empire-2014-13-em-vancouver.html

14) Across the Empire, 2014 (14): Flanando em Vancouver: http://diplomatizzando.blogspot.ca/2014/09/across-empire-2014-14-flanando-em.html 

15) Across the Empire, 2014 (15): Adieu, Vancouver (mas prometemos voltar): http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-15-adieu-vancouver-mas.html

16) Across the Empire, 2014 (16): De Vancouver a Missoula, Montana: dois países, três estados, quase 1000km: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-16-de-vancouver-missoula.html

17) Across the Empire, 2014 (17): De Missoula, Montana, ao Mount Rushmore, South Dakota, via Little Big Horn: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-2014-17-de-missoula-mt-ao.html

18) Across the Empire, 2014 (18): De South Dakota a Minnesota, terras de cowboys, gado e milharais: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-18-de-south-dakota.html

19) Across the Empire, 2014 (19): Wisconsin e Michigan, dos vidros ao lago: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/09/across-empire-2014-19-wisconsin-e.html