Across the Empire, 2014 (22): Detroit, entre a
tecnologia e a arte
Paulo Roberto de Almeida
Sexta-feira 19/09: com a Escócia salva – mas tem gente que não concorda
– o dia foi dedicado às duas realizações mais características e mais caras do
ser humano: a tecnologia e a arte (que de certa forma se confundem, pois uma se
inspira na outra, para o maior bem da humanidade).
Pela manhã, bem cedo, fui a Dearborn, visitar o Henry Ford Museum, um
enorme complexo contendo não apenas as maiores invenções tecnológicas desde a
revolução industrial, mas também cenas da vida americana desde a colônia até os
dia de hoje. Existe uma certa linearidade cronológica nos diversos blocos de um
imenso salão de exposições, dividido em várias alas, mas o mais importante é a
coleção impressionante de máquinas e mecanismos de transporte e de produção, de
todos os tipos, que Henry Ford acumulou ao longo de sua vida, a começar pela
agricultura, atividade à qual ele sempre deu especial atenção. O complexo
integra ainda um “Greenfield Village”, com montagens reais da vida camponesa,
mas que preferi não visitar, tanto por falta de tempo, como porque se tratava
de algo mais didático, dedicado a crianças e jovens. Concentrei-me nas
realizações tecnológicas, inclusive no famoso modelo T, o carro que revolucionou
o mundo da produção, e não apenas automobilística, criando o que ficou
conhecido como a linha de montagem (que na verdade é uma derivação prática da
teoria econômica de Adam Smith, sobre s divisão social do trabalho). Entre 1908
e 1928, esse modelo básico, podendo ser montado por qualquer trabalhador
sumariamente instruído, mas que era submetido a uma assemblagem precisa,
concebida por engenheiros, foi o exemplo da moderna organização do trabalho: ao
reduzir o preço de um automóvel em mais de 60% da média do mercado do seu
tempo, o Ford T é uma brilhante demonstração de como o capitalismo inteligente
pode transformar, por meio de uma tecnologia engenhosa um produto de luxo em
mercadoria de consumo de massa.
Existem dezenas de modelos de praticamente todos os tipos de automóveis,
inclusive europeus e alguns japoneses, mas predominantemente americanos, como
seria de se esperar; senti falta do meu primeiro carro, que usei na Europa,
enquanto morava na Bélgica: um Citroen Deux Chevaux – ou seja, dois cavalos de
(im)potência – que me levou a vários pontos do continente, mas sempre em
velocidade reduzida: quando tentei ultrapassar os 120km/h, o motor fundiu, e
demorou certo tempo para juntar dinheiro para trocar o motor... Gostei também de
um dos primeiros modelos de ônibus escolares, mais uma demonstração de que o
transporte de estudantes sempre foi um componente essencial do processo
educacional neste país.
No meio de toda aquela tecnologia, algumas lições de história, inclusive
constitucional, libertação dos escravos, direitos da mulher, etc. Os visitantes
aprendem que o texto constitucional desenhado em Filadélfia – mas com raízes
anteriores – é o mais velho documento desse gênero no mundo; logo após, foram
definidos os primeiros atos adicionais, chamados de Bill of Rights, que são
especificamente dedicados a salvaguardar os direitos e as liberdades dos
cidadãos americanos CONTRA o governo. A base de tudo isso é a autonomia do indivíduo,
a liberdade, e a independência da nação, como explicava Thomas Paine (aliás
presente num vídeo bastante esclarecedor sobre a revolução contra o reio
Jorge), em seu famoso panfleto, Common
Sense, mostrado numa primeira edição ali preservada.
Um outro painel explicava exatamente contra quais exações britânicas os
americanos se revoltaram, nos famosos episódios que foram aumentando as
reclamações dos colonos no sentido de se sentirem “taxados sem representação”.
Passamos, depois, toda a tarde no Detroit Institute of Arts, uma
instituição modelo no gênero, e altamente visitável: mas, como a fome apertava,
Carmen Lícia eu visitamos primeiro o restaurante do museu: eu comecei pela
soupe du jour, um seafood and corn chowder, e depois dividimos um plateau de
fromages, como pode ser visto nesta foto que Carmen Lícia fez, que fizemos
acompanhar de duas taças de Cabernet Sauvignon e eu uma pequena garrafa de
Perrier, terminando por um expresso double.
Depois do estômago, a arte, duplamente, pois que, no meio da visita, em
plena sala dedicada aos murais de Diego Rivera, pudemos assistir ao ensaio da
banda que tocaria logo mais no começo da noite, do qual fiz um pequeno filme; creio que não conseguirei exibir aqui, pois são muitos MB, mais exatamente 134, e a conexão do hotel é muito ruim; vou tentar colocar no iCloud, para dar apenas o link, e registro uma foto aqui do evento;
destaques, para o nome da chinesa, que se chama Grace Kelly (mais alguma coisa
chinesa) e para as horríveis bermudas vermelhas do trompetista, aliás, um
desses calções de jogadores de basquete. Não sei se ele pretendia se apresentar
desse jeito, em todo caso, não esperamos para ver.
Continuamos visitando o museu, com algumas peças conhecidas de livros de
arte, e outras dentro do padrão esperado para instituições desse calibre: os
inevitáveis impressionistas franceses, alguns grandes nomes da pintura
europeia (Brugel, Cranach, Van Gogh), mas também uma coleção altamente significativa de arte americana, asiática,
africana, e o que mais sempre tem nos museus peso-pesados.
Compramos alguns objetos na loja do museu – entre eles um novo colar
para Carmen Lícis e um CD de jazz para mim – e depois ainda fomos passear pela
cidade, para ver mosaicos e pinturas em estações de bonde elevado, que aqui
eles chamam de people mover.
Amanhã, vamos atravessar esta ponte, apropriadamente chamada Ambassador,
em direção a Windsor, por onde entramos no Canadá, em direção a Toronto. Ainda
temos algum caminho pela frente, e possivelmente mais dois ou três museus, além
de uma bela cidade canadense.
Paulo Roberto de Almeida
Detroit, 19 de setembro de 2014
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