Conceitos “carcereiros” na teoria social (e política) do Brasil
Paulo Roberto de Almeida
Durante toda a sua história, o Brasil não conseguiu escapar de certas “prisões mentais” que dificultaram seu desenvolvimento inclusivo e homogêneo. Durante mais de três séculos, talvez quatro, não conseguimos escapar do escravismo efetivo, que significou o tráfico africano e o escravismo negro (que rapidamente superou o indígena, por ser mais produtivo e “expendável”); ele foi substituído pelo escravismo mental, que perdura até hoje.
Depois veio, a grande ideologia da industrialização nacionalista que contaminou todas as políticas públicas desde o final do século XIX até hoje, compreensível pela importância das revoluções industriais que transformaram o mundo, a partir do núcleo europeu ocidental, até hoje.
Nunca fizemos uma revolução educacional, isto é, ensino básico de qualidade para todos, até hoje.
Mais recentemente, alguns novos “conceitos carcereiros” vêm aprisionando nossas políticas públicas, inclusive no terreno diplomático (que é o meu universo de trabalho acadêmico e profissional), e que insistem em moldar a agenda da teoria social, inclusive no setor governamental: deixo de lado o ridiculo molde “decolonial” que, na área acadêmica, veio tomar o lugar da teoria da dependência, outra grande ilusão metofológica.
Na área diplomática, o BRICS e o tal de Sul Global (antes apenas Sul-Su) são os dois novos queridinhos de acadêmicos e dirigentes da nossa diplomacia, aprisionando qualquer nova reflexão sobre uma agenda própria de desenvolvimento econômico e social.
Por que o Brasil precisaria das muletas mentais (e práticas) do BRICS e do tal do Sul Global para poder se desenvolver de maneira uniforme e independente? O Mercosul anda em baixa atualmente, sendo que foi, durante três décadas, o principal projeto estratégico da diplomacia brasileira.
As elites econômicas e políticas ainda não perceberam que ambos conceitos nos prendem a modelos e caminhos de atuação interna e externa que limitam e constrangem nossa atuação independente num mundo dominado por impérios — o que nunca fomos, nem seremos, no futuro previsível — e povoado por Estados nacionais, que possuem independência relativa?
Continuamos sem revolução educacional, mas sempre aderindo a modismos que nos aprisionam mentalmente, e que contaminam o discurso público, inclusive o diplomático.
Certas coisas demoram para passar: talvez o Brasil ainda não tenha crescido o suficiente. Como crianças pequenas, imitamos o que vem de fora e certas modas criadas por intelectuais. BRICS e Sul Global são apenas os exemplos mais recentes dessas prisões mentais, que têm incidência direta nas políticas públicas, inclusive as diplomáticas.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 18/11/2025