O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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sábado, 6 de abril de 2024

O Sul Global é uma impostura ideológica - Gilles Kepel (Figaro)

 Como eu dizia:

Gilles Kepel: «Le “Sud global” est une grande imposture idéologique et une aberration géopolitique» https://www.lefigaro.fr/vox/monde/gilles-kepel-le-sud-global-est-une-grande-imposture-ideologique-et-une-aberration-geopolitique-20240405 - 

Mais en attendant ce soi-disant sud global est une arnaque et une énorme bêtise de la taille de lui-même …

Les gens se laissent berner facilement.

Gilles Kepel: «Le “Sud global” est une grande imposture idéologique et une aberration géopolitique»

Le Figaro, 3/04/2024

GRAND ENTRETIEN - Dans son nouveau livre, Holocaustes (Plon), le professeur des universités décrit la nouvelle donne géopolitique qui a émergé après le 7 octobre et le déclenchement de la guerre à Gaza. Il pointe les impasses d’un «Sud global» dont les défenseurs ne partagent rien d’autre que la haine de l’Occident.

LE FIGARO. - Le titre de votre livre, Holocaustes , peut donner l’impression que vous renvoyez dos à dos lespogromistes du 7 octobre et la guerre menée par Tsahal à Gaza. Peut-on utiliser le même terme pour les deux événements.

GILLES KEPEL. - L’objectif n’est pas d’établir une équivalence entre l’hécatombe à Gaza et la razzia pogromiste du Hamas, mais de montrer que, avec le 7 octobre et ses suites, on assiste à une tentative de refonder totalement l’ordre moral du monde. Après l’extermination des Juifs par les nazis, il y a eu un consensus entre le bloc soviétique et les Occidentaux - le procès de Nuremberg en 1947 en ayant été l’expression la plus significative. Or aujourd’hui, dans un grand nombre de pays du « Sud global » et même dans certains milieux européens et parmi la jeunesse universitaire, on constate l’effacement de la mémoire du 7 octobre du fait de l’hécatombe consécutive à Gaza.

(...)

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Ficções acadêmicas, realidades geopolíticas: o tal de Sul Global - Paulo Roberto de Almeida

Ficções acadêmicas, realidades geopolíticas

Paulo Roberto de Almeida

Se você quiser falar com a UE sabe para onde e para quem ligar. O mesmo ocorre para o caso de querer falar com a Rússia, com os EUA, com a China. 

Mas se quiser falar com o tal de Sul Global telefona para quem? Para o Lula, para o Modi, para o Zuma, algum líder de um bloco diversificado e indefinível?

O Sul Global simplesmente não existe; é uma invenção acadêmica, construída a partir daquele mesmo conjunto heteróclito de países, muito diferentes entre si, antigamente chamados de subdesenvolvidos, depois de países em desenvolvimento, alguns poucos emergentes, outros em franco retrocesso econômico e político. 

Os jornalistas caíram na trampa dessa ficção acadêmica, políticos demagogos os seguiram e repetem um conceito que eles não sabem sequer definir!

Repito: o Sul Global não existe como entidade política internacional, mas tem gente que gosta de encher a boca com… vento!

Brasília, 26/02/2024

segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

III Cúpula do G77/China - Kampala, 21-22/01/2024

 Íntegra da Nota à imprensa nº 26 disponível no link a seguir: III Cúpula do G77/China - Kampala, 21-22/01/2024


 
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O Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Mauro Vieira, participará da III Cúpula do Sul do Grupo dos 77 + China (G77/China), a ser realizada em Kampala, nos dias 21 e 22 de janeiro.

​O G77/China congrega 135 países em desenvolvimento que se coordenam para promover seus interesses coletivos e aumentar sua capacidade de negociação por meio da atuação conjunta nos principais foros do sistema das Nações Unidas, além de promover a cooperação Sul-Sul para o desenvolvimento. O agrupamento tem grande importância para a articulação dos interesses de seus membros, nas negociações internacionais, em particular em temas econômicos e de desenvolvimento sustentável.

A participação brasileira em alto nível na III Cúpula do Sul reflete a centralidade atribuída pelo Brasil ao multilateralismo e à cooperação entre os países em desenvolvimento.

A visita do Ministro Mauro Vieira a Kampala é também oportunidade para dar continuidade à agenda africana da política externa e à preparação da ida do Presidente Lula à Etiópia, em fevereiro próximo. O Presidente participará, como convidado especial, da reunião de cúpula anual da União Africana, e realizará visita bilateral àquele país.


quarta-feira, 25 de outubro de 2023

E como anda o tal de Sul Global, muito falado, pouco visto? - Paulo Roberto de Almeida

 O tal de "Sul Global", uma invenção de acadêmicos muito apreciada por populistas de vários quadrantes do planeta, é sempre muito cortejado, mas não se sabe muito bem de quem se está falando, ou quais os seus contornos exatos, ou pelo menos suas instruções coletivas.

Já tratei desse fantasma conveniente em um artigo de abril deste ano, mas vou voltar ao assunto novamente nesta próxima sexta-feira. Eis aqui o que escrevi anteriormente, antecipando sobre o novo artigo.

Paulo Roberto de Almeida


Se eu quiser falar com o tal de Sul Global, telefono para quem?

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)

Artigo para a revista Crusoé

  

Como encontrar interlocutores válidos, na pletora de Estados e blocos regionais?

Meio século atrás, quando Mister K – Henry Kissinger, o grande nome da diplomacia americana e mundial – pontificava em diferentes cenários problemáticos – Vietnã, China, Oriente Médio, Chile, por bons e maus motivos –, e quando a Europa enfrentava uma longa fase de “euroesclerose” – aproximadamente desde a quebra do sistema de Bretton Woods, em 1971, e o projeto do “mercado unificado” em 1986 –, havia uma preocupação entre as grandes potências ocidentais (já organizadas no G7), sobre como efetuar a coordenação entre elas para assuntos não exclusivamente econômicos, geralmente tratando de guerras ou ameaças de conflitos envolvendo uma ou outra das grandes potências. Tendo de exercer o que foi chamado de “shuttle diplomacy”, ou seja, de viagens rápidas, conectando duas ou mais capitais, para extinguir alguma fogueira preocupante, Kissinger não sabia como mobilizar os principais líderes europeus para associá-los a uma ou outra de suas missões “pacificadoras” (ou guerreiras, segundo os casos). Indagado por que empreendia sozinho todas aquelas missões desafiadoras para qualquer diplomata experiente, ele costumava dizer: “Se eu quiser falar com a Europa, eu telefono para quem?”

De fato, a Europa ocidental – tanto a então Comunidade Europeia, quanto outros países membros da Otan – não possuía um representante definido para negociações diplomáticas complexas, pois as instâncias comunitárias ainda não tinham evoluído no plano institucional para designar os equivalentes dos “presidentes”, “porta-vozes” ou “chanceleres” dos Estados nacionais. Ela fez progressos, desde então, e já consegue falar de uma voz única (ou quase), como no caso da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia. Hoje, o Secretário de Estado, ou qualquer outro chanceler “externo”, sabe a quem telefonar quando quiser falar com a Europa, ou com qualquer outra potência ou Estado membro da ONU.

 

Saindo dos campos verdejantes do “centro” para as selvas e desertos da “periferia”

Essa mesma preocupação da velha raposa metternichiana que era o Kissinger dos anos 1970, se manifesta atualmente quando alguém (geralmente um acadêmico, ou político) fala desse tal de “Sul Global”. Essa entidade diáfana e praticamente fantasmagórica existe, apenas que não tem personalidade ou representante definidos. O chamado Sul Global, no entanto, não é novo, aliás, é eterno, existindo em todas as épocas, geralmente no hemisfério sul, como fica geograficamente evidente pela própria designação. Essa configuração bonita e pretensiosa – quando se fala de um “Sul Global” dá a impressão de algo grandioso e muito relevante – já existiu sob a forma de colônias europeias, depois de “países subdesenvolvidos” ou, numa reencarnação mais simpática, “em desenvolvimento”, alguns deles ascendendo como “economias emergentes” (os tigres asiáticos, por exemplo), ou, os mais infelizes, sendo rebaixados à categoria de “menos desenvolvidos” (isto é, os “super pobres”), com muito poucas variações no que se refere à divisão entre todos eles e os “países desenvolvidos”, antigas metrópoles coloniais ou “potências hegemônicas”, isto é, imperialistas, por definição.

Nada disso é novo na história da humanidade, pois a divisão entre centro e periferia é básica na evolução histórica das sociedades mais ou menos organizadas sob a forma de Estados soberanos e as comunidades humanas sujeitas a um tipo qualquer de dominação. Quando o sistema internacional de cooperação entre Estados soberanos se consolidou no pós-Segunda Guerra, a ONU mantinha uma divisão quadripartite: os países desenvolvidos, os em desenvolvimento, os socialistas e a China, sempre um “grupo à parte”. A segunda categoria, sempre reclamando algum tratamento de favor – ou preferencial e mais favorável, no linguajar do Gatt e de outros organismos da ONU, se mobilizou nos anos 1950 e 60 para a reforma do tratamento igualitário concedido a todos eles em Bretton Woods: em 1944, não se fazia nenhuma distinção entre todos eles (e de socialista só havia a União Soviética, que participou da conferência que criou o FMI e o Banco Mundial, mas não aderiu a essas entidades do “capitalismo). 

As demandas para a reforma do Gatt e do sistema de cooperação ao desenvolvimento focavam na recusa do tratamento igualitário e da reciprocidade estrita, em favor de um tratamento diferencial para os “subdesenvolvidos” ou “em desenvolvimento”, que passaram a ser agrupados no Grupo dos 77, com a criação da Unctad (a conferência das Nações Unidas para comércio e desenvolvimento). Minhas passagens por diversas entidades multilaterais foram marcadas por intensas discussões no interior do G77 (e dentro dele, o Grulac, o subgrupo latino-americano) e “contra” o Grupo B, dos “desenvolvidos” (e dentro dele os europeus da antiga CEE, que demoravam horas para se concertarem entre si, e depois buscarem uma postura unificada com o resto dos “ricos”). As discussões entre os países pobres e emergentes não eram menos acaloradas e demoradas, mas como era preciso contemplar os “interesses nacionais” de todos os membros do G77 (que ascendeu a mais de 120 integrantes), a postura negociadora adotada era, ordinariamente, a mais radical possível, ou a mais confusa, o que frequentemente também ocorria entre americanos, europeus e japoneses. Não foram poucas noites atravessadas em discussões intermináveis em torno de um conceito ou de colchetes ([conceito]) que inundavam alguma resolução, texto de tratado ou declaração (na maior parte das vezes inúteis, pois que poucos cumpriam depois). Certos drafts (rascunhos) de resoluções continham mais brackets (colchetes) do que ideias interessantes. Mas assim era, e é, o mundo da ONU.

Pois bem, o Sul Global é exatamente isso: uma massa de 130 ou 140 países em desenvolvimento – os socialistas desapareceram pelo caminho, e a China permaneceu sendo a China, o “grupo do eu sozinho” –, que pediam “tratamento diferencial e mais favorável”, depois uma “Nova Ordem Econômica Internacional” (NOEI), mais adiante novas preferências comerciais e acordos favoráveis às “políticas nacionais de desenvolvimento” (a palavra chave em todos os convescotes multilaterais), mais “transferência de tecnologia” (de graça, claro), um maior volume de “empréstimos concessionais” e o reforço da “cooperação ao desenvolvimento”. Alguns países (poucos) pularam a barreira do subdesenvolvimento, ascendendo do G77 para os desenvolvidos (os tigres asiáticos), vários ex-socialistas ingressaram na UE e na OCDE, outros, talvez mais numerosos, com as crises financeiras, retrocederam para o grupo dos “super pobres” (ou LDCs, na sigla em inglês). 

O Sul Global permanece o mesmo, e até tem gente pedindo uma nova NOEI, quando não uma “nova ordem global” tout court. Pois bem, retomo a pergunta do título: se eu quiser falar com o tal de Sul Global, eu telefono para quem? Mister K teria alguma ideia?

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4375: 27 abril 2023, 3 p.

 

sexta-feira, 6 de outubro de 2023

A arte de se ocupar das pequenas coisas - Paulo Roberto de Almeida

 L’être et le néant 

(mas não tem nada a ver com Jean-Paul Sartre, e sim com Raymond Aron):

O tal de Sul Global aparece como o objeto mais diáfano de estudos e discussões acadêmicas desde a famosa controvérsia sobre o sexo dos anjos em plena Idade Média. 

Se construiu uma suposta identidade de interesses num ajuntamento heteróclito de estados e nações como se fossem personagens reais, a partir de suposições jamais empiricamente confirmadas!

Os anjos de antigamente também juntavam cérebros respeitáveis em torno de absolutamente nada, sobre seres aparentemente similares. Só faltava definir o sexo: se fossem do sexo feminino talvez não tivessem almas. 

Mas tem gente que fala pomposamente desse Sul Global como se fosse uma manada a ser graciosamente tangida em direção de uma fabulosa “nova ordem global”, um generoso cenário de relações “não assimétricas”. 

Não é o Ser e o Nada?

Paulo Roberto de Almeida

Brasília , 6/10/2023

quarta-feira, 28 de junho de 2023

Definições simples: a de uma tirania, por exemplo - Paulo Roberto de Almeida

Definições simples: a de uma tirania, por exemplo

A diferença entre um governo normal e uma tirania é quando o chefe de governo ignora completamente os órgãos de Estado para mandar e desmandar a seu bel prazer, ou quando decide, por exemplo, massacrar o seu próprio povo, ou outros povos, sem nenhum objetivo concreto, a não ser por puro terror e desejo de vingança pessoal.
Putin é exatamente isso e só isso.
Lula ainda não percebeu?
O que mais seria preciso ocorrer, nessas categorias indignas de qualquer postura civilizada, para que ele e o seu assessor para assuntos internacionais se convençam de que eles estão justamente apoiando um criminoso de guerra, um violador do Direito Internacional, um monstro depravado e sedento de sangue?
O BRICS e o tal de Sul Global ainda não estão convencidos disso?

Onde está a consciência moral, ou simplesmente ética, desses mandatários? 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 28/06/2023

terça-feira, 27 de setembro de 2022

Les Pays du Sud dans le multilatéralisme: un colloque à la Sorbonne, 6-7/10/2022

 Le laboratoire AGORA de CY Cergy Paris Université, le centre Roland Mousnier de Sorbonne Université, l’université de Marbourg et l’université de Montréal s’associent dans l’organisation d’un colloque intitulé :

 

 

Les Pays du Sud dans le multilatéralisme

Les 6-7 Octobre 2022

À l’Institut des études slaves (Sorbonne Université) au n°9, rue Michelet, Paris 75006

Organisateurs :

Régine Perron, MCF HDR Histoire des relations internationales, CY Cergy Paris Université

Samir Saul, Professeur Histoire des relations internationales, Université de Montréal

Hubert Zimmermann, Professeur Relations internationales, Université de Marbourg

Christophe Réveillard, Chercheur au Centre Roland Mousnier (UMR 8596 - IRCOM), Sorbonne Université.

 

Le jeudi 6 octobre :

Accueil : 9h30

Introduction : Régine Perron, CY Cergy Paris Université

 

10h : Présidence de séance: Jean-Pierre Dozon, Directeur d’études à l’EHESS

En Afrique du nord et subsaharienne

-Prof. Mohamed Lazar Gharbi, La Tunisie postcoloniale et l’option multilatéraliste (avec le FMI), Université La Manouba, Tunis

-Mariel Reiss, Multilateralism in Eastern and Southern Africa, Université de Marburg

-Komi Abalo et Dossou Ogouchina O'Lougbegnon, Les échanges intracommunautaires entre la zone CEDEAO et la zone CEMAC pour quel multilatéralisme avec la France ?, Université de Montréal (UDEM)

-Elhadji Saer Thiam, La CEDEAO comme exemple de construction du multilatéralisme en Afrique: Entre intégration économique et maintien de la paix et de la sécurité, CY Cergy Paris Université.

 

14h : Présidence de séance : Dominique Barjot, Professeur Histoire économique, Sorbonne Université

En Asie

-Prof. Lun Zhang, Dedans ou dehors: l'évolution de la stratégie de Pékin à l'encontre des organisations internationales, CY Cergy Paris Université

-Andi Akhmad Basith Dir, Expectation Goes South: the European Union’s Timber Regime in Indonesia, Philipps-Universite Marburg/Universitas Diponegoro Indonesia

 

En Amérique Latine

-Hildete de Moraes Vodopives, Centre Roland Mousnier Sorbonne Université, et Paulo Roberto de Almeida, Centro Universitário de Brasilia, Brazil and the challenges of multilateralism: high participation, low decision-making power.

-Getsiva Cayo, Centre Roland Mousnier Sorbonne Université, et Sebastian Adins, Pontifica Universidad Católica del Perú (PUCP), La participation du Pérou dans la formation du Pacte Andin (1968-1975).

 

16h 30: Clôture de la première journée.

  

Vendredi 7 octobre :

9h30 : Présidence de séance : Olivier Forcade, Professeur en histoire des relations internationales, Sorbonne Université

Dans le monde arabe

-Caroline Piquet, Les pays du Golfe dans le système international de 1945 à nos joursCentre Roland Mousnier Sorbonne Université

 

Les petits Etats insulaires et non-insulaires

-Carola Klöck, Climate change negotiations of Island and Non-Island States in International Institutions, Sciences Po Paris

 

Avec l’Union européenne

-Ngeti Zwane, African migration to the European Union, Université de Marburg

-Christophe Réveillard, Les PTOM de la CEE aux pays ACP de l'UE, Centre Roland Mousnier

 

Conclusion : Hubert Zimmermann, Université de Marbourg

 

12h30 : Clôture du colloque

 

Avec le soutien de CY Agora, CY Advanced Studies, du Centre Roland Mousnier, de la Faculté des Lettres de Sorbonne Université et de la Fondation Maison des Sciences de l'homme.

 

sábado, 3 de setembro de 2022

A reconstrução da política externa brasileira e das relações com a América Latina - Marcelo Viana Estevão de Moraes (FSP)

 A reconstrução da política externa brasileira e das relações com a América Latina

Marcelo Viana Estevão de Moraes

Doutor em ciências sociais pela PUC-Rio e pesquisador do Centro de Altos Estudos de Governo e Administração (Ceag/UnB)




Folha de S. Paulo, 01 de setembro de 2022


Hoje, além do conflito por procuração em curso entre a Otan e a Rússia no território ucraniano, o cenário mais amplo aponta para tensões crescentes entre os EUA e a China na disputa por hegemonia global.

Essa tendência traz desafios para o Brasil, que se encontra no hemisfério americano, sob a influência geopolítica direta do "hegemon", mas cuja economia depende cada vez mais das relações comerciais com a China. Um quadro de riscos e de oportunidades a demandar perspicácia e destreza na condução da política externa para a defesa do interesse nacional.

O secretário de Estado americano, Antony Blinken, declarou em conferência na Universidade George Washington que a China representa o mais sério desafio de longo prazo à ordem internacional: seria o país que não apenas pretende reformar essa ordem como detém também os recursos de poder para tanto.

A própria guerra na Ucrânia talvez não ocorresse se a Rússia não estivesse fortalecida em razão da parceria estratégica firmada com a China e que funciona como um vetor fundamental para a integração econômica e logística eurasiática, com destaque para a BRI (Belt and Road Initiative).

Nesse cenário, o desafio para o Brasil é retomar o fio condutor de sua política externa ativa e altiva, evitando alinhamentos geopolíticos automáticos com potências ou blocos, tendo por base uma agenda ecumênica de paz e desenvolvimento na perspectiva do Sul Global, privilegiando a interlocução com a América do Sul e a América Latina para a consecução de uma estratégia coletiva regional, por meio do resgate da União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e do adensamento da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac).

Priorizar a América Latina e, especialmente, a América do Sul

O Brasil, por suas dimensões econômicas, territoriais e populacionais, parafraseando Paulo Nogueira Batista Júnior, não cabe no quintal de ninguém, mas qualquer estratégia deve considerar que isoladamente o país tem baixa margem de manobra, dado que seus recursos de poder são relativamente escassos.

Uma estratégia coletiva sul-americana e latino-americana amplia o poder de barganha e negociação.

O grande jogo geopolítico brasileiro desdobra a projeção sobre seu entorno em círculos concêntricos de influência.

O primeiro círculo e o mais importante é a região platina, zona de maior densidade econômica e populacional da América do Sul.

O segundo círculo incorpora os demais países do subcontinente, em especial o bioma amazônico, e o Atlântico Sul, por onde transita quase todo o comércio exterior brasileiro.

O terceiro círculo congrega toda a América Latina e o Caribe, bem como a Antártida e a costa ocidental da África.

Os três círculos conformam o entorno geoestratégico do Brasil, região em que sua presença ativa é vital para seu desenvolvimento e sua segurança, e que deve servir de plataforma de projeção para o mundo.

No início deste século, entre outras iniciativas, o Brasil liderou a criação da Unasul e da Celac.

A Unasul foi uma organização internacional criada pelos 12 Estados sul-americanos em 2008 com o objetivo de, entre outros, articular as ações dos diversos países nos vários campos das políticas públicas, devendo funcionar como instrumento denso de governança desse espaço regional bioceânico.

A Celac, criada posteriormente, em 2010, também foi impulsionada pelo Brasil com a realização em Salvador, em 2008, da primeira cúpula autônoma dos países latino-americanos e caribenhos, sem a tutela de anglo-saxões e ibéricos. Sua vocação é a concertação política e a cooperação para o desenvolvimento.

O abandono da Unasul e da Celac por parte do governo Bolsonaro significou um retrocesso da política externa brasileira.

A Unasul e a Celac foram atingidas por uma campanha psicológica adversa acerca de uma suposta União das Repúblicas Socialistas da América Latina (Ursal) -uma enorme bobagem que viralizou com fake news.

Esse retrocesso não foi um fato isolado.

Houve a subordinação da política externa a um americanismo ideológico radical de extrema direita -o trumpismo- que compromete o diálogo com o atual governo estadunidense, e a avacalhação do Itamaraty, órgão que sempre funcionou como referência de excelência burocrática para a administração civil brasileira.

O Brasil é indispensável para o êxito da integração por ser multivetor no espaço regional: o projeto regional se articula com o objetivo nacional brasileiro de consolidar sua integração territorial interna; viabiliza potenciais sinergias entre os sistemas nacionais em todas as esferas (produtiva, comercial, logística etc.) associando o acesso ao Pacífico, por meio de corredores interoceânicos, à marcha para o oeste brasileira; favorece a instituição de uma doutrina estratégico-militar regional que avançava no Conselho de Defesa Sul-Americano, fundamental para o controle do entorno oceânico vital da grande "jangada de pedra" sul-americana, a segurança da extensa fronteira terrestre brasileira e a cooperação em torno do desenvolvimento sustentável da Amazônia.

No entanto, a eventual recondução do atual mandatário manterá o país como pária, no ponto mais baixo de sua reputação internacional, como um problema para o mundo e não como portador de soluções.

Só uma liderança respeitada internacionalmente e testada na arte da política e da administração poderá fazer a diferença desejada e aproveitar a conjuntura regional favorável à retomada dos projetos de integração.

terça-feira, 9 de agosto de 2022

O sul da política externa lulista - Demétrio Magnoli (FSP)

O sul da política externa lulista

'Sul global' é fantasia acadêmica, tardia flor ideológica do terceiro-mundismo

Demétrio Magnoli

Sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP. 

Putin Zelenski são igualmente responsáveis pela invasão russa da Ucrânia. O diagnóstico neutralista de Lula encontra sua teorização na réplica à minha última coluna, assinada por um grupo de professores universitários (Folha, 2/8).

O "conflito é multicausal", explicam, atribuindo-o em partes iguais ao "expansionismo da Otan" e à "deriva nacionalista do regime de Vladimir Putin". A ordem dos fatores não é casual: fazendo eco a Lula, e ignorando as evidências factuais, o primeiro surge como raiz da tragédia e, implicitamente, como fonte do segundo. O conjunto do texto desdobra o argumento inicial e, nesse passo, descortina os fundamentos da política externa do provável futuro governo. Por isso, merece exame.

Homem observa destroços de imóvel em Toretsk, Ucrânia - Bulent Kilic-4.ago.22/AFP

O Brasil deve "trabalhar pelo multilateralismo", dizem os autores, enquanto criticam as ações multilaterais destinadas a enfrentar a agressão russa. A ONU, principal instituição multilateral, votou duas resoluções de condenação à invasão, uma no Conselho de Segurança (vetada por Moscou) e outra na Assembleia-Geral. As sanções à Rússia assentam-se nessas resoluções —e são, elas mesmas, iniciativas multilaterais adotadas por dezenas de países.

As sanções não atingiram "o objetivo de acabar com a guerra", escrevem os professores, inventando uma meta maximalista impossível. De fato, embora as exportações da Rússia tenham sido pouco afetadas, suas importações sofreram golpes profundos, o que provocou recuo generalizado na produção industrial russa, como explica Paul Krugman. As sanções reduzem, a longo prazo, as capacidades militares de Putin. Mas o governo Bolsonaro as condena --e Lula também.

O fornecimento de armas à Ucrânia ampara-se no princípio multilateralista da autodefesa coletiva, consagrado na Carta da ONU. Os autores dizem que "a sobrevivência de Kiev será um abalo para a visão do mundo de Putin", como se tal "sobrevivência" fosse uma dádiva da natureza, não um fruto do auxílio militar. Bolsonaro e Lula pedem, juntos, o fim desse suporte bélico. Não é preciso excessiva perspicácia para concluir que a "visão do mundo de Putin" prevaleceria e a Ucrânia deixaria de existir caso imperasse a posição compartilhada pelos dois.

No texto de réplica, curiosamente, sanções e ajuda militar são excluídas do conceito de multilateralismo. Para os autores, multilateralismo parece só se aplicar a iniciativas de um certo "sul global", que faria contraponto à "posição ocidental". Aí, emerge uma noção organizadora da concepção de política externa lulista.

"Sul global" é um herdeiro imaginário do antigo Terceiro Mundo e, mais nitidamente, do Movimento dos Países Não Alinhados (NAM). Nascido da Carta de Bandung (1955), o NAM adotou posições coletivas que refletiam o ciclo da descolonização afro-asiática. Depois, tornou-se um campo de concorrência diplomática entre China e Índia, até perder relevância. Já o "Sul global" não passa de uma fantasia acadêmica.

Quem estrutura o "Sul global"? A China, engajada no jogo de poder mundial com os EUA? A Índia, cuja rivalidade com a China produz alinhamentos duais, com os EUA e a Rússia? A Turquia, integrante da Otan que, para preservar sua influência geopolítica regional, mantém uma parceria limitada com a Rússia?

A autonomia brasileira no sistema internacional exige a rejeição da Guerra Fria 2.0 entre EUA e China e solicita a edificação de parcerias flexíveis baseadas no interesse nacional. Nossa política externa certamente não deve buscar "alinhamentos automáticos com grandes potências" –mas a condenação efetiva da guerra imperial russa não equivale a nenhum "alinhamento automático".

"Sul global" é uma tardia flor ideológica do terceiro-mundismo. No atual discurso lulista, funciona como pretexto sofisticado para a reiteração da política bolsonarista de solidariedade com Putin.


terça-feira, 12 de julho de 2016

E se eu quiser falar com esse tal de "Sul Global"? Ligo para quem? - Paulo Roberto de Almeida

Estava aqui pensando com os meus botões, o meu zipper, o meu velcro: 
Ouço, leio, vejo tantos acadêmicos falarem num tal de Sul Global, que comecei a me perguntar, aos meus botões, etc., onde é que teria de buscar para falar com esse personagem tão importante nos escritos, nos dizeres, nas perorações, de tantos gramscianos de academia?
Digam-me senhores, por favor: se eu quiser falar com o tal de Sul Global, eu ligo para quem, teclo qual número?
Isso é porque eu estava lendo algumas dessas matérias abundantes em certos meios que falaram de um tal de Sul Global, assim, com maiúsculas.
Você não sabe? Nem eu.
Se eu quiser falar com o G7, sei para onde chamar, para o sherpa de plantão na coordenação do próximo summit.
Se eu quiser falar com o Império, sei para onde ligar (só espero que não tenha de ser para aquele idiota do Trump).
Se eu quiser falar com aqueles confusos europeus, é só entrar no site dos eurocratas de Bruxelas, e mandar uma mensagem.
Até se eu quiser falar com os companheiros (se não estiverem presos), sei para onde ligar (sabendo que a PF também vai estar gravando a minha chamada), e serei (acho, espero) colocado em contato com algum neobolchevique encarregado de Relações Públicas (devidamente subsidiado por alguma doação legal, claro).
Mas, se eu quiser falar com esse tal de Sul Global, eu não tenho a menor ideia de quem chamar, qual número de telefone compor, a quem apelar...
Eu ainda me pergunto porque tantos acadêmicos (gramscianos?) falam nesse tal de Sul Global, já que não conhecemos, se me permitem o espírito policialesco, sua identidade, endereço, qualificações, CEP e site.
Alguém poderia me informar?
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 12/07/2016