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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Congresso resvala, ou descamba, mais um degrau para a irracionalidade e a imoralidade...

O Congresso se prepara para aprovar duas medidas absolutamente, repito ABSOLUTAMENTE maléficas do ponto de vista da boa governança, da moralidade, da racionalidade nos gastos públicos, enfim, do bom funcionamento das instituições.
A primeira é a aprovação do final do voto secreto em quaisquer votações, o que é não apenas um tiro no pé, mas simplesmente uma amputação a frio das duas pernas. A partir da aprovação dessa monstruosidade, os congressistas, que já andam nas mãos do Executivo mendingando verbas para seus projetos de vereança federal, cairão ainda mais na escala da submissão ao Executivo, que poderá assim controlar, e remunerar, quem for mais obediente.
A segunda é a aprovação da PEC que obriga o Executivo a repassar verbas justamente para os projetos de vereança federal de suas excelências, o nosso pork barrel, ou seja, os projetinhos paroquiais que representam o reverso da chantagem do Executivo contra eles: os vereadores federais agora também poderão chantagear o Executivo na aprovação do orçamento. Ou tem dinheiro para seu pork barrel, ou não tem orçamento.
Em relação a essa gastança desenfreada de suas excelências, contra qualquer racionalidade, vale reproduzir aqui editorial do Estadão do mês passado, quando se discutia esse tipo de mudança, para ver como continuamos andando para trás na trajetória da desgovernança...
Paulo Roberto de Almeida

Uma LDO da gastança

26 de outubro de 2013
Editorial O Estado de S.Paulo

Já em mau estado pelo excesso de gastos, as contas da União poderão ser mais prejudicadas com a adoção de novos dispositivos incluídos no relatório final do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovado na quinta-feira pela Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização do Congresso. Um dos itens acrescentados torna obrigatória, a partir do próximo ano, a liberação de recursos para certas despesas determinadas por emendas parlamentares individuais. É uma antecipação do orçamento impositivo, previsto em proposta de emenda constitucional (PEC) ainda na fila de votação do Senado. Depois de aprovada pelos senadores, essa proposta ainda passará por uma segunda votação na Câmara dos Deputados.

Segundo o relator do projeto da LDO, deputado Danilo Forte (PMDB-CE), dificilmente a presidente Dilma Rousseff vetará aquele dispositivo. Não pode interessar ao Executivo, em sua opinião, abrir uma disputa com o Congresso em ano de eleição. Se essa avaliação for correta, o Tesouro será forçado, mesmo sem a PEC, a liberar recursos equivalentes a até 1,2% da receita corrente da União para emendas parlamentares.
Pelas estimativas atuais, isso equivalerá a cerca de R$ 12,8 milhões para emendas de cada um dos 594 senadores e deputados. É um valor menor que o previsto nas normas atuais, de R$ 15 milhões, mas a liberação será obrigatória. No regime em vigor, a realização desse tipo de gasto depende do arbítrio do Executivo e a liberação é concedida, em muitos casos, em troca de apoio em votações no Parlamento.
O regime atual pode ser defeituoso, mas permite ao Executivo o controle de uma parcela do gasto federal - que é excessivo. Além do mais, a qualidade das emendas parlamentares é normalmente muito baixa. As verbas previstas são destinadas, na maior parte dos casos, a projetos de interesse paroquial, a clientelas eleitorais e, não raro, a organizações civis dirigidas por laranjas.
Mesmo os projetos mais honestos caberiam mais propriamente em orçamentos estaduais ou municipais. Muitos deputados e senadores se comportam, na apresentação de emendas, como vereadores com mandato federal. No conjunto, essas emendas, mesmo quando isentas de fraudes, acabam resultando em pulverização de recursos federais e, portanto, em desperdício. Apenas combinam com o baixo grau de planejamento característico da administração de recursos da União.
Parlamentares favoráveis ao orçamento impositivo costumam invocar, em defesa de sua posição, o ideal de equilíbrio entre Poderes. Tendo o Executivo o poder de arbitrar a liberação de verbas, o sistema atual deixa os parlamentares em desvantagem, dependentes da boa disposição de quem comanda o Tesouro e sujeitos a pressões por barganhas políticas. Isso pode ser verdadeiro, mas descreve apenas uma parte dos fatos. Raramente os parlamentares demonstram algum empenho em cuidar da boa gestão do dinheiro dos contribuintes, como se a responsabilidade pela administração fiscal coubesse apenas ao Executivo.
Além disso, a LDO estaria aprovada no fim de junho, se deputados e senadores cumprissem suas obrigações mínimas. Os parlamentares nem sequer poderiam ter saído de férias sem ter liquidado essa obrigação. Saíram, no entanto, embora de forma extraoficial. A aprovação do relatório ocorreu com quase quatro meses de atraso. É muito difícil reconhecer a quem age dessa forma alguma autoridade moral para defender um orçamento impositivo.

Outro dispositivo, enxertado pelo deputado André Vargas (PT-PR), torna dispensável a consulta ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) para aumento de gastos do Judiciário e do MP, por exemplo, com reajustes salariais, criação de cargos e abertura de varas ou tribunais. Se mantida na versão final da LDO, essa iniciativa enfraquecerá o controle interno do Judiciário e do Ministério Público. Como presidente do CNJ, o ministro Joaquim Barbosa, do STF, havia tentado barrar a instalação de quatro Tribunais Regionais Federais, defendida, por notável coincidência, pelo deputado André Vargas.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Gasto Publico do Brasil: uma "Suecia" de favelas - Marcos Mendes


Marcos Mendes, Doutor em economia pela USP, consultor do Senado Federal
Blog Brasil-Economia-Governo, 5 de Novembro de 
2012
O presente artigo mostra que, em comparação internacional, o gasto público brasileiro é elevado.
Os dados utilizados são da Penn World Table, uma confiável fonte de informação comparada de contas nacionais, com dados para 189 países, apresentados em paridade do poder de compra (http://pwt.econ.upenn.edu/php_site/pwt_index.php), ou seja, leva-se em consideração a diferença de custo de vida entre os países. Os dados referem-se ao consumo final do governo em 2006.
O consumo final do governo (G) representa os serviços individuais e coletivos prestados de forma gratuita (ou parcialmente gratuita) pelas três esferas de governo. Ele é medido pela remuneração dos servidores públicos, mais o consumo final de bens e serviços pelo governo (por exemplo, o pagamento a um hospital privado que presta serviços ao SUS, o giz para sala de aula ou os canapés de uma recepção oficial), e pela depreciação do capital fixo do governo.
É importante observar que esse conceito não inclui as despesas de transferências (juros, aposentadorias e pensões, seguro-desemprego, bolsa-família). Logo, ficam afastados dois argumentos usuais: os de que nosso governo gasta muito porque paga muito juro, ou de que gasta muito porque investe em política social (o “grosso” da política social, que é a previdência e assistência, está fora da conta de “G”). Veremos que, mesmo desconsiderando esses itens, o Brasil tem gasto elevado para o padrão internacional.
Também não estão incluídas as empresas estatais (de economia mista ou 100% públicas). Somente as empresas dependentes de verbas dos tesouros federal, estadual e municipal são consideradas.
A variável “G” restringe-se ao gasto corrente, não incluindo o investimento público. É, portanto, grosso modo, a despesa corrente de manutenção da máquina pública (salários mais consumo final de bens e serviços).
A medida aqui utilizada é o consumo do governo como proporção da absorção interna. A absorção interna é a soma de “G” com o consumo das famílias (C) e o investimento (I). Quanto maior a proporção G/(C+I+G), maior a preferência do país por consumo do governo em relação às opções de consumo privado ou investimento.
O Brasil fica em 61º lugar, em uma lista de 189 países, com um consumo do governo equivalendo a 19% da absorção interna; um pouco acima da média (17,9%) e da mediana (16,2%). A princípio, nada muito fora do padrão.
Porém, quando analisamos quais são os 60 países que estão à nossa frente, percebemos que há algo de errado com o Brasil.
Vinte desses países estão na África subsaariana, região extremamente pobre e dependente de ajuda internacional. Essa ajuda entra nos países via governo, e a sua aplicação interna leva a um gasto público elevado. Isso sem falar nos baixos padrões de governança da região, que tendem a provocar inchaço e privilégios na esfera pública.
Vinte e dois países são ricos em recursos minerais (exemplos: Arábia Saudita, Rússia, Venezuela, Iraque). Esse tipo de economia gera elevadas rendas governamentais, expandindo o poder de gasto do setor público.
Vinte e três países são socialistas ou o foram no passado recente (exemplos: Cuba, China, Moçambique, Montenegro, Quirguistão) e, por isso, mantêm ou herdaram grandes estruturas burocráticas.
Vinte e três países tiveram, no período 1996-2004, gasto militar igual ou superior a 3% do PIB em pelo menos dois desses anos. São países que vivem ou viveram situações de conflito militar interno ou externo (exemplos: Israel, Jordânia, Índia, Yemen). É evidente que o gasto militar contribui para o alto consumo desses governos.
Há, ainda, um grupo de 23 “micropaíses”, com população inferior a 3 milhões de habitantes (exemplos: Ilhas Salomão e Tonga). Estes não se beneficiam de economias de escala e têm elevados custos fixos per capita nos serviços públicos, levando a um maior peso do governo na economia.
A Namíbia se encaixa em todas as cinco categorias acima. Cinco países, como Botswana e Angola, estão em 4 categorias. Sete países, como Timor-Leste e Líbia estão em 3 categorias. Dezenove países aparecem em duas categorias, entre ele Brunei, Eritréia e Azerbaijão. Três países (Maldívias, Vanuatu e Sri Lanka), além de estarem em algumas das categorias acima, ainda foram destruídos pelo tsunami de 2004, o que exigiu esforço governamental de assistência às vítimas.
Somente dois países, entre os 61 com maior relação G/C+I+G, não se enquadram em nenhuma das características acima: Brasil e Suécia! E bem sabemos que não somos nenhuma Suécia, no que diz respeito à qualidade dos serviços públicos. Ademais, a Suécia vem empreendendo, nos últimos anos, grande esforço para reduzir o tamanho de seu governo.
A tabela a seguir mostra a situação do Brasil e a de países com os quais normalmente nos comparamos. Os demais BRICs, que nos superam, estão encaixados em algumas características descritas acima. A diferença do Brasil para a média do grupo mostrado na tabela é de 4,7 pontos percentuais.

Estamos, portanto, no meio do caminho entre um único exemplo de Estado padrão de primeiro mundo (Suécia) e os países que gastam muito em função de suas idiossincrasias. Certamente uma posição atípica.
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