O Congresso se prepara para aprovar duas medidas absolutamente, repito ABSOLUTAMENTE maléficas do ponto de vista da boa governança, da moralidade, da racionalidade nos gastos públicos, enfim, do bom funcionamento das instituições.
A primeira é a aprovação do final do voto secreto em quaisquer votações, o que é não apenas um tiro no pé, mas simplesmente uma amputação a frio das duas pernas. A partir da aprovação dessa monstruosidade, os congressistas, que já andam nas mãos do Executivo mendingando verbas para seus projetos de vereança federal, cairão ainda mais na escala da submissão ao Executivo, que poderá assim controlar, e remunerar, quem for mais obediente.
A segunda é a aprovação da PEC que obriga o Executivo a repassar verbas justamente para os projetos de vereança federal de suas excelências, o nosso pork barrel, ou seja, os projetinhos paroquiais que representam o reverso da chantagem do Executivo contra eles: os vereadores federais agora também poderão chantagear o Executivo na aprovação do orçamento. Ou tem dinheiro para seu pork barrel, ou não tem orçamento.
Em relação a essa gastança desenfreada de suas excelências, contra qualquer racionalidade, vale reproduzir aqui editorial do Estadão do mês passado, quando se discutia esse tipo de mudança, para ver como continuamos andando para trás na trajetória da desgovernança...
Paulo Roberto de Almeida
Uma LDO da gastança
26 de outubro de 2013
Editorial O Estado de S.Paulo
Já em mau estado pelo excesso de gastos, as contas da União poderão ser mais prejudicadas com a adoção de novos dispositivos incluídos no relatório final do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovado na quinta-feira pela Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização do Congresso. Um dos itens acrescentados torna obrigatória, a partir do próximo ano, a liberação de recursos para certas despesas determinadas por emendas parlamentares individuais. É uma antecipação do orçamento impositivo, previsto em proposta de emenda constitucional (PEC) ainda na fila de votação do Senado. Depois de aprovada pelos senadores, essa proposta ainda passará por uma segunda votação na Câmara dos Deputados.
Segundo o relator do projeto da LDO, deputado Danilo Forte (PMDB-CE), dificilmente a presidente Dilma Rousseff vetará aquele dispositivo. Não pode interessar ao Executivo, em sua opinião, abrir uma disputa com o Congresso em ano de eleição. Se essa avaliação for correta, o Tesouro será forçado, mesmo sem a PEC, a liberar recursos equivalentes a até 1,2% da receita corrente da União para emendas parlamentares.
Pelas estimativas atuais, isso equivalerá a cerca de R$ 12,8 milhões para emendas de cada um dos 594 senadores e deputados. É um valor menor que o previsto nas normas atuais, de R$ 15 milhões, mas a liberação será obrigatória. No regime em vigor, a realização desse tipo de gasto depende do arbítrio do Executivo e a liberação é concedida, em muitos casos, em troca de apoio em votações no Parlamento.
O regime atual pode ser defeituoso, mas permite ao Executivo o controle de uma parcela do gasto federal - que é excessivo. Além do mais, a qualidade das emendas parlamentares é normalmente muito baixa. As verbas previstas são destinadas, na maior parte dos casos, a projetos de interesse paroquial, a clientelas eleitorais e, não raro, a organizações civis dirigidas por laranjas.
Mesmo os projetos mais honestos caberiam mais propriamente em orçamentos estaduais ou municipais. Muitos deputados e senadores se comportam, na apresentação de emendas, como vereadores com mandato federal. No conjunto, essas emendas, mesmo quando isentas de fraudes, acabam resultando em pulverização de recursos federais e, portanto, em desperdício. Apenas combinam com o baixo grau de planejamento característico da administração de recursos da União.
Parlamentares favoráveis ao orçamento impositivo costumam invocar, em defesa de sua posição, o ideal de equilíbrio entre Poderes. Tendo o Executivo o poder de arbitrar a liberação de verbas, o sistema atual deixa os parlamentares em desvantagem, dependentes da boa disposição de quem comanda o Tesouro e sujeitos a pressões por barganhas políticas. Isso pode ser verdadeiro, mas descreve apenas uma parte dos fatos. Raramente os parlamentares demonstram algum empenho em cuidar da boa gestão do dinheiro dos contribuintes, como se a responsabilidade pela administração fiscal coubesse apenas ao Executivo.
Além disso, a LDO estaria aprovada no fim de junho, se deputados e senadores cumprissem suas obrigações mínimas. Os parlamentares nem sequer poderiam ter saído de férias sem ter liquidado essa obrigação. Saíram, no entanto, embora de forma extraoficial. A aprovação do relatório ocorreu com quase quatro meses de atraso. É muito difícil reconhecer a quem age dessa forma alguma autoridade moral para defender um orçamento impositivo.
Outro dispositivo, enxertado pelo deputado André Vargas (PT-PR), torna dispensável a consulta ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) para aumento de gastos do Judiciário e do MP, por exemplo, com reajustes salariais, criação de cargos e abertura de varas ou tribunais. Se mantida na versão final da LDO, essa iniciativa enfraquecerá o controle interno do Judiciário e do Ministério Público. Como presidente do CNJ, o ministro Joaquim Barbosa, do STF, havia tentado barrar a instalação de quatro Tribunais Regionais Federais, defendida, por notável coincidência, pelo deputado André Vargas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário