Por que essa introdução? O Supremo Tribunal Federal começará a julgar daqui a pouco uma questão que, para os demagogos, opõe, de um lado, milhões de brasileiros honrados — e, atenção!, não estou dizendo que não o sejam — e, de outro, banqueiros supostamente malvados, cúpidos, que só pensariam em lucrar com a desgraça alheia. Leiam trecho de reportagem de Giuliano Guandalini na VEJA desta semana. Volto depois.
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Concluído o julgamento do mensalão, o Supremo Tribunal Federal (STF) vai se debruçar agora sobre uma questão que afeta diretamente um número muito maior de brasileiros. Deverão ser julgadas, a partir da quarta-feira 27, as ações que questionam os critérios de correção das aplicações de cadernetas de poupança usados nos planos de estabilização econômica anteriores ao Real. Trata-se de uma disputa de mais de duas décadas. Esses processos, em sua maioria, dizem respeito aos planos Bresser e Verão, editados nos anos 80, e Collor I e Collor II, no inicio dos anos 90. Os juízes de primeira instância, quase sempre, tomaram decisões favoráveis aos poupadores. Como resultado, uma avalanche de novas ações chegou aos tribunais. Estima-se a existência de um total aproximado de 1 milhão de ações individuais e outras 1000 coletivas. Segundo cálculos atualizados do Banco Central, caso o STF julgue inconstitucionais as leis e regras então usadas para corrigir os depósitos, o total dos expurgos a ser pagos aos poupadores soma 150 bilhões de reais.
O julgamento deverá se estender por diversas sessões, e a decisão final deverá ser proferida somente em 2014. Mas o tamanho da cifra, se confirmada a vitória dos poupadores, desde já amedronta o governo e o sistema financeiro. Não será trivial absorver uma perda de 150 bilhões de reais. Estudos do Ministério da Fazenda e do Banco Central flertam para o risco de quebra de instituições. Os efeitos não parariam por aí. Como os 150 bilhões de reais deixariam de ser registrados como lucro e passariam a ser prejuízo dos bancos, não haveria o recolhimento de 60 bilhões de reais (40%) em imposto de renda e outros tributos. Um terço dos 150 bilhões de reais recairia sobre a Caixa, banco público que, automaticamente, teria de ser recapitalizado com recursos do Tesouro. Por fim, haveria um impacto brutal no crédito. Os bancos, em média, emprestam o equivalente a nove vezes o seu capital. Se ocorrer uma redução de 150 bilhões de reais no capital, o enxugamento na oferta de crédito seria de 1,35 trilhão de reais — metade do crédito disponível atualmente.
Um estrangulamento dessa magnitude teria efeitos avassaladores. Em uma nota técnica anexada à peça de defesa do governo, o Ministério da Fazenda afirma que “uma eventual decisão contrária às instituições financeiras” significaria uma “brusca descapitalização do setor, com possíveis insolvências e enfraquecimento da solidez do sistema financeiro, e, consequentemente, impactos severos na economia real”. Um parecer do BC reforça os riscos: “O impacto potencial dessas ações pode ser considerado preocupante, dadas as repercussões possíveis sobre o sistema financeiro, sobre as finanças públicas e, consequentemente, sobre o crescimento e o emprego no pais”.
O julgamento entrou para a lista de assuntos de prioridade máxima no governo, diante da grande possibilidade de derrota. São necessários ao menos seis de um total de onze votos de ministros do Supremo para confirmar a constitucionalidade dos planos econômicos. O placar, segundo fontes do governo, está apertado. O ministro Luís Roberto Barroso deve se declarar impedido, porque, quando na iniciativa privada, advogou a favor dos poupadores. Luiz Fux também poderá se declarar impedido, porque sua filha trabalha em um escritório que atua contra as ações. Três dos ministros, pelas suas manifestações sobre o tema, tendem a votar pela inconstitucionalidade. São eles Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Portanto, para evitar o desastre financeiro para o Brasil, os demais seis ministros teriam de reconhecer a constitucionalidade daquelas leis. Como parece ser seu destino, há a possibilidade de que seja de Joaquim Barbosa, presidente do STF, o voto decisivo.
Por anos, o governo e os bancos não deram a devida atenção a essas ações. Ambos julgavam que as reivindicações eram improcedentes e, cedo ou tarde, seriam derrubadas. Não foi o que ocorreu. A questão acabou sendo tratada, nos tribunais, pelo seu lado social, como um embate entre grandes bancos e pequenos investidores. Agora, pelo volume de dinheiro envolvido, o que está em julgamento no STF se o Brasil vai ser jogado em uma crise financeira e fiscal sem precedentes. Do ponto de vista puramente jurídico, a filigrana reside em avaliar se os bancos podiam ter se recusado a cumprir as leis que deram sustentação aos planos econômicos impostos pelo governo.
Obviamente, eles não tinham essa alternativa. Se desobedecessem, ficariam sujeitos a multas e até à suspensão de funcionamento. Além disso, se os planos fixaram a poupança no primeiro mês abaixo da inflação, eles garantiram que também os aluguéis e as prestações da casa própria fossem reajustados por índices inferiores. Se o STF considerar as leis inconstitucionais, os inquilinos que pagaram aluguéis mais baratos vão ter de ressarcir os proprietários dos imóveis? Da mesma forma, quem teve as prestações da casa própria ajustadas abaixo da inflação vai ter de pagar a diferença às instituições financiadoras? Essas perguntas dão a dimensão do caos que se instalaria na hipótese de o STF tirar o chão constitucional das leis que deram sustentação jurídica aos planos econômicos.
(…)
Retomo
A correção da poupança, como se nota, foi apenas um item da equação econômica, era apenas um dos “preços” da economia. Havia outros, que estavam atrelados aos mesmos índices. Não há como fazer a história girar para trás. De resto, um dos pilares das decisões judiciais é a razoabilidade, ou não existe justiça.
Fora do STF, os demagogos estão assanhados. Sabem como é… Demonizar banqueiros, no Brasil e no mundo, rende simpatizantes, leitores, admiradores… O sujeito pode até ficar com a fama de “corajoso”, como se corresse algum risco. Em tempos em que black blocs depredam bancos, sob o silêncio cúmplice ou mesmo o entusiasmo de alguns de nossos pensadores e colunistas, defender que eles arquem com a correção da poupança de planos de décadas passadas parece coisa pouca, até pequena.
Ao longo dos anos, as grandes instituições bancárias poderão dar um jeito de recuperar ou minimizar suas perdas. Pior será para o país — e, portanto, para os brasileiros —, que arrecadará menos impostos, que verá minguar o crédito, que arcará, sim, com uma parcela considerável do rombo, já que a Caixa Econômica Federal seria uma das mais prejudicadas.
Receios
Em temos um pouquinho mais normais, eu talvez não temesse o risco de o Supremo tomar uma decisão errada. Hoje em dia, tenho cá minhas reservas. A Justiça e as instituições, de modo geral, andam com medo da chamada “voz das ruas”. Na imprensa, os “odiadores” profissionais de bancos já babam suas ignorâncias — afinal, são muito bonzinhos e gostam do povo…
Espero que as ministras e os ministros do Supremo Tribunal Federal apelem a alguns especialistas e peçam que estes façam as contas para saber quanto uma decisão errada, mas “boazinha”, poderia custar NÃO AOS BANCOS, MAS AOS BRASILEIROS.
Se o voto de Minerva couber mesmo ao ministro Joaquim Barbosa, espero que ele salve o “povo” das tentações da demagogia. Terá prestado um outro serviço inestimável aos brasileiros.
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