Irapuã Santana
Doutor em Direito
Uma chance no Brics
O ingresso de novos integrantes no grupo abre brecha para entrada de outros mais democráticos
O GLOBO, 11/09/2023
No fim de agosto, o Brics — grupo formado por países em desenvolvimento até formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — convidou Argentina, Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos para se unirem a ele.
Nesse novo cenário, o bloco detém hoje 72% dos minerais de terras raras, 75% do manganês do mundo, 42% do abastecimento mundial de petróleo, 50% do grafite global e 28% do níquel do planeta. O Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais sinaliza que o novo Brics conta tanto com grandes produtores de petróleo e gás, como com dois dos maiores importadores do mundo, China e Índia.
Em entrevista ao portal g1, o ex-diplomata Paulo Roberto de Almeida afirma que a posição não favorece o Brasil, tendo em vista que “a China sempre foi o país preeminente no Brics e agora no Brics+. O Brasil se revela caudatário de uma grande potência, que quer constituir um grupo antiocidental”. Por outro lado, complementa que sempre “existem benefícios em desenvolver laços econômicos e comerciais com quaisquer países, dentro das regras normais do sistema multilateral de comércio, usando moedas conversíveis, de maneira a potencializar a amplitude dos pagamentos externos”.
Para o professor do MIT Daron Acemoglu, “o mundo não precisa que mais países caiam sob a influência chinesa e russa ou que se alinhem contra os Estados Unidos; em vez disso, precisa de um terceiro grupo genuinamente independente para fornecer um contrapeso tanto ao eixo China-Rússia como ao poder dos EUA”.
Ao adicionar Arábia Saudita, Etiópia, Egito, Irã e Emirados Árabes Unidos, o Brics sinaliza que a democracia não é um valor prioritário. Lembrando que o agrupamento não é considerado para relações meramente comerciais.
Em artigo intitulado “Democracia gera crescimento”, publicado pela Universidade de Chicago, conclui-se que a democratização, historicamente, criou condições para os países alcançarem um crescimento econômico em torno de 20% entre 5 a 10 anos, refletindo no aumento dos investimentos na educação, saúde e outros serviços públicos.
Outra preocupação que surge é referente ao desemprego, considerando que tanto os trabalhadores administrativos quanto os operários do mundo podem acabar por competir não com mão de obra cara e altamente qualificada nos países ricos, mas com software, maquinaria e robótica avançados alimentados por inteligência artificial.
No livro “Poder e progresso: nossa luta de mil anos pela tecnologia e prosperidade”, aponta-se que a tecnologia sempre foi usada pela elite para explorar os mais fracos. No entanto não precisa ser assim, e os avanços tecnológicos de ponta podem se tornar ferramentas de capacitação e democratização, contanto que as decisões importantes não permaneçam nas mãos de poucos líderes tecnológicos.
O ingresso de novos membros abre brecha para a entrada de outros mais democráticos para formar um bloco verdadeiramente independente, dando ao mundo emergente uma voz necessária nos debates sobre o futuro da globalização e da tecnologia.