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domingo, 8 de dezembro de 2024

A queda da categoria "extremista" (quem mateou mais?) - AUGUSTO DE FRANCO Revista ID

A queda da categoria "extremista"

Assad não era extremista

AUGUSTO DE FRANCO

Revista ID, DEZ 8, 2024

 

Os democratas comemoram a queda do governo Assad.

Os tolos, os analfabetos democráticos e os infectados pela realpolitik, dizem: "Depois do Assad virão os extremistas. Vai piorar".

Ora, isso pode acontecer mesmo. Mas é difícil. Veja por quê.

A dinastia Assad não era extremista, no sentido exato do termo: não queria romper as regras do jogo, não queria derrubar o regime. Só que o jogo desse regime, mantido há meio século por Hafez e Bashar, era tenebroso: ditatorial, sanguinário, assassino.

É improvável que o HTS e outros rebeldes extremistas, se instalando no poder, consigam chegar perto das 800 mil pessoas que sucumbiram sob os governos dos carniceiros Assad (pai e filho).

Sim, vejam a resposta do Grok, IA do X:

“Sob o governo de Hafez al-Assad, que governou a Síria de 1971 até sua morte em 2000, estima-se que cerca de 300.000 pessoas foram mortas, particularmente durante eventos como a repressão à Irmandade Muçulmana na década de 1980, incluindo o massacre de Hama em 1982.

Sob o governo de Bashar al-Assad, desde que assumiu o poder em 2000, a guerra civil que começou em 2011 resultou em um número significativamente maior de mortes. O Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH) reportou que até março de 2021, o conflito havia causado a morte de pelo menos 388.652 pessoas, com uma estimativa total de quase 500.000 mortes até 2021.

Portanto, combinando as estimativas, pode-se dizer que sob os governos de Hafez e Bashar al-Assad, o número total de mortes pode chegar a aproximadamente 800.000 pessoas, considerando os dados disponíveis e as estimativas de mortes em contextos de conflito e repressão”.

Isso é mais uma evidência de como a categoria "extremista" é inadequada. Ditadores não extremistas podem causar mais prejuízos à humanidade do que rebeldes extremistas.

Bastam dois exemplos. A rigor, Stalin e Mao não eram extremistas - não depois que chegaram ao poder.

Durante o governo Stalin morreram 10 a 20 milhões de pessoas por execuções diretas (durante a Grande Purga dos anos 1930, em campos de trabalho ou Gulags), por fome (especialmente durante a Holodomor na Ucrânia entre 1932-1933, onde milhões pereceram) e por deportações forçadas e outras formas de repressão.

Durante o governo de Mao Tsé-Tung entre 30 a 45 milhões de pessoas foram mortas por fomes (principalmente no Grande Salto Adiante, onde políticas agrícolas desastrosas levaram a uma das piores fomes da história humana), execuções e perseguições políticas (durante a Revolução Cultural e outras campanhas, muitos foram mortos ou morreram devido à tortura ou condições de trabalho nos campos de reforma) e em campanhas de repressão (como as campanhas “Cinco Antis" e "Três Antis").

Está simplesmente errado dizer todo mal que assola a humanidade vem dos “extremistas”. Putin não é extremista. Xi Jinping não é extremista. Seus alinhados nas democracias parasitadas por populismos, como Obrador e Cláudia, Manuel e Xiomara, Petro, Evo e Arce, Lula e Ramaphosa, não são extremistas. E, no entanto - juntamente com outras ditaduras, como a de Canel, de Maduro, de Ortega e Murillo, de Kim, de Khamenei e Assad (até ontem) - compõem hoje o eixo autocrático: a maior coalizão antidemocrática (contra as democracias liberais) já articulada no planeta em toda a história.

Então estamos “comemorando” não apenas a queda da brutal ditadura de Assad, mas a queda da noção de “extremismo” como categoria de análise.

 

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sexta-feira, 1 de novembro de 2024

O que é o PT? - Augusto de Franco ( Revista ID)

Para quem ainda não sabe o que é o PT

Um resumo do que é esse partido e do que ele defende

PT assina resolução do Foro de São Paulo que defende Maduro

Façamos um resumo do que é o PT e do que esse partido defende.

O PT se diz - e é dito - de esquerda, mas não de uma esquerda democrática (como a de Boric, no Chile) e sim de uma esquerda populista que, no plano externo:

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  • Reconhece a eleição fraudulenta de Maduro (ou não reconhece a vitória da oposição roubada pelo ditador), não critica as violações de direitos humanos na Venezuela e nunca teve a decência de chamar aquele regime pelo que ele de fato é e todo mundo sabe: uma ditadura.

  • Diz que Israel é genocida e vê o Hamas como uma força de libertação (na prática, apoia a guerra do Irã para destruir a democracia israelense - uma ilha de liberdade cercada por quinze autocracias do Oriente Médio).

  • Apoia Putin e afirma que Zelensky é nazista (e não move uma palha para defender, nem mesmo com palavras, a resistência ucraniana à invasão militar da ditadura neoczarista russa).

  • Aplaude a entrada do país no cafofo de ditaduras chamado BRICS (uma articulação anti-OTAN e anti-UE disfarçada de bloco econômico).

  • Concorda e aplaude efusivamente o alinhamento do Brasil ao eixo autocrático (Rússia, China, Irã etc.) contra as democracias liberais.

No plano interno, o lulopetismo, quer dizer, o neopopulismo que caracteriza o comportamento político do PT:

  • É contra a autonomia do banco central e das agências reguladoras.

  • É contra uma reforma administrativa que viabilize corte de gastos e, portanto, é contra o equilíbrio fiscal. 

  • É contra as privatizações.

  • É contra a lei das estatais.

  • É inclinado a fazer uso político dos bancos públicos. 

  • É a favor da escolha governamental de "complexos industriais estratégicos" para privilegiar investimentos públicos.

  • É espalhador da falsa narrativa de que o mensalão, o petrolão, o impeachment de Dilma e a prisão de Lula (e de outros dirigentes petistas, como Dirceu) fazem parte de um mesmo "projeto articulado de fora", de um golpe das elites, apoiadas pela CIA e pelo FBI, para destruir a Petrobrás e as empreiteiras, tomar o pré-sal e tirar o Lula da eleição de 2018.

  • É uma força política minoritária no Brasil, que depende hoje totalmente do judiciário e da televisão: é minoria nos governos e parlamentos estaduais e municipais, no Congresso Nacional, nas mídias sociais, nas ruas e nas urnas. Só não é minoria no STF e em alguns canais de TV (além da máquina do governo federal aparelhada, é claro).

No plano das concepções e práticas e, consequentemente, em termos de comportamento político, o PT:

  • Toma a ordem (uma ordem "mais justa") - e não a liberdade - como sentido da política.

  • Concebe e exercita a política como continuação da guerra por outros meios (na base do "nós contra eles") para implantar uma ordem mais justa (pré-concebida pela teoria ou pela ideologia).

  • É estatista (ou tem uma visão estadocêntrica do mundo).

  • É antiliberal e antipluralista.

  • Crê numa imanência histórica, na existência de leis da história que podem ser conhecidas por quem tem a teoria verdadeira ou o método correto de interpretação da realidade e na luta de classes (ou na luta identitária: a afirmação da diferença convertida em separação) como motor da história.

  • Acredita que a igualdade (ou a redução da desigualdade) socioeconômica é precondição para a liberdade (ou para a igualdade política).

  • Defende que há uma equivalência entre democracia e cidadania (ou reduz a democracia à cidadania para todos).

  • Como horizonte utópico propõe a fuga para um futuro (idealizado) onde a vida, supostamente, será melhor.

  • Usa a democracia contra a democracia (concorrendo à eleições não como quem quer fazer parte do metabolismo normal da democracia, capaz de realizar o princípio da rotatividade ou alternância, e sim como quem se aproveita de um instrumento, um meio para alcançar e reter o poder).

Saber é melhor do que não saber. Sabendo de tudo isso cabe às pessoas decidir, baseadas em seu próprio juízo, se devem apoiar esse partido.

O PT sempre foi assim? Mais ou menos. O partido surgiu da confluência de três vertentes: i. o sindicalismo dito “autêntico” do ABC paulista e associados, ii. o marxismo-leninismo dos intelectuais revolucionários que ficaram clandestinos, foram presos ou exilados durante a ditadura militar e iii. o basismo de setores da igreja católica que fizeram uma opção preferencial pelos pobres, animados pela ideologia (chamada de teologia) da libertação (de fundamentos marxistas). Inicialmente a primeira vertente carregou uma espécie de banditismo social das corporações sindicais; a segunda transfundiu para a nova agremiação a ideia de revolução, de acumulação de forças e de ruptura, e a concepção e a prática da política como uma continuação da guerra por outros meios; a terceira introduziu o “pobrismo” (a crença de que ser pobre continha uma virtude especial) e aproximou o partido de setores sociais urbano-periféricos e rurais (para além da esfera de influência da aristocracia operária). Evidentemente os quadros dirigentes do partido saíram das duas primeiras vertentes, numa espécie de aliança tácita para empalmar o poder na organização, simbolizada pelo conluio de “inimigos íntimos”’ Lula-Dirceu.

Bem… não vou recontar, mais uma vez, a história. Já publiquei dezenas (talvez mais de uma centena) de artigos sobre o tema a partir de 2005. Vale a pena espiar um ou dois desses artigos; um deles, de maio de 2016, intitulado O PT e a Irmandade Muçulmana: isomorfismos; e outro, de julho de 2017, intitulado Para começar a entender o PT. Adicionalmente, também pode ser importante ler a pequena nota, de outubro de 2018: PT nunca mais, Bolsonaro jamais. E, como uma síntese quase exaustiva, mais dois artigos recentes: um de fevereiro de 2023, Há algum fundo de verdade na alucinação anticomunista?, e outro, de julho de 2024, A estratégia de conquista de hegemonia do neopopulismo no Brasil. Para quem não dispõe de muito tempo, talvez baste ler apenas este último.

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