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quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Quem diria: a relação especial com Trump e os EUA fez chabu: comércio numa baixa histórica em 11 anos - Victor Irajá (Veja)

 Comércio entre Brasil e EUA atinge pior marca em 11 anos

Por Victor Irajá
Veja, 14 out 2020

Relação de Bolsonaro com Trump não se refletiu em números, afetados pela combinação dos efeitos da crise causada pela pandemia e restrições comerciais

Em maio do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro exaltou a parceria comercial com os Estados Unidos, o que definiu como um realinhamento da diplomacia brasileira em relação ao país presidido por Donald Trump. “O Brasil de hoje é amigo dos Estados Unidos, o Brasil de hoje respeita os Estados Unidos e o Brasil de hoje quer o povo americano e os empresários americanos ao nosso lado”, disse o presidente brasileiros antes de de adaptar seu bordão: “Termino com meu chavão de sempre. Brasil e Estados Unidos acima de tudo, Brasil acima de todos”. Os números comprovam que, ao Norte, o negócio não é bem assim. De acordo com um relatório divulgado pela Amcham Brasil, o comércio bilateral entre Brasil e Estados Unidos até o mês de setembro registrou, em 2020, o pior resultado dos últimos 11 anos. Entre janeiro e setembro, os dois países transacionaram 33,4 bilhões de dólares, uma redução de 25,1% em relação ao mesmo período do ano passado. O relatório aponta fatores principais para explicar a forte redução das trocas bilaterais.

O fator mais óbvio é a pandemia, que provocou uma queda expressiva no consumo da população e da necessidade das empresas por produtos oriundos da exportação brasileira. Mas outros fatores provocam uma reflexão sobre as diretrizes do Itamaraty de Ernesto Araújo. A China, atacada de frente por membros do governo, ampliou sua participação no mercado brasileiro como principal parceiro comercial do país. De acordo com o relatório, o país asiático representa 28,8% de todas as transações do Brasil. A queda no preço do petróleo, também graças à Covid-19, também teve impacto significativo nos resultados. O último fator envolve uma política protecionista do mandatário americano, que restringiu a entrada de produtos da siderurgia brasileira para proteger a indústria nacional. Em agosto, já com as eleições de novembro na cabeça, Donald Trump anunciou que cortaria em mais de 80% a importação de aço brasileiro até o fim do ano. O governo Bolsonaro devolveu com complacência: renovou, sem qualquer contrapartida, isenção de tarifa de importação sobre o etanol americano, enfurecendo os produtores locais. 

Segundo a análise, no acumulado do ano, as exportações brasileiras para os EUA caíram 31,5% em comparação com igual intervalo de 2019, alcançando o total de 15,2 bilhões de dólares. É o menor valor para o período desde 2010. Em termos relativos, os EUA foram o mais afetado entre os 10 principais destinos de exportação do Brasil em 2020. Foram sete bilhões de dólares a menos em exportações. A taxa de queda foi quatro vezes maior do que a redução das exportações totais do Brasil para o mundo. Por outro lado, as importações brasileiras vindas dos Estados  Unidos despencaram neste terceiro trimestre, com redução de 41,6% em relação a 2019. Entre janeiro e setembro de 2020, as importações totalizaram 18,3 bilhões de dólares, uma queda de 18,8%. Apesar da forte redução do comércio bilateral, os EUA seguem como o segundo principal parceiro comercial do Brasil. 

No início do mês, a Amcham havia traçado cenários para os impactos das eleições americanas para a política externa e as relações comerciais do Brasil. A instituição alerta para um maior caráter de defesa de uma política nacional-desenvolvimentista e protecionista do republicano em relação ao candidato democrata Joe Biden, cujo partido é mais historicamente ligado aos ideais globalistas. Segundo o documento, sob a liderança de Trump, os Estados Unidos se tornaram mais avessos ao multilateralismo e à atuação de organismos internacionais, como a Organização Mundial do Comércio (OMC), a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização das Nações Unidas (ONU).  Trump, aponta o relatório, também tem sido crítico de alguns acordos de livre comércio firmados pelos Estados Unidos (como o NAFTA e a Parceria Transpacífica) e tende a privilegiar negociações bilaterais em detrimento de negociações que envolvam múltiplas partes. Por lá, é Estados Unidos acima de todos. 

https://veja.abril.com.br/economia/comercio-entre-brasil-e-eua-atinge-pior-marca-em-11-anos/

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

A verdadeira chanceler do Brasil: Tereza Cristina, ministra da Agricultura (Veja)

Apenas um trecho, a última frase desta matéria da Veja, sobre quem seria uma melhor chanceler para o Brasil, aliás, a primeira mulher a ocupar o cargo.
Na Índia, "Ernesto Araújo e Tereza Cristina farão apresentações, no dia 27, num seminário para atrair investimentos. Há pouca dúvida quanto a quem será mais aplaudido."
Isso é evidente...
Paulo Roberto de Almeida

Titular da Agricultura ocupa o vácuo de Araújo e coleciona apoio internacional (e de membros do governo) como o nome de bom-senso do Brasil no exterior
Por Victor Irajá
Veja, 22/01/2020

Se a ministra Tereza Cristina fosse lojista, não perguntaria ao cliente seu credo ou sua ideologia — muito menos atentaria para a cor da pele ou a orientação sexual do comprador. A avaliação bem-humorada é de membros do próprio Ministério da Agricultura, pasta comandada por Tereza, quando provocados a se manifestar sobre a chefe. Distante das hordas ideológicas que infestam o governo — com o entusiasmado apoio do presidente —, a ministra tem a preocupação de vender, vender cada vez mais.

Empenhada em obter o respaldo do mercado internacional para os produtos brasileiros, e em contornar as caneladas do titular do Itamaraty, Ernesto Araújo, Tereza Cristina vem conquistando o apoio de representantes diplomáticos mundo afora — e amealhando entusiastas de seu trabalho dentro do Executivo. O resultado pode ser visto nos acordos fechados por ela com países de diferentes orientações políticas — como China e Alemanha — e no recorde do volume exportado de itens agrícolas. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Universidade de São Paulo, o ano passado foi o melhor da história do Brasil para os empresários do campo.

Um fato recente ratifica a postura pragmática da ministra. Quando desembarcou em Brasília ao raiar do último dia 7, ela foi atingida por uma enxurrada de ligações. Membros do governo a procuravam, desesperados com a nota do Itamaraty de “apoio à luta contra o flagelo do terrorismo”, emitida depois da morte, por ação dos Estados Unidos, do general iraniano Qasem Soleimani. Visitando a filha em território americano, a chefe da Agricultura não havia lido o posicionamento oficial da diplomacia nacional sobre o episódio, ocorrido no dia 3. Na volta ao país, sua agenda foi subtraída por uma série de reuniões com representantes agrícolas e membros do Executivo preocupados com o alinhamento da chancelaria às decisões tomadas pelo presidente Donald Trump. Incomodada, Tereza classificava a nota do Ministério das Relações Exteriores como “fora do tom” e exibia dados de exportações para o Irã, com o qual o Brasil tem um superávit de mais de 2 bilhões de dólares — trata-se de um dos maiores importadores de carne do país.

Não é segredo em Brasília que existe hoje um clima de tensão controlada entre o chanceler e sua “substituta”. Para membros da pasta da Agricultura, os textos explosivos de Araújo vêm atrapalhando os esforços da ministra para melhorar as relações com o Oriente Médio e contornar os impactos da disputa comercial travada por americanos e chineses. Foi ela quem costurou a manutenção das relações com a China e a Liga Árabe no ano passado, quando Bolsonaro e seu chanceler flertavam com o rompimento. Tereza Cristina convenceu Araújo da importância de ambas as frentes para o agronegócio nacional e se empenhou ainda pela permanência da embaixada do Brasil em Tel Aviv, enquanto o presidente batia o pé pela transferência para Jerusalém. Infelizes com Araújo, generais estrelados no Planalto têm procurado a titular da Agricultura para resolver trapalhadas diplomáticas — entre eles, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, um dos poucos a quem Jair Bolsonaro dá ouvidos.

Desde o início de sua gestão, a ministra — uma engenheira-agrônoma de 65 anos, nascida em Campo Grande (MS) e reeleita deputada federal em 2018 (DEM) — acumula milhagens atrás de investimentos e novos compradores. Atravessou o planeta dedicando seu tempo aos aliados mas também a governos reticentes com Bolsonaro, como o da França. Pela atuação, Tereza ganhou a pecha de “chanceler pragmática”. Bem avaliada na Câmara e no Senado, ela sabiamente rejeita a alcunha para não causar ciúme no comandante do Itamaraty, malquisto pelo Congresso.

Na terça-feira 14, depois de enfrentar uma pesada agenda, a ministra embarcou para a Alemanha, onde participaria de uma rodada de encontros entre os principais produtores e ministros da Agricultura do mundo. Lá, discutiu o acirramento das sanções ao Irã anunciadas pelos Estados Unidos. Ela avalia que o castigo comercial prejudica o Brasil, que, se negociar com empresas iranianas, poderá sofrer reações duras dos EUA, o que atrapalhará um acordo para liberar a exportação de carne brasileira aos americanos, vedada desde 2017.

Durante as reuniões, Tereza Cristina assinou um termo de cooperação técnica na agricultura com os alemães e marcou conversas com representantes da Holanda, da Ucrânia e da Itália para deliberar sobre o aumento das tensões no Oriente. No berço do nazismo, quando instada a se posicionar sobre a nota da embaixada alemã a respeito do simulacro de Goebbels feito pelo ex-secretário de Cultura Roberto Alvim, resumiu: “Demitido com razão”. O comentário a autoridades europeias funcionou como um mecanismo para ajustar a imagem do Brasil. A ministra vendeu a ideia de que enxotar Alvim comprovou o repúdio do governo ao autoritarismo.

Da Europa, ela partiu para a Índia, a fim de compor a comitiva presidencial que realizará um périplo pelo país. Tereza, reitere-se, chegou quatro dias antes do desembarque de Bolsonaro e de seu chanceler. Aproveitou para armar encontros com produtores de carne e peixe e representantes do governo indiano para acertar os ponteiros de uma nova relação — o Brasil passou a vender carne à Índia apenas em maio. Ernesto Araújo e Tereza Cristina farão apresentações, no dia 27, num seminário para atrair investimentos. Há pouca dúvida quanto a quem será mais aplaudido.