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segunda-feira, 18 de março de 2013

Retratos do Brasil de hoje (infelizmente) - Percival Puggina

Triste quando o que aparece para postar é sempre negativo, pessimista, desalentador. Mas o que fazer quando essa é a realidade dos nossos tempos, de milhares de pessoas em todo o Brasil, desamparados, não assistidos por nenhuma política social, por nenhuma ação afirmativa, nenhuma cota, nenhum olhar do Estado, já que não somos maioria oprimida, apenas brasileiros normais?
Dois exemplos da vida como ela é, em dois textos recentes do gaúcho Percival Puggina.
Paulo Roberto de Almeida  

O SOCIAL E O SOCIETÁRIO NO PETISMO
          Percival Puggina

          Não sei se já contei isto. Acho que já contei, sim, mas conto de novo porque a situação perdura. Eu havia estacionado em um posto de gasolina e quando me dirigia para o inevitável cafezinho, um rapaz, maltrapilho e maltratado como diria o Chico, aproximou-se de mim, declarando-se com fome, e me pediu um cachorro-quente. A frase - "Estou com fome" - não admite qualquer contestação. "Claro que sim, vem comigo".

            Suponhamos que eu parasse naquele posto diariamente e que, também diariamente, o rapaz estivesse ali, reiterando-me seu apelo. Ao cabo de um mês eu teria despendido uma boa quantia com ele sem elevá-lo um centímetro na escala social. Ao contrário, eu o teria degradado à condição de  dependente. Agora, ampliemos a cena. No meu lugar, coloque o governo federal, substitua o rapaz com fome por 22 milhões de famílias e o lanche por uma ajuda de custo para completar, em cada núcleo familiar, por pessoa, uma receita mínima de R$ 70 (o governo chama isso de renda...).

            O leitor pode estar pensando - "Será que o Percival Puggina prefere que as pessoas passem fome?". Não, claro que não. Eu não sou contra o Bolsa- Família. O Lula é que era contra o Bolsa-Escola, no tempo do FHC. Escrevo motivado pela recentíssima divulgação pela ONU dos novos Índices de Desenvolvimento Humano. Eles situam o Brasil na 85ª posição do ranking mundial, com uma visível estagnação nos últimos anos. Como é possível? Com 22 milhões de famílias recebendo do governo um complemento de "renda" mensal?

            Pois essa é a consequência do problema que muitos, entre os quais eu mesmo, já cansaram de advertir. O Bolsa-Família é um programa necessário, sim. FHC, aliás, já o havia instituído com o nome de Bolsa-Escola, sob severas críticas de Lula e do PT. É um programa que cria dependência em proporções que tornam desnecessário prová-la. Mas, isoladamente, nada faz que se possa denominar promoção social ou desenvolvimento humano. Em nada contribui para que as famílias em situação de miséria disponham, um dia, das condições necessárias para cuidar bem de si mesmas. Esse "cuidar bem de si mesmos" é o que fazem as pessoas nos países situados no topo da tabela da ONU. Na maior parte desses casos, não é o Estado que cuida bem das pessoas, mas as pessoas que têm habilitações que lhes permitem uma renda suficiente para fazê-lo.

            A pergunta que dirijo ao PT, ao seu parceiro PMDB, e aos demais membros dessa organização societária estabelecida no Brasil, é esta: - Quando é que vocês vão levar a sério o problema da Educação? Os indicadores sociais já mostram que estamos praticamente estagnados! Menos gente passa fome no Brasil e isso é muito bom. Mas cai nos ombros dos senhores, após uma década no poder, o peso dos anos perdidos e o desastre social que os números estão a apontar.

            Reconheço que o PT descobriu o Brasil em 2003. Reconheço que, assim como Cabral cravou uma cruz nas areias de Porto Seguro, Lula plantou uma estrela vermelha nos jardins do Palácio da Alvorada. Reconheço, também, que o PT realizou isso após haver inventado a roda, a roldana, o avião e a suíte presidencial a bordo do avião. Mas o fato é que nos setores fundamentais do bem estar social - Educação, Saúde e Segurança as coisas vão de mal a pior. A síndrome da dependência em que se afundou parcela significativa da população brasileira tornou-se elemento fundamental da organização societária que (vou usar um neologismo que a esquerda adora) se empoderou no Brasil.
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* Percival Puggina (68) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.

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 AS INSTITUIÇÕES TITUBEIAM!
          Percival Puggina
 
          Foi assim. Saíramos para jantar, minha mulher e eu. Íamos, no carro dela, para um restaurante localizado em rua calma de Porto Alegre. Procurando onde estacionar, subimos a via até encontrar vaga. Dali, caminhamos no sentido inverso, rumo ao restaurante. Minha mulher seguia alguns passos adiante. Subitamente, um rapaz com o rosto semi-encoberto materializou-se ao meu lado. Surpreso com a aparição, esbocei um sorriso que pretendia significar - "Brincadeira sem graça, moço!". Creio que ele interpretou minha atitude como desrespeitosa e, por isso, retrucou ao meu sorriso com cara de poucos amigos. Cenho cerrado, baixou os olhos na direção da arma que apontava. Só nesse momento, acompanhando o olhar dele, vi a pistola e entendi o que estava acontecendo. Pediu-me a chave do carro, no que foi prontamente atendido, e a carteira, que acabei negociando pelo dinheiro que levava no bolso. Alguns metros adiante, um parceiro pedira para minha mulher que retornasse ao ponto onde eu estava sendo depenado. Em poucos segundos concretizou-se a operação.

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            Muito já escrevi a respeito da ideologia que, escarrapachada nas fofas e seguras instâncias do Estado e do governo, dá causa à proliferação da criminalidade em nosso país. Tenho mostrado a tolerância das leis penais, clamado pela construção de mais e mais presídios, e reprovado as misericordiosas progressões de regime que desembocam num prematuro e fervilhante semiaberto. Tudo absolutamente em vão, claro. Emitia esses clamores motivado pelo relato de experiências alheias, muitas das quais bem mais aterrorizantes do que a minha. Aliás, a bem da verdade, o assalto que sofremos foi sem resistência nem insistência. Vapt-vupt. Eles queriam o carro e nós que sumissem dali tão depressa quanto possível. Com o ocorrido, entrei para as estatísticas. Tive meu choque de realidade. Sou recente vítima de uma ideologia que estimula a criminalidade, de uma legislação que protege o bandido e deixa a vítima ao desabrigo, e de uma política de direitos humanos "politicamente correta", perante a qual eu sou o malfeitor e o bandido é o justiceiro revolucionário. Aliás, essa é a tese do líder do PCC, o bandido Marcos Willians Herbas Camacho, mais conhecido como Marcola, que se for objeto de dissertação em muitos cursos de Direito do país garante título de mestrado com louvor. Escrita com palavras santimoniosas, a mesma tese já inspirou pelo menos uma Campanha da Fraternidade.

            Aqui no Rio Grande do Sul, durante o governo do petista Olívio Dutra, o Secretário de Justiça, desembargador aposentado João Paulo Bisol, diante de clamores sociais ante o vertiginoso crescimento da bandidagem, observou que também ele, secretário, se estivesse sem dinheiro, com filho doente precisando de remédios, não hesitaria em assaltar uma farmácia. Passaram-se mais de dez anos e até hoje só vi farmácias assaltadas pelo dinheiro do caixa. Nenhuma por comprimidos de antibiótico. Assim, passando a mão por cima, com plena vigência do desconcertante binômio "a polícia prende com razões para prender e a justiça solta com razões para soltar", tornamo-nos um país onde o crime é rentável, compensa e os bandidos passeiam em liberdade.

            Horas após o fato descrito acima, relatei-o sucintamente no facebook. Em pouco tempo, mais de uma centena de mensagens se seguiram, descrevendo experiências semelhantes ou piores. Um bom número dessas vítimas, dispersas pelo Brasil, contavam terem sido assaltadas várias vezes (o recordista menciona 18 ocorrências). Pois bem, o silencioso ataque a um casal, a caminho do restaurante, numa rua tranquila de Porto Alegre, tem a ver com todos esses relatos e estes tem a ver com o surto de violência em Santa Catarina. Quando o Congresso decide fazer alguma coisa a esse respeito, como, por exemplo, retirando o direito a progressão de regime para quem comete crime hediondo, o STF declara a lei inconstitucional. Esgota-se a paciência dos brasileiros. Infames linchamentos, que vez por outra ocorrem em regiões diferentes do país, decorrem, em boa parte, da descrença social nas instituições do aparelho estatal voltadas para a proteção dos cidadãos. O crime, organizado ou desorganizado, declarou guerra à sociedade e é inequívoco: as instituições titubeiam!
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* Percival Puggina (68) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia e Pombas e Gaviões.

sábado, 14 de agosto de 2010

Balanco do governo Lula: o capitulo social (RIP Fome Zero)

O Brasil mudou? Talvez, mas esses habitantes da cidade que tinha sido escolhida para ser o símbolo da mudança talvez não concordariam com a avaliação. Vejam a matéria abaixo.
Paulo Roberto de Almeida

Os restos mortais do Fome Zero se espalham pela cidade onde nasceu
Augusto Nunes - Direto ao Ponto
Blog Veja, 13/08/2010

Concebido pelo presidente Lula, o Programa Fome Zero nasceu em 3 de fevereiro de 2003 num palanque armado na única praça de Guaribas, interior do Piauí. Morreu dois anos depois sem ter saído do berço, mas nunca teve sepultamento cristão. Ninguém providenciou o velório, o atestado de óbito não foi expedido. Só existe a certidão de batismo, assinada pelo governador Wellington Dias e por quatro ministros que, na grande festa promovida há sete anos e meio, enxergaram no recém-nascido a cara do Brasil-Maravilha inventado pelo maior goverrnante de todos os tempos.

Depois da discurseira do governador, depois do falatório dos ministros Ciro Gomes (Integração Nacional), Benedita da Silva (Assistência e Promoção Social), José Graziano (Segurança Alimentar) e Olívio Dutra (Cidades), os quase 5 mil habitantes souberam como seria, no máximo até dezembro de 2006, a vida de quem tivera a sorte de vir ao mundo no lugarejo promovido por Lula a Capital do Fome Zero. Um vidaço de Primeiro Mundo.

A cidade seria premiada com médicos, um hospital, postos de saúde, uma farmácia, escolas, esgoto, água, luz, telefone, calçamento, um hotel, uma estrada asfaltada de 53 quilômetros, um programa de fortalecimento da agricultura familiar, outro de capacitação profissional. Quem não ganhasse dinheiro no campo prosperaria na cidade como artesão ou costureira. Uma empresa do governo, Emgerpi, cuidaria exclusivamente do mundaréu de canteiros de obras. E administraria com especial carinho p Memorial do Fome Zero, colosso arquitetônico destinado a eternizar a lembrança do dia em que tudo mudou.

As coisas se arrastaram até 2005, quando o governo federal descobriu que o Bolsa-Família rendia muito mais votos, matou o Fome Zero de inanição e tentou sumir com o corpo. Não conseguiu, constatou em julho a repórter Sandra Martins, do jornal Tribuna do Piauí. A jornalista descobriu que os restos mortais da fantasia eleitoreira se espalham pela cidade iludida. E transformaram Guaribas numa prova contundente de que a visão do Brasil real é obscurecida por um país do faz-de-conta que só existe na propaganda oficial.

Passados sete anos e meio, há em Guaribas as três escolas que já existiam, um posto de saúde, um médico, nenhum hospital, três enfermeiros, nenhuma farmácia, cinco telefones públicos, uma lanchonete, uma mercearia, uma agência do Bradesco. As calçadas são contadas em metros, as ruas continuam sem pavimentação, só existe água em poucas casas, falta energia elétrica, e centenas de fossas denunciam a inexistência de tratamento de esgoto no aglomerado de 942 residências, incluídos os casebres miseráveis que o governador e os ministros prometeram erradicar.

O programa de capacitação profissional parou nas máquinas de costura que enferrujam perto da praça. A agricultura familiar nunca desceu do palanque: neste ano, a safra se resumiu a um punhado de sacos de milho. A estrada não foi pavimentada. A construção do memorial ficou no esqueleto. Esquecido pelo PAC, que entre o que não vai construir incluiu até um trem-bala, o monumento virou ruína sem ter sido inaugurado.

Como as 805 bolsas-família são insuficientes, muitos moradores engrossaram a diáspora dos nordestinos. “A população diminuiu, as pessoas estão indo embora em busca de trabalho”, lamenta o secretário de Administração da prefeitura, Edmilson Pereira Maia, que atribui o fiasco do Fome Zero ao descaso do governo federal. “Eles montaram aqui uma administração paralela e depois abandonaram tudo”, informa. O escritório ocupado pela Emgerpi está com as portas lacradas há mais de ano. O dono do imóvel, Manoel Gomes, avisa que só vai devolver a mobília e os objetos que reteve quando receber o aluguel atrasado.

Lula prometeu visitar Guaribas duas vezes. Nunca deu as caras por lá, mas importou alguns moradores para uma audiência em Brasília. Carmelita Rocha, 70 anos, uma das integrantes da comitiva, jamais soube exatamente o que foi fazer na capital, mas garante que ali viveu os melhores momentos da vida. Comeu bem, dormiu num quarto de hotel, passeou em carros de luxo. As coisas hoje ficaram muito piores.

Viúva há três meses, sustenta a própria família e a da irmã, que também enviuvou recentemente, com os R$ 400 da aposentadoria que herdou do marido, enterrado na cova rasa com o corpo envolvo numa rede. “Compro um saco de arroz, café, açúcar, massa de milho, sabão e só”, diz Carmelita. “Não estamos passando fome rachada, mas são vários dias que não temos o que comer”. Ela recorda nitidamente do comício que lhe prometeu três refeições por dia. Se conseguisse uma, Carmelita ficaria muito feliz.


Vejam como está a rodovia que Lula prometeu em 2003 à capital do Fome Zero

Foto: André Pessoa

Em 3 de fevereiro de 2003, liderada pelo governador Wellington Dias, a comitiva encorpada por cinco ministros e dezenas de pais da pátria baixou em Guaribas, no interior do Piauí, para a festa de lançamento do Programa Fome Zero. Concebido pelo governo Lula, o programa garantiria três refeições por dia e uma vida de Primeiro Mundo aos 200 milhões de brasileiros ─ começando pela cidade de 5 mil habitantes oficialmente promovida a Capital do Fome Zero.

Três horas de discurseira celebraram as providências que haveriam de conferir feições europeias ao lugarejo distante de Teresina mais de 600 quilômetros. “Vamos começar pelo asfaltamento da estrada”, prometeu em nome do presidente Lula o governador piauiense, sob os sorrisos aprovadores dos figurões federais e a felicidade geral da população: nada merecia mais urgência que a pavimentação dos 54 quilômetros de terra que ligavam (ou separavam) Guaribas de Caracol, o município mais próximo.

O presidente Lula exigira o asfalto, explicou Wellington Dias, porque fazia questão de aparecer por lá de carro, não a bordo de helicópteros. Em novembro de 2009, os moradores de Guaribas foram informados de que o chefe de governo enfim daria as caras na capital que nunca visitou. O comício foi cancelado quando Lula soube que não havia nada a inaugurar. Nem havia estrada asfaltada.

Como se verá num dos posts desta sexta-feira, as promessas nunca saíram do papel. A construção do Memorial Fome Zero, iniciada em 2003, foi interrompida no ano seguinte. Ao virar ruína antes de existir, o memorial transformou-se num monumento à fantasia irresponsável. Passados sete anos e meio, a foto mostra como está a rodovia que leva à capital do Brasil do faz-de-conta que Lula inventou e Dilma Rousseff finge que enxerga.